Capítulo Trinta e Oito
PATRONUS
"E assim termina mais uma partida do Campeonato de Quadribol de Hogwarts. Eu sou Lino Jordan, e vocês viram: Sonserina 300, Lufa-Lufa 40."
- Dá pra acreditar nisso? – Rony perguntou enquanto ele, Hermione, Harry e Gina voltavam para o castelo.
O frio havia diminuído um pouco, mas ainda assim o vento estava bem gelado. Apesar disso, o sol brilhava, e Harry sentiu-se aliviado de finalmente poder ficar fora do castelo por algumas horas sem congelar.
- Faz parte, Rony... – Gina respondeu ao irmão. – Quando a Angelina decidiu usar a estratégia de marcar muitos pontos, ela já sabia que a Sonserina iria sacar tudo e tentar desfazer o nosso jogo...
- É, mas – Rony continuou. – acontece que agora eles estão só 30 pontos atrás de vocês!
- Mas eles têm um jogo a mais que a gente... – Harry deu com os ombros.
- É, e além do que, – Gina acrescentou. – Eles não fizeram nada de ilegal.
- E você chama mandar a pobre Ana Abbot pro hospital de quê? – Hermione perguntou escandalizada. – Todos os balaços do jogo iam atrás dela... E aquele Draco filho da... – Hermione ficou tão obviamente nervosa, que chegou até a ser engraçado.
- Essa é a minha garota! – Rony disse, enquanto punha o braço em volta dos ombros de Hermione e a chacoalhava de leve. – Fanática por quadribol... Não fala de outra coisa! Eu tenho que insistir pra ela deixar o "Quadribol Através dos Séculos" de lado e ler um pouquinho de "Hogwarts: Uma História"! Todo mundo tem que ler "Hogwarts: Uma História". É um clássico!
- Não enche, Rony! – Hermione deu um tapa de brincadeira no ombro do Rony, e ele fez a maior encenação, como se tivesse doído.
- Abusa de mim, vai! – Rony disse com uma voz fingida de ofendido. – Me bate, me cospe, me joga na parede e me chama de lagartixa...
- Lagartixa? – Harry perguntou confuso, e quando viu Hermione corar, abriu um sorriso que ia de orelha a orelha.
Harry e Gina riram dos dois. Provavelmente "lagartixa" era uma piada que só eles mesmos iriam entender, mas era sempre tão bom ver o Rony e a Hermione juntos... Eles viviam brigando, mas era tão óbvia a afeição que um tinha pelo outro. Para ser sincero, Harry acreditava que eles até gostavam de brigar tanto. Um era mais teimoso que o outro, e nenhum dos dois dava o braço a torcer. Além do que, Harry acreditava que eles se divertiam ainda mais quando faziam as pazes.
- Tá! Mudando de assunto, – Hermione interferiu, tentando vencer o vermelho que tingia as suas bochechas. – Harry, você não tinha que ir falar com o Professor Lupin depois do jogo?
- Ok, Hermione... Eu já entendi! – Harry disse, ainda com um sorriso enorme estampado no rosto. – Você vai me mandar embora, arranjar uma desculpa e fazer o mesmo com a Gina, e depois tirar satisfações com a sua lagartixa... Tudo bem, eu sei quando eu não sou querido! – Harry deu uma piscadinha para a Gina, e os dois se acabaram em risadas quando a Hermione tentou encontrar palavras para contradizer Harry, mas não conseguiu achá-las. – Eu tenho mesmo que ir ver o Professor Lupin e aquele cachorro velho...
Harry se separou dos amigos de raro bom humor. Era difícil ultimamente encontrar momentos em que se pudesse esquecer de todas as preocupações e deixar de lado tudo o que fizesse lembrar a guerra. Mas eles ainda conseguiam fazê-lo. Até quando ele estava em circunstâncias mais íntimas com a Gina, a maldita sombra do Voldemort ainda exercia influência. Não que eles deixassem de fazer qualquer coisa por causa disso. Pelo contrário! Os últimos encontros que Harry teve com a Gina foram "apimentados" com uma paixão que estivera latente há anos. Era como se o desespero, e o medo de que fosse a última vez em que eles se veriam os fizessem sentir coisas jamais imagináveis por nenhum dos dois. E quando Harry dava por si, ele estava até ligeiramente assustado com a profundidade de todos aqueles sentimentos. E até um pouco culpado. Ele bem que tentava afastar pensamentos que envolviam uma certa ruivinha de sua cabeça durante o dia e concentrar-se em coisas mais urgentes. Mas parece que o critério de prioridades do seu corpo e do seu coração punham Gina como o item mais urgente da lista, e ele acabava por imaginar coisas que o deixava corado só de pensar que ele era capaz de chegar àquilo. Está aí um assunto do qual Harry nunca mencionaria com o Rony. O fato dos dois dormirem em um quarto cheio de adolescentes de 15 anos, e todos homens, faziam-nos ouvir certos tipos de comentários do qual Rony sempre corava até as pontas das orelhas e evitava o nome "Hermione" para o Harry até o final do dia. Se Rony sentia-se mal de falar para ele da Hermione, que era só a sua amiga, imagina o quão pior seria se o Harry falasse da Gina para ele, que era irmã dele. Não! Definitivamente, comentários do tipo "eu queria que fulana polisse a minha varinha" eram proibidos entre o Rony e o Harry. Que esses comentários continuassem com o Dino e o Simas...
Harry entrou na sala de Defesa Contra as Artes das Trevas como tem o feito já há algum tempo: sem bater. E quando se aproximou da porta no fundo da sala onde teria acesso à saleta na qual Harry, Remo e Sirius conversavam para que não fossem ouvidos, ele percebeu que a porta estava ligeiramente entreaberta, e que ele podia ouvir os sussurros de uma conversa que passavam pela fresta da porta. Normalmente ele não pararia para ouvir a conversa, mas quando ele ouviu o seu nome, a curiosidade venceu a boa educação, e ele acabou tendo o maior cuidado possível para não ser percebido e ouvir a conversa.
- É como se o passado tivesse voltado pra me assombrar... – Harry reconheceu a voz de Sirius, que estava carregada de cansaço. – A primeira vez que eu vi os dois juntos, eu quase pus a pobre menina pra correr por causa da minha reação. Era como se eu tivesse vendo o Pontas e a Lílian...
- Eu falei pra você que uma das minhas alunas era assustadoramente parecida com a Lílian... – Remo disse com a voz igualmente triste.
- É... e você não tava brincando! – Sirius redargüiu.
- E agora eles estão juntos... – Remo continuou. – Eu sei exatamente como você se sentiu quando os viu naquela caverna. Eu me senti igual quando os vi na Sala Comunal.
Sirius riu de leve, e Harry compreendeu de quem eles estavam falando. Harry tirou seu medalhão de debaixo de suas vestes e o abriu. As usuais imagens de sua mãe e seu pai, um de cada lado do medalhão, encontraram-lhe com sorrisos nos rostos. Harry não via tanta semelhança entre seus pais e ele e a Gina, mas também, Harry não conviveu com eles. E apesar de todos dizerem que ele é a cara do pai dele, sempre que Harry olha suas fotografias, ele não conseguia sentir ser igual ao seu pai. Talvez seja uma semelhança menos superficial, e mais no jeito de ser. Se assim o for, ele não teria como discutir com Sirius e Remo, levando em consideração que ele não tem o menor conhecimento dos modos de agir de seus pais.
Harry voltou seu medalhão para debaixo de suas vestes e, respirando fundo, ele voltou ao presente. Bateu na porta da saleta para chamar a atenção dos dois e forçou um sorriso para fingir que não havia ouvido nada. Remo foi até a porta e, ao certificar-se de que era o Harry quem batia, ele o convidou para entrar, trancando a porta antes de voltar sua atenção para os outros dois. Coisa que ele não deveria ter esquecido antes, Harry notou com um leve sorriso.
- Senta, Harry. – Sirius ofereceu enquanto Remo fazia o mesmo.
- O que foi dessa vez? – Harry perguntou, usando de cautela.
Sirius e Remo entreolharam-se, até que Sirius voltou sua atenção para o Harry.
- E eu preciso de algum motivo em especial pra querer ver o meu afilhado? – Sirius perguntou com o tom de voz fingindo mágoa e com um sorriso que não alcançavam seus olhos.
- Não foi isso que eu quis dizer. – Harry respondeu sério. Ele sabia que Sirius estava brincando, mas Harry tinha lá as suas dúvidas se Sirius sabia que estava brincando. – É alguma coisa da Ordem?
- Na verdade, – Remo respondeu por Sirius. – tem mais a ver com você... Talvez um pouco com a Gina, mas mais com você.
- Que tem a Gina? – Harry perguntou, olhando de um adulto para o outro.
- Harry, – Sirius foi quem chamou a atenção. – o Aluado acabou de falar que tem a ver com você, e a sua preocupação é a Gina? Tá vendo Remo? – Sirius perguntou, voltando sua atenção para o amigo. – É por isso que eu sou solteiro. E vou ser pro resto da vida! Nenhuma mulher vai me deixar no estado em que o pobre Harry se encontra. E tão novinho...
Dessa vez, todos estavam certos de que Sirius estava troçando. Seu sorriso era genuíno, e apenas Remo mostrava algum traço de preocupação nos olhos.
- Você fala isso agora... – Remo acrescentou sorrindo. – Mas fui eu quem teve que agüentar inúmeras lamentações suas no passado.
- Bom, mas a gente não tá aqui pra falar dos meus fracassos amorosos... – Sirius interrompeu com um olhar maroto. – Eu não tenho culpa se as mulheres me amam... – Remo e Harry viraram os olhos em exasperação, mas estavam de bom humor. – A gente tá aqui pra falar de algumas das conclusões às quais você chegou desse seu último... pesadelo.
Harry balançou a cabeça em um sinal positivo, ficando agora mais sério. Ele relatara ontem mesmo o que ocorrera ao Dumbledore – Harry não achou necessário correr o risco de acordar o velhinho para contar algo que não tenha sido tão significativo. Pelo menos não para a Ordem. Para Harry, as conclusões às quais ele chegara eram extremamente importantes, e até um pouco assustadoras.
- E o que tem elas? – Harry perguntou, olhando do Sirius para o Remo, e de volta.
- Eu quero dizer que eu acho que você tá certo. – Sirius olhou longamente para o Harry. – Mas quero perguntar se você realmente compreende o que isso quer dizer.
Harry retribui o olhar de Sirius e começou a relembrar a madrugada anterior quando ele, conversando com a Gina, permitiu-se pensar em tudo aquilo que já ouviu de Voldemort. Não havia como negar que se ele não estava assustado antes, agora ele estava – e muito. Era como se ele finalmente tivesse deixado de lado tudo o que ele especulava sobre o que estaria acontecendo, para finalmente abrir os olhos e ver o que está acontecendo. De repente, muitas das ações e ditos do Voldemort passaram a ser olhados por uma perspectiva completamente diferente. Harry, pensando em tudo isso, deixou de responder ao seu padrinho, que com um suspiro disse:
- Harry... eu entendo que deve ser difícil pra você ao pensar que a Gina já é suspeita há algum tempo. Mas eu quero saber se você entende o quanto isso é perigoso pros outros. Pro resto da população.
- E o que me importa os outros? – Harry perguntou, de repente sentindo muita raiva. – Quando que alguém lá fora fez algo por mim? Principalmente algum dos incompetentes do Ministério! Eu quero que eles se danem!
- Harry... – Remo suspirou tristemente. – Você não quer dizer isso...
- E quem disse que não? – Harry perguntou, desafiando Remo a encontrar uma resposta. – Eu tô cansado dessa palhaçada toda! A gente aqui lutando, morrendo de preocupação, rezando pra não aparecerem mais Marcas Negras por aí, enquanto o Ministro tá lá... na dele, achando que tudo vai muito bem e dizendo que o Dumbledore é um lunático, enquanto que eu sou um mentiroso! O Cedrico morreu na noite da Terceira Tarefa, e ele simplesmente ignorou o fato. Dizendo que eu tava inventando história e que tava muito abalado... – Harry estava agora a um ponto de gritar, mas controlava o volume de sua voz com tremendo esforço. – Pouco me importa se vocês dizem que ele tá com medo. Eu tenho lá minhas suspeitas se ele tá do nosso lado. A gente passou o ano passado inteiro achando que tinha um auror dando aula pra gente, enquanto na verdade a gente tinha um Comensal da Morte! Quem me garante que esse Ministro também não seja suspeito?
- Calma, Harry! – Sirius repreendeu com a voz tão firme quanto a do seu afilhado. – Eu, mais do que ninguém, tenho motivos pra acreditar que o Ministro é um idiota e covarde. Mas você tem que tomar cuidado com o que você fala, e pra quem você fala. Acusar alguém de ser um Comensal da Morte é algo gravíssimo! Ainda mais se esse alguém é o Ministro, e você, querendo ou não, é o famoso Harry Potter. Eu sei que você não gosta, mas você é uma pessoa pública. E apesar daquela Rita Skeeter ter sumido, ainda tem repórteres de baixo calão pra dar e vender por aí...
Harry acalmou-se um pouco e tentou ver a razão nas palavras de seu padrinho. Harry bem sabia que tudo o que Sirius dissera fazia sentido, mas ele continuava com raiva de tanta gente, que ele nem sabia se conseguiria engolir e aceitar calado mais uma vez.
- Harry, eu te amo como se você fosse meu próprio filho... – Tanto Harry quanto Sirius estavam com nós na garganta com aquele comentário. – E é até por isso que eu quero que você tome muito cuidado. – Sirius olhou sério para o Harry por um bom tempo. – Se acontecer alguma coisa com você, Harry, não vai haver como eu te proteger. Quem vai dar crédito pro assassino convicto e fugitivo que eu sou?
A voz de Sirius estava falha, e seus olhos extremamente angustiados. Harry teve a nítida impressão que seu padrinho estava quase perdendo o controle de si mesmo e de suas emoções.
- Harry, não tem dementador que me impediria de fazer o que fosse pra te manter seguro. Eu falhei com o seu pai, mas com você eu não vou... O passado não vai se repetir!
Harry abaixou a cabeça sem ter o que dizer. A verdade é que o nó na sua garganta era tão grande, que ele temia nem conseguir dizer nada. Como ele poderia redargüir ao seu padrinho, quando o mesmo havia usado tais argumentos? Harry sabia que Sirius Black se culpava, e se culparia até o último dos seus dias, pela morte de Tiago e Lílian Potter. Fora inclusive um das primeiras coisas que Sirius havia lhe dito. Harry o acusara de ter matado seus pais, e ele disse que não negava...
- Agora chega, Sirius. – Remo disse com um tom de voz tão diferente de sua usual calma, que Harry não pôde deixar de olhar com curiosidade para o seu professor. – Você quer ter pena de si mesmo, o problema é seu! Mas se eu vir você usar esse tipo de comentário mais uma vez que for, com o Harry, eu não vou me responsabilizar pelo que vai ser dito e feito...
Os olhos de Remo eram frios, e Harry teve a impressão de que aquela discussão já devia ter surgido algumas vezes entre o Sirius e o Remo. Eles ficaram por um bom tempo olhando um para o outro, e parecia que uma longa conversa estava se passando entre os dois. Mesmo que nenhum deles estivessem pronunciando palavra alguma.
- A gente já conversou sobre isso, Remo. E agora não é a hora. – Lupin balançou a cabeça em concordância, e Sirius voltou-se mais uma vez para o Harry. – O que eu é quero mesmo dizer pra você, e o motivo de eu ter te chamado aqui, é que você é importante pra muita gente, Harry. Você e a Gina é o que tá dando esperança pra Ordem continuar de pé. Mas os dois. Não um ou outro. Eu não quero ficar sabendo mais tarde que você fez alguma besteira, e que por causa da Gina ou quem quer que seja, você acabe morto por isso. Em muitas coisas você é igualzinho ao seu pai. E tendências a ser herói e mártir é uma das semelhanças. Você é mais importante vivo do que se sacrificando por alguém. Entendeu, Harry?
Sirius estava tão sério, e seu olhar era tão profundo, que Harry só conseguiu balançar a cabeça em consentimento. Os olhos negros de Sirius prendiam os verdes de Harry de tal maneira, que Harry não se atrevia a desviar a atenção de seu padrinho.
- Você já passou por tanta coisa nesses seus quinze anos, que é difícil de acreditar que sejam só quinze mesmo... Você tem uma maturidade que supera a de muitos adultos que eu conheço, e eu só espero que você faça bom uso dela... – Sirius respirou findo e continuou. – Você pode ter muita coisa, Harry. Mas o que eu e o Remo, e até os seus pais mais queriam pra você, é que você fosse feliz. Acredito que você só vá encontrar a sua felicidade quando tiver uma família só sua. E eu vou fazer de tudo que eu puder pra que você chegue a isso. Mas você tem que se comprometer que não vai me deixar lutar sozinho... Se você resolver desistir de tudo, e se sacrificar por alguém, me avisa agora, que aí eu vou desistir de tudo! Eu não tenho mais forças pra ficar lutando se for pra ser tudo em vão...
Harry não queria perder o controle daquela maneira, mas ele percebeu que era tarde demais quando sentiu uma lágrima escorrer de seu olho. Era incrível o quanto Sirius o compreendia, e o quanto Harry o respeitava e estimava.
- A gente tem um trato, Harry? – Sirius perguntou enquanto se levantava, e esticava e oferecia a sua mão. Sua voz continuava séria, e o seu olhar continuava severo.
Harry balançou a cabeça em um sinal positivo e levantou-se também para apertar mãos com o seu padrinho. Na mesma hora em que a sua mão encontrou a dele, Sirius o trouxe para um abraço apertado, e Harry sentiu um alívio enorme. Seu padrinho fora duro com ele, mas Harry sabia que não havia melhor maneira para mostrar estima do que as palavras que Sirius lhe oferecera.
- Obrigado, Sirius. – Harry disse enquanto saía do abraço de seu padrinho.
- A melhor maneira que você tem de me agradecer, é se manter ao seu trato. – Sirius sorriu.
- E por que eu não me manteria? – Harry perguntou enquanto enxugava os olhos e voltava a sorrir. – Eu só tenho a ganhar com ele...
- Você só tem a ganhar com ele...
Continua no Capítulo Trinta e Nove...
