Harry tentava prestar atenção à aula de Transfiguração, mas não conseguia. A ausência de Simas na aula estava fazendo com que ele ficasse preocupado... com um mau pressentimento. Além disso, não vira Simas entrar no dormitório na noite anterior, e quando acordara de manhã ele também não estava lá.
O fato é que Harry estava evitando a todo custo admitir para si mesmo que estava preocupado com Simas. O amigo o ofendera.
O problema é que aquela vozinha chata, que sempre aparece na cabeça da gente para nos chamar à razão, agora estava incomodando Harry.
Ele estava tentando prestar atenção aos bruxos camaleônicos famosos da História, quando ouviu uma voz dentro de sua cabeça dizendo: "Você está preocupado com o Simas". Harry não se espantou, não era a primeira vez que a voz da consciência o assaltava e teimava em apontar-lhe a verdade. "Não estou, não", disse ele para si mesmo, determinado a intimidar a voz. "Está sim", insistiu ela. "Você disse que ia confiar nele... lembra?".
- Professora - disse Harry sem pensar, levantando a mão. Agora era tarde. A professora McGonagall já havia se virado para ele e, como ele não tinha prestado atenção a uma palavra sequer da aula, não podia nem inventar uma dúvida.
- Sim, Potter?
- Por que... por que o Simas não está na sala?
Rony, que estava sentado ao lado direito de Harry, olhou para ele espantado. Hermione, do lado esquerdo, deu o sorriso de superioridade de quem já havia previsto aquilo.
- O Sr. Finnigan - respondeu a professora. - sofreu um atentado ontem à noite, provavelmente logo após o jantar. Ele foi encontrado desacordado próximo à Floresta Proibida. Está na ala hospitalar, mas logo estará bem. Ele já acordou, mas Madame Pomfrey deu a ele um remédio para que dormisse de novo.
- Por quê? - perguntou Harry.
- Porque sua memória foi parcialmente apagada. Nada sério, coisa de esquecer um dia ou dois, mas é bom que repouse para recuperar a memória e nos contar o que aconteceu.
- Ah...
Harry ficou mais tranqüilo por saber que Simas estava bem. Por outro lado, a idéia do amigo ter sofrido um atentado perturbou-o ainda mais. McGonagall pareceu perceber isso, pois parou novamente de escrever e disse:
- Não se preocupe, Sr. Potter, provavelmente foi apenas algum aluno idiota que quis provar que sabia usar um feitiço do esquecimento.
Harry ficou quieto e tentou fazer uma cara de quem havia concordado com a teoria da professora. Porém, Harry, exatamente como Simas, representava pessimamente mal, e sua cara de concordância não enganou ninguém.

No intervalo daquela manhã, Harry foi direto até a ala hospitalar. Para sua surpresa, encontrou Simas sentado na cama, perfeitamente consciente.
- Harry! - gritou ele ao ver o amigo entrar.
- Você está bem? - perguntou Harry, dispensando os cumprimentos. Estava muito preocupado com Simas.
- Sim... desculpe por ontem.
- Você se lembra? - perguntou Harry, surpreso.
- Lembro. Eu me lembro de ter ofendido você, depois você subiu. Aí, eu saí do castelo... e então não lembro mais nada.
- Bom, o que importa é que já passou - disse Harry, mais para tranqüilizar a si mesmo do que para tranqüilizar Simas.
Mas o amigo não queria saber de palavras confortantes: o atentado o preocupava também.
- Sabe tanto quando eu que isso não é verdade, Harry - disse ele. Harry baixou os olhos. - Alguém fez isso, e foi de propósito. Temos que descobrir quem foi o culpado.
- Eu sei - concordou Harry. Então, Madame Pomfrey chegou e disse:
- Garotos, foi um encontro comovente, mas o tempo de visita acabou. Por favor, Harry, retire-se. Seu amigo tem de descansar, você sabe.
Harry olhou inquisidoramente para Simas, que disse, sorrindo:
- Pode ir. Vou ficar bem - e acrescentou, em tom de deboche: - Além do mais, você sabe que não adianta discutir com a Madame Pomfrey.
Harry sorriu e saiu da ala hospitalar.

A aula de Defesa Contra as Artes das Trevas estava maçante. Embora o professor Roberts fosse um sujeito muito carismático e os alunos gostassem dele, aquela mistura de criaturas perigosas com feitiços de defesa não estava agradando ninguém.
- Por que os professores insistem em misturar as matérias? - disse Rony, irritado, para Harry. - Só devíamos aprender sobre esses bichos feiosos nas aulas do Hagrid.
- Eu sei - respondeu ele. - Da mesma forma que é muito chato aprender a ihistória/i dos bruxos camaleônicos. Isso é o Binns quem devia dar. Além de que, na aula dele, seria muito mais interessante aprender isso do que aquela droga de revolta dos elfos dom...
Rony tapou a boca de Harry antes que ele terminasse de dizer "domésticos". Hermione, que estava sentada no lugar de sempre, ao lado esquerdo de Harry, dava muito valor aos elfos domésticos, e no ano anterior havia liderado um movimento para lutar por boas condições de trabalho a eles. O movimento fracassara, por desinteresse tanto dos alunos quanto dos próprios elfos, que não queriam saber de seus direitos. A garota levara um ano para compreender que os elfos simplesmente igostavam/i de ser escravizados e eram felizes assim. Ao que tudo indicava, ela já havia assimilado isso, mas...
- É melhor não arriscar - disse Rony. - Vai que ela começa tudo outra vez.
Se o garoto raciocinasse um pouco, não se preocuparia em falar dos elfos perto de Hermione. Afinal, mesmo nas últimas aulas de História da Magia do Prof. Binns, em que eles vinham sendo assunto constante pela sua única revolta (15 de março de 1714), a garota não vinha apresentando nenhuma reação histérica ou fazendo cenas dramáticas pelos direitos das criaturinhas.
A verdade é que havia um assunto que estava perturbando muito Hermione, chegando a dispersá-la nas aulas. E esse assunto era Lucky Star.
"A presença dela aqui não é lógica... é absurda! Deve haver alguma coisa que...", pensou ela. "Será que é o Roberts?". Hermione olhou fixamente para o professor. "Ele me parece tão esquisito... mas ninguém pode negar que é simpático". Ela fechou os olhos. "Posso até ouvir a voz dele me chamando... Hermione Granger... Hermione Granger..."
- Hermione Granger! - gritou Roberts. A garota despertou de um salto.
- Sim, professor?
- Onde você está com a cabeça? É a terceira vez que eu a chamo!
- Desculpe, professor.
- E vocês dois - continuou Roberts, apontando Harry e Rony. - Eu os vi conversando! Vocês três vão pegar uma detenção!
- O quê?! - exclamaram Harry, Rony e Hermione em uníssono.
- Isso mesmo! Vou levá-los à sala do Filch. Ele saberá o que fazer com vocês.
Argo Filch era o zelador de Hogwarts. Ele era um sujeito no mínimo detestável. Odiava todos os alunos e era odiado por eles. Sua diversão preferida era arranjar motivos para dar-lhes detenção ou expulsá-los, e sua única companhia era uma gata suja e magra chamada Madame Nor-r-ra.
Filch era um sujeito frustrado, e tinha um bom motivo para isso: ele era um aborto. Um aborto é um bruxo que nasce sem poderes, ficando então confinado a passar a vida convivendo com as limitações dos trouxas.
Depois que Harry, Rony e Hermione se levantaram, Roberts os levou até a porta, andou com eles por uns dez metros e disse:
- Vocês sabem o caminho?
- Sim - respondeu Rony, ainda sem entender o motivo da detenção.
- Então vão. E ai de vocês se forem pra outro lugar!
O professor os observou até que eles saíssem de seu campo de visão.
- Vocês entenderam isso? - perguntou Hermione aos dois.
- Eu não - respondeu Harry. - Nunca vi o Roberts tão bravo.
- Nem eu - disse Rony, quase pisando numa barata que passava rapidamente por eles.
- Acho que ele quer mostrar eficiência - disse Hermione. -, para durar mais de um ano em Hogwarts.
- Essa é a noção dele de eficiência? - protestou Rony, observando a barata subir no primeiro degrau da escada que levava a uma das torres. - Chega cinco minutos atrasado pra aula, depois dá uma detenção sem motivo algum! Acho que nem o Snape seria assim tão chato!
- Aposto que seria - retrucou Harry. - Chegamos.
Eles bateram à porta da sala do diretor. Ninguém atendeu.
- Será que ele não está? - indagou Hermione.
- E estaria onde? - disse Rony. - A vida social do Filch se resume a conversar com aquela gata idiota. Aqui é o melhor lugar para eles ficarem a sós.
Hermione fingiu que não tinha ouvido nada e bateu novamente. Harry disse:
- Talvez aquele incompetente esteja dormindo. Vamos abrir.
Ele girou a maçaneta e a porta se abriu. Tudo estava escuro lá dentro, as cortinas estavam fechadas e eles não sabiam onde ficava a janela.
- iLumus/i - murmurou Harry, iluminando a ponta de sua varinha.
Antes não tivesse feito aquilo. Mesmo sob a luz fraca da varinha, Harry, Rony e Hermione puderam ver claramente a imagem que os esperava. No chão, jazia o corpo inerte e sem vida de Filch, com os membros rígidos e os olhos muito abertos. Ao lado dele, Madame Nor-r-ra fitava Harry, com um brilho intenso nos seus olhos de gato.

Naquele momento, alguém entrou naquela sala de aula vazia e escura. Não abriu as cortinas, a luminosidade não poderia estar mais adequada ao seu estado de espírito.
Quem visse aquela pessoa ali provavelmente diria que ela estava louca ou algo parecido, mas ela sabia bem que o que estava sentindo não era loucura. Era muito parecido com isso, mas não era loucura.
Costumava cantar músicas à noite, quando estava só, mas agora ia dedicar uma música a quem mais estava sofrendo com tudo aquilo. Seu coração.
Sentou-se sobre uma das mesas, depois de se certificar de que havia trancado a porta, e começou a cantar:

/pp style="margin-left:138.0pt"ibrHeartbr I know I've been hard on youbr I'm sorry for the things I've put you throughbr Before you start to break on mebr Or ask for sympathybr I need to make you see/i/pp

/pp style="margin-left:138.0pt"ibrOh heartbr I'm not sure it's been long enoughbr to say what I feel is really lovebr There is just one way to learnbr Sometimes we'll get hurtbr and right now it's our turn /i/pp

/pp style="margin-left:138.0pt"ibrGive it timebr Help me throughbr Heart, we can do this togetherbr You're my strengthbr You're my soulbr I need you now more than ever /i/pp

/pp style="margin-left:138.0pt"ibrOh heartbr All the hurt will soon be gonebr if you, if you just keep on being strongbr You will always be my friendbr So keep on hanging inbr and we'll find love again /i/pp

/pp style="margin-left:138.0pt"ibrGive it timebr Help me throughbr Heart, we can do this togetherbr You're my strengthbr You're my soulbrI need you now more than ever /i/pp

/pp style="margin-left:138.0pt"ibrHeartbr I know I've been hard on youbr I'm sorry for the things I've put you throughbr But please, don't you break on me I need to make you see brIt wasn't meant to be brCause you, you'll always be my friend brSo keep on hanging in brAnd we'll find love again /i/pp

Sem mais aquela, abriu a porta e deixou a sala.

Harry, Rony e Hermione ficaram parados ali, tentando raciocinar. Hermione foi a primeira a falar.
- Ok - disse ela, trêmula. - Vamos... avisar o Dumbledore, vai ficar tudo bem, eu sei que vai.
- Por que a gente sempre se mete em encrenca? - lamentou Rony, nervoso.
- É uma ótima pergunta - disse uma voz atrás deles, vinda da porta. Eles olharam ao mesmo tempo. Era Dumbledore, acompanhado por Hagrid. Os dois estavam olhando para o corpo de Filch, enquanto o olhar astuto de Madame Nor-r-ra passava de um a outro, desafiadoramente. Harry se adiantou:
- Sr. Dumbledore, nós não...
- Vocês não fizeram nada, eu sei. Vamos com calma. Não há dez minutos, Argo Filch foi até meu escritório e me pediu para encontrá-lo em sua sala. Quando venho com Hagrid, encontro o zelador morto e vocês três bem ao lado dele. O que querem que eu pense?
- Mas nós não sabemos quem foi! - gritou Hermione, desesperada. - Ou mesmo se foi alguém, não tem marca nenhuma no corpo dele...
- Está bem, eu acredito em vocês - interrompeu o diretor, calmamente. -Agora voltem para a sala, vou cuidar disto aqui.
Os três não esperaram segunda ordem. Passaram por Dumbledore e foram andando para a sala de Defesa Contra as Artes das Trevas sem olhar para trás.
A aula já estava terminando quando eles chegaram. O professor não dirigiu a palavra a eles até sair.
- Ele está estranho hoje, não? - comentou Harry com Dino Thomas.
- Está mesmo. O que aconteceu quando ele levou vocês até a sala do Filch?
- Ele não nos levou até lá! - disse Hermione.
- Claro que levou! Ele demorou uns cinco minutos para voltar, achamos q tinha deixado vocês lá e vindo pra sala.
- Não, ele só andou uns dez metros com a gente - disse Rony.
- Estranho.
- É verdade - concordou Harry, mas na verdade não estava prestando a mínima atenção. Estava com o pensamento em outra pessoa... em Lucky. Era hora do almoço, finalmente ia vê-la novamente.
Ele arrumou o material, saiu sem esperar por Rony e Hermione e desceu correndo as escadas para o Salão Principal.
Lucky estava lindíssima, em um vestido preto que contrastava muito bem com sua cadeira prateada. Harry se sentou sem parar de olhar para ela e quase caiu no chão. Só depois de se equilibrar na cadeira ele viu que Simas estava bem a seu lado.
- Oi, Harry - disse ele, sorridente como sempre.
- Oi, Simas - respondeu Harry, sorrindo também. - Que bom que você já está fora da ala hospitalar.
Então, os pratos se encheram magicamente de comida, como o usual. O que não foi usual, porém, é que quando Harry foi dar a primeira garfada no cuscuz de camarão, algo cinzento e pesado pulou sobre ele violentamente e o derrubou com cadeira e tudo no chão. Surpreso, ele viu que era Madame Nor-r-ra, a gata do zelador Filch.