Capítulo 1

"A Chegada "

Abri os olhos com relutância. Havia dormido a viagem toda e agora a claridade laranja do céu se infiltrou pelas minhas pálpebras, tingindo minha visão de vermelho.

Pela posição do sol, sabia que chegaria ao meu destino em pouco tempo. Estou nervoso. Vejo minhas mãos tremendo enquanto abro o trinco e empurro a janela para fora, deixando entrar um vento empoeirado e fragrante de mato.

Escoro novamente a cabeça e fecho os olhos, evitando lembranças. Olho para a entulhada cabine de trem e mesmo sem querer a comparo com a última vez que viajei esse trilho. Eu estava então acompanhado dela, com medo, com muito medo, e vivia uma mentira diária. Mas havia as noites que passávamos juntos, numa cabine grande, luxuosa e sozinhos, o corpo dela encostado no meu, tão quente.

E aí veio a arena, mais mentiras, a pérola, o mar, os beijos, a flecha, o sequestro, o horror, o horror, o horror...

Não, não vou por esse caminho. Houve o tratamento e agora quem sabe, virá a cura. Sou uma vítima da guerra e enquanto posso escolher, escolherei a sanidade. Fecho minha mente aos pensamentos intrusivos e passo os dedos trêmulos pelas cicatrizes dos pulsos, repetindo o mantra; "sou Peeta, tenho 19 anos, eu era do distrito 12, morava na padaria dos meus pais, a padaria não existe mais, meus pais não existem mais, o distrito 12 está sendo reconstruído e eu sou uma parte importante da reconstrução. É, sou o Peeta, tenho 19 anos, moro no distrito 12, a padaria não existe mais..."

Sigo repetindo, como que em oração, até o trem andar os últimos metros e soar o apito.

Cheguei, enfim.