Capítulo Quarenta e Cinco

ABDUÇÃO

Era incrível como o tempo era capaz de passar de forma rápida quando se tinha inúmeras preocupações na cabeça. Parecia que quanto mais coisas Harry tinha a fazer, menos horas o dia passava a ter. Faltando pouco mais de um mês para os N.O.M.s, Harry deparou-se com todo tipo de revisão possível e imaginável. E o que mais irritava era que cada professor acreditava existir só a matéria que ensinava, e que os alunos só tivessem aquilo para rever e reforçar o estudo. O acúmulo de matéria era impossível, e Harry se perguntava se até Hermione estava dando conta daquilo tudo. Mas como sempre, a menina era um exemplo acadêmico, e nesse ano, quase que com pena do desespero de Rony e Harry, Hermione volta e meia se encontrava gastando parte de seu tempo ajudando os dois melhores amigos. Coisa que ela se recusava a fazer em anos anteriores. Foi nessas semanas caóticas, que Harry passou a entender por que Hogwarts era um internato. Ele literalmente usava todos os horários em que não estivesse dormindo ou comendo para estudar. Nem os treinos de quadribol tinham mais prioridade. Afinal de contas, além de sua própria falta de tempo, mais quatro jogadores do time passavam por situação parecida, mas Harry suspeitava que a dele era moleza comparado com os N.I.E.M.s com que Angelina, Katie, Fred e Jorge estavam lidando. Angelina, mesmo sendo rígida como era, entendeu e aceitou o motivo da diminuição na quantidade dos treinos, e Harry, apesar de sentir falta de voar com a freqüência que o fazia, respirou aliviado por ganhar algumas horinhas de vez em quando.

Harry e Rony estavam tendo um trabalhão com a matéria de Defesa Contra as Artes das Trevas. Mas não era só eles. Como nos N.O.M.s poderia cair toda matéria que eles estudaram até ali, – do primeiro ao quinto ano – quase todo mundo estava tendo que correr atrás da matéria dos primeiros dois anos. Já que com os professores Quirrel e Lockhart, eles não aprenderam quase nada. A sorte é que Defesa Contra as Artes das Trevas sempre foi uma matéria na qual Harry se deu bem, e Hermione não precisava explicar muito, e ele já assimilava bem a maioria dos tópicos.

Foi no dia 21 de Abril, um sábado, que Harry pela primeira vez em muito tempo decidiu não fazer nada. Era dia de visita a Hogsmeade, e praticamente todos os alunos que podiam, decidiram ir. Mas Harry realmente resolveu ficar para trás. Ele estava tão cansado, que só a idéia de sair de Hogwarts já era exaustiva. Mas Gina pensava completamente o oposto. Ela via e entendia todo o cansaço pelo qual Harry, Rony e Hermione estavam passando. Mas para ela, o cansaço vinha em forma diferente, e ela não estava tendo tanta matéria para rever para fazer suas provas finais. Ela até tinha outras preocupações, mas só o fato de não estar no quinto ano, já resultava em mais tempo de descanso. Ela estava começando sim a ficar entediada. Harry notou que na maior parte do tempo, sua companhia era o amigo Colin Creevey. Gina não se dava bem com as meninas do seu ano, e Harry nunca entendera por quê. Ela se dava bem melhor com os meninos, e talvez o fato de que ela tenha crescido com seis irmãos, todos homens, seja o motivo. Colin tinha uma disposição para exaurir qualquer um, e Gina estava prestes a fugir do castelo, nem que fosse por algumas horinhas apenas. Harry nem podia condená-la, já que quando fora ele quem precisava ficar em reclusão, fugir e sair escondido foi exatamente o que ele fez. E quase fora descoberto.

Rony e Hermione saíram logo cedo, e apesar de muita insistência da parte dos dois, Harry ficou para trás de bom grado. Além do quê, ele secretamente acreditava que Rony e Hermione não achavam a idéia de irem sozinhos a Hogsmeade tão desagradável assim. Pelo contrário. Depois do café da manhã, para o qual Harry desceu o mais tarde possível, ele deitou-se em um dos sofás da Sala Comunal, e por lá ficou por um bom tempo, perigando cair no sono novamente. Mas na verdade, ele estava apenas descansando e resolveu fazê-lo na sala comunal, esperando que Gina aparecesse, e que ele pudesse ficar algum tempo com ela. Já que os dois têm estado ligeiramente afastados um do outro. O que era compreensível, levando em consideração os diferentes anos que estavam cursando, e seus diferentes horários. E pela primeira vez, Harry começou a pesar esse assunto. Quase nunca ele se pegou imaginando o que estaria fazendo em alguns anos, mas dessa vez foi diferente. Harry ficava questionando como seria quando ele terminasse os seus sete anos em Hogwarts, e Gina ainda tivesse mais um pela frente. Harry sabia que não seria fácil, mas também não queria ficar sofrendo por antecipação e resolveu voltar a pensar nesse assunto quando ele chegasse.

 - Ê moleza, hein? – Gina comentou com um sorriso, enquanto se aproximava de Harry.

Harry sentou-se e puxou Gina para perto de si com certa ferocidade, e beijando-lhe brevemente os lábios várias vezes, o que só fez a menina rir ainda mais.

 - Só você mesmo pra me fazer rir hoje... – Gina disse sorrindo.

 - Eu sei que é um saco, Gi, mas pensa pelo lado bom... ainda não teve nenhum ataque por um bom tempo. Pelo menos nenhum que a gente tenha ficado sabendo.

Harry tentou consolá-la, enquanto passava a mão em seus cabelos e recebia olhares admirativos de meninas do primeiro e segundo ano que estavam na sala comunal. Não que elas estivessem ouvindo a conversa, provavelmente não estavam, levando em conta a distância em que o grupinho se encontrava e o tom de voz que os dois estavam usando. Elas provavelmente estavam admirando o casal, e o fato de que Harry Potter era uma das partes, possivelmente era mais fator de admiração. Gina percebeu também e, antes de voltar sua atenção mais uma vez ao Harry, ela deu uma piscadinha para as meninas, que coraram por terem sido flagradas e riram baixinho, disfarçando o embaraço, voltando ao jogo de Snap Explosivo que estavam jogando.

 - Mas não é ficar no castelo, Harry... – Gina parecia lutar para encontrar palavras, e Harry passou a ficar curioso com a razão do incômodo. – Eu não sei... mas hoje eu acordei com um pressentimento ruim... não sei bem dizer o que é.

 - Talvez não seja nada. – Harry sugeriu. – Deve ser só o cansaço. Eu sei que eu pelo menos tô morto... – Harry sorriu e espreguiçou-se com um bocejo, como que para provar o que disse. – E por agora, a idéia que mais me agrada é ficar o dia inteiro sem fazer nada.

 - Bom, então, – Gina disse enquanto se levantava. – eu espero que você não se importe que eu termine uma tarefa enquanto você fica aí fazendo "nada"...

Harry sorriu e acompanhou com os olhos Gina subir as escadas para o seu dormitório, provavelmente para ir pegar seu material. Ele nunca gostou de ficar longos períodos parado, sem fazer nada, mas naquele dia em especial, era como se o tempo tivesse parado. E o sentimento que Harry tinha podia ser comparado com aquela calma que se sente e se presencia antes uma tempestade. Antes do céu despencar, tudo pára. As árvores se movimentam em câmera lenta, os pássaros só planam, e até o vento parece mais devagar. Era bem assim que Harry se sentia naquele momento, e com os seus pensamentos tomando esse rumo, Harry lembrou-se do comentário da Gina sobre um mau pressentimento. Ele não sabia o quanto disso poderia ser creditado à feitiçaria, mas se Gina estivesse sentindo o mesmo que ele, – a calma antes da tempestade – era bem provável que uma má notícia estivesse mesmo por vir.

 - Você vai ficar deitado aí mesmo? – Gina perguntou afetuosamente enquanto largava alguns livros no chão e se acomodava, sentando no chão, com as costas apoiadas no sofá onde Harry estava deitado.

 - Eu acho que aqui onde eu tô é um ótimo lugar... – Harry respondeu com um sorriso maroto, e aproximando seu rosto do pescoço de Gina, trazendo arrepios à menina. Ocasionais beijinhos traziam algumas risadinhas a ela, mas logo que abriu seu livro, ficou determinada a terminar sua tarefa, e Harry teve que se conter com acariciar o cabelo dela, enquanto pensava distraído em outras coisas.

 - Você sabe por que os unicórnios deixam as meninas se aproximarem deles com mais facilidade que os meninos?

 - Nem idéia, Gina...

Gina suspirou em derrota e comentou:

 - Esse livro não diz, e eu não quero ter que ir à biblioteca agora...

 - Então espera a Mione chegar... – Harry sugeriu. – Pergunta como quem não quer nada, e não deixa ela saber que é pra uma lição, deixa ela acreditar que é só curiosidade sua. Ela vai te responder com bastante entusiasmo, e você vai poupar o esforço da pesquisa...

Gina olhou para o Harry com uma sobrancelha erguida e um meio sorriso. Harry corou e respondeu ligeiramente sem graça:

 - Ah... eu tenho gênio como melhor amiga... de vez em quando, eu tenho que saber tirar proveito... – Harry lançou um sorriso maroto, e Gina beijou-lhe brevemente.

 - E eu acho que vou fazer exatamente isso... – Gina respondeu, fechando o livro e aproximando-se mais uma vez de Harry. Fato tal que ele não reclamou nem um pouco.

 - A Marca Negra!

Harry olhou em direção ao grupo de alunos do segundo ano que estava próximo à janela e que tinha feito o anúncio. Eles estavam com expressões assustadas, e Harry voltou brevemente sua atenção à Gina, notando que ela estava tão preocupada quanto ele. Os dois se levantaram prontamente e correram até a janela – assim como vários outros alunos. E como dito, a Marca Negra flutuava no céu, aterrorizando muitos, e indicando que alguma barbaridade havia acontecido. Harry buscou inconscientemente a mão de Gina, e os dois juntos deixaram correndo a sala comunal em direção à sala do Dumbledore.

 - O Rony e a Mione, Harry... – Gina disse enquanto os dois corriam pelos corredores. – Eles tão em Hogsmeade! E se...

 - Eu tava pensando nisso agora mesmo, Gina... – Harry respondeu ofegante. – Mas é melhor a gente não se desesperar antes de saber o que aconteceu de verdade.

 - Eu sabia que alguma coisa ruim iria acontecer... – Gina disse com voz de auto-crítica. – Desde que eu acordei tá esse sentimento pesado...

Harry nem sabia o que dizer em consolo. A verdade é que ele não conseguia esperar saber de fato o que estava acontecendo para se preocupar em demasiado com os dois amigos. Se Voldemort estava à procura dele, Harry, Rony e Hermione eram vítimas em potencial, e ele não poderia fazer nada a respeito.

 - Prof. Lupin! – Gina exclamou, parando bruscamente de correr quando os dois se aproximaram do gárgula que guarda a porta da diretoria e onde Remo Lupin estava.

 - Harry, Gina... eu estava mesmo esperando por vocês.

Harry notou que a expressão do professor Lupin era de extremo cansaço, e parecia que os cabelos grisalhos dele tinham aumentado em quantidade de um dia para o outro.

 - O que tá acontecendo? – Harry perguntou, ávido por notícias.

 - De alguma forma, Voldemort sabia que hoje era saída à Hogsmeade... provavelmente esses malditos espiões! – Lupin socou a parede com raiva, e Harry se surpreendeu ao notar quanta força o plácido Remo Lupin tinha. – Acontece agora que vários Comensais atacaram o vilarejo, e com certeza há vítimas. O Dumbledore já está lá, e eu fiquei com mais alguns professores para vigiar e acalmar os alunos que ficaram. Além, claro, de preparar a enfermaria...

Harry e Gina entreolharam-se, e Harry engoliu seco. "preparar a enfermaria"... Quais seriam as exatas dimensões desse ataque?

 - Vamos... – Lupin disse enquanto começou a andar em direção contrária à porta de Dumbledore. – A Madame Pomfrey com certeza precisa de ajuda, e vocês precisam de uma distração enquanto notícias não chegam.

Gina procurou a mão de Harry, e os dois cruzaram os dedos, caminhando logo atrás de Lupin, rezando para toda e qualquer deidade conhecida, pedindo que tudo estivesse bem, e que ninguém se machucasse seriamente.

 - Papoula? – Remo chamou, enquanto abria a porta da enfermaria.

O caminho pelos corredores foi consideravelmente rápido, levando em conta que ninguém estava realmente com a cabeça concentrada no que se passava. Todas as atenções estavam viradas para o que estaria acontecendo em Hogsmeade.

 - Papoula, eu trouxe dois ajudantes pra você... – Remo comentou, recebendo uma única sobrancelha erguida da enfermeira como resposta. – O Sirius tá na entrada do castelo. – Remo voltou-se para Harry e Gina. – Eu vou até lá e esperar com ele para receber os outros.

Harry e Gina balançaram a cabeça em concordância e demasiados distraídos para contestar.

 - Por favor, me ajudem com esses lençóis e travesseiros. Quanto mais camas arrumadas, melhor. Eu não sei ao certo com quantos feridos estamos lidando.

Harry e Gina prontamente começaram a ajudar Papoula Pomfrey, e sem nenhuma palavra de conversa, os três adiantaram bastante o expediente na enfermaria, até que os primeiros feridos começaram a chegar. Justino Finch-Fletchley, monitor da Lufa-Lufa, correu até os dois e disse ofegante:

 - O Dumbledore pediu pra chamar vocês dois até a sala dele. Ele disse que logo vai estar lá. – Justino parecia confuso com o recado, mas aparentemente estava muito mais preocupado em ajudar a quem precisava, do que saciar curiosidades fúteis, e logo deixou os dois.

Ao chegarem na sala do Diretor, encontraram Dumbledore já presente, e Hermione também na sala. Mas a visão não era muito encorajadora. A menina chorava desesperada, e Rony não estava à vista.

 - Cadê o meu irmão? – Gina perguntou receosa e com uma voz falha.

Hermione desesperou-se mais ainda, e a expressão grave de Dumbledore falava alto.

 - Cadê o Rony? – Gina perguntou agora um pouco mais forte, e Harry sentiu um nó na garganta quando Dumbledore demorou ligeiramente a responder.

 - O Sr. Ronald Weasley está vivo, mas foi levado por Comensais...

 - Não... – Gina balançou a cabeça de um lado para o outro, e lágrimas começaram a escorrer de seus olhos. – É mentira...

Harry aproximou-se da menina e a abraçou, dando-lhe conforto, tanto quanto recebendo dela.

 - Temo que seja verdade, Srta. Weasley... – Dumbledore redargüiu gravemente. – E a Srta. Granger pode explicar-lhe com mais detalhe, tendo em vista que eu provavelmente estou sendo requisitado na enfermaria.

Dumbledore pôs a mão no ombro de Harry em um gesto de conforto e deixou sua sala.

 - O que aconteceu, Mione? – Gina perguntou, ainda extremamente aflita.

Harry caminhou em direção à cadeira em que Hermione estava sentada. Ele ajoelhou-se em frente a ela e posicionou sua mão no joelho da amiga. Ele não sabia o que dizer. Parecia que sua garganta tinha se fechado permanentemente, e que seu cérebro se recusava a aceitar que seu melhor amigo estava nas mãos de Comensais da Morte.

 - Foi horrível... – Hermione começou, contendo consideravelmente seu choro. – Eles usaram a maldição Imperio em mim, e eu não podia fazer nada... Eu sabia o que tava acontecendo, mas não conseguia lutar! Eu ouvia aquela voz, e não conseguia fazer nada pra ela parar...

Gina abraçou Hermione com força, e Hermione desabou mais uma vez. Gina sabia bem o quão horrível a maldição Imperio podia ser, mas Harry não tinha nem noção. Só sabia que devia ser uma das piores formas de abuso, mas nunca tinha sentido na pele, já que ele não encontrava problemas em bloquear a maldição.

 - É tudo minha culpa! – Hermione continuou. – Eles levaram o Rony, e eu não fiz nada, enquanto tudo o que ele queria era me proteger...

 - Você é a bruxa mais inteligente que eu conheço, Mione. – Harry finalmente encontrou sua voz, e disse ligeiramente rouco. – Tenho certeza que não foi sua culpa.

Gina balançou a cabeça em concordância, mas Hermione apenas se revoltou.

 - De que me adiantou ser inteligente, se quando eu mais precisei, se quando Rony mais precisou de mim, eu não pude fazer nada?!

 - De que me adiantou ser uma feiticeira se quando o meu irmão precisou de mim, eu tava presa nesse castelo?! Hermione, você não pode pensar assim! Você mesma me disse que eu não posso ser culpada por você ter passado meses como pedra no seu segundo ano. Por que pra você seria diferente? – Gina perguntou, chorando quase tanto quanto Hermione.

 - Por que será que eles levaram o Rony, mas deixaram você pra trás? – Harry perguntou pensativo, e Hermione parecia não ter pensado naquilo até o momento.

 - Eu sei por quê... – Gina abaixou a cabeça e respondeu baixinho. – O Voldemort disse um dia que tinha dado certo uma vez, e que daria de novo... Ele tá fazendo comigo, o que fez com a professora Figg...

Gina ergueu a cabeça e olhou para o Harry com os olhos cheios d'água. Harry nada podia fazer, a não ser abaixar a cabeça e jurar vingança a Voldemort. Todo ódio do mundo estava do seu lado, e ele prometia a si mesmo, que um dia vingaria cada lágrima derramada de todas as pessoas que ele ama ocasionada pelo Voldemort.

Continua no Capítulo Quarenta e Seis...