Capítulo Trinta e Cinco
FLAGRA
- Quanto tempo você acha que demora até ele descobrir? – Gina perguntou ao Harry enquanto os dois estavam sentados em frente à lareira na Sala Comunal.
Aquele era mais um dia de neve, e os poucos alunos que haviam ficado em Hogwarts estavam aproveitando o último dia de feriado para fazerem mais uma guerra de bola de neve. No meio da bagunça, Harry e Gina isolaram-se e voltaram para a Sala Comunal. Os dois não tiveram muito tempo sozinhos durante os últimos dias, já que Rony estava sempre com eles. A ausência da Hermione fez Harry sentir exatamente como o Rony e a Hermione deviam se sentir quando ele, Harry, ficava tempo demais com o casal. Mas a diferença é que Harry sabia que o Rony e a Hermione eram um casal, e os dois não encontravam problema nenhum em caminhar de mãos dadas, trocar abraços, ou até uns beijinhos em público de vez em quando. Mas por algum motivo, Gina estava com um pé atrás sobre deixar o seu irmão saber sobre o que acontecia entre o Harry e ela. Harry não entendia muito bem aquela decisão, levando em consideração que o que ele mais queria fazer era gritar para o mundo que ele finalmente encontrara um pouquinho de felicidade no meio daquela loucura toda que a Guerra proporcionava. Quando a razão era ouvida, Harry concordava com a sensatez do silêncio sobre o relacionamento dos dois. Ainda mais agora que haveria espiões entre os alunos de Hogwarts. O conhecimento público que Harry Potter estaria namorando Gina Weasley traria atenção para ela, e talvez até a desconfiança com isso. Se fosse segredo, talvez a Gina ficasse mais segura, pelo menos até que o risco de ser descoberta acabasse.
- Não sei... a Hermione volta hoje, então talvez a gente não precise mais ter tanto cuidado. Tenho certeza que a gente vai ganhar mais tempo com a chegada da Mione também... – Gina disse com um sorriso maroto e um beijo rápido nos lábios de Harry.
- Mas por que você não quer que ele saiba, Gina? Eu tenho certeza que mesmo se ele ficasse bravo, depois de um tempo ele aceitaria numa boa! – Harry perguntou, tentando não deixar se distrair pela proximidade de Gina, e pelas possibilidades que "mais tempo" lhes proporcionariam.
- O Rony tem muito o que crescer quando o assunto é um dos irmãos dele, Harry... Ele é muito competitivo, e vive sempre tentando ser melhor que a gente. A única coisa que ele tem que mais nenhum dos outros irmãos têm, é a sua amizade. O famoso Harry Potter é o melhor amigo dele, e isso ele não precisa dividir com os irmãos. – Gina respirou fundo e olhou fixo nos olhos de Harry. – Ele não tá pronto ainda pra dividir você, Harry. Ele mal consegue lidar com o fato da gente ser amigo! Mas isso ele tá aceitando, porque é quase uma "obrigação" nossa sermos amigos. Como se a profecia fosse o que unisse a gente...
- Mas não é isso! – Harry respondeu indignado. – Aliás, tudo o que eu mais queria é que essa profecia nem existisse! Eu fico com um nó na garganta só de pensar nas coisas que o Voldemort deve estar tramando pra tirar você de mim... Se essa profecia não existisse, você não estaria correndo perigo agora...
- Talvez... mas você tem que admitir que se não fosse por essa profecia, a gente não estaria junto hoje... acho que nem amigo, a gente seria... – Gina abaixou a cabeça, e seu tom de voz era fraco.
- Como é que você pode dizer isso, Gina? – Harry perguntou com a voz firme e baixa. – Eu nunca senti o que eu sinto por você antes por ninguém. E não é uma porcaria de um papel que me fez sentir assim... Não é só porque alguém resolveu fazer umas rimas pra prever o futuro que eu tô aqui, na tua frente, tentando te convencer que o que eu sinto é de verdade! Eu tô cansado do mundo achar que me conhece, e eu ter que fazer o que é esperado de mim! Mas até isso eu agüento... agora você duvidar de mim... achar que eu não tenho a capacidade de tomar minhas próprias decisões e decidir o que eu quero... isso dói, Gina. Muito!
Harry estava muito sério e realmente magoado. O que ele tinha com a Gina era algo do qual ele se orgulhava. Algo que ele sabia, sentia que era verdadeiro. Ele não tinha dúvidas de que, por mais novo que fossem aqueles sentimentos, eles eram verdadeiros. E doía tê-los tido posto em dúvida. Foi pensando nisso, que uma dúvida ainda maior, e dez vezes mais dolorida, passou pela cabeça de Harry.
- É assim que você se sente, Gina? É por causa da profecia que você tá comigo? – Agora o tom de voz do Harry era muito diferente. Toda a seriedade tinha dado lugar à dúvida, e a sua confiança passou a ser receio. Só a dor que continuava estampada em seus olhos.
- O que você acha, Harry? – Gina perguntou com a voz rouca. – Eu passei sabe lá quanto tempo atrás de você, tentando chamar a sua atenção... Desde os meus dez anos, eu já sabia o que queria. Dez anos. Você não sabe o quanto doía ver você pra cima e pra baixo com meu irmão, e saber que pra você, eu não passava de uma garotinha boba pra quem você tinha que dizer "bom dia" e "boa noite" quando você passava as férias em casa.
Gina deu uma pausa e respirou fundo. Harry fez menção de dizer algo, mas Gina o impediu com um movimento de sua mão e continuou a falar:
- Harry, a minha infância ficou pra trás no dia em que eu descobri que estava sendo traída pelo único amigo que eu tinha aos onze anos de idade. Desde lá, a única certeza que eu tinha na minha vida era que você, por algum motivo, era, pra mim, muito mais do que o Menino-Que-Sobreviveu. E não dá nem pra dizer que foi porque você me salvou naquele dia... Alguma coisa dentro mim gritou que você era diferente, desde a primeira vez que eu te vi, e quando eu nem podia imaginar que algum dia você salvaria a minha vida. Eu vivo com isso há muito tempo, Harry. Muito antes de saber que eu sou parte de uma profecia...
Harry olhou nos olhos da Gina e notou que eles estavam cheios d'água, mas que ela lutava contra as lágrimas. Como o seu coração apertava cada vez que ele a via sofrer... Era impossível de entender o porquê, mas Harry sabia que não queria de jeito nenhum que o rosto dela fosse marcado por qualquer outra coisa que não fosse um sorriso. Harry puxou Gina para o seu abraço e se certificou de que ela estava mesmo ali, e que ninguém o acordaria daqueles sentimentos.
- Não vamos mais duvidar um do outro... tá bom? – Harry perguntou com um sussurro, e sentiu Gina balançar a sua cabeça em um sinal positivo.
Harry abaixou ligeiramente a cabeça e beijou a têmpora da Gina. Da têmpora, ele passou para a bochecha, pescoço e, em pouco tempo, seus lábios estavam nos de Gina. Ele poderia esquecer de qualquer coisa estando naquele abraço, envolvido em uma tarefa da qual ele tinha certeza de que nunca se cansaria. Mas mesmo distante como ambas suas mentes estavam, os dois foram trazidos de volta à realidade quando algo como um livro foi deixado cair no chão e fez um barulho enorme na sala deserta. Gina e Harry se afastaram um do outro, corados até a raiz dos cabelos.
- Ãh... desculpe-me pela interrupção... É que a jovem Natália McDonald aqui havia me dito que você estava aqui, Harry... – Remo Lupin olhou para a garotinha do segundo ano, que estava pegando seu livro do chão, quase tão envergonhada quanto o Harry e a Gina. – Mas estou certo de que o que eu tinha pra falar pode ser deixado pra outra hora...
Harry ousou olhar para a cara do professor somente uma vez. Ele não achava possível sentir-se tão envergonhado quanto estava naquele momento. E o que fez aumentar ainda mais a sua vergonha foi o fato de que Remo Lupin – apesar de sem graça – estava com um sorriso no rosto, e um brilho maroto nos olhos que o Harry sabia que estaria igualzinho nos olhos de seu padrinho mais tarde.
A menina que havia trazido o Professor Lupin até a Sala Comunal, depois de pegar seu livro, saiu o mais rápido que podia e subiu as escadas para os dormitórios femininos. Não falou nada para ninguém, e Harry sabia que a pobrezinha devia estar extremamente sem graça.
- Bom, eu vou indo então... – Remo Lupin começou a direcionar-se à saída, mas Harry voltou a si e tentou controlar o máximo que pôde a sua vergonha.
- Não! Espera... – Lupin virou-se mais uma vez para o casal, dessa vez com o rosto e a expressão controlados de sempre. – O que você veio dizer?
Harry respirou fundo e finalmente se controlou o suficiente para olhar nos olhos do professor.
- Na verdade quem queria falar com você é um cachorro velho que eu tenho lá na minha sala--
- Eu já vou até lá. – Harry interrompeu o professor, e Lupin sorriu.
- Ok... A gente te espera.
E com isso, Remo Lupin deixou a Sala Comunal da Grifinória, e Harry e Gina respiraram aliviados. Harry voltou sua atenção para a Gina e notou que ela ainda estava um tanto vermelha. Parando para pensar melhor na cena, Harry notou o ridículo da situação. Ele e a Gina tão vermelhos como tomates, com culpa estampada no rosto, e o professor Lupin provavelmente segurando a risada. Porque se fosse o Harry, ele riria com certeza.
- Você tá achando isso engraçado? – Gina perguntou quando Harry não pôde conter uma leve risada. O tom de voz dela era bravo, mas um sorriso no seu rosto entregava que ela não estava tão brava assim. – É... pra você não tem problema. Ele é teu amigo... Agora, eu não sei nem como eu vou olhar pra cara dele na próxima aula de D.C.A.T.. Vai ser absolutamente humilhante!
Gina começou a rir, e Harry fez o mesmo. Depois do susto, o alívio ao ver que não era nenhum irmão ciumento ou briguento fez com que Harry pudesse rir da situação. E ele era muito grato por isso. Ele tinha certeza de que ainda ouviria bastante sobre isso, e que o seu padrinho em especial acharia a situação esplêndida e digna de assunto por semanas! Mas como ele não tinha nem idéia de como abordar o assunto para o seu padrinho, talvez esse flagrante do professor Lupin não tenha sido de todo mal...
- É melhor você ir logo ver o seu padrinho... – Gina sugeriu, ainda com um sorriso no rosto. – Quanto mais tempo você demorar, maior vai ser a "história" do professor Lupin, e maior vai ser a tiração de sarro...
- Você tá certa. – Harry concordou e a beijou rapidamente antes de se levantar. – A gente se vê mais tarde...
Com isso, Harry pegou o seu casaco e saiu correndo da Sala Comunal. Literalmente. Ele queria alcançar o professor Lupin antes que ele chegasse à sua sala, e contasse o que aconteceu. Ele sabia que seria difícil, mas não custava tentar.
O fato de ser feriado, e não ter nenhum professor no corredor, foi uma bênção. Porque Harry com certeza tomaria uma bronca e uma suspensão se fosse pego correndo. Sem se importar com muita coisa, Harry abriu a porta da sala do professor Lupin e, só depois que já tinha adentrado, foi que ele lembrou que esqueceu de bater.
- ... e eu perdi essa? – Harry reconheceu a voz do padrinho. – A culpa é tua, – Sirius bateu de leve no ombro de Lupin – que não quer sair por aí com um cachorro! Eu poderi--
Sirius tirou os olhos do amigo e viu que Harry tinha entrado. Lupin, que estava de costas para o Harry, virou-se também e estava com um sorriso que ia de orelha a orelha.
- Olá, Harry! – Remo exclamou com a voz mais calma e agradável possível.
- Duas marias-fofoqueiras, é isso que vocês são! – Harry disse com a voz indignada, e ninguém agüentou. Caiu todo mundo na risada, inclusive o próprio Harry.
- Quer dizer então que o Aluado aqui te pegou no flagra? – Sirius perguntou com o melhor dos humores. – Ah... Mas se fosse comigo, eu não ia te deixar tão fácil assim!
- Isso é porque o professor Lupin conhece uma coisinha chamada respeito. – Harry disse sorrindo também, e sem mágoa nenhuma. – Já ouviu falar?
- Mas você é meu afilhado... – Sirius respondeu como se fosse a resposta mais óbvia existente. – É minha obrigação tirar sarro e te encher o saco!
- Tá, tá... – Harry disse não muito convencido. – Mas por que você me chamou aqui?
- Não, não! – Sirius continuava sorrindo. – Nem pense que você vai desconversar tão fácil assim! Pode tratar de sentar, se acomodar, porque a gente tem muito o que conversar, meu garoto!
- Muito o que conversar? – Harry perguntou desconfiado.
- Pode apostar que sim. – Sirius respondeu um pouco mais sério. – Eu ainda vou me vingar do Tiago um dia por causa disso, – Sirius sorriu afetuosamente. – mas como ele não tá aqui, a obrigação de te falar sobre algumas... coisinhas... é minha! Então pode sentar!
Harry olhou para o professor Lupin como que pedindo socorro, e ele sorriu se desculpando.
- Nem olha pra mim, Harry. Eu sei que é difícil de acreditar, mas de vez em quando o Sirius tá certo. E bem, dessa vez é... sério. – Remo sorriu e sentou-se também.
Harry olhou de um amigo do seu pai para o outro e suspirou em derrota. Não havia como fugir, e ele sabia exatamente quais eram essas "coisinhas" das quais o seu padrinho queria falar... Sorte tinha a Gina que não viera com ele...
Continua no Capítulo Trinta e Seis...
