Capítulo Trinta e Quatro
TRAIÇÃO
- Eu quero que vocês todos obedeçam às minhas ordens, e de qualquer detalhezinho, mínimo que seja, eu quero ficar sabendo. – Os olhos de Voldemort estavam mais vermelhos do que nunca, e seu ódio era quase palpável. – O Potter, eu sei que está lá. Mas eu quero saber quem é a feiticeira, e eu não quero desculpa por vocês não encontrarem e descobrirem quem ela é. Da mais velha, eu já me livrei. Chegou a hora de eu me livrar da mais nova. – Um sorriso cínico moldou-se no rosto desfigurado de Voldemort, que só podia ser notado pela expressão que seus olhos adquiriram. Mas tão rápido quanto apareceu, o sorriso sumiu, e Voldemort voltou sua atenção mais uma vez para a fila de frente a ele. – Eu estou recrutando vocês, somente pelo fato de vocês estudarem em Hogwarts, e terem acesso mais fácil a essas informações. Eu não quero ter que me decepcionar mais tarde. Porque quando eu me decepciono... digamos que quem vai sofrer são vocês.
Voldemort virou-se e foi até sua mesa, onde sua varinha estava repousada. Com muita leveza, o Lord das Trevas a ergueu, e caminhou mais uma vez em direção às várias pessoas que não se mexiam nem para respirar.
- Recebam agora a minha marca, e façam jus e ela!
Um feixe de luz vermelha saiu da ponta de sua varinha e atingiu um a um, marcando todos eles com a Marca Negra, e deixando todos eles de joelhos, contorcendo-se de dor no chão.
Harry acordou, mas dessa vez sem gritar. Talvez ele estivesse finalmente se acostumando com os horrores que presenciava em seus sonhos e aprendendo a lidar com a dor que sempre os acompanhava. Seguindo sua rotina, Harry sentou-se na sua cama e pegou de cima do seu criado-mudo seus óculos, seu medalhão e sua varinha. Dessa vez, porém, Harry antes de sair do quarto, foi até o seu baú e pegou uma Capa que pudesse lhe proteger do frio que estava fazendo.
Harry desceu as escadas de cabeça baixa e tentando não pensar muito no que acabara de acontecer. Harry não conseguira ver o rosto de nenhuma das pessoas que o Voldemort recrutou, mas pelo que ele ouviu, eram todos alunos de Hogwarts... Chegando à Sala Comunal, Harry aguardou a presença da Gina, mas a amiga não apareceu. Preocupado, Harry foi até a escadaria que o levaria aos dormitórios femininos, e a visão que o encontrou abalou-lhe profundamente.
Gina estava toda encolhida, sentada em um dos degraus e apoiada na parede. Suas mãos cobriam seu rosto, e seu corpo tremia todo, e Harry sentiu um vazio no peito quando notou que ela estava provavelmente chorando.
- Gina? – Harry chamou o nome da amiga com não mais que um sussurro. A visão da amiga naquele estado tinha alterado e muito o seu poder sobre a sua voz.
Gina levantou a cabeça e olhou para o Harry com os olhos cheios d'água e um espanto e medo enormes. Harry sabia que Gina tinha os mesmos pesadelos que ele quando o Voldemort estava envolvido. Mas nunca antes o alvo do Voldemort tinha deixado de ser ele, Harry, para passar a ser a Gina. Harry sentiu um nó em sua garganta quando começou a pensar no que o Voldemort faria se finalmente descobrisse que Gina era a feiticeira. Ele não teve receio nenhum em matar a Sra. Figg exatamente por esse motivo. Quão pior seria com a feiticeira da profecia?
Harry subiu os poucos degraus até onde Gina estava e sentou-se do seu lado, posicionando seu braço em volta dos ombros dela. A amiga recostou a sua cabeça nos ombros dele, e Harry começou a acariciar os cabelos dela com a sua mão.
- Eu não vou deixar ele te pegar, Gina. – Harry beijou o alto da cabeça dela. Se a promessa era para a amiga ou para ele mesmo, Harry ainda tinha suas dúvidas. – De jeito nenhum ele vai chegar perto de você... Ninguém mais vai tirar você de mim. – Essa última frase foi dita tão baixinho, que Harry nem sabia se tinha só pensado, ou realmente dito em voz alta.
Gina enxugou os olhos com a mão e, respirando fundo, ela se endireitou e levantou sua cabeça do ombro de Harry.
- A gente precisa falar pro Dumbledore, Harry. Ele precisa saber que ele tem Comensais da Morte entre os seus alunos.
Harry balançou a cabeça em um sinal positivo e, respirando fundo, ele se levantou, oferecendo sua mão para ajudar Gina a fazer o mesmo. A amiga aceitou a sua mão e, quando estava de pé, pegou Harry de surpresa ao fechar os seus braços em volta da cintura dele, envolvendo-lhe em um abraço.
- Obrigada, Harry.
Harry não sabia bem ao certo por que ela estava o agradecendo, mas não reclamou nem por um instante de ter Gina em seus braços. Harry retribuiu o abraço e, em pouco tempo, os dois estavam saindo da Torre da Grifinória, Gina com o braço em volta da cintura do Harry, e ele com braço posicionado nos ombros dela.
Ao entrarem na Sala do Diretor, eles deram de cara não com o Dumbledore, mas com o Professor Snape. Sem dizer uma palavra, Severo Snape saiu da frente da porta, em um convite silencioso para que os dois entrassem. O Professor de Poções que já era normalmente pálido, dessa vez estava ainda mais, e com olheiras profundas debaixo dos olhos. Sua expressão era grave, e com enorme preocupação nos olhos.
Dumbledore também não estava muito melhor que Snape. Sua idade estava agora evidente em seus olhos cansados e seus ombros caídos. Dumbledore esticou o braço para as cadeiras de frente a sua mesa, oferecendo-lhes que se sentassem. Harry e Gina se sentaram de frente para a mesa, enquanto Snape sentou-se em um sofá mais afastado e posicionou sua mão sobre os seus olhos.
- Vocês conseguiram ver o rosto de algum deles? – Dumbledore perguntou com uma voz falha e rouca.
Harry olhou mais uma vez para o Professor Snape e suspeitou que o motivo de ele estar na Sala do Diretor àquela hora da noite era o mesmo que o dele e da Gina. Gina balançou a cabeça de um lado para o outro, em um sinal negativo, e respondeu ao diretor:
- Não. A gente só sabe que o Voldemort recrutou alunos daqui para que eles descobrissem quem é a feiticeira.
- Então... –Dumbledore continuou com uma voz cansada. – Os nossos suspeitos são todos aqueles que foram para as suas casas durante esse Natal. O que nos resulta em quase todos os alunos... – Dumbledore suspirou tristemente. – Vocês gostariam de dizer mais alguma coisa? – Dumbledore perguntou, voltando sua atenção mais uma vez para Harry e Gina.
- Não, Diretor. – Gina respondeu de cabeça baixa, e Harry consentiu.
- Então, por favor, voltem para a Torre da Grifinória, que eu tenho ainda alguns tópicos a discutir com Severo...
Harry e Gina entreolharam-se, e em comum acordo, levantaram-se sem dizer nada. Antes que chegassem à porta, porém, Dumbledore os interrompeu dizendo:
- O que aconteceu nessa noite não sai dessa sala, entenderam? Ninguém pode saber que a gente conhece o plano do Voldemort. Eu quero que esses novos Comensais pensem que está tudo na mesma, e que eles vão poder agir numa boa. Se eles desconfiarem de qualquer coisa, passarão a ter mais cautela, e o nosso trabalho ficará mais difícil. Fui claro?
Harry e Gina balançaram suas cabeças em sinais positivos, e murmuraram : "Sim, Diretor.". Ao saírem de sua sala, nenhum dos dois disse mais nada, até chegarem ao quadro da Mulher Gorda. Havia muita coisa se passando pela cabeça de Harry, e ele suspeitava que a linha de pensamento da Gina era mais ou menos a mesma. Como é que ele reagiria quando os alunos que saíram para as festas de final de ano voltassem? Qualquer um deles poderia ser um Comensal da Morte a mando do Voldemort, para descobrir e entregar a identidade de Gina. Talvez eles pudessem diminuir essa lista, excluindo aqueles que são de famílias trouxas. Harry acreditava que o Voldemort não se "rebaixaria" a esse ponto. Se nem o Snape sabia as identidades dos recrutados, isso queria dizer que o Voldemort estava agindo com muita cautela e segredo. Provavelmente nenhum Comensal, a não ser os pais dos novos recrutas, sabia quem eles eram. Talvez por isso, Snape estivesse às escuras também. Isso, e o fato de que Voldemort já não confiava mais em alguns de seus Comensais da Morte como costumava. Através de várias reuniões da Ordem da Fênix, Harry ficou sabendo que o Snape estava tendo cada vez mais dificuldades de conseguir informações. E o Dumbledore já disse que, se for necessário, para a proteção do Snape, talvez o Professor de Poções não voltasse mais às reuniões de Comensais da Morte.
- Senha? – A Mulher Gorda perguntou enquanto bocejava.
- Harpias. – Harry respondeu, trazendo de volta a sua atenção para o que estava fazendo.
Gina entrou primeiro na Sala Comunal, mas não foi direto para o seu quarto. Ela deu alguns passos e parou, olhando para o chão.
- Gina? – Harry disse, aproximando-se dela e posicionando a sua mão no ombro da amiga.
- Era verdade o que você disse há pouco? – Gina perguntou baixinho, sem desviar a sua atenção do chão.
- Verdade o quê? – Harry perguntou meio incerto e curioso com o desconcerto de Gina.
- Sobre você me proteger? Não deixar ninguém me tirar de você?
Harry respirou fundo e tentou controlar o seu coração disparado. Com um nó na garganta, ele percebeu que agora era o momento. Ele não sabia bem ao certo por quê, mas sabia que o que fosse dito naquele instante marcaria para sempre. Gina levantou o olhar do chão e voltou a sua atenção para o Harry devido ao silêncio que caiu entre os dois. Harry notou que ela estava mordendo o lábio inferior, e essa era a maneira dela de demonstrar que estava nervosa. Ele também estava muito nervoso, mas decidiu que o melhor seria ser sincero. Mesmo porque, ele não conseguiria mentir pra Gina nem se quisesse.
- Cada palavra. – Harry começou com o tom de voz trêmulo. – Tudo o que eu disse é verdade, e eu não retiro nem uma palavra.
Harry não sabia ao certo de onde vinha tanta coragem, porque a vontade de sair correndo e se esconder era enorme. Mas ainda assim, ele continuou parado, em frente à Gina, e olhando fixo nos olhos dela. Gina por sua vez, estava com dificuldade de dizer o que queria. Ela fazia menção de dizer algo várias vezes, mas em todas elas, ela acabava desistindo, e nenhum som saía de sua boca.
- Eu tô com tanto medo quanto você, Gina. – Harry disse, usando de toda a sua coragem que possuía. – Mas o meu maior medo não é pelos outros... Meu maior medo é que o Voldemort apareça e tente tirar você da minha vida mais uma vez. Se depender de mim, a Câmara Secreta não vai acontecer de novo. De jeito nenhum.
Harry acabou o que tinha de dizer com os seus olhos úmidos, e quando olhou bem para a Gina, reparou que algumas lágrimas silenciosas desciam pelo seu rosto. Gina deu um passo a frente e o abraçou com toda a força que podia. A sua voz estava abafada pela roupa do Harry, mas ele podia ouvir bem o que ela dizia.
- Eu quis isso tantas vezes, Harry... e vai doer tanto se eu abrir os olhos e descobrir que é só mais um sonho...
Harry tirou um de seus braços que estava envolvendo Gina em um abraço e o trouxe para perto do rosto da amiga. Com o maior dos cuidados, ele deu pequeno passo para trás e levantou o queixo da Gina, fazendo com que ela olhasse diretamente em seus olhos. Mais nervoso do que nunca, mas com a maior certeza que já sentiu na vida, Harry aproximou-se lentamente dela, e seus lábios se encontraram em um beijo que selaria a sua vida para sempre. A vida de Harry sempre foi mais difícil do que a dos outros garotos da sua idade. E depois de tudo pelo que ele já passou, seus quinze anos tinham a maturidade de uns trinta. Harry sabia que, não importa o que acontecesse com ele dali para frente, seu coração já havia escolhido o que queria. Ele não tinha a pretensão de pensar que tudo já estava certo, e que sua vida já estava resolvida – afinal de contas, nada é certo durante uma guerra. Mas ele sabia muito bem que os laços que uniam ele com a Gina eram muito mais fortes do que ele jamais poderia sentir, e que mais ninguém o completaria com tanta perfeição quanto ela.
Harry afastou seus lábios dos da Gina e abriu os olhos para ver a reação dela. Gina ainda estava de olhos fechados, e lentamente levou sua mão trêmula aos lábios. Um sorriso se fez em sua expressão, e Harry respirou aliviado, sentindo o nervosismo deixá-lo como se nunca estivesse estado lá. Gina abriu os olhos, e uma única e última lágrima escorreu de seu olho direito. O próprio Harry estava no meio de um turbilhão de emoções, das quais muitas eram novas, mas maravilhosas.
- Não me deixa sozinha, Harry. – Gina disse com um sussurro. – Não tem ninguém no meu quarto, e eu não quero ficar lá sozinha...
Harry sorriu e pegou a mão dela na sua. Ainda meio abalado, ele se direcionou ao sofá perto da lareira e tirou a sua capa de frio. Gina olhou incerta para ele, e ele sorriu para assegurar-lhe de que estava tudo bem.
- Deita...
Gina olhou para o Harry com a testa franzida, sem entender muito bem a sugestão que ele tinha feito. Mas com a maior das confianças, ela acabou deitando no sofá, como Harry havia pedido, e apoiou a cabeça em uma das almofadas que estava perto do braço do sofá. Ela virou de lado e olhou para o Harry, esperando o que ele faria. Harry ajoelhou-se no chão, de frente para ela, e jogou sua capa por cima dela.
- Eu fico com você até você dormir... – Harry sorriu e beijou o alto de sua cabeça.
Gina começou a protestar, mas Harry simplesmente sentou-se no chão e começou a acariciar o cabelo dela, até que ela se acalmasse, e o sono finalmente tomasse conta dela. Por pouco Harry não ficou na Sala Comunal também, quando pensou em todos os degraus que teria que subir, e o quanto estava cansado. Mas reunindo o resto de suas forças, Harry olhou uma última vez para Gina, que parecia sorrir enquanto dormia, e levantou-se sussurrando: "Bons sonhos, Gina.". Em pouco tempo, Harry também estava dormindo, em sua própria cama, e tendo ótimos sonhos como ele desejara à Gina. Sonhos que envolviam um período em que não havia mais guerra, e que seu coração conseguia em paz o que queria com tanta certeza...
Continua no Capítulo Trinta e Cinco...
