Capítulo Cinqüenta e Seis

DOR

Na manhã seguinte ao retorno de Rony, muitos sussurros e murmúrios podiam ser ouvidos por todo o Salão Principal. Rony mais uma vez era o centro das atenções, mas diferentemente do ano anterior, quando ele aumentou tanto a história de ter ficado com os sereianos, que a história já nem parecia mais a mesma, dessa vez Rony falava pouco, e na verdade, parecia querer fugir do assunto. Cada pessoa que o parava para perguntar o que havia se passado, como é que ele voltara, acabava decepcionada, pois Rony era curto em suas respostas, e quase que "fugia" das perguntas. Harry não entendia bem o porquê, mas fez questão de apresentar o assunto mais tarde ao amigo e descobrir o que estava se passando.

Ao chegar no Salão Principal com Gina, Rony e Hermione, Harry notou que os sussurros não rondavam apenas o Rony. Parecia que algo mais havia acontecido, mas Harry nem suspeitava o que seria. Lembrou-se que Dumbledore dissera na noite anterior que de fato havia ainda alguns detalhes dos quais Harry não tomara conhecimento, mas que ficaria sabendo no café-da-manhã. "Agora é a hora...", Harry pensou não muito animado, nem otimista com a perspectiva de mais notícias.

E nem precisaram esperar muito tempo. Harry nem havia terminado de comer, quando o Diretor chamou a atenção de todos os alunos.

 - Como vocês bem devem ter percebido, algumas coisas aconteceram da noite de ontem para hoje. Decidimos que as aulas do dia de hoje serão suspensas enquanto fazemos alguns ajustes em nosso horário. Amanhã mesmo, as aulas serão retomadas. Mas voltando ao que aconteceu: o querido colega Ronald Weasley está de volta conosco... – Como já era de se esperar, Harry notou que todas as mesas aplaudiram com vigor exceto, é claro, a mesa da Sonserina. – Mas... é em um tom mais grave que eu tenho algumas notícias não tão agradáveis para dar. Primeiro, quero dizer-lhes que o estimado professor Lupin ficará afastado por tempo indefinido. Sua saúde não é das melhores, e ele encontra-se nesse momento na enfermaria.

Várias pessoas exclamaram surpresa, e dentre os vários sussurros que surgiram mais uma vez, Harry pôde notar vários olhares na direção do Rony. O amigo ficou muito desconcertado, e Harry foi capaz de entender por que. Provavelmente, aqueles que olhavam especulativamente para o Rony, estavam se perguntando se o culpado pelo professor Lupin estar na enfermaria não era o Rony. Afinal de contas, era muita coincidência o Rony voltar na mesma noite que Remo Lupin se fere...

 - E devido à falta de um professor substituto com emergência para a matéria de Defesa Contra as Artes das Trevas, – Dumbledore continuou, antes mesmo que os sussurros cessassem. – vocês terão esse período livre até as provas finais. Como o bom organizado que Remo Lupin é, todas as provas já estão prontas, e toda a matéria já foi dada, então não há com o que vocês se preocuparem. Outra coisa que eu queria mencionar, que com certeza alguns de vocês já perceberam, – Dumbledore olhou especialmente para a mesa da Sonserina, e Harry ficou confuso com a ação. – é que certos alunos nossos não estão entre vocês. E é com enorme pesar que eu informo que eles não mais se juntarão a nós. Normalmente, uma notícia como essa não seria dada em público, mas antes que se pense que algo tenha acontecido à saúde de Sebastian Sloan, Leonard Cranston e Harriet Hillard, eu quero informar-lhes que esses três alunos foram expulsos de Hogwarts por razões que não cabem serem aqui mencionadas.

A surpresa foi geral. Todos olhavam para a mesa da Sonserina, como que procurando os três alunos dentre eles, mas como era de se esperar, nenhum deles estava presente no Salão Principal.

 - E por conseqüência da expulsão de Sebastian Sloan, capitão do time de quadribol da Sonserina, não haverá a final de quadribol esse ano aqui em Hogwarts. A partida final seria Sonserina versus Grifinória, mas com a partida cancelada, a vitória é concedida à Grifinória, a que desde já é concedida a Taça de Quadribol de 1995/96. Parabéns ao time.

Todos aplaudiram educadamente, mas nem os membros da Grifinória tinham muita vontade de festejar. Está certo que era quase certeza que a Grifinória ganharia da Sonserina, e que taça já estava praticamente garantida, mas ainda assim, por algum motivo, a ocasião não pedia comemoração. Três alunos haviam sido expulsos! O único caso que Harry podia lembrar-se de expulsão em Hogwarts era a do seu amigo Rúbeo Hagrid... mas isso já devia fazer uns cinqüenta anos. O tom de voz e expressão de Dumbledore ao relatar o acontecido denunciavam que havia algo mais grave por trás dessas expulsões, e Harry decidiu que iria fundo atrás da verdade. Harry só via aquela expressão nos olhos do diretor quando o assunto era um: Voldemort.

Aos poucos, todos foram se retirando do Salão Principal, mas ainda com muitas dúvidas com relação ao que estava se passando. De uma só vez, ficaram sabendo que um aluno abduzido voltara, que havia um professor ferido e que três alunos haviam sido expulsos. A quantidade de especulações era assombrosa. E muitos olhavam estranho para o Rony. Fato tal que só fazia com que o menino se calasse ainda mais, e fizesse aumentar a preocupação de Harry, Gina e principalmente da Hermione com relação a ele.

Os quatro se direcionaram à sala que Hermione, Gina e Harry usaram enquanto planejavam chegar ao Rony. Como fora dito pela Gina, eles voltariam àquela sala com a presença do Rony, e juntos, eles arrumariam tudo. Nenhum dos quatro estava muito de bom humor, mas Rony parecia o mais distante dentre eles. Não que Harry o culpasse, afinal de contas só o próprio Rony sabia pelo que ele tinha passado, mas ainda assim Harry preferiria que o amigo simplesmente contasse tudo e voltasse a ser a pessoa alegre de sempre. Era estranhamente devastador vê-lo assim.

 - É... agora eu entendo o que vocês quiseram dizer com "bagunça". – Rony comentou sem muita emoção quando eles entraram na sala e encontraram tudo exatamente do jeito que deixaram.

 - O que tá acontecendo com você, hein, Rony? – Gina perguntou, dando voz ao que Harry, e com certeza a Hermione também, já queriam dizer há algum tempo. – Desde que você voltou, você não fala quase nada, e quando diz, é com esse entusiasmo todo! – Gina disse com sarcasmo, mas sorrindo para o irmão. – A mãe e o pai vêm hoje aqui pra te ver. E com certeza o resto da família vem também... Você não vai querer recebê-los assim, vai? – Gina aproximou-se do irmão, recostando sua mão no ombro dele e sorrindo-lhe mais uma vez.

Mas parecia que o sorriso de Gina só conseguia com que Rony ficasse ainda mais irritadiço, e Harry pôde ver que Gina se magoava com aquilo, ainda mais com o comentário de Rony.

 - E o que você quer que eu faça, Gina? Fique sorrindo pelos cantos, achando que tá tudo bem? – Rony perguntou nervoso e tirou o ombro de debaixo da mão da irmã. – Por que não tá tudo bem! Você não faz nem idéia pelo que eu passei! Não tem nem noção do que é ficar sabe-se lá quantos dias nas mãos de Comensais da Morte! Sim, porque até as contas de quantos dias passaram, eu já perdi faz tempo! Aliás, eu perdi qualquer noção de tempo, estando lá!

Harry notou que Rony machucara bastante a Gina com suas palavras, mas a menina recusava-se a deixar se vencer por isso. Gina respirou fundo e falou com uma voz controlada e séria.

 - Ainda assim não é motivo pra você descontar isso na gente. Nem eu, nem o Harry, muito menos a Mione merecemos esse desprezo que você tem tratado a gente. Eu não consigo achar palavra melhor pra descrever o seu comportamento. Não que a gente estivesse esperando muito de você, mas que pelo menos a gente pudesse ter trazido o Rony de volta. E esse que tá falando comigo não é o nosso Rony...

 - Azar, então Gina. Porque se você tava esperando outra pessoa, vai se decepcionar. Esse sou eu, quer você queira quer não. – As pupilas de Rony estavam tão dilatadas, que Harry mal podia ver o azul de seus olhos. Rony olhou tão profundamente para a irmã, e com tanta raiva, que Harry começou a realmente pensar se naquele momento Rony realmente odiava Gina.

 - Você fala como se fosse minha culpa! – Gina exclamou, seu rosto tão vermelho quanto o de Rony. Naquele momento os dois eram provas do famoso "curto temperamento Weasley".

 - E não é? – Rony perguntou, chocando a todos. – Por que outro motivo eu fui levado, senão pra servir de isca pra você? Pensa que eu não sei que o único motivo de eu estar lá era pra que você se entregasse? Que eu sofri o que sofri por causa de você? O Voldemort fez questão de me lembrar disso quase que diariamente!!!

Harry olhou pasmo para o melhor amigo. Só mais tarde ele viria a perceber que Rony deixara de dizer "Você-Sabe-Quem", e chamar Voldemort pelo nome. Naquele instante, Harry só conseguia pensar no que Rony dissera: que tudo aquilo era culpa da Gina. Como é que ele podia dizer isso?

 - É isso que você pensa? – Gina perguntou baixinho, não conseguindo mais conter as lágrimas. Rony balançou a cabeça positivamente e, naquele instante, Harry não conseguiu identificar nenhum traço de dúvida no gesto do amigo. – Se é isso mesmo que você pensa de mim, não vai ter nada que eu possa te dizer pra te convencer do contrário. E... eu sinto muito, Rony. Muito, muito mesmo! – A voz de Gina já falhava, e a menina deixou a sala chorando silenciosamente e de cabeça baixa.

 - Gina! – Hermione chamou a amiga antes que ela saísse de vez. – Você sabe que não é assim! De cabeça quente não se resolve as coisas... – Hermione procurava o que dizer, mas num raro momento não encontrava as palavras que queria.

Gina olhou mais uma vez pro Rony, que simplesmente abaixou a cabeça e virou-se de lado. Olhou para a Hermione, que parecia dividida entre sair com a Gina e conversar, ou ficar com o Rony e tentar resolver as coisas. E, finalmente, olhou para o Harry. Ele balançou a cabeça de um lado para o outro, como que em uma súplica para que ela não deixasse a sala, mas sabia que era em vão. Antes de virar-se mais uma vez para sair, Gina sorriu levemente para o Harry, e ele sabia que mais tarde poderia conversar com ela.

Assim que a porta bateu, Rony chutou com raiva alguns livros, e vários pergaminhos se espalharam.

 - Por que você disse isso, Rony? – Hermione perguntou. – Você sabe bem que não é assim! A última coisa que a Gina iria querer é que você fosse pego por culpa dela! Você não sabe como ela ficou--

 - Pouco me importa, Mione! – Rony respondeu gritando, e Hermione deu um passo para trás. – Eu não quero saber se ela chorou ou deixou de chorar! Pelo menos ela tava aqui dentro, dormindo no quentinho e comendo todas as refeições nos horários certinhos. Nem se compara com o que eu passei!

 - E o que você queria? – Hermione respondeu no mesmo tom de voz. Harry observava os dois discutindo e ouvia aquela gritaria em silêncio, por hora. – Que ela simplesmente deixasse de comer e fosse ir dormir no relento por simpatia a você enquanto você continuasse nas mãos do Voldemort? Que bem isso ia fazer? De que maneira isso resolveria o seu problema ou te traria de volta?

 - Não enche, Mione! Me deixa! – Rony respondeu, chutando mais alguns livros em meio à sua frustração.

 - É... talvez seja isso mesmo que eu tenha que fazer. – Hermione disse em um tom de voz bem baixo e também deixou a sala. Seus olhos cheios d'água assim como os de Gina.

Harry cruzou os braços e ficou olhando para o Rony, esperando qual seria a reação do amigo.

 - E você, Harry? O que tem de maravilhoso pra me dizer? – Rony voltou-se para o amigo com o rosto ainda mais vermelho.

 - Não bastou você dar patada na Gina e na Mione? Vai querer me afastar também? – Harry perguntou em um tom de voz neutro, esperando que o amigo se acalmasse.

 - Ah! Eu tô cansado disso tudo! – Rony exclamou, mais uma vez deixando transparecer toda a sua frustração.

 - Eu também, Rony. – Harry descruzou os braços e abaixou-se para recolher os papéis que estavam espalhados. – Mas eu não acredito que isso seja motivo para mandar a sua irmã e a sua namorada embora daqui; as duas chorando...

 - A Mione tava chorando? – Harry olhou para o amigo, e pela primeira vez o viu hesitar. Talvez ele estivesse se arrependendo do que fez.

 - Tava... E você teria percebido se não tivesse tão empenhado em machucar todo mundo à sua volta...

Rony ajoelhou-se do lado do Harry e o ajudou com os papéis. Harry pôde perceber que o amigo estava se acalmando, e achava sinceramente que o Rony não tivera a intenção de dizer nenhuma daquelas palavras duras, e agora lutava consigo mesmo, pensando em alguma maneira de desfazer o ocorrido.

 - Por que às vezes eu sou tão mula, hein, Harry? – Harry olhou para o amigo, que continuava a catar os papéis. Rony falava sério, e sua expressão mudou de raiva para arrependimento.

 - Só às vezes? – Harry perguntou sorrindo, e Rony retribuiu o gesto.

 - Eu não sei por que eu fiz isso! Eu juro que eu não queria fazer elas chorarem! – Rony largou os papéis e olhou exasperado para o Harry. – Mas sei lá... na hora, eu só queria machucar a Gina...

 - Fazer ela sentir um pouco do que você sentiu? – Harry perguntou, e Rony olhou para ele com as sobrancelhas erguidas.

 - Será que foi isso? – Rony perguntou com um sussurro, mais para si mesmo do que para o Harry. – Eu preciso falar com ela! – Rony disse, levantando-se demonstrando pressa. – Eu não sei quando você cresceu tanto e ficou tão sabido das coisas, Harry, mas obrigado! – Rony comentou muito sem graça, e ficou até ligeiramente corado. E sem esperar resposta, ele deixou a sala, provavelmente para ir atrás da Gina e da Hermione.

 - Nem eu... – Harry disse baixinho para ninguém, enquanto terminava de juntar os papéis e pôr pelo menos um pouco de ordem naquela sala. Mais tarde, quando os Weasley deixassem o castelo da visita que fariam para ver o Rony, os quatro poderiam voltar mais uma vez para recolherem suas coisas. E dessa vez, de preferência, sem discussões. As coisas já estavam ruins o suficiente sem que eles brigassem entre si.

Continua no Capítulo Cinqüenta e Sete...