Capítulo Vinte

DESCOBERTA DO DIRETOR

O caminho até a sala do Diretor estava desobstruído. Parecia que naquele horário, até os fantasmas estavam dormindo. Mas o que mais incomodava Harry não era a possível aparição de Pirraça, ou muito menos de Filch. Durante aquela caminhada, Harry lutava contra alguns sentimentos estranhos que a proximidade de Gina Weasley estava lhe proporcionando.

Ele já estivera em baixo daquela Capa de Invisibilidade com Rony e Hermione por várias vezes antes, mas em nenhuma delas, Harry estivera tão distraído. Enquanto andava, ele tentava ao máximo não esbarrar em Gina. Aquela Capa estava ficando pequena de mais para duas pessoas. Ou então, ele é que estava crescendo de mais. Ou então, Harry admitiu para si mesmo, ele teria que ignorar esse friozinho na barriga e simplesmente chegar mais perto de Gina. O problema é que ele reconhecia aquele sentimento: já sentira uma vez quando via Cho Chang. Só que ele nunca estivera tão próximo de Cho. Nem nunca teve uma vontade irresistível de passar o braço sobre os ombros dela e ficar se perguntando que xampu que ela usava, porque o cheiro era muito bom...

Engolindo seco, Harry ficou ainda mais nervoso quando se deu conta do que estava pensando. Ele teria que parar com aquilo imediatamente, senão precisaria se manter escondido em baixo da Capa de Invisibilidade, mesmo quando eles chegassem à Sala do Dumbledore. Seu sangue se concentrava em dois lugares, e um deles não dava exatamente para ser explicado sem evitar muito constrangimento.

 - Você sabe a senha? – Gina perguntou quando os dois se aproximaram do gárgula que guardava a porta.

Harry balançou a cabeça em um sinal afirmativo. Por que será que a Gina estava tão nervosa em ter que falar com o Dumbledore?

 - Gina? Tá tudo bem?

A menina abaixou a cabeça como que envergonhada, e Harry começou a entender menos ainda.

 - Ãh... sabe quando eu disse que tinha falado com o Dumbledore sobre esses sonhos? – Gina ergueu a cabeça e a agora, além de envergonhada, ela parecia muito culpada. – Eu falei... só que não exatamente...

 - Gina, eu não tô entendendo. – Harry disse sincero para ela. – Você vai ter que ser mais precisa. Afinal de contas: você falou ou não com o Dumbledore?

 - Eu conversei com ele sobre você ter me salvado e sobre pesadelos. Só que sobre os meus pesadelos. Eu não falei pro Dumbledore que eu tinha os mesmos pesadelos que você...

Gina abaixou a cabeça mais uma vez, e agora Harry entendeu porque ela estava tão nervosa e envergonhada. A vergonha que ela sentia era de si mesma, por não ter contado toda a verdade para ele. Tanto ele, Harry, quanto o Dumbledore.

 - Gina? – Harry ergueu o queixo da amiga com sua mão e sorriu para ela. – Então agora é uma boa hora, né?!

Gina suspirou aliviada e abraçou o Harry. Ela agradeceu a compreensão, mas naquele instante, com a Gina mais próxima do que nunca, Harry não conseguiu produzir uma resposta coerente. Se ele estava tendo dificuldades antes, agora então que podia sentir todo o corpo da amiga próximo ao seu, era como se fosse tortura. Tentando se controlar, Harry respirou fundo, e os dois se afastaram.

 - Sapos de Chocolate.

Gina olhou confusa para o Harry, mas quando a porta da sala abriu, ela entendeu que Harry tinha dito a senha. Ninguém entendia as excentricidades do bruxo que era considerado o mais poderoso da época, e seus alunos não seriam os primeiros.

 - Harry? – Dumbledore perguntou enquanto saía pela porta que dava acesso aos seus aposentos. – Eu pensei mesmo ter ouvido vozes. A que devo a honra da visita? Ainda por cima tão cedo?

Dumbledore passou os olhos do Harry para a Gina e caminhou em direção à sua mesa. Enquanto sentava-se, o Diretor indicou que os dois fizessem o mesmo. Gina estava muito nervosa ainda, e Harry decidiu que seria melhor que ele falasse até que a amiga se sentisse forte o suficiente para explicar o porquê de ela estar ali.

 - A minha cicatriz doeu hoje de novo...

Em pouco tempo, Harry relatou tudo o que Voldemort dissera para Nagini naquela madrugada. Em nenhum instante Dumbledore o interrompeu, e Harry sentia-se muito grato por isso. Ele sabia que o Diretor deveria estar se perguntando por que Gina estava com ele, e mais ainda: por que ela não parecia nem um pouco surpresa com o relato do pesadelo. Mas o fato de que Dumbledore confiava o suficiente nele para não dizer nada, nem desconfiar da presença da amiga ao seu lado, era algo que importava muito para o Harry. Ele se sentia estranhamente orgulhoso pelo fato de que o Dumbledore confiava nele.

Ao fim do relato, o Diretor parecia muito preocupado, e Harry compreendia a sua aflição. Afinal de contas, Arabella Figg era sua amiga, e agora ela corria perigo já que o Voldemort sabia que ela não tinha morrido, assim como o resto do mundo acreditava. A sexta feiticeira da sétima geração estava sendo ameaçada pelo próprio Voldemort, e corria iminente risco de morte.

 - E eu tô aqui, Diretor, – Gina respirou fundo, provavelmente juntando toda a sua coragem. – porque eu também presenciei o que o Harry acabou de dizer.

Dumbledore olhou para a Gina, mas não disse nada. Estava esperando explicação e, com um suspiro, a menina continuou.

 - Já faz um tempo que toda vez que o Harry sonha com Tom Riddle, eu sonho também. Eu não sei por que, mas--

 - A grande aliança! – Dumbledore interrompeu Gina eufórico.

O Diretor levantou-se com rapidez e pegou um livro enorme de sua estante. Gina olhou confusa para Harry, mas tudo que ele pôde fazer foi balançar os ombros. Ele também não estava entendendo nem um pouco aquele comportamento estranho. Os dois permaneceram em silêncio, enquanto Dumbledore fazia anotações freneticamente naquele livro. Virava páginas, lia trechos, e fazia comentários baixinhos e inteligíveis.

 - Ãh... Professor? – Harry perguntou meio incerto, tentando chamar a atenção do Diretor.

Dumbledore parou de escrever quando foi chamado e olhou fixamente para o Harry. Seus olhos brilhavam como há muito tempo não se via. O Diretor desviou seu olhar para a Gina. Balançando a cabeça em um sinal positivo, Dumbledore disse:

 - É sim, querida... Eu acho que é você...

Gina olhou para o Dumbledore, e de volta para o Harry. Agora, além de confusa, a menina parecia ligeiramente assustada. Harry esticou sua mão e entrelaçou os dedos com a amiga que estava sentada ao seu lado. Gina sorriu, agradecendo o gesto de conforto, mas ainda parecia um tanto apreensiva.

 - Diretor... Eu não tô entendendo... – Gina disse em um tom baixo.

 - Claro que você não está, querida. Mas vai! – Dumbledore sorriu e voltou-se para o Harry. – A profecia, Harry! A profecia!

A profecia? Será que Dumbledore queria dizer que a Gina é que era a nova feiticeira? "Leão a salva, cria a grande aliança": Harry lembrou-se de um dos versos da profecia. Agora ele entendia como Dumbledore chegara àquela conclusão. Será que era isso mesmo? Harry olhou pasmo para a Gina, que estava entendendo menos ainda. Ela sabia da profecia, mas não tinha nem idéia que fazia parte dela.

Harry também estava confuso, mas o seu conflito era outro. Por um lado, ele estava aliviado que fosse a Gina a feiticeira: uma amiga ao invés de uma desconhecida. Mas por outro lado, Harry se recusava a aceitar que Gina fosse a sétima da sétima geração. Ele sabia sobre todo o sofrimento que a Sra. Figg passara por ser uma feiticeira, e Harry não queria que sua amiga tivesse que passar por tudo aquilo também. Se não bastasse tudo o que a Gina já sofreu, agora ela teria que enfrentar mais essa?

Dumbledore, que estava também perdido em seus próprios pensamentos, de repente voltou à realidade e olhou para os dois amigos.

 - Tudo vai ser explicado, Sta. Weasley, mas por enquanto, eu tenho que conversar com uma amiga. – Dumbledore olhou para o Harry com o seu usual brilho no olhar. – Vão agora, antes que alguém acorde e dê falta de vocês. A gente conversa ao fim do dia.

Dumbledore levantou-se, e os dois seguiram seu exemplo. Ao chegarem até a porta, o Diretor sorriu, e falou mais uma vez.

 - Você pode ir adiantando algumas coisas, Harry. – Dumbledore voltou-se para a Gina. – Se eu estiver certo, Sta. Weasley, você acaba de trazer novas esperanças para todos aqueles que lutam contra o Voldemort. Eu estou cruzando os dedos...

Com isso, Harry e Gina saíram da sala do Diretor, e assim que a porta foi fechada, Gina perguntou:

 - O que ele quis dizer, Harry? Eu não tô entendendo nada!

Harry sorriu e passou o braço nos ombros da amiga, enquanto cobria os dois mais uma vez com a Capa de Invisibilidade.

 - Calma, Gi... eu vou te contando algumas coisas no caminho, mas fica tranqüila, porque você vai entender tudo melhor quando a gente voltar a conversar com o Dumbledore.

Gina suspirou em rendição, relaxando os ombros em baixo do braço do Harry. Ele ficou muito feliz quando notou a mão da amiga em sua cintura e pensou que, no final das contas, talvez essa Capa não fosse tão desconfortável assim...

O caminho de volta até a Torre da Grifinória foi um tanto barulhento, devido às várias perguntas e repostas. A conversa não passava de cochichos, mas como o Castelo estava deserto, qualquer barulhinho parecia ser mais alto do que na verdade era. Harry não pôde responder tudo o que Gina perguntara. A algumas perguntas não o fez porque não sabia a resposta, e a outras simplesmente porque achava que a Sra. Figg e o Dumbledore saberiam explicar melhor para a amiga. Mas mesmo assim, tudo o que sabia, e achava que Gina compreenderia sem longas explicações, foi respondido e Harry se sentia muito aliviado por isso.

Em pouco tempo estavam de volta ao retrato da Mulher Gorda e, dessa vez, não teve como evitar: teriam que acordá-la. Tiraram a Capa de Invisibilidade que os cobria e acordaram a Mulher Gorda da forma mais gentil possível. Com um enorme bocejo, ela se ajeitou e, ainda com muito sono, perguntou qual era a senha. Ela parecia muito desconfiada, mas estava sonolenta demais para fazer qualquer tipo de inquisição.

 - Corda de coração de dragão. – Harry respondeu, enquanto punha a Capa de Invisibilidade no bolso.

 - Se você está dizendo... – A Mulher Gorda disse junto com mais um bocejo, enquanto o quadro desprendia-se da parede para dar acesso à Sala Comunal.

Harry e Gina mal tinham entrado, quando ouviram passos descendo as escadas que vinham dos dormitórios masculinos. Não daria tempo de se esconder, e Gina olhou para Harry com os olhos arregalados. Com um rápido "Te vejo daqui a pouco!", a menina subiu suas próprias escadas, mas não sem antes que Neville Longbottom pudesse vê-la.

 - Oi, Harry. – Neville cumprimentou, olhando para as costas da Gina que acabava de subir as escadas.

 - Acordou cedo, Neville. Caiu da cama? – Harry perguntou ao amigo, meio incerto do que dizer.

Neville tirou os olhos das escadas e olhou para o Harry. Ele provavelmente deveria estar pensando besteira, e Harry não tinha nem idéia de como dizer para o Neville que não era aquilo que ele estava pensando. Harry lembrou-se de uma conversa que ele ouviu quando o Neville disse ao Simas que a ele, Harry, e a Gina estavam namorando. Se o Neville já pensava isso antes, agora então...

 - Escuta, Neville, eu sei que parece suspeito, mas não é nada disso que você está pensando--

 - Não precisa se explicar. – Neville interrompeu Harry. – Eu sei que vocês estão namorando...

Harry franziu a testa e pensou que essa seria a oportunidade perfeita para descobrir de onde Neville tinha tirado essa idéia.

 - Quem falou isso? Eu e a Gina não estamos namorando...

Neville olhou confuso para o Harry.

 - Mas eu vi uma foto de vocês dois juntos. Tava no chão da sua cama, e você e a Gina estavam deitados olhando pro céu... – Neville coçou a cabeça e continuou. – Eu não olhei muito porque não queria bisbilhotar, mas enquanto eu pus de volta na sua cama, eu vi! Era vocês dois!

Harry riu aliviado e Neville entendeu menos ainda.

 - Não era eu naquela foto! Muito menos a Gina! – Harry riu mais uma vez e explicou. – Aquela foto é do meu pai e da minha mãe, quando eles ainda estudavam aqui...

 - Ah... – Neville disse baixinho, aparentemente envergonhado por ter assumido coisas. – Então vocês não estão namorando?

 - Não... – Harry sorriu. – Esse ano ela ficou muito minha amiga, mas não passa disso... – Neville balançou a cabeça em consentimento, e Harry continuou. – Eu vou subir, que eu tenho que deixar umas coisas no quarto, e vou aproveitar para já pôr o uniforme. – Neville ia dizer algo, mas Harry continuou, interrompendo o menino. – A gente se vê.

Sem nem esperar para ouvir o que Neville tinha para dizer, Harry subiu apressado as escadas para o seu quarto. Não queria ter que ficar respondendo a perguntas sobre o seu relacionamento com Gina Weasley.

Sentando-se em sua cama, Harry pegou a foto que o Neville tinha visto. Com um sorriso, Harry entendeu porque o colega de quarto pensou que fosse ele e a Gina naquela foto. A semelhança entre ele e o seu pai era óbvia e, como o próprio Sirius dissera, Gina lembrava muito a sua mãe. Como na foto, Lílian Evans sorria e cobria o rosto meio tímida, para qualquer um que olhasse de relance e não conhecesse os seus pais, aqueles dois na foto podiam muito bem ser Harry Potter e Gina Weasley. Guardando a foto debaixo do travesseiro, Harry olhou no relógio que horas eram.

 - Mais cedo ou mais tarde ele ia ter que acordar mesmo... – Harry disse para si mesmo sorrindo, e levantando-se de sua cama. – Dessa vez vai ser mais cedo.

Harry aproximou-se da cama do Rony e, sem cerimônia nenhuma, acordou o amigo, esquecendo-se completamente de sutileza. Rony levantou muito sonolento, e os dois se arrumaram para mais um dia de aulas.

Continua no Capítulo Vinte e Um...