Capítulo Quarenta e Quatro

A NÃO IDA A HOGSMEADE

 - O que foi, Gina?

Rony foi quem fez a pergunta, mas era evidente que sua curiosidade era a mesma de Harry e Hermione, quando a mais nova das Weasleys aproximou-se dos três na Sala Comunal.

 - Nada! – Gina respondeu baixinho e com a expressão ligeiramente chateada. – Eu briguei com o Colin, e... bom, eu não quero falar sobre isso!

Gina largou suas coisas no chão e sentou-se ao lado delas. Harry franziu a testa e a olhou com mais cuidado. Hermione também parecia desconfiar de que a chateação de Gina não era "nada" como ela dissera, mas limitou-se a simplesmente lançar um olhar inquisitório para o Harry, que foi respondido com um balançar de cabeça negativamente.

 - Você é quem sabe... – Rony respondeu, dando com os ombros e passando seu braço em volta da cintura da Hermione. Os dois estavam sentados em um sofá, e Hermione aproveitou-se da nova posição para encostar a sua cabeça no ombro do Rony.

Harry olhou para os dois amigos e sorriu involuntariamente. Gina provavelmente sorria também, mas seu sorriso cessou quando os olhos do Harry encontraram os seus. Harry estava certo de que algo a chateava mais do que ela queria admitir. Já há algum tempo ele guardava essa desconfiança, mas não queria pressionar Gina a dizer nada com o qual ela não se sentisse confortável em dizer. Harry sorriu mecanicamente para a Gina, e a menina abaixou a cabeça.

 - Hoje eu recebi uma carta dos meus pais... – Hermione comentou calmamente. – É tão estranho... Eles contaram o que anda acontecendo por lá, mas não têm nem idéia do que anda acontecendo por aqui. Eu falei com eles sobre Você-Sabe-Quem durante as últimas férias e o Natal, mas acho que eles não estão tão preocupados já que eles não têm nem noção do que a volta dele significa. Uma coisa é você ouvir o que se passa, e outra é viver o que se passa.

Rony posicionou sua mão na cabeça da Hermione e acariciou seus cabelos afetuosamente.

 - Em pensar que a gente já tá quase na primavera, e que logo a gente vai tá voltando pra casa, todo mundo, mais uma vez... – Hermione continuou os seus comentários distraída.

 - É. – Harry concordou. – E dessa vez não vou ser só eu que não vai querer voltar pra casa. – Harry sorriu para os dois amigos e percebeu Hermione corar levemente.

 - Mas não é só isso. – Rony acrescentou, com as pontas das orelhas suspeitamente avermelhadas. – Aqui em Hogwarts, a gente tá seguro. E aposto que metade das coisas que acontecem lá fora, a gente nem fica sabendo...

 - E imagina o terror que a mãe vai ser quando a gente voltar pra Toca... – Gina completou. – Se ela já é super protetora em condições normais, imagina agora que a sua cria corre perigo!

A expressão de Rony revelava que ele temia o mesmo que Gina, e que a idéia de ter sua mãe o paparicando durante toda as férias não era lá muito apelativa. Mas essa conversa levou Harry a pensar em algumas coisas que sempre o perturbavam quando o ano letivo estava por acabar. Tudo bem que ainda faltava tempo, mas só de pensar em ter que voltar para a casa dos Dursleys mais uma vez... Harry suspirou cansado e voltou seus pensamentos para os Weasleys. Como ele gostaria de passar as férias com eles, mesmo que a Sra. Weasleys o colocasse debaixo de sua asa como faz de costume. Mas se no ano passado, Dumbledore não quis que ele fosse até a última semana de férias, nesse ano não seria diferente. A desculpa era que ele ficava seguro na casa de seus parentes. Mas pensar nisso, fez-lhe lembrar de um sério detalhe. Ele só ficava seguro na casa dos Dursleys porque a Sra. Figg era sua fiel de segredo, mas e agora? Arabella Figg não estaria mais lá nesse verão para ficar de olho nele. Será que a casa dos Dursleys continuaria sendo o lugar mais seguro para ele? E quanto à Gina? Se não era seguro para ele, Harry, passar o verão na Toca, por que seria para a Gina? Ainda mais agora que Voldemort desconfiava principalmente dela e tinha todo o intuito de matá-la.

 - Ah, mas mudando de assunto, – Rony sorriu mais entusiasmado. – amanhã é sábado, e finalmente a gente vai poder ir pra Hogsmeade... tava começando a ficar cansado de ficar aqui dentro esse tempo todo!

 - Você sempre fica cansado de ficar aqui. Qualquer coisa é desculpa pra ir pra Hogsmeade... – Hermione o repreendeu sorrindo.

Harry olhou de rabo de olho para a Gina, e notou que a menina tinha piorado consideravelmente o seu humor. Então aí estava o problema: Hogsmeade.

 - E aí, Harry? – Rony voltou-se para o melhor amigo. – Quais são os planos pra amanhã?

 - Nenhum... – Harry respondeu baixinho. – Pelo menos não em Hogsmeade. – Harry lançou um olhar maroto para a Gina, o qual Hermione notou.

 - Como assim "não em Hogsmeade"? – Rony perguntou indignado. – Vai me dizer que você vai ficar aqui no castelo... Faz mais de um mês que não tem saída pra Hogsmeade!

 - Ah... Hogsmeade já não tem mais tanta graça... Eu vou ficar por aqui mesmo...

Harry olhou significativamente para a Gina, e a menina sorriu em retribuição.

 - Ah, eu já entendi tudo! – Hermione exclamou, sentando-se ereta e saindo do abraço do Rony. – Aposto que a Gina também não vai sair do castelo. Tô certa?

Rony olhou para todas as partes e pareceu entender também. Ele ficou ligeiramente corado, mas tudo o que disse foi que não queria saber.

 - Eu acho que vocês estão certos em ficar. – Hermione falou séria. – Eu sei que a Rita Skeeter vai ficar esse ano todo "afastada" do jornalismo, mas ainda assim, existem vários outros jornalistas inescrupulosos por aí... E aposto que "Harry Potter e sua nova namorada" seria assunto na certa. Se no ano passado já inventaram coisas me envolvendo, imagina agora! – Hermione sorriu.

Harry ficou ligeiramente sem graça, lembrando-se da matéria da Rita Skeeter dizendo que a Hermione estava brincando com os seus sentimentos e o traindo com Victor Krum... O problema nem foi a matéria em si. O problema foi o Snape ler pra toda a sala aquele monte de mentira, e ainda mais na frente dos alunos da Sonserina! Harry aproveitou a desculpa que Hermione – sem querer – lhe forneceu, e concordou.

 - É por isso que a gente vai ficar... – Ele disse em voz baixa e olhando para o chão.

 - Bom, você é quem sabe. – Rony acrescentou. – Eu ainda acho que você é maluco de ficar todo esse tempo trancafiado no castelo, mas se é o que você quer...

Harry olhou para a Gina e notou que seu melhor amigo não estava ajudando em nada com aquele tipo de comentário. Mas de qualquer forma, Harry conversaria mais tarde com a Gina, quando os dois estivessem a sós. Mas essa chance teria que esperar, porque Harry passou toda a noite de sexta-feira junto com Rony e Hermione. Terminando algumas tarefas e depois jogando xadrez, conversando. Um dos motivos também foi que Gina passou um bom tempo com o Dumbledore depois do jantar. Mesmo se Harry estivesse sem fazer nada, ele ainda assim não poderia ter falado com a Gina naquela noite.

Mas a madrugada foi diferente. Harry – e por conseqüência, a Gina – teve mais um pesadelo com o Voldemort. Nesse último, não houve nenhuma promessa de matar alguém, ou então algum plano macabro. Voldemort apenas confirmou um dos tópicos que já fora debatido em reuniões da Ordem da Fênix: os dementadores. Quando Voldemort abduziu Harry para que, com auxílio do seu sangue, ele voltasse a um corpo físico, Voldemort já havia mencionado dominar Azkaban, mas até agora, nada havia sido feito. E para um certo alívio dos membros da Ordem, a situação continuaria a mesma por mais um tempo. No pesadelo que Harry por último tivera, Voldemort conversava com a Nagini, e ele dizia que ainda não atacaria Azkaban enquanto não se livrasse da feiticeira. Ele seguiria seus planos e, se dessem certo, ele traria os dementadores de volta para o seu lado. Mas se não desse, se a feiticeira sobrevivesse, ele teria que parar de pensar um pouco nela, e aumentar seu círculo de seguidores. O que Harry entendeu daquela conversa, é que Voldemort tinha um grande plano para atacar Gina e que, pelo jeito, ela não tinha grandes chances de sair viva. Voldemort exalava confiança quando falava de seu "plano", e Harry temia que essa confiança fosse fundada. O que mais irritava é que Voldemort, com medo de terem espiões no seu círculo, não discutia seu plano, e se o tivesse feito, Harry nada ficara sabendo. Harry desceu brevemente à Sala Comunal e esperou pouco tempo até que Gina aparecesse. Nada de muito significativo foi dito. Harry explicou o que foi dito, já que Gina não era Ofidioglota, e ambos decidiram que seria melhor esperar até o dia seguinte para relatar o pesadelo ao Dumbledore. Com um beijo de boa noite, cada um foi para o seu lado, aproveitar o resto de madrugada de sono.

No dia seguinte, como Harry previra, todos os alunos do terceiro ano para cima deixaram o castelo. Estavam todos muito cansados e, provavelmente, decidiram que uma cerveja amanteigada da Madame Rosmerta iria bem. Harry também pensava que uma tarde fora do castelo seria bem útil e aproveitada, mas não queria deixar a Gina sozinha e para trás.

 - Por que você brigou ontem com o Colin? – Harry perguntou enquanto os dois voltavam da sala do Dumbledore, e caminhavam em direção à cabana do Hagrid para uma visita.

 - Foi besteira, Harry... – Gina deu com os ombros e cruzou seus dedos com os de Harry. – Ele tava falando de Hogsmeade e insistindo que eu fosse... bem por aí.

 - Já entendi... – Harry comentou baixinho. – E o Rony ontem também não ajudou muito, né? – Harry perguntou com um sorriso.

 - Não muito... – Gina concordou, sorrindo de volta. – Mas também, ele não tinha como saber. E por falar nisso, – Gina parou de andar e virou-se de frente para o Harry, olhando séria nos olhos dele. – obrigada por ser maravilhoso... ontem, hoje, e sempre. Você podia ter ido se divertir com os seus melhores amigos em Hogsmeade e, ao invés disso, tá aqui comigo... trancado também... – Gina forçou um sorriso.

Harry aproximou-se de Gina e lhe beijou os lábios suavemente.

 - A verdade é que eu prefiro ficar com você... – Harry sussurrou no ouvido da Gina, que se arrepiou, e Harry sorriu quando percebeu a sua reação.

Os dois foram interrompidos por alguém pigarreando, obviamente para chamar atenção. Harry afastou-se ligeiramente de Gina para ver quem estava lhe perturbando, e sentiu-se corar quando viu que era o professor Lupin.

 - Vocês vão ter por costume fazer isso na minha frente? – Remo Lupin sorria de orelha a orelha, principalmente depois de notar o desconforto da Gina e do Harry.

Gina abaixou a cabeça e corou profundamente, enquanto Harry tentava achar algo o que dizer. Lupin resolveu aliviar as aflições do garoto.

 - Vocês deram sorte que sou eu, e não aquele cachorro velho. É um risco ter esse tipo de atitude na frente da minha porta...

Lupin estendeu a mão e apontou para a porta entreaberta. Harry nem tinha notado que era ali que eles estavam. Lupin despediu-se com um olhar maroto nos olhos e continuou o seu caminho depois de fechar a sua porta por completo.

- É melhor a gente ir... – Harry sugeriu, começando a caminhar mais uma vez. – Eu já ouvi o suficiente do Sirius pra durar uma vida inteira.

Gina riu baixinho, provavelmente porque sabia que Sirius tinha colocado o Harry contra a parede, mas apesar de muita insistência da parte dela, Harry se recusou a contar exatamente o que Sirius lhe dissera.

 - É, é melhor mesmo... – Gina concordou, posicionando seu braço na cintura de Harry e caminhando ao seu lado. Já em bem melhor humor do que quando acordara.

 - Ora, ora...

Harry virou-se na direção da voz, mas nem precisaria tê-lo feito. Ele já tinha certeza a quem aquela voz pertencia. E pelo visto, eles não chegariam à cabana de Hagrid tão cedo.

 - O que você quer, hein, Malfoy? – Harry perguntou, com a voz bem seca.

 - O que será que dois alunos da Grifinória estão fazendo, perambulando pelos corredores, num sábado onde, em tese, todos estariam em Hogsmeade? – Malfoy estava sozinho, mas não se deixava abalar por esse fato. Continuava arrogante como sempre.

 - Não é da sua conta, Malfoy... – Harry respondeu, contando mentalmente até dez e tentando se segurar.

 - É sim da minha conta, Potter. Ou será que você esqueceu que eu sou um monitor. – Malfoy perguntou com um sorriso irritante, e Harry teve que aumentar sua conta até cem. – Agora, quantos pontos eu devo tirar da Grifinória por causa desses dois pombinhos?

 - Você tem é que ficar na sua, Malfoy. Ninguém aqui tá fazendo nada de errado. – Gina se interferiu e, aparentemente, chamou a atenção de Malfoy para si.

 - E quem te perguntou o quer que fosse? – Malfoy redargüiu com o nariz em pé. – Eu no seu lugar ficaria bem quietinha... Quanto é que o Potter tá te pagando, hein? Não deve ser muito se você continua usando roupa de segunda mão, e o nome Weasley continua na lama. Talvez eu possa te dar mais, se você for tudo o que parece ser na cama...

Dessa vez não houve contagem que segurasse o controle de Harry. Ele partiu pra cima do Draco, e só se lembrou que poderia ter usado a sua varinha, quando sentiu uma dor imensa no seu punho. Malfoy caiu sentado, e sua varinha rolou para longe dele. Furioso, e de orgulho ferido, Draco se levantou e partiu pra cima do Harry com igual veemência. Harry não sabia de nada o que estava acontecendo à sua volta e só parou de esmurrar Malfoy quando ouviu altos latidos. Um cachorro preto enorme se aproximou dos dois e começou a rosnar para Malfoy, que pegou sua varinha e, indignado, tomou o seu caminho.

O grande cachorro, que agora Harry reconhecia como o seu padrinho, puxou com a boca a barra de suas vestes, indicando que Harry o seguisse. Harry o fez, e Gina, apavorada, aproximou-se dele, limpando um caminho de sangue que escorrera de seu supercílio. Assim que a porta da sala do Lupin se fechou, Sirius transformou-se de volta à forma humana e parecia furioso.

 - Você vai me explicar o que acabou de acontecer no corredor?

Harry abriu a boca para se explicar, mas seu padrinho o interrompeu, antes que ele pudesse dizer qualquer coisa.

 - O que você acha que passou pela minha cabeça, quando eu vi a Gina apavorada, entrando por essa porta e pedindo pra que eu viesse com ela? – Harry tentou se desculpar, mas foi interrompido mais uma vez. – Eu fiquei desesperado! Eu achei que você estivesse em perigo, que algo sério estivesse acontecendo, e você tava "brigando"?

Dessa vez, Sirius ficou em silêncio, e Harry arriscou uma explicação.

 - Desculpa, Sirius... mas é que eu perdi a cabeça! Ele falou que... AH! Não importa o que ele falou! – Harry se exaltou também, toda a sua raiva para com o Malfoy à flor da pele. – O que importa é que ele tava merecendo tomar umas porradas já há algum tempo...

 - Ah... e você foi lá e fez isso! Brilhante, Harry! Da próxima vez, tenta chamar um pouquinho mais de atenção pra cima de si, porque dessa vez, metade do castelo tava em Hogsmeade! – Sirius estava mesmo furioso, mas estava se forçando a respirar lentamente para se acalmar.

Gina olhou do Harry para o Sirius e, meio incerta, aproximou-se da porta, fazendo menção de quem iria sair.

 - Não! Fica, Gina... – Sirius voltou-se para a menina, um pouco mais gentil. – Desculpa por você ter tido que ouvir isso, mas... Bom, vamos deixar pra lá.

Sirius voltou-se para o afilhado e, depois de respirar fundo mais umas vezes, continuou:

 - Eu fiquei assustado, Harry. Desculpa por ter exagerado com você também... Eu nem quero saber o que aquele menino falou, mas pra você ter perdido a cabeça, deve ter sido sério mesmo. Eu confio em você, Harry. Só não me assusta desse jeito mais uma vez, ok?

Harry balançou a cabeça em um sinal positivo, ligeiramente confuso com a atitude do padrinho. Ele não tinha feito nada de demais, então por que aquele escarcéu todo que Sirius fizera? Harry podia apostar que o próprio Sirius já se metera em várias brigas quando tinha a mesma idade que ele... Mas o Sirius ficara genuinamente assustado com o Harry e, bem, talvez o nervosismo com o qual todos estavam lidando devido à guerra era o real culpado desse desentendimento.

 - Desculpa de novo, Harry. E você também, Gina...

Harry e Gina sorriram de leve para Sirius e deixaram a sala ligeiramente confusos. Bom, talvez um chá com o Hagrid os ajudasse a espairecer.

Continua no Capítulo Quarenta e Cinco...