KIARA POV
Conforme a noite se aproximava, o brilho dos astros no céu se tornava cada vez mais intenso. Não tardou para que a floresta submergisse num completo e macabro breu. Seguindo Yusuke, Hiei e Kurama sem prestar muita atenção em meus próprios passos, ao chegarmos ao cemitério da ilha Nozomi, a pouca iluminação proveniente de antigos lampiões indicou precariamente o nosso caminho.
Ao adentrarmos o local através do portão velho e enferrujado, uma fisgada de ansiedade atravessou o meu peito, deixando minhas pernas completamente bambas. Meses se passaram desde o dia em que me separaram de meu irmão. Daquele instante em diante, todas as noites eu passei a imaginar como seria o nosso reencontro. Em que estado o encontraria? O que teriam feito a ele? Haveriam sequelas? Querendo manter o otimismo, eu me forçava a acreditar que tudo daria certo para nós dois, ainda que não possuísse muita esperança de estar certa.
— Que bom que vieram, estávamos esperando por vocês — repentinamente ao sair de trás de uma lápide, uma youkai de aparência cadavérica surgiu por entre as sombras daquele cemitério. Cicatrizes enormes e profundas desenhavam o seu corpo, desde o rosto até as asas, a deixando mais medonha do que realmente era.
— Você?! Não pode ser! Como...? — Yusuke exclamou furioso.
— Eu te subestimei no outro dia, mas não vai acontecer de novo.
Confusa, sondei Yusuke por alguns instantes antes de compreender a situação. Sua notória expressão de raiva denunciava a incredibilidade por deparar-se com aquela youkai. Prontamente me lembrei de que ele havia nos assegurado de ter matado Asuka ainda em Kuroshimi, e pela cara que fazia, deixava claro que havia se enganado.
Preocupada demais em achar o meu irmão, ignorei Asuka por completo. Desesperadamente olhei para todos os lados, tentando, sem sucesso algum, encontrá-lo naquele lugar escuro e sombrio.
— É impossível! Você estava morta. Eu tenho certeza! Como foi que conseguiu se livrar do meu Leigan? — ainda abismado, Yusuke perguntou.
— Isso não vem ao caso. Apesar de realmente ter feito um enorme estrago em mim...— ela gesticulou em torno das marcas em seu corpo —...continuo de pé.
— Onde estão Kuwabara e Kazuki? — Kurama perguntou interrompendo a discussão dos dois.
— Estão aqui — ela apontou para o lado.
Aflita, olhei na direção indicada. Ao ver Kazuki surgir detrás das sombras e dirigir-se até uma região iluminada do cemitério, senti o meu coração palpitar mais forte do que acreditava ser capaz de suportar. A ponto de gritar pelo seu nome, me contive ao perceber que arrastava algo consigo. Estreitei os olhos para enxergar o que atrasava a sua caminhada e, ao perceber, levei as mãos a boca num impulso.
Ensanguentado, o corpo de Kuwabara jazia caído aos seus pés. Incapaz de acreditar que Kazuki tivesse realmente ferido um ser humano inocente, desviei o olhar, completamente chocada com a situação. Sem saber como encarar Yusuke, Hiei ou Kurama, ignorei os seus protestos ao meu lado, e me atentei a apenas ao meu irmão, observando que ele se encontrava num estado tão lastimável quanto o que eu esperava. Seus olhos opacos e sem vida não respondiam a nenhum estímulo externo, e seu físico aparentava ser o de alguém completamente desnutrido, ainda que alguns músculos tivessem permanecido intactos. Por fim, mirei o ofuda em seu peito sabendo que precisava removê-lo dali o quanto antes para liberá-lo do controle mental do qual havia sido submetido.
Vencida pelo ódio, sentia a energia demoníaca crescer dentro de mim, fluindo ao redor de todo o meu corpo e, como se fosse combinado, num impulso nós quatro avançamos ao mesmo tempo em direção aos inimigos, a fim de derrotá-los de uma vez por todas.
— Não se aproximem, senão eu darei a ordem para que Kazuki mate esse imprestável! — Asuka vociferou de repente, nos fazendo frear de súbito antes de alcançá-los.
Trêmula de raiva e indignação, não podia acreditar que aqueles youkais utilizavam Kazuki para fazer todo o seu serviço sujo.
— O que vocês pretendem com tudo isso? Quem são vocês e o que querem? Por que não abrem o jogo logo de uma vez? — Kurama perguntou dissipando toda a tranquilidade em seu tom de voz.
— Eu é que deveria perguntar isso a vocês. Kurama Youko, você chegou a ser uma lenda no Makai, mas hoje não é nem metade do que foi um dia. O que vocês pretendem? — ela alternou os olhares entre Yusuke, Hiei e Kurama — Eu queria entender o porquê três youkais como vocês defendem humanos. Com a força e habilidade que possuem, vocês poderiam ter tudo que quisessem, mas preferem se afundar com essa atitude patética. É claro que ainda há tempo para consertar isso. Convido vocês três a se unirem a nós para reescrevermos a história desse mundo desprezível.
— O quê?! — Yusuke exclamou incrédulo — Está sugerindo que simplesmente entreguemos Kiara a vocês?
— Não, de maneira nenhuma. Ela é nossa convidada de honra, e com certeza irá nos ajudar.
Asuka me lançou um olhar enigmático, e incapaz de entender o que ela tentava me dizer com tudo aquilo, permaneci calada. Somente conseguia pensar em como livrar Kazuki das mãos imundas daqueles criminosos.
— A única coisa realmente desprezível aqui é esse seu discurso moralista pra cima de nós. Se vocês são covardes demais pra nos enfrentar como inimigos, fale logo de uma vez. Será menos vergonhoso do que querer bancar a nossa aliada para poupar a sua própria vida — Hiei a respondeu.
— Hiei tem razão. Vocês são covardes! A prova disso é que precisam se esconder atrás de suas próprias vítimas — Yusuke apontou para Kuwabara e Kazuki — Se estão com medo, se entreguem logo. Nós não vamos nos aliar a vocês!
— É uma pena que não queiram cooperar — a youkai disse ao esboçar um diminuto sorriso nos lábios — Nesse caso teremos que fazer do jeito difícil. O amigo de vocês não me interessa, então podem ficar com ele. Eu o entregarei em troca da garota. Quero que ela, e somente ela, venha até nós. Depois disso, libertaremos esse humano.
— Pode esquecer! — Yusuke exclamou avançando um passo em direção a Kazuki — Eu não vou deixar que isso aconteça!
No mesmo instante, Kazuki ergueu a lança que estava habituado a usar como arma, a levando ameaçadoramente até o pescoço de Kuwabara. Yusuke estancou os passos de repente, enfurecido com a chantagem, enquanto Asuka sorria por detrás deles.
— Não adianta, Yusuke — desesperada, respondi um tanto incerta sobre o que estava prestes a fazer — Eu vou...
— Mas Kiara...
— Mas nada. Kuwabara está em perigo! Desde o começo eu disse que eles estavam atrás de mim, e que vocês não tinham nada a ver com isso. Vocês nem sequer deviam ter vindo comigo até aqui. Agora Kuwabara está prestes a morrer, e eu não tenho outra alternativa a não ser me entregar.
Ao notar as minhas intenções, Yusuke agarrou o meu braço com força, reprovando minha decisão.
— Não tente me impedir! — num movimento brusco, me livrei de suas mãos, deixando-o ainda mais enfurecido. Sabendo que tentaria me segurar novamente, me adiantei ao suplicar — Eu não vim até aqui pra ver o meu irmão se tornar um assassino!
De repente sua expressão mudou, como se enfim compreendesse a minha angústia. Em seguida, ele se afastou descontente e resignado. Assim, sem olhar para trás, virei as costas para os três e segui em direção a Asuka, enquanto tentava procurar uma solução para sair daquela enrascada.
Por alguns poucos instantes senti minha mente se esvaziar por completo. Alheia a tudo ao meu redor, ignorei a existência de todos ali presentes. Até mesmo o quase-morto Kuwabara não podia ocupar espaço nos meus pensamentos, por mais que quisesse ajudá-lo. Focada somente em Kazuki, não desgrudava os olhos dele, e somente despertei daquele estupor ao ouvir o alerta repentino vindo por trás de mim.
— Espera aí Kiara! — Kurama gritou alarmado
Interrompendo os passos na metade do caminho, me voltei em sua direção para encarar a expressão extremamente familiar presente em seu rosto:
Desconfiança.
Rapidamente me choquei ao entender o que ele insinuava. Como não havia percebido antes?! Logo eu que sempre desconfio de tudo...afinal, quem poderia garantir que aquele era o verdadeiro Kuwabara?
Congelei com a possibilidade, arrancando um riso irônico de Asuka que continuava a nos observar atentamente, percebendo de imediato o nosso raciocínio.
— Como pôde cair no mesmo truque mais de uma vez? — a pergunta feita pelo suposto Kuwabara me fez arregalar os olhos no mesmo instante. Permaneci imóvel ao vê-lo se levantar do chão para assumir em seguida a sua verdadeira forma.
Num piscar de olhos, o youkai-urso que havia me atacado há meses atrás estava diante de mim mais uma vez, me deixando possessa de ódio ao relembrar daquele fatídico dia em que, impotente, assisti aos meus companheiros serem assassinados.
— Há quanto tempo, não é? — ele estreitou os olhos amarelos de maneira ameaçadora — Acho que temos assuntos inacabados pra resolver.
— Dessa vez eu te mato! — tomada pela raiva, me lancei em cima dele com toda agressividade que possuía. Porém, já esperando pelo ataque, com tranquilidade ele facilmente bloqueou o golpe, recuando até criar uma segura distância entre nós.
— Não se apresse. Não é só comigo que você deve se preocupar hoje.
Confusa, olhei por detrás dele ao notar que a horda de demônios surgia ali de repente. Tentava contabilizar em que número estavam, mas terminei deixando a conta de lado ao perceber que aquilo era inútil. Pareciam fracos, como aqueles que o meu clã costumava ser contratado para derrotar. Porém, é claro, eu eu não possuía a experiência necessária para enfrentar a todos de uma só vez.
Assim, ao me ver encurralada por tantos adversários, instintivamente recuei dois passos trombando repentinamente com algum obstáculo. No entanto, ao olhar para trás descobri que não havia nada ali, ou pelo menos não parecia haver. Estendi as mãos até encostar em uma parede invisível. Uma barreira? Mas como...?!
Assustada, notei então que Yusuke, Hiei e Kurama, que já haviam percebido a existência daquela redoma o qual estavam impossibilitados de penetrar, tomavam providências para tentar derrubá-la. No entanto, tudo parecia em vão. Irritada, cerrei os punhos com força ao me dar conta de como havíamos caído tão facilmente naquela armadilha. A estratégia de usar a imagem de Kuwabara foi a maneira perfeita para que me afastassem de meus aliados. Para finalizar o plano, em seguida conjuraram uma barreira entre nós para nos separarem por completo, impedindo assim que qualquer um deles pudesse me dar suporte na batalha que planejaram a seguir. Como pude ser tão descuidada?
— Já entendeu, não é? Dessa vez você não vai escapar de nós — anunciou uma terceira voz desconhecida. Mirando em sua direção, encontrei um youkai diferente, estendendo uma das mãos em minha direção ao conjurar a redoma que me confinava. Ao seu lado, a criança de cabelos prateados e um outro sujeito de oleosos cabelos negros nos observavam com a cara fechada numa expressão de frieza.
— Idiotas...— o conjurador murmurou ao notar a insistência de Yusuke, Hiei e Kurama na tentativa de derrubar a barreira —...podem se esforçar o quanto quiserem, mas jamais vão conseguir quebrá-la. Eu sou o maior perito em criar barreiras que existe em todo o Makai. Criaturas mais fortes que vocês já tentaram destruí-las e, ainda assim, não conseguiram. Elas são impenetráveis!
— Desgraçados! Aonde é que tá o verdadeiro Kuwabara?! — irritado, Yusuke gritou.
— Morto, é claro. Confesso que derrotar aquele lá não foi tão simples e até me custou mais do que deveria...— ele ergueu o braço livre, nos mostrando a carne dilacerada na região do punho —...mas ele terminou como todos os outros que entraram em nosso caminho.
Yusuke estremeceu de raiva, aumentando o nível de seu youki para um patamar impressionante. No entanto, de nada adiantaria todo aquele imenso poder. Impotentes, era certo que nenhum deles jamais conseguiria invadir aquela redoma.
— Chega dessa conversa fiada! — impaciente, Asuka interrompeu a discussão antes de se voltar para os seus fracos subordinados — Peguem ela, agora!
Após a ordem, os animalescos youkais avançaram em minha direção. O mais veloz se adiantou ao se jogar repentinamente pra cima de mim, empunhando uma arma afiada. Sem conseguir raciocinar muito, desviei para a direita, correndo em seguida para longe dali, enquanto tentava usar as lápides daquele cemitério a meu favor. Deixando para trás Yusuke, Hiei e Kurama, que continuavam a todo custo tentando quebrar a barreira que os impedia de passar, avancei em meio a penumbra do cemitério, desembainhando a katana que carregava. Por fim, coloquei minha energia demoníaca em ação pela primeira vez no dia, pronta para me defender do que fosse necessário.
Sendo mais lenta do que boa parte daqueles demônios, não demorou para que alguns me alcançassem. Incapaz de prestar atenção em tantos ataques simultâneos, tentei desviar ao mesmo tempo em que revidava precariamente com a lâmina do sabre. De surpresa, um deles saltou por cima de mim, me cercando por trás. Ao tentar me defender de sua investida, abaixei a guarda para aqueles que estavam na minha frente e, naquele instante, fui atingida no braço, soltando a katana num reflexo de dor.
Na sequência, uma rasteira seguida de um golpe no estômago me derrubaram no chão. Ao bater as costas no concreto, perdi o fôlego e, sem tempo para reagir, um youkai com aparência de lagarto saltou em cima de mim tentando perfurar o meu pescoço com as suas afiadas presas preenchidas por veneno.
Com dificuldade, o repeli para longe com um chute e, em seguida, me coloquei de pé num pulo. Porém, completamente cercada, inevitavelmente fui imobilizada pelos demais youkais que ali se encontravam. Tentáculos e garras me seguravam por todos os lados, comprimindo ossos e músculos a fim de impedir qualquer tipo de movimentação.
Pensei em ter ouvido alguém gritar pelo meu nome, distante e desesperado. Yusuke talvez? Tomada pela raiva de estar presa naquela situação, não fui capaz de conter a fúria dentro de mim. Sentindo-me sufocada pela horda de demônios ao meu redor, de súbito exteriorizei o meu youki de maneira explosiva, incapaz de controlar a minha própria energia. Em meu entorno, os demônios caíram ao solo. Não estavam mortos, apenas atordoados com o impacto do golpe. Zonza, senti minha visão se turvar pela fraqueza em que me afundava e quase cedi ao peso do meu corpo. Não aguentaria fazer muito mais do que aquilo, tendo em vista o quão esgotada estava.
— Imprestáveis! — Asuka exclamou.
— Viram só? Eu disse que ela era como uma bomba-relógio. É tão instável que pode explodir a qualquer instante — o demônio-urso a respondeu — não cheguem perto demais.
O quê? Eles usaram aqueles subordinados apenas para evitarem uma aproximação comigo?
— Estava certo, Hodag. Mas vamos ver se ela será capaz de fazer o mesmo com o próprio irmão — Asuka resmungou rangendo os dentes.
— Deixem ele em paz! — em desespero, gritei num tom de súplica.
— Ora, deveria se preocupar mais consigo mesma do que com o seu irmão. É você que está em apuros aqui — ela retrucou.
— O que vocês querem com a gente, afinal?
— Já que perguntou, queremos saber onde está o raríssimo artefato que vocês komorebis guardavam?
— Artefato? — perguntei confusa ao franzir o cenho. A que ela se referia? A verdade é que não possuíamos nada que fosse tão valioso a ponto de alguém querer roubar.
— Não se faça de de desentendida. O seu povo foi encarregado de guardar algo que não lhes pertencia, algo de valor e poder. Onde está?
— Encarregados por quem? Eu não faço a mínima ideia do que você tá falando!
— Não tente me testar, porque eu não tenho paciência pra isso! Encarregados pelos Deuses, é claro. Como filha do líder e futura comandante de seu clã, você com certeza sabe do que estamos falando.
— Isso não é verdade! Não tínhamos nada que pudesse ser do interesse de vocês. Vocês estão se confundindo!
— Que irritante. O seu irmão chegou dizer exatamente o mesmo. Eu vasculhei a mente dele e realmente não achei nada, assim como na mente de cada um daqueles komorebis idiotas. Todos diziam que não sabiam do que estávamos falando. Parece que é um segredo muito bem guardado, não é mesmo?
— É tão bem guardado que nem nós mesmos conhecemos!
— Já chega! Se prefere continuar mentindo, não tenho outra escolha...— ela rosnou de raiva — Ataque-a, Kazuki!
Sob controle de Asuka, Kazuki disparou em minha direção. Convicta de que aqueles youkais malignos acreditavam que eu não teria coragem de enfrentá-lo, me posicionei para a luta sem hesitar. É verdade que machucar o meu próprio irmão não estava em meus planos, mas se aquela era a nossa única alternativa, eu não pensaria duas vezes em combatê-lo. Além disso, estava certa de que teria a oportunidade perfeita para salvá-lo daqueles sequestradores. Habituada a treinar com Kazuki desde de sempre, já havia me acostumado com o seu estilo de luta e, conhecendo todas as suas técnicas, não precisaria gastar energia alguma para derrotá-lo. Liberta-lo daquele controle mental seria mais fácil do que havia imaginado.
Empunhando sua lança, ele tentou me atingir. Sem perder tempo, escapei de sua primeira investida ao praticamente me deitar ao chão, apoiando as mãos no solo para em seguida tomar impulso. Ao me levantar, com um chute no rosto, o arremessei no solo. Inevitavelmente a arma escapou de sua mão e, antes que ele pudesse contra-atacar, me lancei por cima de seu corpo para que pudesse imobilizar os seus braços, removendo com sucesso o ofuda preso em seu peito.
Ao arrancá-lo dali, me retirei de cima de Kazuki, ajudando-o a se reerguer do solo.
— Kazuki, você tá bem? Consegue me ouvir?
— Kiara... — as palpitações em meu peito aceleraram ao ouvi-lo pronunciar o meu nome pela primeira vez em tanto tempo. Aliviada, me aproximei mais ainda mais para ajudá-lo a se levantar, já que se encontrava visivelmente fraco e desnutrido. Ajoelhei diante dele para lhe dar apoio e o forcei a erguer o rosto ensanguentado. Preocupada, então notei que suas expressões continuavam vazias, e o olhar sem vida se mantinha preso ao solo.
De repente, uma fisgada de dor percorreu todo o meu corpo, se espalhando por cada centímetro do meu interior. Abismada, ao olhar para baixo percebi a afiada lâmina de uma adaga fincada em meu abdômen. Com o mesmo semblante apático de antes, Kazuki enterrava a arma em meu corpo, a pressionando cada vez mais fundo. Ele não voltou ao normal, mesmo depois de eu remover o ofuda? Mas como...?!
— KIARA! — as vozes de Yusuke e Kurama se misturaram distantes de mim, enquanto ainda tentavam derrubar aquela barreira impenetrável.
— Idiota. Achou mesmo que seria tão fácil trazer o seu irmão de volta? — Asuka perguntou em tom de deboche — Ele recebeu um tratamento diferenciado dos homens daquela aldeia. Retirar o pergaminho não é o suficiente pra fazer com que ele volte ao normal.
Incapaz de me mover, senti a minha pressão sanguínea cair, enquanto agonizava pressionando a profunda ferida em meu corpo, numa tentativa frustrada de aliviar a dor dilacerante que me queimava por dentro.
Ao ouvir Asuka se aproximar, tudo ao meu redor ficou confuso.
— Agora vamos ver o que você tanto esconde de nós — ela sussurrou em meu ouvido ao se ajoelhar diante de mim.
Derrotada, senti as suas mãos comprimirem suavemente as minhas têmporas antes de invadirem sem piedade todas as memórias que possuía.
