Capítulo Um
Era o fim de uma longa semana e Elena sabia que devia ir para casa, mas o simples pensamento de passar mais uma noite sozinha era o bastante para mantê-la sentada na cadeira de seu consultório em Mystic Falls.
O último paciente havia saído e seu turno se encerrado. Ela virara a cadeira para a rua e passara os últimos 15 minutos contemplando a paisagem através da janela, relaxada demais para perceber que estava ficando tarde. O sol estava se pondo e a cidade começava a se iluminar, acendendo suas luzes.
Era sexta-feira à noite. As pessoas começaram a ocupar as calçadas, conversando em grupos e indo a algum lugar se divertir. Elena não tinha vontade de fazer o mesmo, mas também se sentia relutante em ir para casa.
Esforçara-se muito para transformar a casa de sua antiga família em um lar, mas, ultimamente, a solidão que sentia lá dentro a assombrava. Podia enchê-lo com música, alugar um filme e assisti-lo, relaxar lendo um livro e fingir que estava em qualquer outro país do mundo, mas ainda assim estaria só. Nos últimos tempos, estava se tornando um estado de isolamento, em vez de solidão.
Elena pensou em sua vida. Em como fora feliz na infância e na juventude, até a trágica morte de seus pais e de seu irmão, em um acidente de carro do qual ela fora a única sobrevivente. Ela se sentia culpada por isso, por ter sobrevivido enquanto eles não. Mas então, ela decidiu seguir a vida e fazer o seu melhor, por sua família.
Quando ela retornou para o último ano da escola, ela conheceu Stefan Salvatore, um aluno novo, que se tornou seu melhor amigo e namorado. Ele a ajudou a superar a perda dos pais, estando sempre com ela. Eles foram apaixonados e felizes, até entrarem na faculdade. Stefan foi estudar em Nova Orleans, com seu melhor amigo, e Elena foi para Withmore, com suas melhores amigas.
A distância foi o motivo que Stefan dera para o término do relacionamento, um ano depois. E Elena ficou arrasada. Ela perdera seu porto seguro, seu amigo, seu namorado. Foram dias difíceis, onde Elena se sentiu sozinha e desamparada outra vez.
Então Caroline, Bonnie e Damon, o irmão de Stefan que estudava em Withmore, passaram a levá-la para festas e shows, para que ela se distraísse. No início Elena recusava, mas com o tempo, passou a ir. E assim, ela foi se aproximando de Damon, que era quatro anos mais velho que ela e já estava na metade de seu curso universitário. Eles passaram cada vez mais tempo juntos, até estarem em um relacionamento.
Cinco anos de namoro depois, eles se casaram. Damon a pediu em casamento no último ano da faculdade e eles se casaram assim que Elena se formou. Foi um casamento simples e bonito, na primavera, com apenas os amigos próximos, em Mystic Falls. Elena não tinha família e Damon tinha apenas o irmão. Stefan compareceu, acompanhado de seu melhor amigo Klaus e sua namorada, a irmã de seu amigo.
Quando Elena viu Stefan com a namorada, ela se sentiu estranha. Não que ainda estivesse apaixonada por Stefan, isso não, ela amava Damon. Mas Elena tinha ficado magoada com o fim do relacionamento deles, da forma em que aconteceu, através de uma ligação telefônica. Mas ela não deixou que as pessoas percebessem. Ela ignorou Stefan e deixou que a felicidade da ocasião a guiasse.
Fora em seu casamento que Caroline e Klaus se conheceram e se apaixonaram. Klaus era artista, um pintor, além de gerenciar alguns negócios da família. Era um homem bonito e muito educado, com sotaque britânico e um sorriso com covinhas. Klaus encantou a todos, até Bonnie que sempre fora a mais desconfiada de todas. Caroline se apaixonou à primeira vista e passou a planejar seu próprio casamento. No fim, tudo acontecera como ela desejara. Ela e Klaus se casaram dois anos depois e tiveram duas filhas, gêmeas. Elena fora madrinha de uma das crianças, junto com Stefan, e Bonnie da outra, com o irmão mais velho de Klaus.
Por muitos anos Elena fora feliz. Ela chegou a pensar que seria assim para sempre. Mas os anos passaram e ela e Damon foram se afastando. Com a residência e depois o consultório, Elena estava sempre trabalhando. Damon seguiu a carreira de negócios, trabalhando para uma companhia que produzia vinhos, o que exigia que lhe ocupava bastante, exigindo que ele estivesse sempre viajando. A agenda deles passou a ser incompatível, eles se viam cerca de uma vez por mês. Tanto que, no casamento de Caroline, Elena fora sozinha, Damon não pôde acompanhá-la. Ela encontrou Stefan, agora noivo de Rebekah, a irmã do noivo de Caroline.
Elena passou a dar sempre desculpas para a ausência de Damon. Ela ia a encontros, aniversários, ações de graça, natais, sempre sozinha. Felizmente ela era bem recebida na casa de Caroline. Bonnie também comparecia, com Enzo, seu noivo. Elena se sentia constrangida por ser casada, mas estar sempre só. Ela sentia falta de um companheiro.
Elena fora deixando o tempo passar, ignorando os sinais de que seu relacionamento não ia bem, até o dia em que soube que o fim tinha chegado. Era noite e ela tinha voltado de uma visita a Caroline. Era aniversário de 3 anos da gêmeas. Elena observou como Caroline tinha sorte por ter uma família tão bonita, com um marido atencioso e duas filhas lindas. Ela se perguntou se teria isso um dia, uma família.
Elena tinha chegado na pensão Salvatore, a casa que dividia com Damon, quando notou um carro desconhecido estacionado em frente. Ela fora surpreendida por uma mulher grávida, que se apresentou como Katherine, amante de Damon. A mulher disse que esperava o filho do marido de Elena.
Fora um choque para Elena, ela sentiu como se seu mundo desabasse. Embora ela soubesse que seu casamento não estava bem, ela não esperava que Damon a traísse. E pior, engravidasse outra mulher quando dizia para ela que tinham que esperar para terem filhos.
Elena não discutiu. Ela saiu de casa deixando tudo para o marido e nunca mais voltou a pensão. Seu coração estava quebrado pelos sonhos desfeitos, pelo amor perdido. Seu divórcio saiu três meses depois e desde então, ela nunca mais falara com Damon. Nesse tempo, ela aceitara um emprego em Nova Orleans e passara cada vez mais tempo com Caroline e sua família.
Durante o primeiro ano após o divórcio, tudo fora difícil, mas Caroline, as crianças e Klaus faziam Elena se sentir bem, querida e acolhida em NOLA. O novo trabalho de Elena a ocupava bastante. Ela trabalhava na emergência do hospital local e com o trabalho intenso ela acabou se ocupando e esquecendo do casamento fracassado. Ela logo se acostumou a uma nova rotina, onde o trabalho ocupava a maior parte de seu tempo, mas jamais deixara de sonhar. Desejava amor, um marido, filhos, uma casa repleta de risadas e segurança, coisas que tivera quando criança.
Elena suspirou lembrando de como fora feliz em Nova Orleans junto da amiga, até que o acidente aconteceu e ela voltou para sua cidade natal, Mystic Falls, dois anos atrás.
Nesse instante, o telefone tocou. Uma leve carranca franziu seu cenho ao ser incomodada em suas reflexões. Quem estaria ligando para o consultório àquela hora? Elena pensou em não atender, mas imaginou que poderia ser alguma emergência.
— Elena Gilbert — disse ela num tom vivido.
— Elena, é o Klaus.
Seu coração deu um salto, ficando preso na garganta. Não precisava ouvir o nome dele para saber quem estava do outro da linha. Conhecia aquela voz tão bem quanto a sua e o sotaque britânico, que não se modificara apesar dos anos nos Estados Unidos, sempre o denunciaria. Ela engoliu em seco, endireitou a espinha e fingiu tratar-se de apenas de uma chamada como outra qualquer.
— Sim, sr. Mikaelson?
Ele emitiu um som impaciente.
— Droga, não me chame assim! Somos amigos a muitos anos para essas formalidades.
Elena engoliu em seco novamente, mas não conseguiu dizer nada. Fazia meses desde que ele falara com ela pela última vez.
— Elena? — Ele parecia impaciente.
— Sim. Estou aqui.
— Vou vender a casa — disse ele abruptamente. — Estou encaixotando os pertences de Caroline... e das meninas... e vou mandar tudo para o Exército da Salvação. Mas achei uma caixa que Caroline guardava. Retratos e coisas que vocês duas fizeram ao longo da vida. Achei que talvez você quisesse ficar com isso. Se não quiser...
A frase não foi concluída, mas Elena sabia o que ele ia dizer. Se ela não quisesse, ele as queimaria. Pegaria todas aquelas recordações e as destruiria.
Elena estremeceu por dentro só de pensar em pegar a caixa e reviver os anos que vivera com Caroline, porque a perda da amiga ainda era muito dolorosa. Mas não podia deixá-lo queimar aquelas lembranças da vida que tiveram juntas, de tudo que compartilharam. Talvez não pudesse mexer na caixa agora, mas a guardaria e daí a alguns anos seria capaz de tirar as coisas lá de dentro e recordar, sem muita dor, apenas com tristeza e nostalgia.
— Sim — disse num tom sufocado, as lágrimas ameaçando caírem. — Sim, eu a quero.
— Estou indo para casa amanhã para terminar de embalar as coisas. Pode passar lá a qualquer hora, para buscar a caixa.
— Eu irei. Obrigada — murmurou Elena.
Ele desligou, deixando-a com o fone encostado ao ouvido, ouvindo o som de ocupado do outro lado da linha.
Elena tinha a mão trêmula ao desligar o telefone. De repente, notou que já não estava sentada. Em algum momento durante a conversa, ela se erguera, provavelmente devido a ansiedade que ela sentira ao falar com Klaus. Apressada, ela pegou a bolsa, fechou tudo, apagou as luzes e trancou a porta ao sair do consultório.
Não eram apenas as mãos que tremiam, mas o corpo inteiro. Sempre ficava assim quando falava com Klaus. Mesmo após meses de treinamento para não pensar nele, para não se permitir sonhar com ele, o simples fato de ouvir sua voz tinha o poder de transformá-la em uma geleia.
Eles conviveram juntos por anos, desde que Klaus e Caroline se conheceram. Eles sempre se trataram com respeito e cortesia. Elena sempre admirou a forma como ele tratava a esposa e as filhas. Mas nunca tinha sido mais do que isso, até depois de seu divórcio com Damon. A mudança para Nova Orleans a deixou mais próxima de Klaus, e Elena fora tola o bastante para se apaixonar pelo marido da melhor amiga. Mais uma coisa pela qual ela poderia se culpar pelo resto da vida.
