O bicho-papão
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As cartas que Harry enviava aos padrinhos eram, a cada dia que passava, mais alarmantes. E foi principalmente por isso que tanto Petunia quanto Sirius apoiaram o garoto quando ele resolveu criar a Armada de Dumbledore. O ex-diretor seguia foragido, sem dar notícias a ninguém, e o clima pesava cada vez mais, dentro e fora das paredes de Hogwarts.
Sirius estava inquieto em Grimmauld Place, e compartilhou com Petunia seus temores de que tudo acabasse se repetindo, afinal, ele mesmo havia fundado um clube de duelos com James quando era pouca coisa mais velho que Harry. Petunia estava tão apavorada quanto o maroto, mas mantinha-se firme porque sabia que, entre os dois, era a pessoa mais racional e com o emocional mais estável.
O maroto voltou a ter pesadelos e tinha dias em que estava tão abatido que parecia ter voltado à Azkaban. Sirius estava frustrado, sentindo-se impotente, e Petunia o consolava, dizendo que ele tinha o papel mais importante de todos: ele era quem proveu a Harry uma casa, um verdadeiro lar. Um lugar onde ele era amado, onde ele seria feliz. O ano estava próximo do fim e em breve os três estariam reunidos. Eles poderiam, inclusive, repensar o fato de Harry voltar a Hogwarts no ano seguinte. Harry estaria seguro, eles estariam seguros.
"Harry nunca vai concordar com isso", Petunia comentou enquanto mexia a panela no fogão. Sirius recém havia dividido com ela a ideia de não mandar o afilhado de volta à escola no ano seguinte.
"Bom, ele pode mudar de ideia, as coisas estão ficando mais perigosas", Sirius explicou. O maroto batia as pontas dos dedos ansiosamente contra a mesa que, com o passar do tempo, passou a gostar graças aos convidados que a ocuparam e encheram a casa com risos. "Ele é só uma criança!"
Petunia parou de mexer a panela e se virou ao noivo. Caminhou até ele e jogou os braços em volta do pescoço do homem. Sirius imediatamente se virou a ela e a enlaçou pela cintura, encaixando-a entre suas pernas.
"Você também era", Petunia comentou carinhosamente. "Você, eu, Lily, James... E isso não impediu você e James de fundarem aquele grupo de duelos".
"Godric, o que eu virei?", o maroto resmungou. "De repente, virei um adulto, uma espécie de pai preocupado. O Sirius jovem ficaria decepcionado".
"Eu acho que ele ficaria orgulhoso", Petunia sorriu a ele. O homem sorriu de volta e capturou os lábios dela.
"Então eu estou me saindo bem nessa coisa de pai?", ele perguntou brincalhão, com os lábios ainda pressionados contra os dela. Petunia simplesmente murmurou um 'uhum'. "O que você me diz de nós treinarmos para os nossos? A parte de fazê-los, eu digo".
Petunia deu uma gargalhada, que foi cortada por um suspiro quando Sirius a puxou para perto até que ela ficasse sentada no colo dele, com uma perna de cada lado do corpo dele.
A panela, há muito esquecida, acabou secando o molho que Petunia antes preparava enquanto a mulher, deitada sobre a mesa da cozinha com a saia do vestido levantada até a cintura, recebia Sirius dentro dela. O maroto entrelaçou os dedos nos dela e devorava a boca dela a medida em que entrava e saía da mulher. Ela gemia, e suspirava entrecortando os risos baixos que escapavam de seus lábios.
Sirius limpou a panela assim que terminaram e se colocou a fazer uma janta para os dois. A mulher colocou a mesa e os dois resolveram inclusive acender algumas velas, que o maroto colocou a levitar pela cozinha usando sua varinha. Os dois comeram conversando animadamente, até o momento em que Sirius se viu assolado pela melancolia que o atormentava vez que outra.
"Sirius?", Petunia o chamou, hesitante. O maroto piscou várias vezes antes de se virar à ela. "Eu queria falar sobre algo com você".
"O que você quiser, minha deusa", Sirius respondeu, tomando a mão dela na sua e sorrindo galanteadoramente à noiva.
"Eu entrei no quarto de Regulus outro dia", ela disse, e o maroto imediatamente sentiu os músculos do pescoço e mandíbula se contraindo. "Eu estava explorando a casa, entrando em cômodos que não havia conhecido, eu não sabia que..."
"Túnia", ele a interrompeu. "Eu não estou bravo com você. Eu nunca vou ficar bravo com você. Essa casa é sua, e você pode entrar e sair onde quiser", ele respondeu com a voz doce, apesar do corpo rijo. Petunia suspirou aliviada. Os dois ficaram em silêncio por alguns segundos.
"Ele era só uma criança", a mulher finalmente desabafou. Sirius franziu o cenho.
"Ele era um Comensal", ele respondeu sério. "Ele era podre como todo o resto da minha família".
"Eu não acho que isso seja verdade", Petunia pontuou.
"Túnia...", Sirius suspirou, cansado, como se já tivesse debatido esse assunto inúmeras vezes antes.
"Ele tinha a idade de Harry quando... Quando você apareceu na nossa casa", Petunia respondeu. "Baby, o seu pai fez aquilo com você e... Desde que entrei no quarto do seu irmão eu fiquei me perguntando se ele não fez o mesmo com ele". Sirius bufou.
"Reggie era o perfeito puro-sangue, meu pai nunca encostou um dedo nele", o maroto teimosamente. Petunia sacudiu a cabeça lentamente em negativa. "Por que esse interesse repentino?"
"Porque estamos entrando em guerra de novo, exatamente como da última vez. E Harry só tem quinze anos!", Petunia explicou, um pouco sem paciência para a cabeça dura do maroto. "Quinze anos, Sirius. A idade que seu irmão tinha quando você saiu de casa. Você saiu porque queriam obrigar você a ser um Comensal. E se fizeram a mesma coisa com ele?"
"Impossível", Sirius respondeu de pronto, mas não conseguiu evitar ficar com uma pulga atrás da orelha.
"Nem todo mundo é corajoso como você para sair, baby", a mulher suspirou.
"Achei que eu fosse inconsequente", ele respondeu teimosamente, o que acabou arrancando um riso baixo de Petunia.
"No seu caso é praticamente a mesma coisa".
Depois que os dois caíram novamente em silêncio, Sirius pensou muito sobre o que Petunia havia dito a respeito de Regulus, e sentiu o peito pesado. E se ela estivesse certa? O maroto estava assolado pelo sentimento de que havia abandonado o irmão. Então, naquela noite, enquanto a loira estava profundamente adormecida na cama, Sirius vestiu um roupão e atravessou o corredor, abriu a porta há muito fechada, e adentrou o quarto.
As bandeiras da Sonserina tomavam grande parte da parede e estavam empoeiradas, deixando o ambiente mais escuro do que ele se lembrava. A cama, mesmo após anos, estava bem-feita, impecável. O maroto imaginou que Monstro fosse o responsável. Olhando para os lados, Sirius chegou à dolorosa conclusão de que Petunia estava certa. Regulus era apenas um garoto. Ele era um menino doce, tímido e extremamente inteligente. Ele conseguia se lembrar que, mesmo após ser sorteado para a Grifinória, sua relação com o irmão seguiu boa.
Era verdade que Orion nunca havia encostado um dedo em Regulus, mas não pelos motivos que o maroto havia dado à Petunia mais cedo. Orion nunca encostou um dedo em Regulus porque Sirius sempre assumia a culpa. Ele conseguia se lembrar, agora qe parava para pensar. Ele lembrou de inúmeras ocasiões em que se enfiou entre o pai e o irmão para apanhar no lugar dele. Os dois eram amigos, confidentes. Eram verdadeiramente irmãos. As coisas só foram piorar quando Sirius atingiu a adolescência e, com toda a rebeldia da idade somada ao ódio que tinha dos valores deturpados de sua família, acabou se afastando do caçula.
Sim, Sirius havia se afastado, não Regulus. E então aconteceu aquela fatídica noite, e Sirius abandonou Grimmauld Place, deixando Regulus para trás. Agora, com os anos passados e todo o sofrimento a que havia sido submetido em Azkaban, ele conseguia enxergar que a hipótese de o irmão ter sido marcado por Voldemort para agradar e, de certa forma, proteger sua família, não era tão absurda assim. Em verdade, fazia todo o sentido.
Sirius caminhou até a cama do irmão e se sentou ali por longas horas, encarando o nada enquanto sua cabeça o metralhava com lembranças. Ele chorou e, quando voltou ao próprio quarto, abraçou Petunia forte e dormiu com o rosto enfiado nos cabelos dela, abraçado pelo conforto que o cheiro da mulher o trazia.
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As semanas que se seguiram foram melhores do que as anteriores. Petunia e Sirius passavam boa parte do tempo juntos no estúdio que ele havia montado para ela. A mulher havia seguido o conselho dele e passou a treinar sua escrita. Ela rabiscava folhas e folhas de papel, algumas ela amassava e jogava na lareira, outras ela encarava com os olhos marejados por longos minutos antes de guardá-las com cuidado dentro da gaveta.
E Sirius observava tudo sobre o livro que fingia ler. Ele tentava prestar atenção à leitura, mas observar Petunia em seu processo criativo era muito mais interessante. O peito dele enchia de orgulho e ele se pegava pensando no quão sortudo ele era por tê-la em sua vida, por ela o amar tanto quanto ele a amava.
E foi movido por esse sentimento que Sirius obrigou Monstro a sair discretamente de Grimmauld Place, dando ordens estritas para que o elfo não desviasse do caminho, não se fizesse visto e nem falasse com ninguém, para levar uma carta até uma editora próxima. Ele havia enchido um envelope com alguns escritos da mulher e, poucos dias depois, a resposta chegou. Petunia deu saltos de alegria ao receber, graças a Sirius, um convite para escrever alguns contos para um livro que seria publicado.
Naquela noite, o casal e Remus – que havia voltado de mais uma missão – comemoraram cozinhando juntos uma grande lasanha, bebendo três garrafas de vinho e ouvindo os antigos discos trouxas de Sirius na vitrola que Arthur havia presenteado o maroto no Natal. O Weasley havia achado o objeto em um pequeno brechó trouxa em seu caminho para o Ministério.
"Ela parece bastante empolgada", Remus comentou, jogando-se contra a poltrona. Os três já haviam jantado e bebido, e Petunia anunciou que tinha trabalho a fazer. Ela subiu as escadas correndo sorrindo a si mesma, deixando os dois marotos no andar de baixo. Os homens se dirigiram a sala de estar e acenderam a lareira. Mesmo com a primavera, todos gostavam de deixar a casa aquecida com o fogo.
"Ela está", Sirius respondeu com um sorriso nos lábios. "Não saiu do estúdio desde ontem"
"Você parece feliz", o lobisomem comentou, sorrindo ao amigo.
"Eu estou", o maroto respondeu, bebericou um gole de seu Whisky de Fogo e largou o copo na mesa ao lado da poltrona onde estava sentado. Ele riu sozinho. "Eu vou me casar, Aluado! Você consegue imaginar? Depois de quinze anos! Eu vou me casar com a mulher mais perfeita do mundo".
"Quando vocês pretendem se casar, afinal?", Remus questionou, curioso. Queria estar presente no momento do casamento, e temia que Dumbledore o mandasse para longe justamente na data marcada.
"No verão, assim Molly consegue me ajudar. Já comecei a plantar alguns lírios no jardim, mas simplesmente não levo jeito!", Sirius reclamou. "Até o verão consigo deixar tudo perfeito e assim todos conseguem vir".
"Eu fico realmente muito feliz por você, Almofadinhas", Remus sorriu sincero. Sirius retribuiu, e se jogou para trás, esticou as pernas e cruzou os pés em cima de uma otomana.
"Um dia você vai ter tudo isso também".
"Eu duvido bastante disso", Remus suspirou e Sirius revirou os olhos. "O quê? Quem iria querer se casar com um lobisomem?"
"Eu consigo pensar em uma pessoa", Sirius debochou, e Remus franziu o cenho. "Ah, Aluado, vai dizer que você não nota?"
"Eu noto", o lobisomem suspirou e largou seu copo em outra mesa lateral. O homem se inclinou para frente, apoiou os cotovelos nos joelhos e escondeu o rosto entre as mãos. "Eu noto, e isso é o pior!"
"Você sente algo por ela?", o Black questionou, curioso.
"Eu não sei, eu...", Remus respondeu sem ousar olhar para o amigo. "Eu sinto algo, não sei nomear. Mas eu sinto essa... conexão? Desde o momento em que a vi pela primeira vez".
"Você acha que ela é sua companheira?", Sirius perguntou, franzindo as grossas sobrancelhas negras, que criaram uma sombra sobre os olhos cinzentos dele. Remus se jogou para trás e bufou.
"Isso é uma lenda, Almofadinhas", o ex-professor reclamou. "Não existe isso de companheira. Nunca conheci nenhum lobisomem que realmente tivesse uma. É tudo boato".
Sirius sorriu maroto e brincou com as pontas do próprio cabelo, que caía solto sobre seus olhos.
"Isso é um alívio", o maroto disse, e o lobisomem o encarou desentendido. "Assim Nymphadora está livre para foder algum primo distante".
Remus sentiu um rosnado se formar em seu peito, e agarrou os braços da poltrona com tanta força que seus nós dos dedos ficaram brancos. Os olhos, antes verdes, ficaram amarelos. Sirius sorriu de orelha a orelha.
"Acho que o mistério está resolvido", o maroto brincou.
"Você faz o mesmo quando o assunto é Petunia!", Remus acusou.
"É claro que eu faço", Sirius deu de ombros. "Só há um laço tão forte quanto o laço de companheiros..."
"O laço de almas gêmeas", Remus concluiu e apanhou o copo, dando mais um gole na bebida. "Mas Túnia não é uma bruxa".
"E daí?", Sirius perguntou sério. "Eu não preciso de uma marca no meu corpo, não preciso que minha mágica se mescle à dela, não preciso de um feitiço. O que eu sinto por ela... Aluado, o que eu sinto por ela é forte, é puro, é pura... magia. Eu a amo mais do que alguém é capaz de amar outra pessoa".
Remus sabia que Sirius estava certo. Seria prepotência demais achar que somente bruxos podiam ter almas gêmeas, quando, em verdade, isso era algo muito maior do que a magia que eles praticavam com as varinhas. Sirius e Petunia eram as únicas pessoas – mágicas ou não – que Remus havia visto manterem um sentimento tão forte vivo mesmo com os anos separados, mesmo com todos os problemas, com todas as tristezas e sofrimento. E então o lobisomem apenas se escorou contra a poltrona, com o rosto apoiado contra a palma da mão, e observou por horas o amigo falar sobre Petunia com um sorriso bobo no rosto.
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A medida em que o verão ia se aproximando, Petunia e Sirius ficavam cada vez mais ansiosos. Molly e Arthur haviam aparecido algumas vezes carregando grandes caixas com enfeites, toalhas de mesa e livros de receitas. A matriarca havia ensinado Sirius a plantar e o jardim já estava quase que totalmente coberto por lírios. Remus ia e vinha, algumas vezes sozinho e outras acompanhado de Moody e Tonks. A última sempre com as bochechas e os cabelos rosa.
Foi em uma determinada tarde em que Sirius se dedicava ao jardim – atividade que ele passou a gostar bastante – que Petunia resolveu carregar algumas caixas sozinha até seu estúdio. O local, além de um ótimo ambiente para escrever, havia se tornado seu ateliê pessoal para os arranjos do casamento. A mulher subiu as escadas, passou pelo retrato ainda silenciado de Walburga e não perdeu a oportunidade de mostrar a língua para a bruxa, que arregalou os olhos e tentou gritar, mas foi impedida pela fita adesiva.
Assim que largou as caixas em cima de uma mesa no estúdio, escutou um barulho baixo, como se alguém estivesse murmurando algo e, curiosa, seguiu o som. Acabou por encontrar Monstro dentro de um quarto sozinho, um quarto que ela já havia entrado antes, mas dado pouca importância. Havia apenas uma escrivaninha no centro do cômodo, nada que chamasse muito a atenção. A mulher se atreveu a entrar no quarto e o elfo, parecendo assustado, virou-se para ela.
"Sangue-ruim, manchando a casa da minha senhora", a criatura murmurou, olhando-a com raiva. "Bella deveria ter matado sangue-ruim, ah, ela deveria... A sangue sujo e o ingrato do filho da minha senhora, que não merece o sangue que tem".
"Por que você me odeia tanto?", Petunia perguntou.
"A ralé ousa falar com Monstro, ela ousa..." o elfo murmurou como se estivesse falando com alguém que Petunia não conseguia enxergar, o que acabou por fazer com que um calafrio corresse por sua espinha. "Monstro vai mostrar pra ela, ele vai".
E então o elfo apontou o dedo para a gaveta da escrivaninha, que passou a tremer e sacudir, como se algo quisesse se libertar ali de dentro. A porta, antes aberta, fechou-se com um estrondo e Monstro, com um estalar de dedos, sumiu.
Petunia correu até a porta e viu que estava trancada. Ela escutava o som da gaveta abrindo com um rangido, e um sentimento muito ruim tomou conta de seu peito. Agarrando-se à pouca coragem que ainda tinha, virou-se em direção ao centro do quarto, e avistou seu maior pesadelo.
"Você vai aprender", uma voz que ela conhecia ecoou pelo quarto.
Vernon estava parado no meio do quarto, e parecia muito mais assustador do que ela se lembrava. O homem a encarava com um sorriso diabólico e descansou os dedos na fivela do cinto. A mulher arregalou os olhos.
"Me deixe sair!", Petunia gritou enquanto batia com os punhos fechados contra a porta. Ela sentia os pelos de sua nuca arrepiando, e uma sensação nada boa de que algo ruim iria acontecer se ela não saísse dali imediatamente. Virando o rosto apenas o suficiente, enxergou Vernon ainda parado, abrindo o cinto, enquanto a encarava com olhos raivosos. Grossas lágrimas passaram a escorrer do rosto dela e o coração da mulher colidia dolorosamente contra seu peito.
"Eu vou ensinar você a se comportar!", Vernon exclamou.
Racionalmente, Petunia sabia que Vernon não estava ali, que era impossível. Ela estava no Largo Grimmauld e o homem sequer conseguiria enxergar a casa, que dirá adentrá-la. No entanto, qualquer racionalidade fugiu à mulher no momento em que ela viu o ex-marido parado no meio daquele quarto macabro. Petunia escutou passos apressados do lado de fora.
"Túnia! Túnia!", Sirius gritou do outro lado da porta, dando fortes pancadas na porta, tentando abri-la. "Se afaste da porta!", ele avisou, e a mulher, mesmo tremendo de medo da figura de Vernon, obedeceu e se afastou da porta.
O maroto tentou uma série de feitiços que conhecia e, somente depois de muito custo, conseguiu adentrar o quarto. No entanto, a porta se fechou logo atrás de suas costas, deixando-o preso ali com ela. Sirius não perdeu tempo e, ao avistar Vernon, que sorria de uma maneira que denunciava suas sujas intenções, jogou-se em frente a mulher protetoramente. Ele abriu os braços e segurou firme sua varinha na mão direita. Petunia estava logo atrás de si, chorando e agarrando a barra de sua camisa com força.
Assim que Sirius ficou bem em frente ao ex-marido de Petunia, o homem, que na verdade se tratava de um bicho-papão, se transfigurou. Longos cabelos negros brotaram da cabeça antes calva, o nariz arrebitou-se, a barriga encolheu e os olhos – ah, os olhos – tornaram-se cinzas e saltaram para fora das órbitas. Sirius conhecia aquele olhar. Era o olhar que denunciava a loucura de sua família. Era o olhar pertencente à mais vil criatura de toda árvore genealógica Black. Em frente a Sirius, estava Bellatrix.
A bruxa sorriu e apontou a varinha do maroto para Petunia e o maroto, mesmo sabendo que aquilo se tratava de um bicho-papão, viu-se incapaz de reagir. Seu maior medo estava bem à sua frente, e ele se via incapaz de reagir.
"Eu deveria ter terminado o serviço, não acha, primo?", a voz estridente de Bellatrix ecoou pelo quarto. "Eu deveria tê-la matado! Sua amante sangue-ruim! Deveria tê-la torturado até que ela me implorasse para morrer!"
Sirius sentiu o coração batendo forte e, respirando fundo, apontou a varinha para a criatura. Sua mão tremia e ele teve que usar mais força do que seria necessário para segurar o pedaço de carvalho.
"Riddikkulus!", Sirius gritou, e a criatura se escafedeu no ar, virando uma grande massa negra. O maroto murmurou outro encantamento e conduziu a massa negra para dentro de uma caixa, trancou-a e a jogou em um canto da sala. Ele se virou para Petunia, que o encarava com os olhos arregalados.
A mulher se jogou no maroto e o tomou em um abraço apertado. Sirius a apertou forte contra si e enterrou o nariz nos fios loiros. Ele a beijou na cabeça meia dúzia de vezes.
"Está tudo bem, está tudo bem", ele murmurou, e a mulher afundou o rosto contra o peito dele. "Era um bicho-papão. Você se lembra que Molly encontrou um no verão? Esse deve ter ficado para trás".
"Eu estava tão assustada!", Petunia sussurrou, e o maroto beijou os cabelos dela.
"Eu sei, eu sei", ele sussurrou de volta. "Eu não vou deixar nada acontecer a você, nunca".
"Monstro me trancou aqui", a mulher confessou. Naquele momento, não conseguiu se importar com a possibilidade de Sirius esganar o elfo. Estava assustada, seu coração batia rápido e sua respiração falhava. Ela se agarrava à Sirius como se ele fosse seu tanque de oxigênio, afundava o nariz contra a tatuagem que escapava da gola da camisa que ele usava e inspirava o cheiro dele, o cheiro que a transmitia segurança.
"Aquele maldito!", Sirius rosnou, e Petunia afastou o rosto o suficiente para encará-lo nos olhos cinzas, que estavam raivosos. O maroto estava puto, e seus olhos eram quase tão loucos quanto o da prima. A mulher segurou o rosto dele entre as palmas das mãos e o obrigou a olhar para ela. Os olhos assumiram um tom carinhoso. Como se uma tempestade tivesse se dissipado e o céu tivesse clareado, revelando uma lua cheia e prateada.
Sirius segurou os pulsos dela e carinhosamente acariciou os punhos da mulher com os polegares. Percebeu que ela havia machucado as mãos batendo-as contra a porta e franziu o cenho. Petunia percebeu e recolheu as mãos, passando a esfregar um corte que havia aberto em sua mão esquerda com o polegar direito. O maroto tomou as mãos dela de novo nas suas e as levou até os lábios, depositando dois carinhosos beijos, um em cada mão dela.
"Vem, eu vou limpar isso para você" e depois vou matar aquela elfo, ele quis concluir.
Sirius apontou a varinha para a porta e a abriu novamente. Conduziu Petunia alguns lances de escada abaixo até que chegassem ao quarto que os dois dividiam, o quarto deles. O maroto a levou até a cama e se sentou ao lado dela. Tomou uma mão dela de cada vez e, com a varinha, fechou os cortes que ali havia.
"Eu fiquei bastante bom em cuidar de ferimentos desde aquela noite em que apareci na sua casa", Sirius comentou. Petunia sorriu a ele. "A pior e melhor noite da minha vida".
"Melhor?", a mulher questionou, arqueando uma sobrancelha.
"É claro!", Sirius exclamou. "Naquela noite eu me apaixonei por você. Eu não sabia, é claro. Mas ainda me lembro do quão triste me senti quando você disse que queria estudar nos Estados Unidos".
"Você disse que era injusto", Petunia relembrou, e Sirius sorriu a ela. Os olhos cinzentos envoltos pelas poucas rugas aqueceram o coração da mulher.
"E era. Eu mal havia conhecido você e sentia que estava prestes a te perder", ele repetiu o que havia dito naquela noite há tantos anos. A mulher se inclinou para frente e colou os lábios nos dele.
Os dois ouviram um grande barulho vindo do andar de baixo e saltaram do lugar, colocando-se de pé. Sirius agarrou a varinha com força e, com a mão livre, segurou Petunia pela mão.
"O que aquele elfo maldito está fazendo agora?", Sirius resmungou.
O maroto saiu na frente, sendo seguido de perto por Petunia. Os dois desceram os lances de escada e chegaram até a sala de estar, onde a lareira abrigava enormes chamas azuis, que dançavam e faziam um som esquisito. Assim que os dois se aproximaram, as chamas ficaram mais vivas e saltaram para fora da lareira, passando a voar pelo cômodo inteiro. Em um determinado momento, as chamas assumiram a forma de um bonito pássaro, que Sirius imediatamente reconheceu. Era uma fênix.
"Harry está no Ministério. É uma emboscada", a voz de Dumbledore deixou os pulmões do pássaro, e o patrono se desfez no ar.
Petunia e Sirius se encararam com os olhos arregalados, e a mulher sabia o que o maroto faria. Ela sequer teve a coragem de pedir para ficar, porque sabia que, se fosse o contrário, ela também faria o mesmo. Petunia apenas teve tempo de abraçar o maroto forte, beijá-lo nos lábios, e pedir que ele voltasse são e salvo para casa com Harry. E então Sirius apontou a varinha para a lareira e agarrou uma quantidade obscena de pó de um jarro ao lado do sofá. Caminhou até a lareira, jogou o pó contra o chão e bradou, com a voz grave que ecoou pela casa inteira. "Ministério da Magia!".
