Capítulo 66 – Dê tempo ao tempo
Os homens trocam as famílias
As filhas, filhas de suas filhas
E tudo aquilo que não podem entender
Os homens criam os seus filhos
Verdadeiros ou adotivos
Criam coisas que não deviam conceber
O tempo passa e nem tudo fica
A obra inteira de uma vida
O que se move e
O que nunca vai se mover
O tempo engana aqueles que pensam
Que sabem demais que juram que pensam
Existem também aqueles que juram
Sem saber
O tempo passa e nem tudo fica
A obra inteira de uma vida
O que se move e
O que nunca vai se mover
Música: Sobre o Tempo – Nenhum de Nós
House passou o dia trabalhando e tentando evitar contato com a sua esposa, ele também se esforçou para se afastar de qualquer confusão. O time estava abalado desde a morte de Kutner, Cuddy ofereceu ajuda psicológica e licença para que ficassem longe do hospital por um período, inclusive para House, mas nenhum aceitou, eles julgavam que o trabalho ajudaria a lidar com a situação. Então focaram no trabalho, o time estranhou a seriedade de House, sem piadas, sem desvios, mas todos imaginaram que era por conta do ocorrido com Kutner, ninguém sabia que House estava preocupado em voltar a ficar bem com a sua esposa.
A noite ele chegou antes dela em casa. Marina e sua sobrinha foram embora assim que House entrou em casa para cuidar das crianças.
"Papai!".
"Ei Gwen". A menina correu e pulou no colo dele.
"Como foi o seu dia hoje?".
"Feliz".
Ele riu. Era contagiante a simplicidade de sua filha.
"O que você fez que deixou o seu dia feliz?".
"Brinquei".
"Uhhh, isso é bom!".
"Buuu baaaaa". Rachel começou a chamar de dentro do cercadinho. A menina estava engatinhando então eles a deixavam em um lugar protegido.
"Vem aqui Rachel". House a liberou e a menina engatinhou feliz para ele.
"Bebê cuidado!". Gwen disse.
"Você é tão cuidadosa com os seus irmãos, Gwen, que eu acho que você será uma ótima babá na adolescência. Isso poupará dinheiro para a sua universidade". House falou bem humorado.
"Unicidade?". Gwen perguntou confusa.
"É um local para estudar quando você for grande".
"Eu grande!".
Ele riu. "Não, você ainda é pequena".
"Eu grande, bebê pequena".
"Você é maior que Ethan e Rachel, mas ainda é uma criança". House explicou.
"NÃO!". A menina falou irritada. Ela estava cada dia mais teimosa.
"Oh meu Deus, você é igual a sua mãe. Eu estou perdido".
"Você bobo".
"Não fale isso, por favor! Sua mãe iria cortar as minhas bolas fora se você sair por aí chamando as pessoas de bobas".
"Bolas?".
"Não Gwen, isso é ainda pior".
"Baaaa... Buuu...". Rachel continuava.
De repente Ethan começou a chorar. E era aquele choro forte e ardido que ele sabia usar tão bem.
"Bebê chora!". Gwen repetiu.
"Sim filha, eu preciso pegar o seu irmão. Fique sentadinha aqui no sofá e você...". Ele olhou pra Rachel. "Eu vou te deixar no cercado para que você brinque e engatinhe a vontade". E ele levou Rachel para a área protegida, mas a menina não queria se afastar dele e começou a chorar também.
"Espere filha, eu já volto!".
"Bolas!". Gwen repetiu.
"Não fala isso Gwen, por favor!". Ele pediu.
"Bolas!". A menina era teimosa.
Ele respirou fundo e foi pegar Ethan.
Assim que o menino o viu parou de chorar na hora e abriu um sorriso.
"Você, meu jovem, pode usar essa garganta para coisas mais uteis do que gritar assim ou comer tanto. Quem sabe... Ser um cantor famoso e muito rico que dará uma vida luxuosa para os seus velhos pais?".
Ethan riu.
"Você gostou disso, não é?".
Então ele voltou com o menino para a sala.
"Rachel, eu tenho que dar mamadeira para o seu irmão. Fique aí no cercadinho só mais um pouco". Ele disse. A menina reclamou, mas Gwen foi até ela com um brinquedo e ambas esqueceram-se do mundo.
"Que bom que a sua irmã mais velha leva jeito com bebês". House falou para Ethan enquanto o garoto mamava. Ethan continuava esfomeado, ele mamava como se não houvesse amanhã. Ethan já era grande para a idade dele, os médicos diziam que ele deveria puxar o pai na altura.
Por incrível que pareça, a harmonia estava reinando naquele lar. As duas meninas brincando juntas no cercado, House e Ethan no sofá. Cuddy chegou e estranhou a calmaria.
"Onde está Marina?". Ela perguntou ainda seca com o marido.
"Ela e Isabel já foram embora". House explicou.
"Mamãe! Mamãe!". Gwen falou assim que ouviu a voz dela. Rachel e Ethan também se agitaram.
"Faz tempo que você chegou?". Cuddy perguntou enquanto deixava a bolsa sobre a mesa e higienizava as mãos (ela sempre fazia isso quando vinha da rua para evitar contaminar os seus filhos).
"Eu cheguei há uns cinquenta minutos. Elas foram embora quando eu cheguei".
"E as crianças estão... bem?".
"Não, aqui são clones deles, os originais estão trancados no armário". House brincou, mas Cuddy não riu. "Sim, eles estão bem".
Gwen foi para a mãe, Rachel também engatinhou para ela depois que House abriu o cercado.
"Calma rapaz, a sua mãe só tem duas mãos". Ele disse para Ethan.
Depois de beijar as filhas, elas voltaram para a brincadeira e Cuddy pegou Ethan. "Ei bebê, você está bem?".
"Ele acabou de mamar, a fralda dele está limpa". House disse. "Você consegue ficar com ele até que eu troque as minhas roupas? Eu ainda não consegui fazer isso desde que entrei em casa".
"Tudo bem". Ela disse e ele foi.
House conhecia Cuddy, ele não poderia fazer o papel de submisso, pois isso a irritaria cada vez mais. Sua esposa precisava de um homem firme e que não cedesse aos caprichos dela.
Ele tomou um banho rápido e se vestiu com uma roupa confortável, calça de moletom e camiseta, depois foi para a cozinha.
"Você prefere que eu cuide deles ou que eu faça o jantar?". House perguntou. Ele chegou com o cabelo molhado e com aquela roupa... Ele estava tão cheiroso com aquela maldita colônia, ele estava tão sexy, Cuddy pensou irritada.
"Você pode cuidar deles até que eu troque essa roupa?". Ela perguntou.
"Sim". Ele ficou com os filhos brincando enquanto Cuddy se vestia.
Quando ela voltou House foi cozinhar, Cuddy preferia a comida do marido, ele tinha muito mais talento do que ela na cozinha. Gwen também preferia as comidas que seu pai fazia.
"Ei filha. Você está bem?". Cuddy perguntou para a sua filha primogênita.
"Sim mamãe".
"Que bom!".
Ethan mordia o brinquedo de borracha desesperadamente. Tudo o que esse menino fazia era intenso. Rachel se perdia entre os blocos de montar que estavam espalhados pelo chão.
"Bolas!". Gwen disse.
"O que você falou filha?".
"Bolas!". A menina repetiu.
House respirou fundo ouvindo tudo enquanto estava na cozinha.
"Você quer uma bola?".
"SIM!". A menina gritou.
"Não temos nenhuma bola em casa filha, mas podemos providenciar". Cuddy respondeu ingênua e House respirou aliviado.
A família jantou. Ethan já havia mamado, mas comeu algumas frutas (House e Cuddy não esperaram os seis meses para entrar com outras alimentações, Ethan era muito esfomeado, eles começaram assim que possível a introduzir outras comidas), Rachel não se alimentava muito bem, era uma preocupação para Cuddy, mas House achava que era uma fase. Gwen era seletiva, mas estava aprendendo a se alimentar com a comida que os seus pais comiam também.
Depois disso o casal levou os filhos para a cama. "Eu estou exausta, vou dormir". Cuddy disse.
"Tudo bem, bom sono". House falou fingindo não se importar. Cuddy ficou sentida. Ele parou de se importar? Parou de tentar agradá-la? Que bastardo! Mas ela não deu o braço a torcer e foi pra cama.
House foi pra sala e abriu o diário de John para ler mais um trecho.
Gregory saiu de casa ontem para estudar em Hopkins. O bastardo não quis a ajuda de ninguém, um amigo dele passou aqui e o ajudou a levar as coisas até Baltimore. Eu nem sei onde ele ficará, ele não me disse nada e eu também não perguntei. Blythe chorou, ela tentou disfarçar, mas eu a vi chorando pelos cantos. Eu não sei o que senti. Esse rapaz conviveu 18 longos anos sob o meu teto. Nós brigamos, gritamos um com o outro, ele se mostrou um jovem rebelde, desorganizado, desobediente, indisciplinado, portando a sua partida é motivo de alivio para mim. Mas, por alguma razão, eu não sei o que sinto.
House se surpreendeu. Ele sempre imaginou que John contava os dias para que ele saísse de casa, ele sempre contou os dias... 'Acho que John sentiu falta de alguém para implicar', House pensou.
A vida sem Gregory em casa é tranquila. Não existem garotas e figuras estranhas entrando e saindo da casa. Tão pouco música alta ou cara feia no café da manhã. Não sinto falta daquela guitarra estridente ou das teclas daquele piano, apesar de que, não quero admitir mas o bastardo tinha jeito para a música, ele só não tocava as músicas certas, claro que não. Gregory sempre preferia aquelas músicas de menos qualidade musical, em detrimento da boa e velha música clássica. Blythe está estranha, a sinto cada vez mais distante, ela começou uma atividade na igreja e passa grande parte do dia lá, eu aproveito para praticar as minhas atividades de carpintaria.
"Que bom pra você, John". House respondeu sarcástico. 'Nem a minha mãe suportava esse homem', ele pensou.
Ele não sabia a razão, mas as últimas partes da leitura o irritaram. Ele deveria esperar essas palavras de John, mas mesmo assim isso o incomodou. Então ele fechou o diário e o guardou. O que será que John queria entregando esse diário para ele? Irritá-lo pela última vez?
House escovou os dentes e deitou-se ao lado de Cuddy. Ela não dormia, mas fingia que sim. Ele a ignorou, virou-se para o outro lado e tentou adormecer.
No dia seguinte o casal não se cruzou no hospital. House ficou até mais tarde envolvido com o caso de um paciente e, quando chegou em casa, brincou um pouco com os filhos e foi dormir. O casal não se falou novamente.
Naquela sexta-feira a noite Cuddy foi deitar e House ficou lendo o diário de John.
Eu fui a um evento dos fuzileiros navais e vi diversos pais e filhos por lá, ambos compartilhando o mesmo amor pela vida militar, eu queria ter tido um filho para me acompanhar nesses momentos, mas infelizmente não aconteceu... Gregory não é meu filho legitimo e nunca fomos parecidos em nada. Ele está na universidade agora tendo uma vida devassa (eu tenho certeza disso), Blythe se ocupando com coisas da igreja e eu passando meu tempo sozinho com as madeiras e minha carpintaria. Semana passada fiz um banco, pra que? Pra quem? Uma vida dedicada a nação e agora me sinto vazio.
House avançou um pouco na leitura.
Eu sabia! Gregory foi expulso de Hopkins. Esse bastardo só nos dá dor de cabeça e problemas. Ele não me disse nada, claro que não, mas eu ouvi Blythe conversando com Helen, a sua prima. Aparentemente ele foi aceito em Michigan e mudará pra lá. Como alguma outra universidade o aceita depois dele ter sido expulso? Se fosse no exército ele não teria outra chance, a vida é implacável, foi isso que eu sempre tentei ensiná-lo, aparentemente sem sucesso.
"É por isso que você ficou sozinho, John...". House falou em voz alta. 'Se eu não tivesse sido expulso, eu não teria conhecido Cuddy', ele pensou.
"House!". Cuddy apareceu na porta da sala.
Ele se virou para olhá-la.
"Você não vem pra cama?".
"Sim, eu já estou indo".
"Eu estou te esperando...". Ela disse.
House franziu a testa, o que aquilo queria dizer exatamente?
Continua...
