::quinta parte::

_ Oh, Willow, ele está de volta Ele *realmente* está de volta! Isso não é fantástico? – Dawn disse agitada, andando de um lado a outro no quarto da amiga.

Willow continuou com a mesma expressão vazia no olhar, mas Dawn achou que, no fundo, ela estava ouvindo e por isso continuou, muito excitada:

_ Buffy está lá com ele agora, no hospital, será que ela vai mandá-lo embora? Ele não pode ir embora agora! Será que a Buffy vai ser burra o suficiente para deixar ele ir embora agora? Ah, mas eu não vou deixar! Eu preciso fazer alguma coisa. O que eu posso fazer? – disse mais para si mesma do que para a amiga.

_ Eu podia... eu podia esconder a mala dele... ah, não, isso é muito idiota, ele poderia ir embora do mesmo jeito...  – abandonou logo a idéia à procura de uma melhor – Eu já sei! Agora que ele está se recuperando, vai precisar de algum lugar para ficar, porque aquela cripta é muito fria e isso seria desumano, porque agora ele é humano! Ele poderia ficar... aqui. Quer dizer, eles passaram por muita coisa juntos e o que ele fez não foi certo, não mesmo, mas agora ele vai ter a chance de reparar o que fez, não é? Se ela deixar, eu acho que ele vai fazer tudo direito, dessa vez.

Aproximou-se e sentou na beirada da cama:

_ Você acha que o Xander ia ficar bravo se o Spike ficasse aqui? – perguntou, esperançosa, mesmo sabendo que não viria qualquer resposta – Não, porque é por causa dele que o Spike está no hospital agora... E Buffy... Buffy não ia querer que o Spike morresse, não é? Giles está no sofá e Xander no quarto dela, mas ele não iria se importar de dormir numa cama dobrável na sala com o Giles, só até o Spike ficar bom e eu poder pensar numa coisa melhor... Oh, isso é perfeito, Willow! – completou rindo, como se a ruiva tivesse realmente contribuído com alguma coisa em sua idéia de manter o rapaz na cidade. – Agora eu vou para o meu quarto para pensar como eu vou dar a notícia para a Buffy. Vou apagar a luz para você poder dormir também, ok? Boa noite. – disse enquanto ajeitava as cobertas da amiga. Depois apagou as luzes e saiu para o corredor, fechando a porta atrás de si. No corredor, deu de cara... com Amy.

_ Amy! – Dawn se assustou ligeiramente – Veio visitar a Willow? Mas é tão tarde... todos já estão dormindo, como conseguiu entrar?

Amy imediatamente resolveu dissimular o que ia fazer, porque seria muito mais fácil levar a menina sem atrair a atenção dos outros com uma luta. Por causa disso, resolveu mudar um pouco seus planos e respondeu, tentando parecer amigável:

_ Sim, eu vim... fiquei tão chateada com o que aconteceu a ela... E eu também não quero atrapalhar o sono dos outros. Você não quer sair um pouco, ir ao Bronze, talvez?

_ Ao Bronze? Mas são quase seis da manhã...

_ Oh, é mesmo... onde nós podemos conversar, então?

_ Vamos para o meu quarto. Buffy está dividindo comigo, mas ela não está, mesmo..

_ Ótima idéia. – Amy sorriu para ela.

Dawn abriu a porta do quarto e as duas entraram. Lá dentro estava Miss Kitty, que acordou soltando um rosnado feroz e pouco amistoso para Amy.

Prontamente, Dawn pegou a gata no colo e tentou acalmá-la.

_ Miss Kitty, essa é a Amy. Lembra da Amy?

_ Eu nunca gostei dessa gata... – a bruxa disse, perdendo o tom falsamente alegre em sua voz.

_ Oh, será que é por isso que ela está assim? Quer dizer, será que ela se lembra dos tempos... dos tempos que você era um rato? – Dawn completou timidamente.

_ Será que você poderia colocá-la para fora? – Amy começou a se sentir nervosa.

_ Ah, claro. – Dawn concordou imediatamente e abriu a porta, colocando o animal no corredor, dizendo carinhosamente – Miss Kitty, fique aqui, está bem?

A gata, vendo-se livre afinal, voltou para o quarto novamente, rouquejando. Deu um pulo e arranhou o rosto de Amy, fora de controle, enquanto Dawn tentava contê-la.

Imediatamente, Amy perdeu a compostura e apontou um dedo para a gata, de onde saiu um raio brilhante –Sua maldita! – disse, jogando-a para o outro lado do quarto, onde caiu sobre a penteadeira, imóvel.

_ Hey, você machucou a Kitty! – Dawn gritou indignada, correndo para ver se a gata estava bem.

O barulho acabou acordando Xander. O rapaz correu para o corredor:

_ Dawn, o que está acontecendo aí? Você tem idéia de que horas...

Amy colocou a cabeça para fora e guinchou:

_ Cuide de sua vida, Xander Harris. Volte a dormir. – disse maliciosa, acertando-o também com um raio que o jogou inconsciente no chão, do outro lado do corredor.

Com Miss Kitty Fantastico no colo, Dawn gritou:

_ Qual é o problema com você? Vá embora, Amy!

_ Oh, não, não, minha querida. Você vem comigo! Conheço alguém que está ansiosa para te conhecer – afastou a gata com um repelão, agarrou a menina e desapareceu com ela no ar.

[...]

_ Dawn... – os olhos verdes de Willow faiscaram no escuro. – É tempo – e aquelas foram sua primeiras palavras depois de um longo tempo.

Levantou-se da cama e começou a procurar uma roupa para vestir.

[...]

_ O sol logo vai nascer. – Buffy comentou, numa forma de afastar o clima pesado e o longo silêncio que se instalara no quarto, depois que jogara por terra qualquer esperança que o ex-amante pudesse ter de se reconciliarem – Quer que eu feche a cortina da janela? – ofereceu.

_ O sol não é mais problema. – ele respondeu, pensativo – E é engraçado, porque, depois que eu saí daquela caverna, fiquei sentado vendo o sol nascer, pensando no quanto seria bom se ele pudesse me queimar, me reduzir a uma pilha de cinzas, porque então eu deixaria de sentir por ter...  – ele desviou o olhar – de sentir o que eu estava sentindo. Mas ele não queimou e foi o nascer do sol mais fantástico que eu já vi. Foi o primeiro, depois de muito tempo.

Novamente o silêncio. Ela voltou a se sentar na cadeira. Ele ficou olhando para a parede por um longo tempo, pensando. Cada um imerso em seus próprios pensamentos. Foi Buffy, novamente, quem espantou o silêncio para longe:

_ Se você queria tanto assim uma alma, poderia ter pedido. Willow conhece o ritual que trouxe a alma de Angel de volta e poderia... ou mesmo Tara poderia ter...

_ Diabos, não, Caçadora! – ele a interrompeu, quase indignado por ela pensar daquele jeito - Não queria nenhum acordo que tivesse nas letras miúdas a cláusula que me transformaria num maldito vampiro eunuco, muito obrigado.

_ Então, você quer dizer que não tem... nenhuma cláusula.  – ela o olhou surpresa – Você já deve ter testado, é claro. – e, percebendo no segundo seguinte o que isso soaria aos ouvidos dele, completou rapidamente – Não... não que isso seja da minha conta.

Ele apenas olhou para ela e respondeu:

_ Sem cláusulas nem letra miúda, meu bem.

_ Mas... mas eu me lembro que você pediu especificamente para voltar ao que era antes... para eu ter o que eu merecia... – ela disse, lembrando-se das palavras dele no sonho – Quando exatamente você foi um vampiro com alma, Spike?

_ Como... como você?... – ele deixou a pergunta sem finalizar, com um olhar atônito.

_ Eu estava lá. Bem, na verdade, eu estive lá em sonhos, eu o vi lutando. No começo eu pensei que fosse o chip, que você o quisesse fora. Mas não era, não é? E o ataque dos insetos repugnantes? Ótimo toque final de classe... – ela completou com uma careta de nojo.

_ Ahn... será que foi por isso que eu não ganhei exatamente o que eu queria? – ele sorriu malicioso e, por alguns segundos, era o mesmo velho Spike, fazendo jogos. – Você acha que eu deveria ter sido mais específico no que estava pedindo?

E será que não havia sido, afinal? Mas ela não ia perguntar, não queria perguntar. Ao invés disso...

_ Eu sei que parece estúpido, mas... – ela se sentia estranhamente nervosa e não sabia por onde começar, porque não gostaria que ele entendesse aquilo de forma errada. O que quer que fosse aquilo – Mas Dawn me disse que sentiu a sua pulsação e... eu gostaria d-de... eu gostaria de ouvir...  posso? – ela perguntou timidamente, sentindo seu rosto pegar fogo.

_ Você gostaria... de ouvir – ele ecoou, completamente confuso.

_ É, eu gostaria.  – ela suspirou e fez um gesto impaciente, rindo nervosa - Ah, que coisa idiota. Eu me escuto falando e é simplesmente tão idiota...

Então ele compreendeu o que ela estava querendo dizer:

_ Você quer ouvir o meu coração. É isso o que quer, amor? – ele perguntou, suavemente.

_ Não me chame assim... – ela protestou encabulada, embora ele a tivesse chamado assim antes durante aquela mesmo conversa e ela não dissera nada. Mas não parecia ofendida.

_ Sente-se aqui – ele se moveu um pouco na cama, para lhe dar espaço.

Buffy aceitou o convite e se sentou ao lado dele na cama, aproximando a cabeça de seu peito e evitando cuidadosamente o curativo que protegia os pontos no peito dele. Percebeu que Xander não teria acertado no coração de qualquer forma, mas sim um pouco mais para a direita. De qualquer forma, era um ferimento mortal, ela sabia.

Sentindo os cabelos dela cascateando à sua volta, Spike não conseguiu reprimir um suspiro, e fechou os olhos.

_ Oh, eu estou te machucando. – ela se afastou e olhou para ele, assustada.

Percebendo o tom de pânico na voz dela, ele abriu os olhos novamente.

_ Está. – ele concordou – Mais do que imagina... mas não tem problema. – ele a puxou docemente para a posição anterior e a envolveu num abraço, com medo que ela se afastasse de novo.

Esquecida de sua promessa de matá-lo se a tocasse novamente, Buffy não se afastou e ficou ali imóvel, apenas ouvindo o coração dele bater. Sentindo sua respiração suave fazer o peito subir e descer, orvalhando seus cabelos. Sentindo a carne quente dele em contato com seu rosto. Os braços dele à sua volta. Sentiu um estranho dèja-vu, como se aquilo já tivesse acontecido com ela antes.

Spike sentia cada centímetro de seu corpo ferver, tudo dentro dele derreter. Sim, ele a queria, é claro. Queria beijá-la, ajoelhar-se diante dela e jurar que nunca mais a machucaria e que mataria qualquer um que sequer tentasse. Queria fazer amor ternamente com ela, não importando quantos pontos da operação estourasse dentro de si com o esforço, mas sabia que não podia. Sabia que se fizesse qualquer coisa impensada, ela simplesmente voaria para longe. Por causa disso, apenas aceitou o que ela estava oferecendo naquele momento e ficou sentindo-a contra o seu corpo, a respiração dela fazendo cócegas em seu abdome, aquela intimidade que era muito maior do que haviam tido quando fizeram amor... não, não amor, corrigiu-se mentalmente, porque Buffy fora muito clara quando dissera que nunca o amara e nunca poderia amá-lo. Não conseguiu impedir seu corpo de reagir ao simples contato da pele dela e sentiu-se arrepiar. Numa tentativa para que ela não percebesse o que aquilo estava causando nele, tentou não pensar, simplesmente não pensar. Isso, é claro, não impediu sua respiração de ficar mais forte, seu batimento cardíaco também. Buffy também sentiu. Ela se afastou um pouco, se libertando dos braços dele e o encarou, mas ele não conseguiu ler a expressão em seus olhos.

A porta se abriu violentamente, carregando o momento para longe. Era Xander.

_ Lamento interromper... – ele olhou de um para o outro, intrigado – O que quer que esteja acontecendo aqui, mas a Dawn sumiu.

Buffy se levantou de um pulo:

_ Dawn?!? O que aconteceu? – exigiu saber, assustada.

_ Amy, aquela bruxa maldita a levou. Enquanto você estava aqui, de chamego com esse traste. – ele a acusou, lançando-lhe um olhar duro.

_ Não é... não é o que você está pensando. – ela olhou para o outro lado, se sentindo culpada e evitou o olhar perturbado de Spike. Isso também não passou despercebido ao amigo.

Spike também se levantou, tentando disfarçar a careta de dor por causa da fisgada que sentiu na ferida, arrancou os fios que o prendiam à maquina e começou a procurar sua roupa, para vestir por cima da calça do pijama do hospital. Vendo isso, Buffy o barrou:

_ O que é que você está fazendo?

_ O que você pensa que eu estou fazendo? Vou salvar a Dawn, é claro. – ele respondeu, resoluto.

_ Mas você não pode. Está ferido, lembra? – ela argumentou, colocando-se na frente dele, as mãos na cintura.

_ Isso não importa. – ele não iria deixar que ela a convencesse.

_ Mas é claro que importa. Eu não vou deixar você sair assim. Eu realmente não vou ter tempo para impedir que você se machuque... mais – ela olhou para ele, séria - Olha, vai ficar por bem ou... – ela o ameaçou, mas sua voz demonstrava mais preocupação do que ela gostaria.

Frustrado, Spike ainda pensou em contra-argumentar, mas viu que ela não iria mudar de idéia e estavam perdendo um tempo precioso. Por isso acabou assentindo e voltou a se sentar na cama bufando. Sentindo-se um inútil.

_ É, vá logo. Salve-a.

_ Ótimo. – ela ficou satisfeita por ele ter aceitado a lógica da situação e saiu com Xander do quarto.

Do lado de fora do hospital, Giles esperava no carro de Xander. Assim que os dois entraram, ele deu a partida.

_ Então, qual a situação? – Buffy já foi perguntando, enquanto sentava no assento da frente, ao lado de Giles e prendia o cinto de segurança.

_ Além da que eu encontrei lá no quarto, entre vocês dois? – a voz de Xander pingava desprezo.

Com as palavras cruéis do amigo, Buffy congelou no assento, com o cinto de segurança no meio do caminho do fecho, sem ação. Ela já estivera naquela mesma discussão com Xander tantas e tantas vezes, que não queria começar uma exatamente agora, precisava direcionar seus pensamentos para salvar sua irmã, não para entrar numa disputa verbal com ele.

_ Nenhuma situação lá dentro, Xander - Buffy tentou dizer com a voz mais calma possível.

Giles percebeu a reação de Buffy com curiosidade. Ele sabia que sua pupila estivera dormindo às escondidas com o vampiro no passado, porque ela mesma lhe contara quando ele voltara à Sunnydale (e ele não conseguira reprimir o riso quando ela acabara de lhe contar aquilo, porque parecera tão temerosa de sua reação sobre com quem ela estivera dividindo os lençóis...). Porém, tinha que se lembrar que agora Spike não era mais um vampiro. Ele fizera o caminho de volta por escolha própria, Giles suspeitava, embora soubesse que se perguntasse diretamente, ele negaria.

O Sentinela não conseguia se sentir de outra forma que não agradavelmente surpreendido por ver que o amor que ele tinha na Caça-Vampiro o fizera dar as costas à imortalidade, enquanto outros tentariam exatamente o oposto: transformá-la em uma fêmea de sua espécie. Se ela retribuísse o amor de Spike, no que ele poderia objetar? Ela era livre para fazer suas próprias escolhas, era uma adulta agora. Não era a mesma coisa, por exemplo, que quando ela estivera apaixonada por Angel, pelo amor de Deus! Naquela época ela tinha apenas 17 anos! Além disso, Spike, vampiro ou não, obcecado ou não por Buffy, os ajudara muitas vezes antes e mesmo depois que ela morrera, cuidando de Dawn como se fosse sua própria irmã, salvando sua vida  e a dos outros em diversas ocasiões, naqueles terríveis meses sem a Caça-Vampiros. E tudo isso sem uma alma, o que ele parecia ter agora. Por causa disso, ignorou completamente o comentário mal-humorado de Xander e começou a explicar o que havia acontecido:

_ Enquanto estávamos dormindo, Amy apareceu e raptou a Dawn. Xander tentou impedir, mas ela o atacou com magia. - resumiu.

_ Alguma idéia do lugar para onde ela possa ter levado minha irmã? – Buffy perguntou, aflita.

_ Algumas, na verdade. Mas Willow também sumiu. - toda a expressão de Giles demonstrava o quanto ele sentia que a situação era preocupante.

_ Você acha que ela está com Amy nessa? - ela não queria sequer considerar a possibilidade, mas o fato da amiga ter desaparecido também, não parecia nada bom.

_ Ela pode estar, sim, tentando terminar o que começou. Por isso, nós vamos para o deserto, para o lugar onde Willow reergueu aquele templo demoníaco. - o Sentinela colocou o carro em marcha.

[...]

_ Vamos, não chore, Dawnie. Não é tão ruim... Logo, tudo vai acabar e eu prometo que você não vai sentir nada. – Amy tentou consolá-la, enquanto a amarrava firmemente numa estaca exatamente em frente ao templo satânico que Willow erguera meses antes no deserto.

_ Por favor, Amy, me solte. Me solte! – ela tentava lutar contra as cordas que a prendiam.

_ Não, eu não posso.  – a bruxa negou – É um desperdício, toda essa energia que você tem dentro de você. Não usá-la para alguma coisa grandiosa é simplesmente um desperdício.

_ Amy, solte a menina – Willow disse calmamente, se aproximando. Seus pés mal tocavam a areia.

_ Willow? Veio para admirar o meu grande momento? Ver o quanto eu sou uma bruxa melhor que você? Ou então veio se juntar a mim? – completou, esperançosa.

Dawn olhou a bruxa ruiva em expectativa, porque sabia que seu destino estava selado se Willow viera para tentar terminar o que começara três meses antes.