Esclarecimento: Só reiterando que esta história não me pertence, ela é uma adaptação do livro de mesmo nome, de Ally Blake, que foi publicado na série de romances "Modern Sexy", da editora Harlequin Books.

Aviso: Este capítulo tem uma cena hot, então, já a partir daqui, esta adaptação passa ser Rated M. Bem, todos foram avisados...


Capítulo 2

Ginny estava de pé no corredor longo do lado de fora de seu apartamento, sua mão trêmula enquanto tentava enfiar a chave na fechadura. Não ajudava muito o fato de Draco estar logo atrás dela, o calor do corpo dele provocando loucuras em seus nervos.

Eles não tinham dito uma palavra depois de se deixarem cair no banco traseiro de um táxi, em que Ginny havia informado seu endereço em uma voz que soou como se ela estivesse imitando uma foca com laringite.

Os joelhos dos dois quase se tocavam a cada vez que o táxi dobrava uma esquina, mas não chegavam a fazê-lo. Os dedos mindinhos quase se tocavam também no assento de tecido áspero, mas não chegavam a fazê-lo. Olhares se esbarravam como se estivessem se buscando, uma e outra vez, ameaçando se enroscar de tal forma que o coração de Ginny parecia a ponto de explodir em seu peito, porém não chegavam a fazê-lo.

Quando finalmente chegaram ao seu prédio, em South Yarra, ela estava tão tensa que ficou surpresa por conseguir caminhar em linha reta.

- Deixe-me tentar - disse Draco, atrás dela. Ele veio até Ginny, tirou a chave de sua mão e a introduziu na fechadura com a maior facilidade, como se ela tivesse simplesmente se aberto para ele, com um suspiro.

Qualquer fingimento de que haveria mesmo uma refeição sendo servida voou pela janela quando ela se jogou nos braços de Draco, deslizou as mãos pelo belo cabelo dele e ficou na ponta dos pés, beijando-o com toda a vontade que vinha guardando.

Adiar a autogratificação, como ela havia feito tantas vezes antes, tinha claramente sido uma idiotice. Ela mal tivera duas conversas com o sujeito, nem ao menos se lembrava de seu sobrenome. Nunca havia sido tão bem beijada em toda a sua vida.

Ele era um profissional, ou pelo menos alguém talentoso e bem acima das restrições das leis da natureza. Fazia coisas com a língua que Ginny nem imaginava serem possíveis. O corpo dela não ligava a mínima para o que era ou não possível, simplesmente se derretia e doía de desejo e implorava por tudo aquilo e ainda mais. Provavelmente mais do que ela saberia como lidar.

A intensidade trouxe consigo uma dor que pareceu preencher seus ossos, deixando-a sem fôlego e fora de si.

"Sorbet !" Ela gritou, em silêncio, como se fosse um mantra, quando o bom senso ameaçou erguer sua cabeça inútil. Era isso que ele era: um ácido, refrescante e adstringente sorbet. E se por algum alinhamento dos astros ele havia tido motivos para escolhê-la para uma aventura de uma noite, justo quando Ginny mais precisava, que assim fosse.

Os lábios de Draco se moveram para o lóbulo da orelha de Ginny, para a pequena depressão na base de seu pescoço, mordiscando ao longo de sua clavícula. As mãos dela se enterraram no cabelo macio da nuca dele, enquanto ela mordia o lábio. Todos os seus sentidos, com exceção dos pontos onde seus corpos se tocavam, tinham ficado tão dormentes que ela não sentia mais suas extremidades.

Ginny só percebeu que o equilíbrio dele também fora afetado quando tropeçaram para trás e a maçaneta, ainda com a chave, machucou suas costas.

Foi então que notaram que ainda estavam no corredor.

Com uma força que nem sabia que tinha, ela levou a mão às costas, abriu a porta com um empurrão tão vigoroso que quase arrancou a maçaneta, agarrou Draco pelas lapelas do paletó e o puxou para dentro. A porta se fechou atrás dele, mergulhando os dois na escuridão. Apenas uma fina réstia vertical de luz era visível na borda das cortinas da sala de estar.

Eles ficaram parados, os dedos dela enroscados no paletó de Draco, a respiração forte dele agitando de leve o cabelo de Ginny, caído sobre os ombros.

A falta de visibilidade fez com que tudo ficasse subitamente maior. O ronronar e os barulhos da geladeira velha tomando vida. O zumbido distante do tráfego ao longo do rio, lá embaixo, pulsando no ritmo do coração dela.

Com um lento e deliberado deslizar, a mão dele encontrou um lugar divertido no final das costas de Ginny, o que fez sua pele se arrepiar e arder. Ela se apertou deliciosamente contra o corpo rijo dele.

Enquanto os lábios dele pousavam sobre os dela, insistentes e quentes como o inferno, todos os sons, próximos e distantes, desapareceram na onda de calor.

Em algum momento, Draco se desfez do paletó e da gravata. Ginny esperava ter entrado no apartamento com seus sapatos, mas não tinha muita certeza. Tudo o que ela sabia era que sentia uma necessidade quase primitiva de ficar na horizontal.

Eles foram tropeçando, recuando pelo apartamento às escuras, trombando nos sofás, mesinhas, abajures, no vaso com uma planta falsa. Um canto dobrado de um tapete quase a derrubou.

Quando algo balançou sobre uma superfície e caiu com som de estilhaços, Draco deu um pulo, mas Ginny apenas o pegou pelo queixo e continuou a beijá-lo.

Sem que fosse preciso explicar novamente, ele a tomou nos braços, levantou-a do chão e encontrou o caminho até o quarto sem bater em mais nada, como se tivesse algum tipo de GPS sexual.

O luar filtrado pelas cortinas transparentes da janela do quarto era felizmente muito mais claro, dando-lhe uma visão perfeita do corpo supremamente masculino de Draco. Sua camisa e calça tinham sumido, deixando-o de cueca boxer preta de algodão. Ela sorriu, ao imaginar o quanto as roupas de baixo dele eram conservadoras, considerando o que estavam a ponto de fazer. Então ele respirou com força, como um garanhão sentindo a presença de uma égua no cio, e deu um passo na direção dela. O que eles estavam a ponto de fazer ficou mais importante do que qualquer outro pensamento.

Ele achou o zíper do vestidinho de Ginny, abrindo-o lentamente, e suas vértebras foram desmoronando em solidariedade.

Roupas tiradas, preservativo colocado, a parte de trás dos joelhos dela encontrou a beirada da cama e ela se deitou. Ele foi junto.

Grande, forte, firme, confiante e lindo de partir o coração.

Só que ele não iria partir seu coração. E ela definitivamente também não partiria o dele. Como se essa certeza fosse a última permissão de que precisava, Ginny estendeu o braço, passou a mão pela nuca de Draco e o puxou para um beijo.

O deslizar de pele sobre pele a deixava sem fôlego, como se seu corpo não conseguisse processar ao mesmo tempo o oxigênio e a avalanche de sensações que caía sobre ela.

Talvez fosse por causa da aventura inédita de uma noite. Talvez fosse porque isso só aconteceria uma vez, e ela estivesse se permitindo uma entrega total.

Talvez fosse Draco.

E então ele estava dentro dela. Foi repentino, chocante, mas ela estava mais do que pronta. Suas pernas o enlaçaram, porque Ginny precisava da sensação se intensificando dentro de si mais do que acreditara possível. Como se fosse por isso que ela esperara a vida toda. Não aquela bobagem romântica e piegas da qual ela vivera até então, mas isso.

Os lábios dele criavam o caos por onde quer que passassem, devastando-a a ponto de ela se sentir sem ossos. Fazendo com que ela se sentisse indefesa, vulnerável...

Não ! Isso era para ser uma tomada de controle sobre sua vida emocional.

Encontrando um último resquício de força, ela o virou até ficar por cima. As mãos dele encontraram seus quadris, seus polegares deslizando por eles, os tremores que passavam por ela acabando com qualquer tipo de ascendência que pudesse ter tido.

Ginny passou as unhas pelo peito de Draco, sobre a sólida ondulação coberta pela pele lisa. E quando os olhos cheios de desejo dele se fecharam, e ele precisou abrir a boca para conseguir respirar, ela se sentiu formidável. Renovada.

As sensações aumentaram, impedindo qualquer pensamento e sentimento, a não ser o desejo fluindo através dela, quente e incansável.

Então toda a sensação se contraiu até ficar do tamanho de uma cabeça de alfinete.

Retrocedeu para algum ponto minúsculo profundamente dentro de seu âmago. Enquanto redemoinhos e calor vermelho-sangue giravam por sua mente, por seu corpo, bombardeando seus sentidos com mais prazer do que ela conseguia processar, o único pensamento vagamente coerente que Ginny teve foi de que, em toda a sua curta vida, nunca soubera que isso poderia ser assim.

Nunca.

E isso vindo do primeiro cara para quem ela já havia olhado e dito: "Isso é coisa de uma noite só". Francamente, considerando por que ela havia ido atrás de sorbet para começar, era mais do que merecido.


Ginny sentou-se na cadeira grande de couro, os olhos fechados, enquanto a cadeira zumbia maravilhosamente embaixo dela. Um ruído surdo à sua direita lhe disse que Luna havia finalmente chegado ao encontro fixo de toda manhã de domingo no Shangri-Lovely Nail Bar.

- Bom dia, raio de Sol ! - borbulhou Ginny.

- Como você pôde começar sem mim ? - resmungou Luna.

Ginny abriu os olhos e deu de cara com Luna, encurvada, de óculos escuros, os cabelos loiros puxados em um rabo-de-cavalo desalinhado, grunhindo enquanto, irritada, apertava os controles, para programar sua cadeira de massagem do seu jeito favorito.

- Você nem estava em casa quando saí. Achei que eu acabaria ficando aqui sozinha hoje.

Luna fez sinal de positivo com as duas mãos para sua manicure habitual, pedindo um expresso duplo, em uma caneca, antes de olhar significativamente para o pacote de biscoitos meio devorado que Ginny deixara sobre uma revista de moda que ainda achara tempo para abrir, entre um e outro sonho, acordada.

- Gotas de chocolate ? A esta hora da manhã ? Não é como se você tivesse desenvolvido um apetite depois que eu fui embora - seus olhos voltaram-se para Ginny, lentamente - Ou será que foi isso mesmo ?

Ela lambeu um pedacinho de chocolate derretido do dedo, com imagens da noite anterior pulando e correndo por sua mente como um velho filme mudo. Um show de slides de braços musculosos, ombros largos e quilômetros de uma pele linda, morna, ficando vermelha sob suas unhas enquanto ela...

Um rubor quente e rápido tomou conta de seu rosto.

- Não mude de assunto. Estamos aqui para falar de você e do rapaz da jaqueta de couro.

Mas Luna estava apontando para o belo esmalte cor-de-rosa que a manicure estava passando nas unhas do pé de Ginny.

- Olhe ! Você fez isso mesmo ! Você deu sorte, sua safada !

- Que diabos meu esmalte tem a ver com isso ?

- Na semana passada você só queria vermelho. Vermelho Privação de Sexo, vermelho Devoradora de Homens. E hoje você escolhe esse cor-de-rosa Saltitando Sobre Canteiros de Margaridinhas ? Alguma coisa aconteceu entre a noite passada e esta manhã.

Ginny piscou várias vezes, sem acreditar que havia se entregado tão facilmente.

- Primeiro fale do garotão mal-humorado da jaqueta de couro.

- Tudo bem. Então, toda aquela pose de garoto malvado, é só da porta para fora. O nome dele é Andrew e ele mora com a mãe. Eles criam furões na sala de estar. Nada disso eu soube até hoje de manhã, quando fiz minha marcha da vergonha, passando pela mãe dele, que havia dobrado minhas roupas em uma pilha arrumadinha, em cima do sofá da sala de estar...

Luna agitou as mãos loucamente à frente do rosto.

- Eu só quero esquecer a história toda. Agora. Sua vez. O Gostosão-Bonitinho voltou ?

- Nããão !

- Quem, então ? Não o Ivan ?

- O barman ? - por esse palpite, Luna não mereceu mais do que um olhar sem expressão.

Luna franziu as sobrancelhas, claramente confusa.

Ginny esperava que ela continuasse daquele jeito. Desejava continuar surfando na doce onda mental em que ainda estava, horas depois, como se estivesse envolta em uma nuvem de um perfume exótico, por um pouco mais de tempo antes que a amiga começasse a dissecar a coisa toda até matá-la.

Então, os olhos embaçados de Luna entraram completamente em foco pela primeira vez.

- O sujeito do terno ! Você pegou de terno ! Sua sonsa safadinha !

Luna guinchou alto o suficiente para que todos no trânsito, do lado de fora do salão, ouvissem cada palavra.

- Fale baixo ! Tenho certeza de que o restante das pessoas não liga a mínima para os detalhes íntimos das minhas escapadas noturnas.

A amiga olhou em volta.

- Você está brincando ? Por que motivo você acha que as mulheres vêm a lugares como este ? Não é preciso ser cientista espacial para conseguir passar esmalte nas próprias unhas em casa. Detalhes. Por favor. Antes que eu desista dos homens de uma vez por todas.

Luna se inclinou para a frente em sua cadeira de tal forma que quase caiu na bacia cheia de água a seus pés. A manicure chegou bem a tempo, enfiou seus pés na água e lhe deu um olhar de censura. Luna pareceu devidamente repreendida.

- E então, quem é ele ? Ele cumpriu todo aquele potencial glorioso ? Você vai vê-lo de novo ?

Ginny expirou longa e lentamente. Ela não ia ter um instante de paz até dar algo a Luna.

Olhando fixamente para os próprios pés, disse finalmente:

- Tudo bem. O nome dele é Draco. Draco não sei do quê, mas começa com M. Talvez seja Mitchell ? Moore ? Ele é ainda mais bonito sem o terno do que com ele. E não, nós não fizemos planos de nos ver novamente. Está feliz agora ?

Luna sorriu enquanto balançava a cabeça e tirava o telefone da bolsa, digitando algumas letras.

- Draco não sei do quê, mas começa com M ? Srta. Weasley, você fica aí com suas sardas bonitinhas em seu narizinho, como se fosse um bloco de gelo, mas é cheia de surpresas...

Ela sabia exatamente o que a amiga estava fazendo. Ela tentou pegar o telefone, mas a amiga era mais rápida do que parecia.

- Fique quieta ! - disse a manicure.

- Isso é importante ! - disse Luna, olhando feio de volta para ela.

A manicure deu de ombros.

- Por favor, não procure por ele na internet. Pelo amor de Deus ! - implorou Ginny.

Luna deu uma risadinha sarcástica.

- Você está brincando ? Hoje em dia isso é a primeira coisa que você tem que fazer no instante em que fica sabendo o nome de um homem. Caramba, se eu tivesse sido inteligente o suficiente para fazer isso com o Sr. Pobre Diabo na noite passada, seria uma pessoa mais feliz hoje. Acredite em mim. Estou lhe fazendo um favor.

Ginny apertou os dentes e desviou o olhar.

Ela sabia que tentar impedir a amiga de fazer o que queria era perda de tempo. E apesar de imaginar que provavelmente nunca veria o sujeito outra vez, uma parte nada pequena dela realmente ficara imaginando como um homem com aquela aparência, que beijava daquele jeito, e que havia aprendido como fazer as coisas que fizera com ela na noite anterior, tinha conseguido chegar à idade que tinha sem ter sido amarrado e casado sob a mira de uma arma.

Quando Luna ficou quieta por um tempo longo demais, Ginny olhou para ela e viu que seus olhos estavam ficando mais e mais arregalados, até parecerem a ponto de saltar para fora da cabeça.

- Eu sabia ! - exclamou Luna.

- O quê ? - perguntou Ginny, apesar de ter jurado a si mesma que não o faria - Ele é casado. Claro que ele é casado. Oh, Deus. Como eu pude ter sido tão...

- Ele não é casado.

A ladainha de Ginny foi interrompida. O alívio que ela sentiu era totalmente equivocado. Especialmente porque não era alívio por não tê-lo ajudado a trair sua esposa inexistente. Era alívio por ele ainda estar disponível.

Mas ela não estava. Claro que já se passaram seis meses desde que ela rompera com Harry. E não tinha apenas terminado, fez questão de se lembrar, mas sim rompido um noivado. Mas ela estava cheia de tudo aquilo: relacionamentos, namoros e blá-blá-blá.

No entanto, ela se viu chegando mais perto da amiga e perguntando:

- Então o que é ?

- Seu Draco não sei do quê se chama Draco Malfoy e é presidente da Fundação Malfoy. Já ouviu falai dela ?

Ginny piscou. Várias vezes.

- Dela, sim. Um representante da Fundação Malfoy é obrigatório em qualquer lista de lançamento, mas eles nunca aceitam; aparentemente, o tipo VIP festeiro não é muito o perfil deles.

- Você devia saber mais sobre suas listas de convidados.

Ela cruzou os braços.

- Eu sei de todos que compram carros esporte e de todos os que gostariam de poder comprar carros esporte. O restante das pessoas é só um borrão.

Luna olhou fixamente para ela.

- Você está falando sério quando diz que esse cara é um borrão ? - Luna virou o telefone e o empurrou para ela. E Ginny se viu encarando uma foto do homem que a havia deixado louca na cama na noite anterior.

Cabelos loiros e pálidos, sobrancelhas retas, olhos cinza, com pálpebras pesadas, que pareciam semicerradas, um nariz orgulhoso, saído diretamente de um romance de Jane Austen. Além de uma mandíbula que teria feito Michelangelo sair para comprar mármore imediatamente.

Ele era realmente tão maravilhoso quanto ela lembrava.

Os hormônios dela ficaram repentinamente tão descontrolados que seu coração pulou na garganta e ficou preso ali. Se estivesse de gravata, teria que afrouxá-la.

Luna enfiou o telefone em sua bolsa imensa, sorrindo e desculpando-se com a manicure por ter ousado se mover.

- Na casa dele ? - perguntou ela.

- Na nossa.

- Claro. No meu território.

Luna provavelmente não sabia o quanto estava certa. A idéia de ter que sair de fininho da cama e se vestir com as mesmas roupas da noite anterior a teria posto em uma posição frágil demais, e a noite passada tinha sido uma forma de ela recuperar o controle sobre a própria vida. Sua casa fora o lugar certo para o sorbet. Ginny não poderia ficar com idéias bobas sobre uma possível permanência, se fosse ela quem tivesse que botar o sujeito para fora.

- Então, ele é o próximo quase sr. Ginny Weasley ?

Ginny abanou a cabeça com tanta força que ela chegou a doer.

- Foi...

"Estimulante, eufórico, erótico", pensou ela.

Mas o que ela disse foi:

- Foi coisa de uma noite.

- Bom - disse Luna - Melhor ficar assim mesmo.

Ela assentiu distraidamente, enquanto sua cadeira de massagem começou a seqüência de relaxamento de suas costas.

Elas tiveram aquela mesma discussão uma dúzia de vezes ou mais nas semanas seguintes à degradante partida de Harry de suas vidas.

Luna tinha até elaborado um mantra que ela estava certa de que Ginny deveria tatuar na testa, ainda que temporariamente: "Homens podem ser para diversão, não apenas para compromisso".

Em parte por isso, ela não contou à amiga que no último segundo tinha dado seu telefone a Draco, rabiscando o número nas costas de um ticket de supermercado e o enfiando no bolso do paletó dele enquanto eles se beijavam como adolescentes na porta do apartamento dela, em alguma hora absurda da madrugada.

- Pare - disse Luna.

A manicure olhou para cima, franzindo a testa. Luna revirou os olhos e, em seguida, apontou para Ginny com o polegar. A manicure assentiu, compreensiva, antes de voltar à sua lixa.

- Pare de pensar nele. É perigoso.

- Você está brincando ? Eu não consigo me mover sem ser obrigada a me lembrar das minhas acrobacias noturnas - disse ela, falando pelo canto da boca - Ainda posso sentir o perfume dele no meu cabelo. Acredite em mim, não é tão fácil assim simplesmente me desligar.

Luna girou em sua cadeira enorme de massagem e encarou Ginny, agarrando-a pelas duas mãos. Dessa vez, a manicure não reclamou, apenas olhou para Ginny também, olhos interrogativos, a lixa pairando acima dos dedos dos pés de Luna.

- Ginny, minha querida - disse Luna - Escute-me, só desta vez. Você não fuma. A droga mais pesada que eu já a vi usar foi cafeína. Você não cutuca o nariz em público. Seu único e verdadeiro vício é romance. Você fica tão envolvida que eu poderia dançar nua na sua frente agora mesmo e você nem veria, por causa dos seus olhos cheios de estrelas. Você, minha amiga, é viciada em amor. É seu único defeito. Mas, como todos os defeitos, ele tem potencial para ser arrasador. É um defeito que tem deixado caos e catástrofes em seu rastro.

Ginny apertou a mão de amiga.

- Eu consigo lidar com isso. Ele não é... não foi nada igual aos outros. Eu juro.

- Se você está dizendo...

E, com isso, Luna pôs de volta os óculos escuros e dedicou-se a dormir em sua cadeira.

A manicure deu de ombros, claramente desapontada, e voltou ao trabalho.

Enquanto isso, Ginny pegou sua revista e fingiu ler, enquanto as palavras caos e catástrofe dançavam à frente de seus olhos. Isso e a expressão no rosto de Harry quando ela havia tentado lhe devolver o anel. Sem surpresa. Sem raiva. Apenas resignação, como se ele tivesse previsto que isso aconteceria antes dela. Seu coração ficou apertado, abafando por um instante o cheiro de especiarias de Draco, que continuava em sua pele.

Porque a verdade era que Harry não havia sido o primeiro. Ela fora noiva mais de uma vez. Três, na verdade. Luna podia achar aquilo uma esquisitice adorável, mas era provavelmente a única pessoa que pensava assim. Ginny tinha quase certeza de que sua mãe achava que ela era uma vagabunda, isso quando não achava que era uma decepção. Não que ela jamais tivesse lhe dado uma pista do que poderia ter feito para melhorar isso.

Ginny afastou o pensamento da sensação de desamparo que a típica falta de afeição de sua mãe sempre lhe causava. Se ela precisasse de um gatilho que a mandasse correndo para os braços do primeiro sujeito que lhe desse um sorriso, a frieza de sua mãe seria perfeita. Algumas vezes, bastava um sorriso sexy, um segundo olhar, um aceno de cabeça passageiro do outro lado de um bar lotado e, de repente, semanas haviam se passado e lá estava ela, jogando-se pela mesma velha estrada. Viajando na sensação de sentir-se adorada.

E se alguém a adorasse o suficiente para lhe pedir que se casasse com ele ? Deus... haveria alguma maneira de sentir-se mais amada ? O problema é que normalmente era aí que ela percebia que a vista do alto não era o que ela imaginava. E que dali não havia aonde ir a não ser para baixo, o peso do anel desconfortavelmente instalado em seu dedo fazendo a descida ainda mais rápida.

Ela fechou a revista e os olhos, mexendo os dedos sob o ventilador que secava o esmalte de seus pés enquanto tentava se livrar do frio que subitamente a envolvera.

Aquela pequena fonte de calor foi suficiente para tirá-la dos altos e baixos de seu passado e levá-la de volta à noite anterior.

Para Draco. O nome passou por ela como um suspiro embriagador. Tudo em Draco havia sido diferente. Ele não tinha olhado para ela nenhuma vez como se ela fosse a realização de seus sonhos. Ele havia sido direto, mas ainda assim misterioso. Frio por fora e quente por dentro.

Ginny se mexeu na cadeira quando a sensação de desejo começou a borbulhar dentro dela. Quem quer que tivesse dito que era preciso amar um homem para apreciar o sexo era porque ou nunca tinha tido um excelente sexo com um estranho, ou estava só usando um mito para convencer garotas adolescentes a se comportarem.

E, por ter saltado direto na cama com ele, Ginny havia pulado alguns dos passos mais viciantes do processo, as caminhadas longas de mãos dadas, os toques casuais que anunciavam muito mais ainda por vir, todas as coisas íntimas que ela sempre parecia confundir com amor.

Seria um sinal de que ela teria uma porção de aventuras de uma noite com caras aleatórios em seu futuro ?

Ela torceu o nariz e decidiu não pensar no quanto isso a inquietava. Melhor apenas aproveitar o sentimento maravilhoso, quente e difuso que vinha apreciando a manhã toda.

Ela fizera por merecer. Estava no caminho certo para não se deixar prender novamente na mesma armadilha emocional.


Draco jogou um comprimido efervescente, o terceiro do dia, em um copo d'água. Enquanto olhava o comprimido laranja se dissolvendo alegremente no fundo do copo, passou a mão pela nuca, até que seus dedos atingiram um plástico rígido.

Ele tirou o boné de beisebol e o segurou nas mãos, dobrando a aba. Não podia se lembrar da última vez que tinha ido trabalhar de jeans e boné, se é que havia feito isso algum dia.

O que Alexandra dissera ? Algo sobre como ele nunca queria parecer nada menos que implacável ?

Se fosse assim, era só porque ele sabia que precisava transpirar confiança e, acima de tudo, credibilidade. Eles precisavam acreditar que ele era capaz. Essas qualidades, que antigamente a simples menção do nome Malfoy evocava, ele teve que trabalhar duro para reconquistar, depois que seus pais jogaram tudo fora em nome de uma vida agitada e veloz.

Mas a idéia de vestir um terno naquela manhã de domingo e de controlar a rebeldia de seu cabelo tinha sido demais até mesmo para ele.

Draco ainda não tinha dormido. E como poderia ? Sempre que fechava os olhos, ele era bombardeado por imagens de uma mulher ruiva maravilhosa. A cabeça dela caindo para trás, buscando o ar, enquanto o apertava mais forte. Então, o borrão denso que havia se estabelecido em torno dele antes de se espalhar até os limites de sua consciência, levando consigo cada pensamento, cada lista de coisas a serem feitas, cada plano, até que tudo ficasse quieto por um instante. O que era um instante a mais do que o que ele tivera em muito tempo.

As nuvens ao lado de fora de sua janela no décimo andar se afastaram, enviando um facho de luz do Sol primaveril insuportavelmente claro para os papéis espalhados por sua mesa, a brancura lhe dando uma dor de cabeça instantânea. Ele fechou os olhos e tomou a bebida efervescente, lavando com ela todos os pensamentos sobre a noite anterior.

Havia papéis que ele precisava ler antes de começar a trabalhar na segunda-feira. Memorandos de um auditor que ele contratara seguindo um palpite e que até agora não prenunciavam boas notícias. Longe disso. Ele podia ter sido cego quanto à gravidade das transgressões de seus pais, mas seus instintos nunca o enganaram desde então.

Se seguir esses instintos significava deixar de lado pensamentos muito mais agradáveis, a fim de manter a distinção e a credibilidade, era isso o que ele faria.

Implacável ? Ele já fora chamado de coisas bem piores, mas havia sido daquilo que a fundação tinha precisado quando ele fora obrigado a assumi-la. A escolha, então, consistira em algo entre a crueldade e a ruína.

O sucesso que ele havia extraído do quase desastre não lhe dera motivo, chance ou opção de mudar.

Draco pôs o boné de volta na cabeça, a aba estreita felizmente bloqueando o pior da claridade.

Quando havia trabalho a ser feito, sonhos despertos com ruivas de lábios doces simplesmente tinham que esperar a sua vez, junto com tudo o mais em sua vida.


A desculpa de Ginny para passar tempo demais na fábrica na manhã de segunda-feira era que ela estava encarregada de fazer uma festa grandiosa para lançar o produto que era mantido em segredo ali. O fato de que isso significava que ela teria a oportunidade de babar sobre o primeiro carro esporte Pegasus Z9 a sair da linha de montagem podia ter algo a ver com isso também.

Parecendo algo saído de um filme antigo de James Bond, o Z9 possuía interior de couro macio, rodas-palito cintilantes, faróis profundos de luz amarelada e curvas sensuais o suficiente para concorrer com a mais carnuda pick-up da mesma era. Ele era lindo, brilhante e feito para durar, como qualquer coisa bem pensada deveria ser.

- Honestamente, Neville - disse ela ao engenheiro mecânico que, com o tablet nas mãos, estava dando à sua amada criação a terceira revisão do dia - , ele é um deleite. A segunda coisa mais sexy que eu vi no ano inteiro.

As sobrancelhas grossas e negras de Neville se arquearam, demonstrando curiosidade.

Ginny sorriu.

- Foi uma semana e tanto.

Neville olhou para as mãos dela pela oitava vez, certificando-se de que ela estava usando as obrigatórias luvas brancas de algodão. E então voltou para seu objeto de desejo, deixando Ginny livre para sonhar acordada à vontade com o dela.

Ela passou um dedo enluvado pelo pára-choque voluptuosamente arredondado do Z9 até que seus sentidos tiniram com a lembrança dos cabelos loiros deslizando por entre aqueles dedos. Ela teve, enfim, que enfiar as unhas nas palmas das mãos para não gemer alto.

Seu telefone estrilou em seu bolso traseiro. Tirando as luvas, ela o puxou de lá com dois dedos, como se ele pudesse queimá-la, para ver "número não identificado" na tela.

Provavelmente era alguém da imprensa. Eles gostavam de surpreender as pessoas.

Ainda assim, sua voz estava rouca quando ela respondeu, com um atordoado "Ginny Weasley".

- Bom dia - disse a voz masculina, grave, que vinha sussurrando doces bobagens em sua imaginação a manhã toda.

Os joelhos de Ginny cederam, e felizmente o Z9 estava por perto.

Ela se agarrou ao retrovisor para não cair sentada. Neville franziu as sobrancelhas para ela, que rapidamente soltou o espelho, limpou as impressões digitais suadas com a barra de sua jaqueta macia e pediu desculpas em silêncio.

- Com quem eu falo ? - perguntou ela, sua voz agora um exemplo de tranqüilidade, esperando convencer o homem do outro lado da linha de que ele não a havia feito enrubescer com um simples bom-dia.

E em uma segunda-feira. Ela fez uma careta, sem saber o que aquilo poderia significar.

- Draco - disse a voz. E então acrescentou, como se ele só se lembrasse disso depois, a secura em sua voz dando uma indicação de que estava silenciosamente certo de que ela sabia muito bem quem era: - Malfoy.

- Oh, Draaaaco. Oi ! Como está tudo ? O que posso fazer por você nesta linda manhã de segunda-feira ?

- Você pode me fazer ganhar o dia dizendo que está livre esta noite.

- Desculpe... o quê ? - disse Ginny.

- Esta noite - disse ele, mais lentamente - Você está livre ?

Livre ? Mas tinha sido uma aventura de uma noite. Não tinha ?

- Com que propósito ?

- Você quer que eu seja específico ?

Ginny olhou em volta. Neville tinha sumido para algum lugar, deixando-a, e o Z9, em sua solidão. Ela mexeu os dedos dos pés para evitar que todo o seu sangue fosse para um único ponto de sua anatomia e disse:

- Claro, por que não ?

Através do telefone, ela ouviu um arrastar e um rangido e imaginou Draco de terno e gravata escuros, em algum arranha-céu chique da cidade, encostado em uma cadeira de escritório confortável de couro, olhando pela janela de um andar altíssimo, com a gloriosa paisagem de Melbourne espalhada a seus pés.

Quando a voz dele deslizou pelo telefone, grave e lenta, sua vibração enviou arrepios por toda a pele dela.

- Eu estava pensando que nós... - ele fez uma pausa, longa o suficiente para que ela prendesse a respiração. E então prosseguiu: - Nós poderíamos apreciar um pouco de música suave. Sem dúvida, também poderíamos conversar. E mais tarde, bem mais tarde, depois que eu tiver afrouxado minha gravata e você tiver chutado seus sapatos para baixo da mesa, e nós dois estivermos agradavelmente ensopados com algum vinho excelente, juntos poderíamos saborear a sobremesa.

Quando ele acabou de falar, ela estava recostada no Z9, o metal frio não conseguindo acalmar sua febre. De alguma forma, ela conseguiu manter sua voz calma quando disse:

- Então você está me chamando para um encontro.

Ele deu uma risada.

- Eu a estou convidando para jantar comigo, mas se você preferir chamar assim...

- Nããão ! - encontro não !

- Não ? - repetiu ele, depois de alguns longos segundos.

Ginny mordeu o lábio. Draco era um homem que ela havia conhecido em um bar e levado para casa. Para transar. Não como algum tipo de simpatia que pudesse levar a algo mais. Sua estridente rejeição à palavra "encontro" acidentalmente havia lhe dado uma saída da situação, se era isso o que ela queria.

Era isso o que ela queria ?

O que ela queria era vê-lo de novo. Queria tanto que todo o seu corpo doía. A vontade vibrava junto com sua pulsação - tum, tum, tum - , das solas dos seus pés até a depressão macia na base de sua garganta.

Outras pessoas, que não eram viciadas em relacionamentos, faziam esse tipo de coisa o tempo todo.

Jantavam. Transavam. Não ficavam noivas de todo sujeito que... então, desde que as expectativas não ultrapassassem a realidade, ninguém precisava sair machucado.

- Ginny ?

- Eu quis dizer "não, eu não prefiro chamar por nome nenhum".

- Certo - a voz parecia ainda mais grave e deliciosa pelo telefone. Os ombros de Ginny se ergueram, para compensar pelos tremores súbitos que corriam pela sua nuca.

- Vou trabalhar até tarde - disse ela.

- Que tal se nos encontrássemos para tomar alguma coisa lá pelas nove da noite ? - isso, um drinque. Mais casual, impossível. Ela escolheu o bar, um pub chique que ela havia notado ocasionalmente, em um dos muitos lugares legais e alternativos de Melbourne. O tipo de lugar que turistas não notavam e que vivia cheio de pessoas que trabalhavam na cidade.

- Não vejo a hora - disse Draco, e então desligou. Ela afastou o telefone e percebeu que estava com a orelha vermelha e dolorida, por ter apertado o aparelho contra ela com tanta força.

- Esse deve ter sido um telefonema daqueles.

Ginny deu um pulo, com a mão no coração. Ela se virou e viu Neville de pé a cerca de um metro de distância.

- Eu nunca vi uma mulher enrubescer nos tornozelos antes - disse ele.

- Meus tornozelos não fizeram nada disso.

- Se você está dizendo...

Ela não pôde evitar. Olhou para os próprios tornozelos, nus entre o final de sua calça capri e os sapatos lustrosos de salto alto, e viu que ele não estava brincando.

- Bem - gaguejou ela - Então você evidentemente tem muito o que aprender sobre as mulheres.

Neville sorriu de volta, enquanto seus olhos iam até o telefone, apertado em sua mãozinha suada.

- É o que parece.

- Ah, não me aborreça, Neville.

A risada de Neville ecoou por todo o salão, enquanto Ginny se virou e correu de volta para o elevador antes que começasse a rir também, seus saltos altos quase dançando no chão de concreto.


P. S.: Nos vemos no Capítulo 3.