::terceira parte::

_ Amy... Amy... – uma voz muito doce começou a chamá-la.

Amy olhou para os lados, assustada. Estava sozinha no apartamento do pai assistindo TV e comendo biscoitos na sala. Por isso, de onde estaria vindo aquela voz? Foi quando ela percebeu: estava vindo de dentro de sua cabeça.

_ O quê? Quem é você e o que quer? – ela disse, assustada.

_ Amy... minha querida filha. – a voz continuou a chamá-la docemente.

_ Mãe? O que você quer? Eu já disse que eu não vou tirá-la do maldito troféu. – Amy revirou os olhos.

_ Não, não Catherine. Não sou Catherine. Sou sua mãe, mãe de seus poderes. E você vai me ajudar.

_ Saia de dentro de minha cabeça. Eu ordeno... – Amy elevou o tom de voz.

_ Não, você não ordena nada.  – a voz sibilou, zangada – Eu a comando e você vai fazer o que eu estou dizendo. Eu estou sofrendo, Amy. Willow prometeu me libertar, mas falhou.

_ Willow, não é? Eu não tenho nada mais com aquela traidora. Ela me chutou para fora de sua vida, como se eu não fosse nada. – Amy disse, ressentida.

_ Willow é fraca, nunca esteve a altura de meu amor por ela. Mas você está e por isso vai ajudar a me libertar e depois me ajudará a governar esse mundo. – a voz feminina a adulou.

_ Hum... interessante. O que eu devo fazer? – a jovem disse, a voz assumindo um tom maldoso.

_ Você precisa encontrar uma fonte de energia e depois eu a trarei até mim.

_ Isso vai demorar, sabe? Eu vou precisar fazer tudo sozinha, porque Rack está morto. – Amy objetou.

_ Não, não precisa. Há outro jeito. Willow sabia o que deveria fazer, mas a Caça-Vampiros a impediu.

_ Farei tudo o que desejar, minha senhora. – Amy sorriu, maldosa.

_ Lilith, minha doce filha. Me chame de Lilith...

[...]

Buffy chegou em casa e notou que estava tudo silencioso. Foi até a cozinha beber um copo d'água e encontrou o bilhete de Dawn preso à geladeira. "Fui ao cinema com Janice. Não volto tarde".

_ Hum. Janice, hein? Aposto que ela foi ao cemitério ver televisão com o Clem de novo... – Buffy comentou consigo mesma, apagou a luz e foi para a sala.

_ Buffy? – Xander chamou do andar superior e começou a descer a escada.

_ Ah. Oi, Xander, não sabia que você estava em casa. – ela respondeu, ainda com o bilhete na mão.

_ Eu não cheguei a sair. Dawn foi ao cinema com a Janice.

_ É o que diz no papel.  – Buffy respondeu com a voz neutra - Como ela está? – fez um gesto com a cabeça em direção ao andar de cima.

_ Willow? Está bem, você sabe, ela não fala muito. Na verdade, ela continua sem falar nada. Mas, pelo menos, não está mais chorando. – Xander tentou parecer otimista, mas a expressão preocupada traiu seus verdadeiros pensamentos.

_ Tenho tanto medo que Willow fique assim para sempre. – Buffy respondeu, a voz muito triste.

_ Eu também. Mas ela vai melhorar, nós não podemos tentar apressar nada.

_ Sheila apareceu na Magic Box essa tarde.  – Buffy contou ao amigo – Então, eu pensei: devemos ficar escondendo isso da mãe dela por muito tempo?

_ Mas a amiga de Giles em Londres continua mandando os cartões postais para ela como se fosse Willow, não é mesmo? – ele perguntou.

_ Continua.  – ela assentiu – Quer dizer, eu acho que continua, mas quanto tempo ainda para que comece a desconfiar que há alguma coisa errada?

_ Eu acho que a coisa toda leva tempo. – ele a olhou e parecia cansado, muito cansado – E eu não sei, Buffy. Sinceramente eu não sei se é pior quando ela está chorando como se só fosse parar quando não sobrar mais nada dentro dela ou quando ela está silenciosa olhando para a parede, como se só estivesse esperando a morte.

_ Às vezes eu tenho essa mesma dúvida, mas Giles disse que nós devemos ter paciência, que ela está se recuperando. Você deu o remédio a ela, não é? A poção que as bruxas inglesas mandaram?

_ Todas as vezes. Aquilo deve ser muito amargo, mas ela toma sem esboçar nenhuma reação. E eu não gosto da idéia de ter que alimentá-la como se fosse um bebê.

_ Quer que eu dê o jantar a ela desta vez? Você precisa sair um pouco de casa, ficar preso aqui todo o tempo quando não está no trabalho e isso não está fazendo bem para você. Hey, tenho uma idéia, por quê não vai buscar Dawn lá na cripta? Ela deve estar lá, vendo TV com o Clem. – ela propôs.

_ Mas eu pensei que ela tivesse saído com a amiga, a Janice. – Xander estranhou.

_ Não. – ela balançou a cabeça - Eu conheço muito bem a minha irmã. Ela nunca deixa bilhete quando sai e só deixou esse porque não quis que eu fosse atrás dela. Ela sabe que eu detesto quando vai sozinha ao cemitério.

_ Você acha que é uma boa idéia deixá-la ficar saindo com esse cara?

_ Clem? Clem é inofensivo e parece gostar da Dawn. Ela ainda sente falta do Spike, eram amigos, e como ele não está mais por perto, ela passa o tempo com o Clem. - Buffy deu de ombros.

_ E você? – ele olhou para ela, preocupado.

_ Eu? O que tem? Eu já lhe disse que acho o Clem inofensivo.  – Buffy respondeu, sem entender o que ele estava querendo dizer.

_ Não. Eu perguntei se você também sente a falta dele, de Spike.

_ Eu pareço sentir falta dele? – ela respondeu, sentindo que iria acabar explodindo. Por quê Xander ficava voltando e voltando ao mesmo assunto? – Como eu poderia sentir falta dele?

_ Tem razão. Só estava checando... Bem, eu estou indo. – Xander concordou e saiu pela porta da cozinha para a noite.

[...]

Logo Dawn e Spike estavam conversando como se não tivessem se afastado no ano anterior, sentados no chão da cripta.

_ Você estava *onde*? - ela o olhou incrédula.

_ África, pequena. Tinha assuntos para tratar lá.  – ele resumiu, resolvendo omitir o que fora fazer tão longe – E depois, Londres.

_ Oh, meu Deus! Isso parece tão legal! Eu nunca saí de Sunnydale...

_ Mas um dia vai sair. Essa cidade é muito pequena para a garota que você está se tornando.

_ E eu vou querer ir para Londres, quando sair daqui. O que você fez por lá?

_ Não muita coisa. Assisti a algumas corridas de cachorro... Mas teve essa noite em que eu tive que roubar um camarada bêbado... precisava do dinheiro, você sabe. Muito frio para viajar no compartimento de carga do avião... – Spike disse, de forma vaga.

_ Você voltou de avião, numa poltrona normal? Mas e o sol? Como consegui escapar do sol? – ela estava espantada.

_ Eu... eu me escondi no banheiro – ele respondeu rapidamente.

_ Você comprou uma passagem para viajar no banheiro? Que besteira. – ela levantou uma sobrancelha.

_ Vamos colocar as coisas da seguinte forma: não servem bebidas no compartimento de carga, meu bem.

_ E foi só o que você fez lá?  - ela contraiu os lábios - Agora não parece mais tão legal assim.

_ Só o que seus ouvidos adolescentes podem escutar.

_ Ah, qual é, Spike. Eu sei que você está louco para contar vantagem... – ela ainda tentou provocá-lo.

_Bem, teve também esse demônio com as mãos de fogo, que me fritaria, se pudesse. Me deu uma bela volta, o sujeito. E é só o que eu vou dizer.  – ele se levantou do chão e estendeu a mão para ela levantar também - Agora já está na hora de você ir embora, eu lhe dou uma carona.

De repente, ouviram um barulho do lado de fora. Dawn levantou-se e chamou alegremente:

_ Clem! Clem, venha ver quem está aqui.

_ Dawnster, Buffy quer que você volte para casa agora. Você sabe que ela não gosta que você fique perambulando...  – Xander se interrompeu, percebendo que havia alguma coisa errada – Espera aí, se você achou que era o Clem quem estava chegando, quem está aí com você?

_ N-ninguém. Ninguém, Xander, vamos embora. – Dawn correu e pegou no braço do amigo, tentando virá-lo para a direção da saída da cripta.

Mesmo com o esforço de Dawn em desviar sua atenção, Xander viu quem estava ali com ela. Viu e não ficou contente:

_ Por quê será que eu tinha certeza que você daria um jeito de trazer sua carcaça de volta para cá? – ele comentou, sarcástico.

_ Não, Xander, ele já estava indo embora. – a garota respondeu pelo vampiro – Estava indo embora, não é, Spike? – ela se voltou para ele, suplicando.

_ Na verdade, acho que não faria mal ter uma conversinha com um velho amigo antes de partir. – Spike sorriu sarcasticamente. Tinha várias palavras para definir Xander, mas amigo não era exatamente uma delas.

_ Dawn, espere lá fora – Xander disse sério.

_ Vamos embora, Xander. Por favor? – ela pediu, ainda segurando seu braço.

_ Espere lá fora, pequena. Não vai demorar. – o vampiro disse suavemente, mas manteve o olhar sobre Xander.

Depois que a garota, ainda muito assustada, concordou em deixá-los, Spike acendeu calmamente um cigarro.

_ Então, conseguiu dar um jeito de ficar mais perto de Buffy, hein?  - o vampiro comentou com a voz gelada, após uma tragada - Mudou-se para a casa dela, não é? Imagino que seja porque sabia que depois de ter um homem de verdade, sua namorada não iria querer mais saber...

Spike não chegou a terminar o que estava dizendo porque, enfurecido, Xander tentou acertá-lo com um soco. O vampiro foi mais rápido, no entanto. Agarrou o punho do rapaz no ar e começou a apertá-lo, implacável, enquanto examinava atentamente a reação surpresa do adversário por não vê-lo gritando por causa do chip em sua cabeça.

_ Ah... eu esqueci de dizer. Os dias de pobre e desprotegido Spike são passado agora. O chip? O chip já não funciona mais. – respondeu a pergunta que estava nos olhos de Xander.

_ Então... então é isso? Veio terminar seu servicinho sujo? Voltou para matá-la.

O vampiro olhou para ele sem conseguir acreditar no que estava ouvindo e acabou empurrando-o para longe.

_ É isso o que vocês pensam? A garotinha ali fora achar isso, eu até entendo, porque ninguém contou a ela o que a irmã dela fez comigo. Muito bom para transar, melhor ainda para espancar, era o que Buffy achava. Eu poderia tê-la matado pelo menos meia dúzia de vezes antes, se eu quisesse. Há muito tempo o chip não funcionava com ela.

_ Cala a boca, Spike. Como se você não gostasse de ser o saco de pancadas dela. Oh, toda a atenção especial. – sua voz era puro sarcasmo.

_ Que você daria um braço para conseguir... não daria? Mas se ela fizesse com você com a mesma intensidade que fazia comigo, você provavelmente pararia numa maldita cadeira de rodas – ele sorriu maldosamente, soltou o cigarro no chão e esmagou com a sola do sapato.

Furioso pelo jeito que Spike estava falando de Buffy, Xander o atacou novamente. Era até irônico que o vampiro houvesse acalentado a chegada daquele acontecimento por tanto tempo, quando o chip ainda estava funcionando em sua cabeça e mandando choques elétricos dolorosos em seu cérebro todas as vezes que tentava machucar algum humano, que agora que a oportunidade realmente chegara, Spike não sentia tanto prazer em surrar o garoto como imaginara que sentiria.

Ele sabia bem que o que acabara de dizer eram apenas palavras vazias, apenas bravatas idiotas provocadas por seu ciúme. Não se sentia assim e não se orgulhava por ter tido aquele relacionamento violento e sujo com Buffy. No fundo, sempre desejara que algum dia ela pudesse se orgulhar dele, reconhecesse seu amor e o amasse de volta. Acabara fazendo muitas besteiras pelo caminho, ela nunca considerara a possibilidade de amar um ser sem alma e isso nunca chegara a acontecer. Agora ela amava aquele perdedor à sua frente e o melhor que ele poderia fazer era simplesmente ir embora. Sabia que Buffy não gostaria de vê-lo chegar machucado em casa, isso levaria a perguntas. Seria melhor para si mesmo e melhor para ela, se simplesmente deixasse a cidade, sem ela saber que sequer chegara a voltar.

Por isso, continuou apenas desviando dos golpes furiosos de Xander, esperando que este se cansasse logo e fosse embora.

_ Olha, garoto, vá embora, está bem? Já passa da hora em que a menina deveria estar em casa... E, a propósito, como está Anya? – Spike perguntou, rindo suavemente, sem resistir à uma última alfinetada e acenou com a cabeça em despedida – Se a vir, mande minhas lembranças.

Xander, por outro lado, nunca atravessava o cemitério desprotegido. Mais irritado ainda pela última insinuação sobre sua capacidade de satisfazer uma garota, sacou da estaca e partiu mais uma vez para cima de Spike.

Spike não esperava por aquilo e, dessa vez, o rapaz levou a melhor sobre ele, enfiando a estaca em seu coração.

_ Uma coisa que eu deveria ter feito há muito tempo. – Xander comentou, ofegante.

Porém, em lugar de se transformar em cinzas como acontece quando um vampiro é estaqueado, Spike olhou para ele como se não entendesse o que estava acontecendo e o sangue começou a escorrer de sua boca. Os dois trocaram um olhar assustado e não demorou muito até que ele caísse no chão, inconsciente.

Xander olhou atônito para a estaca ensangüentada em sua mão.