::sétima parte::

_ Hey... você precisa deixar esse hábito de desaparecer desse jeito, você sabe... - Buffy aproximou-se suavemente. Estava certa, afinal, Willow estava sentada ao lado da sepultura de Tara.

_ Eu fui comprar uma gaiola nova para Amy, você sabe, com Miss Kitty em casa, não seria seguro deixá-la solta. Com Amy de novo como rato, Kitty anda muito... hmmm... amigável demais com ela.

_ Oh, certo, Amy... você está pensando em deixá-la como um rato para sempre?

_ Não... Giles já conversou com as bruxas do coven inglês e combinou com elas: vai mandá-la para lá, para que elas possam ajudá-la. Como me ajudaram - Willow interrompeu o que estava dizendo e acariciou uma das pétalas de uma das rosas do vaso - É engraçado... quando Tara estava viva, eu nunca lhe dei flores e agora é praticamente tudo o que eu posso dar a ela. - prosseguiu, como se estivesse pensando em voz alta. 

_ Mas eu tenho certeza que ela deve estar contente por ver que você está se recuperando... - Buffy sentou-se ao lado da amiga, na grama – Eu sei que eu nunca cheguei a dizer o quanto eu sinto por causa da morte de Tara. Eu sinto muito, Willow. Ela era... mais do que apenas uma boa amiga. Ela parecia estar sempre lá, sorrindo, deixando todo mundo em paz e era confortador, ela nunca teve nenhuma maldade no coração.

_ Você sabe... Quando eu o matei...  - Willow continuou, ainda olhando as flores que trouxera - quando eu matei Warren, uma parte de mim tentava desesperadamente parar com aquilo, enquanto a outra, a outra gostou imensamente de fazer o que eu fiz. Essa parte me assusta, Buffy. Então eu fui atrás de Rack e essa parte tomou conta. Mesmo tentando, eu não conseguia mais dominá-la.

_ Eu sei o que você quer dizer... - Buffy respondeu, seu pensamento também longe, no passado.

_ Sabe? - Willow a olhou confusa.

_ Está brincando? Quando Faith envenenou Angel, eu fui atrás dela para trazer seu sangue para ele. Quando eu a esfaqueei, eu gostei de fazer isso, uma parte de mim gostou. Eu queria matá-la naquela hora e acho que se ela não fosse uma Caça-Vampiros também, teria conseguido.

_ Você nunca me contou...

_ Ninguém sabe disso. Porque é a parte de nós que não queremos que ninguém conheça, que sabemos que as pessoas que a gente ama nunca se orgulharia.

_ Eu tenho certeza que Tara nunca se orgulharia de mim, pelo que eu fiz... - refletiu sobre o que a outra dissera - Você sabe quando dizem que uma hora pára de doer e então você começa a se curar? - Willow olhou para Buffy, os olhos muito tristes.

_ Sim, eu sei... um dia... eu acho que um dia só ficam as lembranças felizes... - ela respondeu hesitante, pois não tinha muita certeza se acreditava naquilo. Ainda tinha muita saudade da própria mãe e não sabia se algum dia ia parar de sentir por não tê-la mais ao seu lado.

_ As pessoas mentem quando dizem isso, Buffy. Nunca pára de doer... E então eu sinto como se eu fosse cair em pedaços porque dói tanto, tanto por dentro, a falta dela, a saudade. Mas então eu me lembro como ela era, me lembro o quanto ela era boa e nunca esperava nada mais das pessoas do elas podiam lhe dar e eu sei que ela está num lugar melhor. E também sei que ela deixou um grande pedaço dela dentro de mim e que eu nunca vou esquecer... - uma lágrima correu por seu rosto abatido pelo longo período de reclusão.

Willow ficou ali, as lágrimas escorrendo por seu rosto e Buffy a abraçou. Ficaram um longo período em silêncio, apenas consolando uma a outra, sem palavras. Depois de um tempo, Willow se afastou um pouco:

_ A única coisa boa, eu acho, é que eu tive oportunidade de dizer a ela que eu a amava, antes que ela partisse. Eu acho que se ela tivesse ido embora antes que eu tivesse a oportunidade de conversar com ela... – Willow percebeu o olhar ferido de Buffy e desviou o assunto - Você sabe porque ele está de volta, não sabe? Sabe porque Spike está de volta e tão... diferente, não é? – Willow encarou a amiga de tanto tempo, sabia que era aquilo que estava em seus pensamentos.

_ Eu sei. Ele me disse... eu acho - Buffy lembrou-se que ele nunca terminara dizer porque ela não era todo o motivo dele querer sua alma de volta - Eu só não entendo porque você o escolheu para ajudá-la, quando sabia onde eu estava também.

_ Buffy... ele estava tão desesperado para bancar o herói para você, que teria ido do mesmo jeito... A diferença é que você... Xander... sabia o caminho e ele não. Oh, Buffy... eu sei que eu não devia, mas enquanto estava guiando-o, dentro da cabeça dele, acabei... hum...  tropeçando numa coisa, não era o meu direito, mas...

_ O que você viu? Ele... ele falou alguma coisa prá você... por pensamento?

_ O que aconteceu, o que ele fez a você antes de ir embora. Porque ele pensa que todo mundo sabe, que você contou a todo mundo.

_ Mas eu não... Ele veio aquela noite. Eu sei que ele só veio para pedir desculpas, mas eu estava tão cansada, minhas costas doíam e eu também... eu não vou mentir, dizendo que eu não fiquei abalada ao vê-lo com a Anya, tão cedo, logo depois de ter dito, ter afirmado... que me amava...

_ Buffy, se você não quiser falar sobre isso, você não precisa. - agora era Willow quem ficava preocupada com a amiga.

_ Não, está tudo bem, de verdade.  - ela sorriu, tristemente - Eu acho... acho que deve ser bom conversar sobre isso com alguém. - viu que Willow assentia, incentivando-a a continuar.

Buffy prosseguiu:

_ Bem, ele veio, como eu disse, para conversar. Eu não queria conversar com ele, queria que ele fosse embora, simplesmente fosse embora. Ele tentou me convencer de sua versão de amor. Tentei explicar que sentia sim, alguma coisa por ele, mas que nunca poderia confiar nele o suficiente para que fosse amor. Quer dizer, depois do que ele fez... depois que ele transou com Anya, como eu poderia dizer a ele, confirmar... - comprimiu os lábios - que seja... Ele simplesmente não me escutou e de repente começou a tentar arrancar a minha roupa, no derrubou no chão, tudo virou um pesadelo. Nós lutamos, ele parecia possesso, eu pedia para ele parar e ele simplesmente não me escutava, era como se... eu não sei. Enfim, eu consegui jogá-lo para longe e então eu acho que ele compreendeu que o que nós tivemos no passado acabou e pareceu ficar abalado quando ele compreendeu o que havia feito. Ele foi embora e então Xander apareceu, ele viu. Ele me viu...  - ela hesitou - depois. E depois contou a Dawn. Eu sabia que Spike tinha ido embora e nunca achei que voltaria e muito menos... que voltaria desse jeito, mas nunca pensei em esconder o que quer que fosse. Só lamento não ter contado para a minha irmã de outra forma.

Willow ouviu atentamente o que a amiga estava contando, o que era tão doloroso para ela contar e comentou:

_ Sinto muito em saber disso e por não ter podido ajudar. E eu sei que ele também sente. Você sabe que essa lembrança está na cabeça dele, torturando-o a cada minuto, não é?

_ Não, eu não... não sabia. - Buffy estava chocada. Pensara que o remorso que ele mostrara no hospital era apenas em relação às vítimas de seu passado, como Angel demonstrara quando voltara do inferno. Nunca passara por sua cabeça que estava inclusa no sentimento de culpa do ex amante.

_ E ele está indo embora. - Willow completou.

_ Está? - ela se surpreendeu. Pensava que agora que ele estava de volta, ficaria. Não havia nenhum motivo para ir embora, de novo.

_ Sim. E se você acha que tem... qualquer assunto para conversar com ele antes, seria uma boa idéia fazer isso logo, porque embora Dawn tenha planos para segurá-lo na cidade, eu não acho que ela vai conseguir fazer isso sozinha...

[...]

No final, Spike acabou não ficando na casa das Summers. Buffy não confiava o suficiente para isso. Feridas precisavam ser fechadas e para isso precisavam de tempo. E não era só na ferida no peito dele que ela estava pensando porque, lembre-se, metade humano, metade demônio, logo ela estava bem fechada e em três dias, para espanto dos médicos, não restava nada além de uma fina cicatriz e depois disso, mais nada.

Por isso, Buffy acabou trazendo uma solução melhor: assim que ele deixasse o hospital, passaria a morar no antigo apartamento de Angel, que estivera vazio desde que ele o deixara para morar na mansão da Rua Crawford, há quatro anos atrás e continuara assim quando o vampiro deixara Sunnydale e se mudara definitivamente para Los Angeles. Ela tinha certeza que Angel não se importaria com o arranjo, mas mesmo assim tentara ligar para perguntar e estranhamente ninguém atendera ao telefone no hotel.

Claro que Spike fora contra a idéia, ainda mais quando soubera quem morava ali antes, ("maldito peaches não vai me ter como inquilino", ele vociferou, quando Buffy sugeriu a idéia pela primeira vez) mas o lugar era limpo, confortável, perto do Bronze. E o melhor, não era dentro de um maldito cemitério, pelo amor de deus. Além disso, Clem poderia ajudar a arrumar tudo por ali - Clement gostava de morar na cripta, muito melhor do que os outros lugares onde morara e se oferecera para ajudar - e os dois acabaram de tirar qualquer vestígio do antigo morador do lugar. No fim, a persistência das irmãs (o que ele preferia, morar no apartamento de Faith? Aí, ele poderia ficar certo que nem Buffy ou mesmo Dawn apareceriam para vê-lo, era bom saber desde já) acabou por convencê-lo.

E então, depois de tudo pronto, ele acabou gostando dali. Claro que sabia que o lugar tinha lâmpadas e abajures, mas sempre preferira a iluminação de velas e espalhara muitas, de várias cores e tamanhos, pela peça principal.

Naquela noite, em seu caminho para uma caçada, Buffy apareceu para uma visita. Entrou silenciosamente no apartamento e viu que ele estava de costas, sem camisa, suas costas ainda perturbadoramente alvas, como quando ele ainda era um vampiro.

Sentado na borda da cama, Spike estava profundamente entretido cantando na penumbra, enquanto se acompanhava com um violão. Ela nunca soubera que ele tocasse qualquer coisa, por isso ficou parada na porta, ouvindo sua voz rouca e melódica:

She comes home to me after a hard night's work
Falls into my arms and sleeps like a bird
And startled, wakes up, like she don't know me
Draws her arm back like she's going to slug me
Who are you anyway, and what are you doing to me?
She's an angel, but she can't feel it
She got wings, she can't see 'em
She's an angel, she can't feel it
But she's flying over me every day
Every day of my life
Bright diamond eyes with daggers beneath them
She carries the chains of a million decisions
That weren't really hers to begin with anyway
But she carries them all, all the people around her
Never even notice that she's very very tired
She's an angel, but she can't feel it
She's got wings, but she can't see 'em
She's an angel, she can't see it
But she's flying above me every day
Every day of my life

Quando ele terminou, se virou para deixar o violão de lado e a surpreendeu parada ali, olhando para ele.

_ Meus olhos... não são de diamante... supondo, é claro que essa música seja prá mim. Mas não é. É? - ela comentou, ainda da porta.

_ Diamantes são de várias cores, amor. - Spike evitou responder diretamente sua pergunta e alcançou a camisa na guarda da cama.

_ Eu... ahn... gostei do que você fez aqui - Buffy deu uma olhada à volta - Ficou realmente acolhedor. As velas... e tudo...

_ E... você veio para dizer o quanto gostou da decoração da minha casa, que você conseguiu para mim? - ele olhou para ela, curioso, enquanto abotoava a roupa.

_ Não. Eu vim para... eu nunca te disse o quanto eu fiquei grata porque você acabou aparecendo para ajudar, arriscando sua vida pela minha irmã. Por mim... - Buffy começou a explicar, não querendo que ele pensasse que ela esquecera.

_ Quando a ruiva entrou na minha cabeça, eu já estava pegando uma das motos do estacionamento... emprestada. - ele respondeu, franzindo a testa por ela não entender que ele não poderia ter agido diferente e se levantou da cama, para chegar mais perto dela.

_ Mesmo assim... Obrigada. Eu só queria que você soubesse o quanto isso significou para mim. E também... - ela hesitou, porque era realmente o assunto que a trouxera e não sabia direito como começar - a-aquela noite. Naquela noite, eu acho que deveria ter pelo menos escutado o que você queria me dizer.

Aquilo o pegou totalmente despreparado e, sem saber o que fazer, estacou no meio do caminho.

_ Não! Você não pode vir aqui e pedir desculpas por uma coisa que eu fiz a você. Não pode esquecer e me perdoar por uma coisa que eu mesmo nunca vou me perdoar! - ele estava furioso por ela tentar assumir uma culpa que era só dele. Aquilo não tinha nenhum sentido para ele.

Buffy sorriu tristemente e continuou com aquilo que sentia que precisava dizer:

_ Espere, escute antes. Me desculpe por ter desprezado o que você sentia por mim. E eu sei que você estava sendo sincero o tempo todo, mas eu não podia... - ela fez uma pequena pausa - não queria acreditar. Ou corresponder. Era muito mais fácil se eu pensasse que você estava se enganando, enquanto tentava convencer a mim mesma que não sentia nada. De um jeito ou de outro, eu acho que você sempre soube a verdade, que eu nunca poderia dar um nome... mas você, simplesmente, sempre soube o que eu sentia.

_ Então você está dizendo... que não me odeia? – na verdade, ela havia dito mais que isso, mas ele não queria arriscar suas chances, se é que havia alguma a ser arriscada.

_ Oh, eu odeio, sim. Quer dizer, eu odiei... muito. Mas eu sei que você estava indo bem antes que eu... antes que Willow me trouxesse de volta. Com Dawn, com o pessoal, até com o Xander. E então... eu voltei. E não tinha nenhum direito de usá-lo. Ou você, de tentar me separar de meus amigos.

Buffy deu alguns passos e parou bem à sua frente. Olhou dentro dos olhos dele e viu toda a dor que aquela lembrança trazia a ele e continuou:

_ E eu não disse que esqueço o que você fez. Eu acho que é uma coisa muito grande para simplesmente fingir que não aconteceu. Mas a verdade é que nós dois nos tratamos muito mal durante esse tempo... que passamos juntos. E eu resolvi que quero ser uma irmã de verdade para a Dawn e que quero que meus amigos sejam felizes... todos os meus amigos - ela enfatizou as últimas palavras alcançando e segurando a mão dele.

_ Buffy, eu... Eu sinto tanto. Se eu pudesse voltar no tempo, eu nunca faria, eu pararia quando você me pediu para parar e eu... eu a amo tanto que... e então você vem com essa conversa de que eu sou seu amigo, mas eu não sei se algum dia eu vou pensar em você como uma simples amiga. - ele soltou a mão dela e passou pelos próprios cabelos, olhando-a com um misto de vexame e desespero. Respirou profundamente - Ah, maldição! Olhe para mim e me diga se eu não estou virando um maldito nancy-boy...

Buffy riu um pouco e beijou-o levemente nos lábios:

_ Eu estou saindo agora para patrulhar e achei que você gostaria de vir... Sempre há utilidade para o novo garoto demônio da vizinhança numa patrulha, você sabe... - ela sorriu para ele, sincera.

::F I M::

notas:

· A música que Spike está cantando na parte final da história chama-se Angel e é de autoria de James Marsters. Antes que alguém me pergunte: não, eu não acho que foi escrita com essa finalidade. Mas, já que ele vai voltar diferente, seria melhor, ao invés de compor poesias, ele voltar cantando. Uma garota pode sonhar, não é mesmo?

· Litle Bit e Nibblet têm o mesmo significado em inglês: mordidinha, pequena porção, pedacinho (a tradução que eu usei aqui). Usei essa última porque eu acho que cabe exatamente no jeito do Spike sempre olhar para Dawn como uma garotinha, sempre na posição de irmão mais velho. No entanto, se você acha que, apesar da  - enorme - diferença de idade, Spike e Dawn deveriam ter um relacionamento diferente do que o mostrado aqui, você não passa de um sick puppy... *risos*

· Eu não controlo o destino dos personagens (hey, acho que eu já disse isso lá no disclaimer...) mas todos sabemos que o Spike vai voltar diferente, por isso eu acho que ele poderia voltar meio humano, meio demônio. Isso seria, sem dúvida, muito diferente do que termos *outro* vampiro com uma alma perambulando pela cidade... De qualquer forma, eu não mando nada, por isso eu só posso ficar aqui desejando intensamente para que o povo da Mutant Enemy perceba isso também. *mais risos*