Um beijo não é apenas um beijo
Capítulo Sete: O outro
Quando a gárgula que guardava a sala de Dumbledore fechou atrás deles, Harry começou a andar pelo corredor até a entrada para sair para a aula seguinte: herbologia. Ele parou ao notar que Rony não o acompanhava.
Ele se virou e viu Rony parado próximo à gárgula com uma mão na cintura e a outra segurando o pergaminho em sua frente. Ele estava com uma cara muito estranha.
"Rony, você não vem para Herbologia?" Harry perguntou, na esperança que estivesse errado em assumir pela cara de Rony que ele ia fazer perguntas sobre Hermione agora.
"Ainda não. Eu quero tentar uma coisa primeiro," Rony respondeu, olhando para o pergaminho, depois dobrando e guardando-o no bolso. Ele cruzou os braços e olhou desafiando Harry.
"O que foi?" Harry perguntou, sabendo o que estava por vir.
"O que foi? Hmmm. Acho que não vou responder isso por enquanto. Que tal isso: eu quero que você balance a varinha que tem nas mãos," Rony respondeu.
Harry respirou fundo e foi até onde Rony estava. Parando em sua frente, Harry segurou a varinha de Hermione e a balançou.
"Comparato Resonai," Rony disse.
Faíscas douradas brilhantes emanaram da ponta da varinha de Hermione. Rony e Harry olhavam a cena, maravilhados. Harry parou de balançar a varinha e as faíscas se apagaram. Rony puxou a varinha de Harry, que não resistiu.
"Foi o que pensei," Rony disse, colocando a varinha no bolso e cruzando os braços. Ele olhava para Harry como se esperasse que ele dissesse algo. Harry apenas o olhava, sem saber por onde começar.
Depois de um silencio desconfortável, Harry falou.
"Não sei por onde começar," Harry disse.
Rony descruzou os braços, seu rosto ficando vermelho, mas ao menos ele estava ouvindo.
"Aconteceu meio que por acidente," Harry continuou, encarando Rony.
"Acidente?" Rony perguntou, seu tom bastante descrente. "Você não pode beijar alguém por acidente, Harry. Ou está tentando dizer que você tropeçou e sua boca caiu sobre a dela?"
"Não exatamente."
"Certo. Bem, me parece que você tinha um plano. Você a levou para sala de Astronomia Avançada, Harry! Qualquer idiota sabe o que acontece lá! Você acha que eu sou tão burro assim?"
"Eu não planejei leva-la até a sala de Astronomia Avançada. Nós entramos lá pra fugir de Pirraça. Eu juro que é verdade Rony. Você mesmo pode perguntar a Hermione quando ela acordar," Harry disse rapidamente.
"Certo. Bem, eu não vou poder perguntá-la porque ela não vai lembrar de você, não é mesmo?" Rony disse nervoso.
"Ah... é." Harry disse calmo. A informação que Dumbledore dera ainda não tinha sido digerida direito. Mas agora ele se deu conta da verdade. Rony falava como se já estivesse decidido que Harry faria o contra-feitiço. Harry não sabia o que fazer; ele precisava de um tempo pra pensar. Mas tinha que fazer isso rápido, porque tempo não era uma coisa que ele tinha em abundancia para desperdiçar.
"Bem não acho que você vai acreditar em mim agora, mesmo que eu diga a verdade. Eu lamento por isso Rony, de verdade. Eu não sabia que isso ia acontecer," Harry falou, tentando olhar os olhos de Rony. Ele não disse nada. Ele apenas olhava para o nada.
"Eu tenho que ir," Harry disse, depois de uma pausa desconfortável. Ao invés de ir para herbologia, Harry decidiu deitar e pensar. Ele se encaminhou para seu dormitório, passando por Rony que ainda estava parado com os braços cruzados e olhando para o espaço.
*****
Rony esperou até que Harry fosse para aula. Ele se estava muito confuso com tudo o que sentia. Eu odeio ter quinze anos, pensou consigo mesmo, enquanto passava pelo corredor da entrada a caminho das estufas.
Por que Harry não foi honesto com o que sentia por Hermione? Mesmo quando se fazia essa pergunta, Rony descobriu a resposta. Ele provavelmente faria a mesma coisa se estivesse no lugar de Harry. Desde o quarto ano, Rony vinha notando como ele se preocupava com a proteção de Hermione. No início ele pensou que fosse algo de irmão, do mesmo jeito que ele protegeria Gina. Depois de pensar muito, ele percebeu que sua proteção aparecia quando ele tinha ciúmes de qualquer rapaz que a olhasse duas vezes. Ele não queria admitir para si mesmo conscientemente, mas em algum lugar no fundo de seu coração, ele secretamente desejava que Hermione fosse dele. Talvez Harry tivesse notado, e ficou acanhado de falar sobre isso.
Ou talvez ele fosse mais óbvio do que achava, Rony pensou. Sua respiração formava nuvens de fumaça enquanto ele andava até as estufas, lembrando de um fato na semana anterior que o fizera sentir ciúmes dela.
Rony estava esperando por Harry e Hermione na biblioteca uma noite, e ela entrou com Ernie McMillan. Eles conversavam animados sobre alguma coisa e ela lhe deu um pequeno murro no braço quando eles se separam e ela se dirigiu até onde Rony estava.
"Então, o que há com você e McMillan?" Rony perguntou.
"Ele estava contando uma coisa engraçada que aconteceu com ele outro dia. O Ernie tem um ótimo senso de humor," Hermione respondeu sorrindo.
Rony soltou a ponta de seu pergaminho, que se enrolou. "Ele não é tão engraçado assim, é?" Rony perguntou, tentando não soar muito ciumento.
"É, ele é sim," Hermione respondeu de um jeito firme. Ela estava tirando seu material e começando a estudar.
Então algo aconteceu que fez Rony querer pular na frente da mesa e protegê-la: Draco Malfoy veio andando até ela, apontando sua varinha.
"Então, Granger," ele disse no seu tom costumeiro, "pensou que ia me fazer passar por idiota na reunião de monitores de novo?"
"Eu não fiz nada disso. Mas se eu quisesse, provavelmente não seria muito difícil, Malfoy," ela replicou, sem nem olhar para ele. "Você oferece tantas chances, que eu provavelmente não teria que dizer ou fazer nada." Ela abriu "Eu sou de borracha e você uma cola – um guia de contra-feitiços" de Glenda Bounder que ela pegou para o dever de Defesa Contra Artes Das Trevas.
Rony olhou para expressão de Malfoy e uma idéia maluca se formou em sua mente, Malfoy sentia atração por Hermione? Ele não tinha o olhar malicioso e frio como de costume. No lugar, parecia que ele queria assassiná-la. Suas bochechas estavam vermelhas, seus olhos estreitados, e parecia que estava respirando mais rápido que o normal. Parecia que ela tinha irritado-o bastante, Rony pensou, segurando sua varinha em caso de precisar enfeitiçá-lo.
Uma das verdades universais que Rony conhecia desde que se entendia por gente era que existe uma linha muito estreita entre o amor e o ódio. As duas eram emoções fortes, e sua mãe sempre dissera para não usar nenhuma das duas para descrever o que sentia a não ser que ele realmente sentisse. A pergunta era quais eram as chances de Malfoy ter cruzado essa linha com Hermione? Não muitas. Mesmo assim, talvez ele estivesse imaginando coisas, mas Rony podia jurar que vira algo que antes não estava lá.
Ele ficou lá parado, a varinha apontada para Hermione, por mais alguns instantes antes de ir embora. Também atípico para Malfoy, ele não havia insultado a família de Rony como costumeiro ou provocado com a falta de dinheiro de sua família. Hermione continuou a ler seu livro, ignorando-o.
"Do que ele estava falando?" Rony perguntou, sem conter sua curiosidade.
"Malfoy se fez de idiota na frente de todos hoje na reunião de monitores e está tentando me culpar como sempre," Hermione respondeu.
"Ele sempre te culpa do que acontece?"
"Claro que sim, Rony. Ele tem inveja de minhas notas e de minha posição entre os monitores. Ele é muito competitivo. E como se não fosse o bastante, ele me discrimina por que meus pais são trouxas. Não importa que eu seja uma boa bruxa, ele sempre vai lembrar disso," Hermione falou, um pouco amargurada.
"É, você não tem que me lembrar do quanto ele é canalha," Rony disse. "O quero saber é se ele tem te culpado de mais coisas do que de costume ultimamente?"
"É, parece que ele resolveu me provocar mais recentemente, mas acho que é por que eu o vejo mais vezes por que nós dois somos monitores. Ele tem mais chances de mostrar a todos o quanto ele me despreza," Hermione disse num tom irritado. Ela se voltou para o livro, sinalizando para Rony que aquele era o fim da conversa.
"Canalha idiota," Rony disse em voz alta, abrindo a porta das estufas para sua aula de herbologia.
*****
Hermione olhou naqueles belos olhos verdes suplicantes e sorriu. Aqueles eram os mesmos olhos verdes que ela conhecia e amava por quase vinte anos, mas agora eles também pertenciam a seu filho de dois anos e meio, Jimmy.
"Mamãe, ´Manta não quer deixar eu colocar minhas maçãs," ele disse, indicando a cesta, frustrado, e olhando para ela.
"Bem docinho," Hermione respondeu, "Você está catando suas maçãs do chão, e algumas estão um pouco estragadas. Está vendo essas coisas marrons nelas?" ela apontou o ponto marrom na maçã que estava entre seus pequenos dedos. Ela o colocou em seu colo.
"Sim, mamãe, mas eu gosto delas," ele respondeu, olhando para ela com aqueles olhos meigos de novo. Ela penteou a franja preta pra um lado, para tira-las dos olhos, ele continuava olhando-a na expectativa.
"Bem, porque você não faz uma pilha com elas bem ali e talvez nós possamos usá-las para fazer cidra," Hermione tirou a maçã das mãos dele e a colocou no chão ao lado deles.
"Eba! Mamãe me deixou ficar com as maçãs!" Jimmy gritou de alegria, descendo do colo de Hermione e correndo para catar mais maçãs debaixo de uma árvore ali perto.
Hermione riu e olhou para Harry, que estava a uns dois metros do chão, pendurado precariamente em uma escada e se esticando para pegar uma maçã bem grande e vermelha. Ele ria enquanto Samantha estava no chão falando com ele.
"Isso, papai. Pegue essa. É tão grande e vermelha!"
"Estou quase lá, Sam," Harry falou para ela, um largo sorriso em seu rosto.
Samantha tirou os olhos de seu pai por um instante e olhou para Hermione. "Mamãe, por que o papai não pode usar a varinha?" ela perguntou, exibindo a mesma curiosidade que Hermione quando tinha quase sete anos.
"Bem, querida, o papai e eu gostamos de fazer as coisa do jeito trouxa às vezes. Pode ser divertido de vez em quando." Hermione respondeu a Samantha, ainda maravilhada de como a filha se parecia com ela quando era criança. Ela parecia uma versão miniatura de Hermione, a exceção dos olhos; ela, como Jimmy, também herdara aqueles lindos olhos verdes do pai.
"Peguei!" Harry gritou e Samantha pulava pra cima e pra baixo, batendo palmas e rindo junto com ele. Hermione também batia palmas e ria, virando a cabeça para checar Jimmy, que agora fazia um morro de uma boa altura com suas maçãs.
"Ei, Hermione," Harry gritou por ela, "Pega!" a maçã veio voando em sua direção e ela segurou habilmente. Samantha correu até ela, as mãos estendidas.
"Hmmm! Posso comer essa mamãe?" Samantha perguntou.
"Sim, Samantha, você pode comer essa," Hermione disse, entregando a maçã a filha. Samantha esfregou a maçã em seu casaco branco, sentou-se no chão e deu uma grande mordida.
Hermione olhou para Harry. Ele ainda estava no alto da escada, se segurando com uma mão, comendo uma maçã com a outra. Ele estava usando seu casaco verde acinzentado favorito que ela havia lhe dado há uns dois natais. Ela amava aquele casaco porque realçava o contraste entre seu cabelo negro e seus olhos verdes. Ele a encarou e sorriu maliciosamente.
"Ei, tenho algo pra você também," ele disse.
"É mesmo?" respondeu. Ela foi até o pé da escada. Ele desceu para encontrá-la. "Você pegou uma maça especial para mim também?"
"Não, eu não tenho uma maçã para você. Mas eu tenho isso."
Ele curvou a cabeça e a beijou intensamente, envolvendo-a em seus braços. O lábio dele estava melado e tinham o gosto da maçã que ele estava comendo. Ele riu e continuou a beijá-la, espalhando o suco de maçã pelo rosto dela.
"Harry!" Hermione exclamou. "Você… está todo… maçã..." ela deu um gritinho, tentando empurrá-lo. Ela só conseguiu atiçá-lo mais, porque antes que ela notasse, ele tinha enlaçado o pé direito dele atrás do esquerdo dela, levando-a ao chão, prendendo-a lá com seu corpo e ainda cobrindo-a com beijos melados, rindo.
Os beijos estavam muito bons e logo Hermione não estava mais resistindo. Ela notou uma mudança em Harry também, os beijos se tornando cada vez menos de brincadeira e mais sedutores. Era um dia frio de outono, mas ela estava ficando com calor, deitada ali no chão, seu marido a beijando.
"Papai e mamãe estão de beijo!" gritou Jimmy, que correu até eles e pulou nas costas de Harry, rindo. Harry e Hermione param de beijar e sorriram um para o outro.
"Eca!" disse Samantha, "de novo não!"
Antes de se levantar e ajudá-la a fazer o mesmo, Harry olhou nos olhos de Hermione e disse, "Vamos ter que terminar isso mais tarde." Sua voz tinha o ar ofegante que geralmente tinha durante os momentos mais íntimos deles.
"Estou contando com isso," Hermione sussurrou para ele. O corpo dela deu uma tremida involuntária de antecipação.
"É um encontro, Sra. Potter," Harry piscou para ela.
Enquanto eles arrumavam suas coisas, Harry colocando Jimmy nos ombros e Hermione segurando Samantha pela mão, Harry segurou a outra mão de Hermione, levou até os lábios e a beijou carinhosamente.
Ela olhou para ele e sorriu, dizendo com o olhar o quanto ele significava para ela.
"Eu te amo, Hermione Potter," ele falou suavemente, "Sempre amei e sempre amarei."
Na ala hospitalar onde Hermione Granger ainda dormia, Madame Pomfrey levantou os olhos. Ela pensou ter ouvido a jovem falar algo que pareceu "maçãs".
******
Harry foi andando distraidamente até seu dormitório. Ele estava tão distraído pelo que ouvira de Dumbledore e pelo que acontecera com Rony que ficou surpreso ao chegar ao retrato.
"Grama de limão," ele disse e a mulher gorda balançou para frente, permitindo o acesso ao salão comunal da Grifinória.
Ele nunca se sentira tão pra baixo. Encarava o prospecto de seus dois melhores amigos nunca mais falarem com ele – Hermione porque não se lembraria de quem ele era e Rony porque talvez nunca o perdoasse por beija-la. Além de tudo isso, o fato de saber que ela era o verdadeiro amor dele foi sufocado pela dura realidade de que ela nunca mais seria dele.
Não demorou muito para concluir que seu amor por Hermione não iria deixar que ela dormisse por dois anos, só pra depois de acordar ficar maluca pelo conhecimento do futuro. Ela ficava muito chateada quando perdia uma aula, ele não sabia o que aconteceria se ela acordasse no seu 17º aniversario e descobrisse que perdeu dois anos! Ele teria que fazer o feitiço e lidar com as conseqüências, não importando o quão doloroso seria. Talvez ele deixasse a cidade como os bruxos do passado faziam.
Com o coração pesado, Harry subiu as escadas de até seu quarto, tirando as vestes da escola, se preparando para ir para cama. Quando ele afastou as cortinas para se deitar, viu Edwiges sentada em seu travesseiro esperando por ele. Ela tinha uma carta e uma pequena caixa amarrada a sua perna, a qual ela esticou para que ele visse.
"Não sei se tem algo que você possa me dar para me fazer sentir melhor, Edwiges," ele disse triste, enquanto desamarrava a carta e a pequena encomenda de sua perna. Ela o olhou preocupada antes de sair voando pela janela do dormitório. Harry abriu a carta e leu:
Harry,
Você não respondeu a coruja que lhe mandei ontem, o que quer dizer que preciso falar com você imediatamente. Não pode esperar. Eu mandei uma coruja para Dumbledore e ele permitiu que você se juntasse a mim na casa do Lupin o mais rápido possível. Eu mandei uma pena chave de portal que vai te trazer até aqui quando você tocá-la.
Isso é muito importante, Harry. Te verei em breve.
Sirius.
Harry enrolou o pergaminho e pegou a caixa que continha a chave do portal, levantando-a até a altura dos olhos para ver melhor. O que Sirius queria? Devia ser algo relacionado à maldição. Sirius estava zangado por ele não ter respondido a coruja? Ele estava tão distraído pela doença de Hermione que não pensara no bilhete de Sirius desde que o lera.
Ansioso para ver Sirius, Harry pegou uma capa, abriu a caixa cuidadosamente e examinou a pequena chave do portal. Era um pedaço do melhor chiclete explosivo – ele riu da escolha de Sirius para chave de portal antes de toca-la com o indicador.
Instantaneamente, ele sentiu a estranha sensação de ser puxado pelo umbigo. A ansiedade intensa fazia seu coração bater tão rápido que era difícil respirar. A última vez que viajara usando uma chave de portal foi na noite da terceira tarefa. Memórias desagradáveis daquela noite agora se adicionavam a fila já cheia de sentimentos e pensamentos ruins em sua cabeça.
Depois de alguns minutos de um turbilhão de cores e de vento, ele pousou num chão acarpetado e caiu, sem conseguir se equilibrar. Algum dia, ele seria mestre em viagens por chaves de portais, e não ficaria caindo como um idiota toda vez que chegasse a seu destino, Harry pensou. Ele olhou pra cima e viu Sirius em pé com um sorriso no rosto. Sua ansiedade começou a diminuir.
"Harry!" ele disse, sua voz indicando o quanto o ele estava feliz em vê-lo. "Que bom que veio tão rápido. Venha aqui. Sente-se." Ele ajudou Harry a se levantar e indicou um sofá de couro marrom com aparência de velho.
Eles estavam numa sala que parecia ser de estudos ou uma biblioteca. Havia milhares de livros alinhados nas paredes. Tantos, que as paredes pareciam ser feitas de livros – e talvez fossem ele pensou. Enquanto Sirius o levava até o sofá, seus olhos pousaram sobre os móveis desalinhados que decoravam a sala. Achou engraçado um aquário cheio de água em um canto, um Grindylow nadando de um lado pra outro dentro dele. É, esse lugar com certeza era do Lupin.
Harry sentou no sofá, continuando a olhar a seu redor. Ele esperava rever o professor Lupin. A última vez que o vira foi no terceiro ano, quando Lupin se demitiu de sua posição de professor de defesa contra a arte das trevas. Harry ficou muito desapontado em ver o professor Lupin partir, e ainda o considerava seu professor favorito.
Sirius se sentou à frente de Harry numa cadeira de estilo da Rainha Ana, que parecia ter visto dias melhores. Como sempre fazia quando via Sirius, Harry percebeu o quanto ele parecia bem. Ele estava feliz em ver que ele parecia estar melhor do que da última vez que eles estiveram juntos. Seu cabelo estava mais curto e bem tratado e parecia que ele vinha tendo refeições decentes. Sirius se inclinou para frente na cadeira, os cotovelos nos joelhos e suas mãos fechadas sob seu queixo. Ele olhou para Harry com uma expressão preocupada, misturada com algo que Harry não conseguiu adivinhar o que era.
"Essa é a biblioteca do professor Lupin?" Harry perguntou.
"É. Infelizmente ele não está no momento. Ele está fora, fazendo consultoria para o pessoal que faz os NIEMs. Ele está ganhando algum dinheiro ajudando-os a corrigir os testes. É um bom emprego para ele, porque o mantém longe das pessoas e lhe dá tempo para ajudar na luta contra Voldemort."
"Ah," disse Harry desapontado.
"Talvez ele apareça mais tarde. Eu sei que ele gostaria de revê-lo," Sirius disse, ao ver Harry se desapontar.
"Mas não é por isso que estamos aqui. Não é mesmo, Harry?" Sirius se sentou direito em sua cadeia.
Harry olhou para seu padrinho, tentando não olhá-lo nos olhos. Ele esperava que Sirius não fosse lhe passar um sermão. Não enquanto ele ainda se sentia tão para baixo com os acontecimentos.
"Olhe Harry, preciso que me responda uma coisa. A mesma pergunta que lhe mandei por coruja: você beijou Hermione?" Sirius perguntou.
"Sim, fui eu," Harry disse, derrotado. "Mas eu não planejei nada, verdade. Só... aconteceu."
"Não pense que precisa defender o que fez para mim, Harry," Sirius disse, "Eu sabia que você tinha a beijado quando não respondeu minha coruja. Temos que falar sobre isso. É importante que saiba o que está acontecendo com sua amiga."
"Eu já sei," Harry disse olhando para ele, "Dumbledore falou comigo e com Rony sobre isso hoje pela manhã. Ele disse que é um tipo de maldição. Ele queria que tentássemos localizar o bruxo que a beijou. Acho que vou ter que dizer que fui eu."
"Sim, bem não se preocupe com isso ainda. Ele explicou como a maldição pode ser invocada e como ela é rara?"
Harry afirmou com a cabeça. Sirius sentou-se mais para frente em sua cadeira e olhou para Harry com uma expressão de pesar.
"Harry, eu sei que todas essas notícias devem ter sido muito chocantes. Tudo o que fez foi beijar uma garota e olhe o que aconteceu! Eu queria me desculpar, eu sinto como se fosse minha culpa você estar nessa situação."
Harry não acreditava no que estava ouvindo. Sirius estava pedindo desculpas? Por quê? Ele não tinha nada a ver com sua decisão de beijar Hermione, e seria impossível impedi-lo de qualquer jeito. Tudo o que ele podia fazer era ficar olhando para Sirius, confuso.
"Entenda," Sirius continuou, "eu devia ter avisado que isso poderia acontecer. Eu só não achei que na sua idade você seria... bem, esqueça isso. Vamos falar sobre isso depois. O que você precisa saber, o que eu quero você saiba antes de tudo é que sua família tem uma tendência natural de invocar essa maldição."
"Como você sabe?" Harry perguntou.
"Seu pai passou pela mesma coisa que você está passando nesse momento, quando ele tinha mais ou menos sua idade," Sirius explicou.
Nesse ponto, a cabeça de Harry parecia que ia explodir. Ele estava a beira de um ataque de nervos há algum tempo, mas essa declaração foi demais. Ele estava cheio.
"Bem, que ótimo Sirius," ele falou com raiva, "Isso ajuda muito. Obrigado pela informação. Com certeza vou contar a Hermione quando ela acordar- ah, mas espere um pouco, ah é mesmo, eu não vou poder contar porque ela não vai ter idéia de quem sou eu! Algo mais que devo saber sobre meus pais?"
Sirius deixou Harry respirar um pouco, antes de se levantar e sentar no sofá ao lado dele. Harry estava inclinado para frente, os cotovelos nos joelhos e as duas mãos apertando forte os cabelos. Seu rosto estava queimando de raiva, desapontamento, e outras emoções que ele não conseguia distinguir. Sirius tirou uma de suas mãos do rosto e olhou para ele.
"Harry, eu não vou fingir que isso não é difícil de escutar, mas vou dizer que tem outro jeito. Você me ouviu? Tem outro jeito de sair da maldição que Dumbledore provavelmente não te disse."
Harry olhou para Sirius, tirando a outra mão do rosto e inspirando devagar várias vezes para se acalmar. "O que? O que é?" Harry perguntou, ainda tentando se recompor.
"É um feitiço que vem sido passado pelas gerações dos Potter. Parece que vocês são um bando de Don Juans," Sirius disse, com um sorriso malicioso no rosto.
"Ha ha ha," Harry disse, com um pequeno sorriso também. Ele cruzou os braços e recostou-se.
"Olhe, a razão de Dumbledore não ter te dito é porque é meio ilegal," Sirius começou, "Claro, isso não impediu seu pai. Ele estava tão apaixonado por Lily que chegava a ser nojento. Eu costumava dizer, 'Pontas, tem certeza que ela é a única bruxa com quem quer ficar para sempre?'"
"Por que é ilegal?"
"Bem, existe uma pequena possibilidade do feitiço dar errado e você e Hermione morrerem."
"Então, por que eu devo fazer esse feitiço ao invés do que Dumbledore propôs?"
"Porque esse feitiço faz com que ela acorde na hora, mas continue lembrando de você. Ela não se lembra dos sonhos, então não fica preocupada em destruir o futuro. Você pode ter seu bolo e pode comê-lo também, exceto por uma pequena limitação," Sirius disse, terminando com um sorriso de pesar.
"E qual é?" Harry perguntou, sentando-se na ponta do sofá.
"Bem, vamos ver, como posso dizer isso da maneira mais educada... vocês têm que permanecer castos até que ela tenha no mínimo dezessete anos."
"Castos?"
"É, castos. Você sabe, sem relações," Sirius disse, olhando para Harry com o que aparentava ser pena.
"Ah," Harry disse, corando, "bem, eu não tinha planos de fazer nada disso por enquanto. Eu só tenho quinze anos. Obedecer a essa regra não deve ser tão difícil, não é?"
Sirius riu, "Fale comigo daqui a uns meses Harry. Queria que seu pai tivesse aqui para te dar algumas dicas em controlar a frustração. Ele era bom nisso, apesar de umas vezes a gente tivesse que segurá-lo, especialmente pouco antes do décimo sétimo aniversário de Lily. Mas você provavelmente não queria saber isso, não é?" Sirius riu de novo.
"Obrigado," Harry respondeu, corando até um tom profundo de vermelho.
"Então, de volta ao feitiço. Eu achei as palavras em um de meus cadernos velhos. Eu copiei caso precisasse – eu beijei várias garotas em Hogwarts e não queria estar despreparado. O feitiço é bastante complicado e requer dois bruxos para ser realizado."
"Dois? Por quê?" Harry perguntou.
"Você precisa de uma magia bem forte trabalhando juntos para superar a maldição. Você precisa de um bruxo que tenha alta ressonância com Hermione, como você tem – Dumbledore lhe falou sobre ressonância, não?"
"Ele falou. Depois eu fiz o teste e foi faísca dourada para todo lado."
"Como eu esperava. Essa é parte difícil, Harry: o bruxo que faça o feitiço junto com você também deve amar Hermione. Isso não é fácil de achar e alguns bruxos não conseguem fazer o feitiço por não acharem alguém para fazer com eles. E se essa pessoa existir, ele deve estar livre de qualquer maldade contra vocês dois em seu coração. Se ele hesitar, mesmo um pouco, pode virar um feitiço fatal contra você e Hermione."
"Então é só isso? Tudo o que tenho que fazer é achar esse bruxo, se é que ele existe, e convence-lo a fazer o feitiço? Bem deve ser fácil, não é? Mais alguma coisa que devo saber?" disse Harry, cheio de sarcasmo.
"Na verdade, tem outra coisa que você precisa fazer," Sirius disse, olhando para ele preocupado. "Tem uma poção que deve ser usada em conjunto com o feitiço. Vocês três devem tomar antes de fazer o feitiço. Ajuda a aumentar a ressonância mágica envolvida para que possa ser usada para contra-atacar a maldição. Infelizmente, procurei em todo o canto e não achei a receita da poção. Acho que o livro que a contem não é mais publicado. O outro bruxo que fez o feitiço junto com seu pai fez a poção, se me lembro bem."
"Quem era o outro bruxo?"
"Gostaria de saber. Seu pai não me disse, ele não disse a ninguém. Não tenho idéia de como o encontrou. Você devia ver, a gente correndo por todo lado de Hogwarts testando bruxos com a varinha de Lily, foi muito engraçado. Mas quando o encontramos, a condição para sua cooperação era que seu pai não revelasse sua identidade para ninguém. Ele manteve a palavra."
Harry tentou não pensar em como seria difícil achar o outro bruxo requerido para esse feitiço. Isso parecia cada vez mais impossível.
"Sobre a poção Harry, acho que pode encontrá-lo em um livro em Hogwarts."
"Hmmm. Talvez Hogwarts o tenha na seção restrita. Droga, gostaria que Hermione não estivesse dormindo. Ela saberia onde encontrá-lo."
"Bem, vai ter que fazer o que puder sem ela por enquanto. É melhor investigar o quanto antes. O nome do livro é: Poções Ilegais: guia para magos. Aqui- eu tenho tudo anotado nesse pergaminho." Sirius entregou um pergaminho a Harry, que o dobrou e guardou no bolso.
"Então, vai me contar sobre o beijo?" Sirius disse, bebendo um pouco de sua cerveja amanteigada.
Harry arregalou os olhos. Ele não queria contar a Sirius algo tão pessoal. Mas a quem mais contaria? Ele tomou um gole generoso de cerveja amanteigada e limpou a boca com a mão.
"Foi muito bom," Harry disse, tentando esconder um sorriso.
"Sim, continue," Sirius disse, cutucando-o.
"Bem, eu nunca tinha beijado uma garota antes e foi bastante intenso."
"Aposto que sim. É preciso mais que um selinho para invocar essa maldição. Você deve ter dado um baita beijo, Sr. Potter."
Harry corou. Ele não queria dizer mais nada.
"Bem, não vou pedir os detalhes sórdidos," Sirius continuou, "Isso é entre vocês dois."
"Obrigado," ele disse aliviado.
Sirius se mexeu no sofá, desconfortável. Harry enrugou a testa, se perguntando porque Sirius pareceu tão desconfortável de uma hora para outra.
"Então, Harry," Sirius começou, "tem outra coisa sobre a qual precisamos conversar." Ele parou.
"O que?"
"É sobre dar uns malhos. Alguém lhe falou sobre isso, além de seus amigos?" Sirius perguntou, tomando um grande gole de sua cerveja amanteigada.
Harry riu. Por isso Sirius estava tão desconfortável. Para ser franco, ele também estava bastante desconcertado.
"Eu acho que sei o suficiente, obrigado, Sirius," Harry respondeu, tentando esconder o quanto se divertia com o desconforto de Sirius e tentando esconder o próprio desconcerto.
"De onde aprendeu?"
"Quando eu tinha dez anos, tivemos uma aula sobre isso e o resto aprendi com meus amigos. Temos que falar sobre isso agora ou melhor, temos mesmo que falar sobre isso?" Harry disse, tentando acabar com aquela conversa desconfortável.
"Sim, precisamos falar sobre isso agora – apesar de você poder só ouvir se prefere não discutir. Tem algumas coisas que precisa saber sobre o amor entre um bruxo e uma bruxa, Harry," Sirius disse.
Harry rolou os olhos. Ele já ouvira outra versão dessa conversa na aula que ele mencionara. Apesar do desinteresse em onde essa conversa ia, ele decidiu mostrar um pouco de paciência com seu padrinho e ouvir educadamente.
"Então, o que preciso saber?" Harry perguntou, largando sua cerveja amanteigada e olhando para Sirius na expectativa.
Sirius passou meia hora falando com Harry sobre sexo. No futuro, ao pensar na discussão, ele se lembrava ter se sentido muito constrangido, mas também grato a seu padrinho por ter a coragem de ajudá-lo a entender algo importante. Ele não ficou surpreso por nada do que Sirius lhe disse, mas aprendeu uma coisa ou outra que não sabia. Algumas das novas informações envolviam conhecimentos que ele nunca poderia obter em uma aula trouxa.
"Existem feitiço, a maioria de magia negra, que só podem ser invocados durante o ato. Espero que nunca tenha que fazer nenhum deles, Harry porque são muito perigosos e têm conseqüências desastrosas quando dão errados. Veja bem, quando um bruxo e uma bruxa ficam juntos desse jeito, suas magias se misturam por um instante, e às vezes coisas inesperadas podem acontecer."
"Como o que?" Harry disse, um olhar quase assustado em seu rosto.
Sirius riu, "eu não queria te assustar, Harry. Essas coisas inesperadas geralmente são muito boas." Sirius adquiriu uma expressão nostálgica em seu rosto. "Você verá um dia." Ele deu um murro no ombro de Harry, como Rony tanto fazia.
"Bem, é melhor você ir, a não ser que tenha mais alguma pergunta para mim," Sirius disse, levantando-se.
"Na verdade, preciso de seus conhecimentos em uma coisa," Harry disse, pondo-se de pé.
