Capítulo Quarenta e Três

A AMEAÇA

- Quer dizer então que era um segredo? Hum... – Voldemort, que estava sentado a uma grande mesa, distanciou sua cadeira e levantou-se com bastante calma. – Pouco me importa o que aquele maldito moleque anda fazendo com menininhas por aí. Mas se for aquela Weasley, a história é outra. Ninguém me tira da cabeça que a feiticeira é ela. E se Harry Potter estiver envolvido com a sétima feiticeira...

Voldemort parou de súbito, e seus olhos vermelhos estavam ainda mais destacados com um brilho horrível. E seu nariz em forma de fenda estava dilatado, sua respiração alterada, provando o quão nervoso ele estava.

- Isso não pode acontecer! – Voldemort exclamou, alterando o seu tom de voz, de modo que todos presentes se assustaram, mas não ousaram se mover. – Se não for ela, eu quero que ela se exploda! Mas se for... Eu não vou correr mais risco.

O Lorde das Trevas acalmou um pouco a sua respiração, e Nagini arrastou-se para perto dele, causando mais medo ainda em quem assistia àquela cena. Rabicho em especial tremia muito. Provavelmente em lembrança das muitas vezes em que seu mestre ameaçou servir rato para Nagini se ele não cumprisse o que lhe foi mandado com exatidão.

- Deu certo uma vez, e vai dar de novo! Aguardem aqui! – Voldemort voltou-se para os seus Comensais, que usavam capuzes e estavam de cabeças baixas, criando sombras que lhes cobriam as faces. – Eu quero me certificar de que não tem ninguém que poderá estragar os meus planos. Se eu encontrar algum espião por aqui, a morte vai ser pouco...

Isso não é nada bom! Harry pensava consigo mesmo, enquanto juntava suas coisas para descer à sala comunal e encontrar Gina. Fazia já algum tempo que ele não sonhava com o Voldemort, e estava sendo tão bom... poder dormir a noite inteira. A não ser quando ele era acordado por outros tipos de sonhos. Mas esses sonhos eram bons. Frustrantes, mas maravilhosos. Já o Voldemort... Só pensar nele já era horrível. Sonhar com ele, então, era terrível. Ainda mais quando Harry presenciava uma ameaça. Dessa vez ele não sabia o que era, mas sabia que Voldemort estava tramando algo, e que o alvo era a Gina.

Harry desceu as escadas e notou que, dessa vez, Gina fora mais rápida que ele. Assim que ele desceu o último degrau, Gina veio correndo em sua direção e abraçou-lhe bem forte.

- Eu sei que é bobeira, – Gina começou, sussurrando para não fazer muito barulho. – mas depois de meses sem nenhum pesadelo com ele, eu comecei a ter esperança de que talvez ele fosse demorar mais... Mas acho que depois de anteontem seria meio difícil...

Harry concordou com Gina. "Anteontem" foi quando Simas, sem querer, pôs muita coisa em risco durante o café da manhã. Ele esperava que não desse em nada, mas levando em conta que era do Harry Potter que eles estavam falando, isso era querer demais. Aliás, quase tudo era querer demais pra ele... Querer que seus amigos estivessem seguros; querer que o seu padrinho pudesse viver livre, sem ser reconhecido como um assassino; querer que o professor Lupin não sofresse tanto a cada lua cheia; querer que não houvesse uma guerra em andamento; querer que ele pudesse ficar numa boa com a Gina, sem que nenhum dos dois corresse riscos... É... Era realmente querer demais. Com um suspiro triste, Harry saiu do abraço da Gina e pegou a mão dela para que os dois fossem à sala do diretor.

Com todo cuidado, eles abriram a passagem com o quadro da Mulher Gorda para que ela não acordasse. Com a Capa de Invisibilidade já sobre os dois, eles andaram pelos corredores, que pareciam ainda maiores e mais frios nas primeiras horas do dia. Harry trouxe Gina o mais próximo possível de si e, por um momento, foi distraído pelo perfume dos cabelos dela. Eles ainda estavam úmidos, e ela deve ter ido dormir com eles molhados. Que cheiro será que era aquele? Parecia jasmim...

- Delícias Explosivas.

O sussurro de Gina e o barulho do gárgula e da porta trouxeram Harry de volta a si, e ele entrou na sala de Dumbledore, que estava vazia. A maioria dos quadros estava "dormindo", e os poucos acordados, olhavam os dois estranhamente enquanto Harry e Gina tiravam a Capa de Invisibilidade de cima de si mesmos.

- O Dumbledore sempre tá aqui... – Gina disse, olhando em volta da sala, depois que as luminárias acenderam-se quando eles entraram. – Mas hoje ele deve tá dormindo... E agora? – Gina voltou-se para o Harry sem saber o que fazer.

- E eu deixei o Mapa do Maroto lá na Torre...

- AH!

Gina gritou assustada e, involuntariamente, aproximou-se de Harry. Ele ficou curioso para saber o que a havia assustado, e virou-se para olhar na direção em que ela estava olhando.

- Fawkes! – Harry exclamou com um sorriso. – Por que o susto, Gina? É só o Fawkes...

- Você também iria se assustar se estivesse olhando em volta da sala e de repente uma fênix aparecesse do nada!

Harry riu de leve e aproximou-se da ave.

- Talvez o Fawkes possa ajudar! A gente não sabe onde o Dumbledore está, mas o Fawkes com certeza sabe!

- E o dia que eu conseguir falar com uma fênix, vai ser o dia que eu vou fazer o Voldemort cair aos meus pés... – Gina disse com um sorriso irônico.

- Rá-Rá! Muito engraçado, Gina. – Harry virou-se de frente para ela, e Gina esticou-se ligeiramente para beijar seus lábios de leve. – Mas o Fawkes já me ajudou uma vez, e talvez possa me ajudar agora... né?

Harry voltou-se mais uma vez para a fênix e acariciou suas penas. A ave ficou com a postura ereta e orgulhosa. Naquele instante, Harry lembrou da Edwiges, que sempre o compreendia tão bem, e esperava que Fawkes soubesse o que Harry queria dele. Num piscar de olhos, a ave desapareceu, e Harry e Gina entreolharam-se.

- Bom, acho melhor a gente sentar e esperar... – Harry sugeriu à Gina, e assim os dois fizeram.

- Será que ele entendeu? – Gina perguntou com uma sobrancelha erguida.

- Se ele tiver entendido, quer dizer que o Voldemort vai cair aos meus pés? – Harry perguntou com um sorriso, em provocação.

- Tá... – Gina sorriu de volta. – Eu mereço essa!

Eles não precisaram esperar muito tempo, e o Dumbledore estava entrando pela porta secreta com Fawkes pousada em seu ombro. Assim que a fênix viu Harry e Gina, ela emanou um som melodioso e abriu as asas. Dumbledore sorriu e acariciou a cabeça da ave, escondendo um bocejo.

- Se Fawkes fosse o meu despertador, eu acordaria melhor todos os dias... – Dumbledore comentou, enquanto caminhava em direção à sua cadeira, ainda de pijamas, e usando um gorrinho ridículo na opinião do Harry.

- Boa noite... ou melhor, – Dumbledore sorriu. – bom dia. Mas acredito que não deve ser tão bom se vocês estão aqui a essa hora.

- Não, não é. – Harry respondeu sério, lembrando-se do seu pesadelo. – O Voldemort decidiu que atacaria a Gina. Ele disse que tem quase certeza que é ela a feiticeira, e que não quer correr riscos.

- E mais uma vez não deu pra ver com quem ele tava falando. – Gina acrescentou. – Eles estavam com aqueles capuzes de novo!

- Então... – Dumbledore suspirou tristemente, mas se recompôs e olhou diretamente pra Gina. – acredito que não possamos fazer muito. Tudo o que podemos é garantir ao máximo a sua segurança. E nisso estaria implícito a impossibilidade de ir à Hogsmeade, ou sair de qualquer forma do castelo...

Gina abaixou a cabeça e olhou fixo para o chão.

- Eu já imaginava. – A menina admitiu com a voz baixinha. – Foi a mesma coisa com o Harry quando o Sirius escapou...

- É, – Dumbledore concordou. – e esse caso, graças a tudo que é sagrado, se desenvolveu muito bem. Espero que com você seja o mesmo.

Gina não respondeu nada e continuou com a cabeça ligeiramente abaixada. Harry não sabia bem ao certo o que fazer, e preferiu não interferir. Ele sabia bem como foi horrível ficar trancado no castelo por uma coisa que ele nem tinha feito.

- Eu acho que seria conveniente se vocês agora voltassem à Torre. Ainda daria algumas horinhas de sono. – Dumbledore sorriu calmamente, e Harry acreditou que quem gostaria de mais "algumas horinhas de sono" era o próprio diretor.

- Tá certo. – Harry respondeu, levantando-se e oferecendo sua mão em ajuda à Gina.

A menina silenciosamente aceitou a mão do Harry e, dizendo um baixo "boa noite" para o Dumbledore, deixou a diretoria.

Os dois caminharam em silêncio de volta à Torre da Grifinória, envoltos mais uma vez na Capa de Invisibilidade do Harry. Ao tormentarem a Mulher Gorda dizendo a senha e se sentarem no sofá vermelho aveludado, Gina comentou:

- Se já não bastasse tudo, agora eu vou ter que ficar presa aqui dentro! – Não passou de um sussurro, mas Harry sabia bem que ela estava sentindo bastante por aquilo. – Eu tô começando a ficar de saco cheio disso tudo. Às vezes, eu fico me perguntando se não seria melhor entregar tudo de vez e desistir...

- Bom, então você sabe como eu tenho me sentindo nesses últimos anos, e eu acabei de descobrir como é que os meus amigos têm se sentido...

- Como assim? – Gina virou-se com a testa franzida para Harry.

- Eu já pensei várias vezes em desistir. Viver na preocupação e vigilância é um saco... E eu já te disse isso uma vez ou outra, pro Rony e pra Mione também. E todas as vezes vocês ficaram bravos comigo. Eu nunca tinha entendido por que...

Harry deu com os ombros e balançou a cabeça de um lado para o outro lentamente. Gina olhava para ele cheia de curiosidade e preocupação, mas não dizia nada. Após alguns instantes em silêncio, Harry respirou fundo e prosseguiu:

- Por que você fica brava comigo quando eu falo em desistir? – Harry voltou-se à Gina com uma expressão de quem já sabia a resposta, mas queria ouvir mesmo assim.

- Porque muita gente iria sofrer... – Gina parecia buscar uma resposta em algum lugar onde só ela encontrava. Ela mexia suas mãos e não tirava os olhos delas enquanto o fazia. – Muita gente entraria em pânico se soubesse que não tem mais a possibilidade e a esperança de que Harry Potter se livrasse do Voldemort mais uma vez...

- Não foi isso que eu perguntei, Gina. – Harry comentou no mesmo tom de voz calmo que usara antes. – Eu quero saber por que você ficaria brava se eu me entregasse. Não os outros.

Gina ergueu a cabeça e olhou fixo nos olhos do Harry por um bom tempo. Nada foi dito naqueles instantes, mas parecia que o silêncio havia sido a melhor comunicação estabelecida até agora. Harry teve sua resposta olhando naqueles olhos castanhos, mas Gina ainda assim respondeu em voz alta.

- Porque você é importante pra mim. Porque perder você seria perder parte de mim mesma e, querendo ou não, você é parte da minha força. Se você desistir, eu não sei se eu sou capaz de resistir.

Harry trouxe Gina para perto de si, e os dois ficaram envolvidos em um emocionado beijo por um longo período. Harry ainda estava se acostumando com a idéia de que realmente havia alguém que lhe amasse de verdade, mas o que mais o espantava, era o fato de que os sentimentos eram retribuídos, e saber que ele, que nunca soubera o que é amar alguém, tinha certeza absoluta de seus sentimentos para com Ginevra Weasley.

- É exatamente assim que eu me sinto. – Harry sussurrou, ainda um pouco sem fôlego. – Eu não quero que você desista pelo mesmo motivo. Contigo eu conheci uma infinidade de coisas novas. Novas e boas. E como eu já disse antes, ninguém mais vai tirar você de mim.

Os olhos de Gina brilhavam, e a menina parecia meio incerta do que dizer. O próprio Harry estava abalado com a profundidade do que ele dissera. Ele não sabia como, mas sentira que aquelas eram as palavras certas a dizer. Gina o abraçou bem forte, e por quanto tempo os dois ficaram assim, nenhum deles seria capaz de dizer. Aliás, quanto tempo passava, era a última das preocupações de Harry naquele momento.