Capítulo 1 - Sigillaria
- Entra! Vai! Entra! - dizia Rony entre os dentes tentando colocar uma Anêmona Dançarina para dentro da estufa de Herbologia.
- Força, Rony! - exclamou Harry empurrando a porta.
- Não consigo! Ela... cresceu... demais... Entra! - Rony fez um esforço maior e conseguiu empurrar a planta para dentro. Harry trancou rapidamente a porta e os dois caíram sentados no chão, cansados pelo esforço que fizeram.
- Obrigada! Obrigada! - dizia a professora Sprout muito contente - Eu disse a Flitwick... As anêmonas são muito nervosas, se as fizer crescer demais não conseguirá controlá-las, elas parecem não cansar nunca.
Rony e Harry ainda arfavam, tiveram que ir rodopiando com a planta da Sala de Feitiços até a estufa. O professor Flitwick queria aprender alguns passos de dança e aumentou a anêmona magicamente para ensaiar com ela. Mas ela cresceu demais e ficou nervosa, o contra-feitiço não funcionou e ele não conseguiu fazê-la voltar ao normal. Apavorado, Flitwick chamou a professora Sprout e ela (espertamente) pediu a dois "dedicados" alunos (Harry e Rony) que passavam por lá para ajudarem a levá-la até as estufas.
- Pela ajuda de vocês, Grifinória ganhará vinte pontos. - disse Sprout sorridente - Agora podem ir, tentarei acalmá-la, aí quem sabe o feitiço funciona.
Os Grifinórios atenderam a professora e se foram para o castelo.
- Da próxima vez, deixarei o Flitwick se virar. Estou tonto até agora de tanto rodopiar. - afirmou Rony fazendo voltinhas com os dedos.
- Pelo menos ganhamos os pontos, Rony. E eles nem perguntaram o que fazíamos por lá. - disse Harry contente.
- E o que faziam? - indagou uma fria voz vinda de trás deles.
- Professor Snape! - exclamaram os dois assustados.
- Eu... nós... - Harry não sabia o que dizer - Nós não fazíamos nada de mais, apenas... passeávamos.
- Nada de mais? - retorquiu Snape - Então acham que andar pelos corredores de Hogwarts tarde da noite não é nada de mais? Certamente vocês... - Snape foi interrompido por um estranho grito de um animal.
Ele se virou e viu um morcego vindo em sua direção, Harry e Rony acharam que ele ia atacar o professor, mas Snape apenas olhou para ele e estendeu a mão pegando uma carta que o animal trazia em suas patas.
- Obrigado, Vladmir. - disse Snape e olhou a carta conferindo o remetente. Vladmir era seu morcego de estimação, quando alguma correspondência chegava e Snape não estava em sua sala, ou no refeitório, Vladmir a pegava e levava até ele. O morcego parecia saber sempre onde estava seu dono.
- Bem, isso é mais importante que vocês. - Snape se voltou a eles - Amanhã verificarei o que faziam. Podem ir para sua casa. - os garotos ficaram contentes e iam saindo - Ah... E antes que eu me esqueça... vinte pontos a menos para Grifinória. - Snape lhes deu as costas e voltou para as masmorras com seu morcego.
- Droga! - praguejou Rony - Ele tinha que aparecer! Maldito!
- Bem... pelo menos não ganhamos detenção. Vamos embora.
Snape entrou em sua sala, abriu a carta e a leu com certa satisfação. Pegou alguns ingredientes e começou a fazer uma poção.
As aulas de Herbologia do sexto e do sétimo ano, tiveram que ser dadas em outras estufas, pois a da anêmona estava interditada. A anêmona ainda estava muito nervosa e nem Sprout conseguiu acalmá-la.
- Isso mesmo, Longbottom! - exclamou Sprout contente com seu melhor aluno - Retirou-as com perfeição. Alguém mais conseguiu fazê-lo sem quebrar o caule? - ela olhou em volta e constatou que não. - Tudo bem, no começo é difícil, mas se acostumarão. As Rhyneas são sensíveis mesmo quando estão verdes, mas após secarem, ficam resistentes e são ótimas para guardar varinhas. Pode-se bater o quanto quiser nelas que não se quebram. O que é ótimo para levar as varinhas em viagens difíceis. - ela pegou a planta que Neville arrancara e a examinou atentamente.
- Cinco pontos para Grifinória, senhor Longbottom. - Herbologia era a única matéria em que o pobre Neville ia se saía bem e diga-se de passagem, muito bem.
- Professora... e esta aqui? Também podemos arrancar? - indagou Simas Finnigan.
- Não, senhor Finnigan. Esta é uma Hormeophytea, deve crescer mais até chegar a ponto de ser arrancada.
- Mas são iguais! - exclamou Dino Thomas.
- Não, não, não! - discordou Sprout - Alguém saberia me dizer qual a diferença entre elas? - a classe toda ficou muda, nem Neville e nem Hermione sabiam.
- As Hormeophyteas, assim como as Rhyneas, têm caules cilíndricos e dicótomos com aproximadamente cinqüenta centímetros, mas possuem, além disso, um rizoma tuberoso e esporângios geminados. - disse alguém à porta da estufa.
Todos os alunos se voltaram à porta para ver quem respondera a professora com tantos termos técnicos.
- Flora! - exclamou Sprout surpresa e correndo de braços abertos até a moça.
A professora parecia feliz, ria e abraçava a moça com intimidade. A moça era bastante alta e jovem, tinha cabelos castanhos, olhos esverdeados, pele dourada de sol e uma boca rosada que dava um largo sorriso à professora.
- Flora, querida, pensei que chegasse amanhã! Que bom vê-la!
- Professora Sprout, também é muito bom para mim vê-la novamente. Eu consegui chegar a Hogsmeade pela manhã, não pude esperar e vim logo para cá matar as saudades.
- Que bom! Dumbledore deve ter gostado, você é bastante aguardada, Flora.
- Bem... eu ainda não o vi. Não resisti e vim às estufas primeiro. - as duas riram e começaram a conversar ignorando os alunos, até que a professora percebeu a falta de educação.
- Perdoe-nos, senhores! Gostaria de lhes apresentar a melhor aluna de Herbologia de Hogwarts, de todos os tempos. Nunca ninguém entendeu tão bem os princípios das plantas mágicas, sua utilização, propriedades...
- Professora Sprout! - disse a moça corando - Por favor, está me deixando constrangida. - a professora sorriu para ela - Bem, senhores, eu gostaria que me chamassem de Flora.
Os alunos sorriram cumprimentando a moça, que era muito bonita e simpática e deveria ter uns vinte e cinco anos. Ela trajava um belo e longo vestido verde, todo desenhado de florzinhas brancas. Seus cabelos estavam presos no alto, mas uma cascata de fios e flores brancas lhe caíam até os ombros. Ela tinha uma expressão de alegria e frescor que deixou os garotos encantados.
- Vamos, vamos, vamos, voltem ao trabalho, tentem tirar pelo menos uma sem quebrar. - disse Sprout fazendo-os voltar à aula - A diferença da Hormeophytea é que suas raízes também podem usadas como guarda-varinhas, mas trabalharemos com elas outro dia.
- Professora, agora devo ir a Dumbledore. Apenas queria vê-la antes.
- Tudo bem, querida, depois nos falaremos. - Sprout deu um beijo estalado em Flora e a moça saiu.
- Viu só que linda? - disse Simas puxando o caule de uma planta.
- Vi! Que princesa! - concordou Rony.
- Acho que já vi a foto dela em algum lugar. - disse Hermione pensativa.
- Deve ser de algum livro de ex-alunos Mione, você vive remexendo neles. - disse Harry - Sprout disse que ela estudou aqui.
- É. Deve ser.
- Neville, você já ouviu falar nela?
- Não, Rony, assim pelo primeiro nome não. Mas... agora vocês viram que há gente interessante que gosta de Herbologia.
- Interessante? - exclamou Dino - Põe interessante nisso!
- Flora, é muito bom tê-la conosco novamente. Que bom que pode vir antes, assim os alunos a conhecerão antes do fim de semana. Sei que lhes causará uma boa impressão. - disse Dumbledore fazendo a moça corar - Será apresentada logo mais, durante o jantar.
- Obrigada, professor Dumbledore. Mas antes eu gostaria de tratar de outro assunto, é importante.
- Eu sei, eu sei. Pode ir, fique à vontade. Ele foi avisado que chegou e irá para sua sala assim que terminar a aula. A senha é Olho de Basílico. Você sabe o caminho, não?
- Bem, se é o mesmo de quando estudei aqui, conheço sim. Com licença!
Flora deixou a sala de Dumbledore e foi pelo castelo. Realmente, estava tudo do mesmo modo de quando ela partiu de lá, há dez anos, para terminar seus estudos na Escola de Magia e Bruxaria da Amazônia, no Brasil. Ela sempre fora fascinada pelas plantas e no Brasil havia a maior diversidade delas em todo o mundo.
Flora se formara há oito anos e desde então vivia no Brasil e sempre viajava pelo mundo a trabalho, estudando, catalogando e descobrindo novas plantas e novos usos para elas. Agora ela voltava a Hogwarts para pesquisar algumas plantas agressivas na Floresta Proibida. Ela andou, andou e chegou a uma porta.
- Olho de Basílico. - a porta se abriu e ela entrou, pode constatar que tudo estava como o resto do castelo, exatamente igual. Ela andava se recordando do tempo que fora estudante e que morria de medo de ir até lá, assim como todos os seus colegas. Ela também pode ouvir a voz do dono daquela sala, ele dava aula na sala ao lado. A voz dele era forte e imperiosa, o que fazia todos os alunos ficarem em silêncio. Quantas vezes ela tremeu só em ouvi-la, ela ficava desconcertada quando ele a olhava na sala de aula e lhe dirigia a palavra.
- "Senhorita Fala-Com-As-Plantas-Sommer, deve se dedicar mais às aulas, não são apenas de ervas que são feitas as poções". - lembrava ela.
- "Como eu era boba. Tremia só em vê-lo. - pensava Flora observando a estante de livros - Mas agora... já estou crescida e não mais uma aluna avoada e desastrada. Sei me controlar".
- Senhorita Sommer! - uma voz fria chamou-a da porta.
Flora tremeu todinha, não podia acreditar naquilo, estava novamente com aquela sensação que a perseguiu durante anos. Ela tentou se controlar e se virou para ele.
- Professor Snape... boa tarde! Desculpe-me ter invadido, mas o diretor me deu a senha e disse que eu poderia...
- Tudo bem, senhorita. Eu já a esperava aqui. - Snape guardava alguns ingredientes em um armário, sem ao menos olhar para ela - Recebi sua carta, descobriu uma propriedade... interessante em uma planta, não foi? - ele sentiu um agradável cheiro de flores.
- Sim, professor. - afirmou Flora - A Associação de Herbologia me informou ano passado que, caso eu soubesse de alguma planta relacionada a lobisomens comunicasse ao senhor. Eu a conheço e como vinha a Hogwarts fazer uma pesquisa... - Snape se virou e finalmente a viu, ela se calou e esperou que ele falasse, mas ele não falou, apenas a olhou e fez uma expressão de surpresa e admiração. Ficou assim durante alguns instantes, percebeu que ela não era mais aquela garotinha de dezesseis anos que fora sua aluna. Ela crescera e muito.
- Mudou muito senhorita... Sommer.
- Bem... Depois de dez anos... - ela ficou constrangida e baixou a cabeça, como sempre fazia quando ele a repreendia nas aulas.
- Então... o que tem a me dizer sobre a planta? - ele foi direto ao assunto que a levara lá e parecia ansioso por aquilo.
- Bem eu... - hesitou ela - trouxe esses livros e tratados. - Snape lhe indicou uma grande mesa. Flora ia colocá-los na mesa, mas deixou que caíssem no chão. Snape a ajudou a recolhê-los
- "Desastrada. Continua desastrada" - pensou o professor. Após colocarem os livros sobre a mesa, Flora começou a falar.
- Há um ano atrás, quando estive no Uzbequistão, estudei a Pleuromeialia. - ela mostrou uma gravura da planta.
- Os nativos de lá, costumavam utilizá-la para espantar o lobisomem, o que, como pude constatar, não funcionava muito bem, pois a criatura às vezes atacava até mesmo com ela. Pesquisei um pouco mais e descobri que era por causa dos esporófitos finos dela, que saíam diretamente do caule e por ela ter esporos tipo trilete, o que a faz perder a força depois da primeira lua cheia que recebe. Mas, - ela pegou outro livro e o abriu - fiquei curiosa e estudando melhor a divisão das Licófitas, encontrei em outra ordem, a das Lepidodendrálias, um gênero muito interessante. O das Sigillarias, elas têm cerca de trinta metros de altura e um caule que chega até um metro de diâmetro. Os seus ramos terminam em tufos de folhas alongadas que podem ter um cordão vascular duplo, no caso Sigillariopse, ou um feixe vascular único, as Lepidonphylloide. - Flora falava e apontava as gravuras para Snape que a olhava sem entender nada - Suas almofadas foliares são hexagonais e... - Snape não se conteve.
- Senhorita Sommer, agradeço sua ajuda, mas... será que pode falar minha língua? - pediu ele impaciente.
Flora corou, depois de tanto tempo entre estudiosos e pesquisadores, usava termos técnicos e complicados como se fossem língua comum.
- Perdoe-me, professor Snape eu... - Flora pensou um pouco e enfim disse - Esta planta, talvez possa ajudá-lo. - ela indicou uma gravura da planta no livro - As folhas dela, quando cozidas em infusão de losna doce, desprendem uma substância que inibe o lobisomem, mas se tomada em grande quantidade pode matá-lo... É isso que quer? - indagou receosa.
- Não! Absolutamente! Quero apenas descobrir um meio de fazê-lo controlar melhor a transformação. Ele... pode tomar uma poção que o faz controlar seus instintos assassinos, mas seu corpo sofre muito.
- Bem, então é só tentar utilizar em pouca quantidade durante o processo. O senhor fez a infusão que pedi na carta?
- Sim, fiz. Ela está bem aqui. - Snape pegou no armário um vidro com um líquido vermelho escuro, ia entregar a ela, mas achou melhor não - Deixei curtir durante duas noites, por sorte era lua-cheia quando me mandou a carta.
- Agora devemos misturar as folhas cozidas de Sigillaria a ela.
- Onde eu as encontro?
- Eu as trouxe. - a moça abriu a pequena valise que trouxera consigo e tirou várias folhas dela, mais do que caberia na valise, mas ela fora aumentada magicamente e parecia haver uma floresta inteira nela. - Veja, este maço é de um tipo e este de outro. - Flora se aproximou dele e mostrou a diferença - Consegue ver o cordão vascular? Aqui no meio... - Snape baixou a cabeça e viu um fio oco e fibroso - Este é único, o outro é duplo. - ele pode ver dois fios ocos no outro - A diferença na infusão é que o duplo é mais forte e deve ser cozido na luz minguante e não na nova, portanto deve-se ter bastante cuidado com ele.
Snape pegou os maços de folhas e as observou, eram iguaizinhas, exceto por aquele minúsculo detalhe que ninguém parecia notar, somente Flora e seus companheiros Herbólogos.
- Quanto tempo elas devem cozinhar?
- Por cinco noites seguidas. Depois devem cozinhar por mais duas noites de lua cheia como a infusão, aí poderá ser misturada a ela.
- Muito bem, tentarei então.
- Professor... é... para quem irá dá-la?
- Digamos que tenho um... amigo que sofre muito com isso e... eu gostaria de ajudá-lo.
- "Remo!" - pensou Flora - Ah! O senhor é um bom amigo então. Mas como ele consegue se controlar... digo, o senhor disse que ele toma uma poção.
- Sim! A Poção Mata-Cão. Ele tem que tomar todos os meses, assim não sai matando por aí, mas não é qualquer um que sabe fazê-la e... a vida dele é muito miserável, vive como homem e como fera. É realmente deprimente a situação dele. - Snape olhou para Flora e percebeu que ela lacrimejava, ela sempre fora sensível e chorona, parece que não mudara em relação a isso - Bem, senhorita, não quero aborrecê-la com esses assuntos, agradeço sua ajuda e... peço segredo, não quero que saibam sobre esse... meu amigo.
- Certamente, professor, não direi nada a ninguém. - afirmou Flora - Entendeu a diferença das duas então? - Snape ergueu os dois maços, um em cada mão.
- Este é na lua nova - disse sacudindo uma mão - e este na minguante. - agora sacudindo a outra.
- Não! - exclamou ela sorrindo - Este é na nova e este outro na minguante.
Snape franziu a testa, se confundira e não via mais a diferença entre elas.
- Acho melhor a senhorita etiquetar para mim. Quero começar a fazê-la hoje mesmo. Esta noite é a primeira lua minguante.
- Claro! Eu já deveria ter feito isso antes. - Flora abriu novamente sua valise, retirou de lá algumas etiquetas, uma pena e começou a escrever.
Sem que eles vissem, uma espécie de trepadeira começou a sair da valise e se agarrou ao vestido de Flora, ela subiu, subiu e se enroscou no cabelo dela.
- Jeanie! - exclamou Flora tentando desenroscar a planta de si, mas quanto mais ela puxava, mais a planta se agarrava a ela - Solte! Vamos, solte! - Snape a olhava confuso, ela poderia facilmente arrebentar a planta, mas ela parecia muito resistente e insistente - Vou ficar zangada... Vamos, desça, agora! - a planta obedeceu e desceu ao chão - Vamos! Saia já daí, quero vê- la. - disse Flora olhando para a valise.
Então um emaranhado de galhos e folhas foi saindo da valise e espalhando pelo chão da sala de Snape. Ele ficou admirado com o tamanho da planta, então viu um bulbo sair vagarosamente da valise e se aproximar de Flora, erguendo alguns galhos para ela.
- Que absurdo, Jeanie! Eu havia dito que você ficaria no Brasil até a minha volta. Como pôde fazer isso? Esconder-se na valise! Você está a três dias sem sol e sem água e se eu não a abrisse? Você poderia morrer aí dentro e o que eu diria a Duarte? Ele é o seu dono, sabia? Nunca mais faça isso entendeu? Não!!! De modo algum... Você não vai... Comporte-se, Jeanie... - ela ralhava séria com a planta que se abaixou e pareceu "envergonhada". Flora apontou para uma janela - Agora vá! Lá fora há um jardim com uma fonte, fique lá e se esconda, se eu ouvir alguém falar qualquer coisa sobre você, a despacho sozinha para Duarte... E não retruque!
A planta se arrastou até a janela, a abriu e deslizou pelas paredes do castelo até o jardim. Flora então não pode se conter começou a rir descontroladamente. Snape a olhava ainda espantado, aquela garota ainda tinha a mania de ficar falando com as plantas.
- Senhorita... - tentou dizer Snape, mas Flora ria sem parar - Senhorita... - ela nem percebia o professor lhe falando, Snape se zangou e falou alto e secamente:
- Senhorita Fala-Com-As-Plantas-Sommer!
Flora parou de rir. O chamado ríspido de Snape a chamara a razão.
- Perdoe-me professor... eu...
- Vejo que não perdeu a mania, senhorita, de ficar falando com as plantas.
Flora se zangou também, pôs as mãos na cintura e respondeu:
- E nem o senhor de ficar me chamando desse jeito. O que eu faço não é mania. Eu "falo", "converso" com as plantas e sou muito bem entendida. - Snape obviamente não acreditou, mas não disse nada e apenas entortou a boca. Ela percebeu sua grosseria e se envergonhou - Eu... desculpe-me professor... e-eu não queria gritar c-com o senhor.
- Tudo bem, senhorita. Não precisa se desculpar, não estuda mais em Hogwarts, não sou mais seu professor e não posso mais lhe dar detenção ou retirar pontos de sua casa.
Flora sorriu. Quantas vezes ele a pegara conversando com as plantas no jardim e só por isso lhe dava detenção.
- Eu disse algo engraçado, senhorita?
- Não, professor. Eu apenas me lembrava de quando estudei aqui. - Flora começou a recolher suas coisas e fechou a valise - Agora já que estão etiquetadas, não há como confundir. Espero que consiga professor. - eles ficaram se olhando durante longos segundos, até que Snape falou:
- O que era aquilo?
- Aquilo? O quê?
- Aquela planta! O que era?
- Ah! - Flora sorriu novamente e Snape achou que ela ficava muito bem assim. - Jeanie! Ela é uma Lupulélia Bulbensis Cycadeoideaceae, quero dizer... uma trepadeira de bulbo submerso. Ela pode ficar tanto fixa a terra, quanto em muros ou árvores. Geralmente elas não se movimentam muito, mas Jeanie é terrível. Fica sempre grudada a mim e me segue para onde vou.
- Por quê? - Snape estava curioso.
- É porque essas plantas são como as aves, acham que o primeiro ser vivo que vêm é sua mãe. Quando o bulbo de Jeanie floresceu a primeira vez eu estava próxima e... Ela me adotou, mas foi um engano. Duarte e eu não estávamos quando ela nasceu. Ele estava tão ansioso por Jeanie, queria ser o "pai" dela, mas ela se adiantou e quando floresceu ele não estava. Nós havíamos saído para fazer compras e quando chegamos, eu entrei primeiro em casa e ela me viu.
- Então a senhorita... é "mãe"? - disse Snape não contendo um pequenino sorriso. Flora sorriu mais ainda.
- Eu tento convencê-la que não, mas realmente ela parece um bebê. Duarte me pediu para que a afastasse, mas é tão difícil.
- Este... senhor Duarte, é... seu... - Snape sabia das modernidades dos bruxos brasileiros.
- Duarte é meu grande amigo. Ele também é brasileiro e eu o conheci assim que fui para lá estudar no Colégio da Amazônia. Ele além de conhecedor de plantas é quem faz as poções na nossa equipe de pesquisa.
- A senhorita teve muita sorte. Sempre foi boa em Herbologia e foi convidada para estudar lá onde há os melhores professores e pesquisadores do ramo. Sem falar nos espécimes. - observou Snape. Flora ficou meio sem jeito, baixou a cabeça e pigarreou tentando disfarçar.
- Realmente lá é incrível. - afirmou Flora - Há tantos tipos de plantas e descobri tantas propriedades maravilhosas. - Snape indicou uma cadeira a ela, ambos se sentaram. Flora começou a contar de tudo o que descobrira lá e dos lugares por onde andara. Ela falava com muito entusiasmo e sorria bastante.
Snape concluiu que ela realmente havia mudado, antigamente ela era tão quieta e calada. Ele jamais a vira lhe dirigir a palavra sem gaguejar, nem mesmo para responder as suas perguntas na sala de aula. Sem contar que ela vivia chorando pelos cantos do castelo. E agora ela sorria maravilhosamente. Fisicamente então parecia ser outra pessoa. Flora sempre fora bastante alta durante a infância e a adolescência e agora devia estar medindo pelo menos um metro e oitenta de altura, mas ao contrário de antes não parecia desengonçada e nem magricela. Seu rosto era quase o mesmo, mas estava mais harmonioso e sua boca já não parecia mais um rasgo enorme. Ela mudara sim e para melhor. Os dois ficaram lá por um bom tempo, contando pequenas histórias sobre seus estudos uma para o outro. Riram (Snape só sorria), trocaram impressões e descobertas, nem pareciam a aluna e o professor de dez anos atrás. Eles estavam totalmente envoltos na conversa, quando alguém bateu a porta. Snape se levantou e a atendeu, era a professora Sprout.
- Snape, por favor, Flora está aí? - perguntou a professora ansiosa.
- Sim, está! - afirmou ele. Sprout levou a mão à boca e arregalou os olhos.
- Ela está bem? Não houve nada? Você não a... - Sprout não pode continuar. Snape lhe lançou um olhar frio que quase a petrificou.
- Se acha que eu a prendi, a torturei e depois usei partes de seu corpo para fazer uma poção está enganada, Sprout. Ela está ali, no fundo da sala.
Sprout entrou, viu a moça mexendo em alguns frascos e ficou aliviada. Flora estava bem.
- Flora, querida! - exclamou Sprout indo até ela. Flora se assustou e derrubou vários vidros na mesa que por sorte não se quebraram. Ela se virou sorrindo sem jeito.
- Professora... é... desculpe-me, professor Snape. - Flora ajeitou tudo e foi sorrindo até Sprout - Veio me buscar para o jantar?
- Jantar? Onde está com a cabeça, querida? O jantar já foi servido há horas. - Flora e Snape se olharam admirados. Conversaram tempo demais.
- Mas... nós nem percebemos... ficamos conversando e perdemos a hora.
Sprout a achou estranha, pegou em sua mão e a levou para porta.
- Já é tarde, querida, quase duas horas da manhã. Vou levá-la a seu dormitório. Obrigada Snape por... cuidar dela. - Sprout na realidade quis dizer: "por não matá-la".
- Espere professora, tenho que pegar minha valise. - Flora voltou ao fundo da sala pegou a valise, os livros, deixou-os cair umas duas vezes e enfim voltou até Sprout - Obrigada, professor Snape... boa noite!
- Boa noite, senhorita Sommer, Sprout.
Sprout levou Flora até a casa de Lufa-Lufa e a acomodou em um belo quarto.
- Está mesmo bem, querida?
- Sim, professora, estou.
- O que você... fazia lá? Digo... ele brigou com você? Tocou naquele assunto da árvore? De quando se machucaram? Ele quis a...
- Professora... eu fui apenas... pegar algumas informações com o professor sobre... as necessidades das plantas nas poções... Ele não me fez mal algum. - Flora sorriu e Sprout acreditou.
- Bem, no próximo fim de semana iremos à Floresta! - vibrou Sprout - Quero lhe mostrar as coisas incríveis que encontrei lá. Você vai adorar!
- Claro que vou! Sempre quis entrar na Floresta Proibida, mas nunca pude, nem mesmo por detenção me mandaram lá.
- Porque sabíamos que se você entrasse não ia querer mais sair, Flora. Você ficava tentando conversar com as plantas.
- Professora, eu não tentava... eu falava com as plantas e ainda falo.
- Ah, querida... ainda com isso? - Sprout a abraçou - Quando você era pequena nós entendíamos porque você era sozinha, ficou órfã muito cedo e era tão retraída... Mas agora você já é uma adulta, linda, inteligente, tem um trabalho maravilhoso, não precisa inventar amigos e nem tentar falar com as plantas como se as entendesse. Você deveria arrumar alguns amigos e se divertir um pouco.
- Professora, acredite, tenho amigos e me divirto muito. Eu mudei, mas... entenda que eu nunca inventei histórias sobre as plantas. Eu as compreendo e elas a mim..
- Oh, querida! - Sprout a abraçou novamente - Está bem, está bem! - ela dava tapinhas nas costas de Flora. Era óbvio que ela também não acreditou - Agora descanse, amanhã teremos muito que fazer.
- Entra! Vai! Entra! - dizia Rony entre os dentes tentando colocar uma Anêmona Dançarina para dentro da estufa de Herbologia.
- Força, Rony! - exclamou Harry empurrando a porta.
- Não consigo! Ela... cresceu... demais... Entra! - Rony fez um esforço maior e conseguiu empurrar a planta para dentro. Harry trancou rapidamente a porta e os dois caíram sentados no chão, cansados pelo esforço que fizeram.
- Obrigada! Obrigada! - dizia a professora Sprout muito contente - Eu disse a Flitwick... As anêmonas são muito nervosas, se as fizer crescer demais não conseguirá controlá-las, elas parecem não cansar nunca.
Rony e Harry ainda arfavam, tiveram que ir rodopiando com a planta da Sala de Feitiços até a estufa. O professor Flitwick queria aprender alguns passos de dança e aumentou a anêmona magicamente para ensaiar com ela. Mas ela cresceu demais e ficou nervosa, o contra-feitiço não funcionou e ele não conseguiu fazê-la voltar ao normal. Apavorado, Flitwick chamou a professora Sprout e ela (espertamente) pediu a dois "dedicados" alunos (Harry e Rony) que passavam por lá para ajudarem a levá-la até as estufas.
- Pela ajuda de vocês, Grifinória ganhará vinte pontos. - disse Sprout sorridente - Agora podem ir, tentarei acalmá-la, aí quem sabe o feitiço funciona.
Os Grifinórios atenderam a professora e se foram para o castelo.
- Da próxima vez, deixarei o Flitwick se virar. Estou tonto até agora de tanto rodopiar. - afirmou Rony fazendo voltinhas com os dedos.
- Pelo menos ganhamos os pontos, Rony. E eles nem perguntaram o que fazíamos por lá. - disse Harry contente.
- E o que faziam? - indagou uma fria voz vinda de trás deles.
- Professor Snape! - exclamaram os dois assustados.
- Eu... nós... - Harry não sabia o que dizer - Nós não fazíamos nada de mais, apenas... passeávamos.
- Nada de mais? - retorquiu Snape - Então acham que andar pelos corredores de Hogwarts tarde da noite não é nada de mais? Certamente vocês... - Snape foi interrompido por um estranho grito de um animal.
Ele se virou e viu um morcego vindo em sua direção, Harry e Rony acharam que ele ia atacar o professor, mas Snape apenas olhou para ele e estendeu a mão pegando uma carta que o animal trazia em suas patas.
- Obrigado, Vladmir. - disse Snape e olhou a carta conferindo o remetente. Vladmir era seu morcego de estimação, quando alguma correspondência chegava e Snape não estava em sua sala, ou no refeitório, Vladmir a pegava e levava até ele. O morcego parecia saber sempre onde estava seu dono.
- Bem, isso é mais importante que vocês. - Snape se voltou a eles - Amanhã verificarei o que faziam. Podem ir para sua casa. - os garotos ficaram contentes e iam saindo - Ah... E antes que eu me esqueça... vinte pontos a menos para Grifinória. - Snape lhes deu as costas e voltou para as masmorras com seu morcego.
- Droga! - praguejou Rony - Ele tinha que aparecer! Maldito!
- Bem... pelo menos não ganhamos detenção. Vamos embora.
Snape entrou em sua sala, abriu a carta e a leu com certa satisfação. Pegou alguns ingredientes e começou a fazer uma poção.
As aulas de Herbologia do sexto e do sétimo ano, tiveram que ser dadas em outras estufas, pois a da anêmona estava interditada. A anêmona ainda estava muito nervosa e nem Sprout conseguiu acalmá-la.
- Isso mesmo, Longbottom! - exclamou Sprout contente com seu melhor aluno - Retirou-as com perfeição. Alguém mais conseguiu fazê-lo sem quebrar o caule? - ela olhou em volta e constatou que não. - Tudo bem, no começo é difícil, mas se acostumarão. As Rhyneas são sensíveis mesmo quando estão verdes, mas após secarem, ficam resistentes e são ótimas para guardar varinhas. Pode-se bater o quanto quiser nelas que não se quebram. O que é ótimo para levar as varinhas em viagens difíceis. - ela pegou a planta que Neville arrancara e a examinou atentamente.
- Cinco pontos para Grifinória, senhor Longbottom. - Herbologia era a única matéria em que o pobre Neville ia se saía bem e diga-se de passagem, muito bem.
- Professora... e esta aqui? Também podemos arrancar? - indagou Simas Finnigan.
- Não, senhor Finnigan. Esta é uma Hormeophytea, deve crescer mais até chegar a ponto de ser arrancada.
- Mas são iguais! - exclamou Dino Thomas.
- Não, não, não! - discordou Sprout - Alguém saberia me dizer qual a diferença entre elas? - a classe toda ficou muda, nem Neville e nem Hermione sabiam.
- As Hormeophyteas, assim como as Rhyneas, têm caules cilíndricos e dicótomos com aproximadamente cinqüenta centímetros, mas possuem, além disso, um rizoma tuberoso e esporângios geminados. - disse alguém à porta da estufa.
Todos os alunos se voltaram à porta para ver quem respondera a professora com tantos termos técnicos.
- Flora! - exclamou Sprout surpresa e correndo de braços abertos até a moça.
A professora parecia feliz, ria e abraçava a moça com intimidade. A moça era bastante alta e jovem, tinha cabelos castanhos, olhos esverdeados, pele dourada de sol e uma boca rosada que dava um largo sorriso à professora.
- Flora, querida, pensei que chegasse amanhã! Que bom vê-la!
- Professora Sprout, também é muito bom para mim vê-la novamente. Eu consegui chegar a Hogsmeade pela manhã, não pude esperar e vim logo para cá matar as saudades.
- Que bom! Dumbledore deve ter gostado, você é bastante aguardada, Flora.
- Bem... eu ainda não o vi. Não resisti e vim às estufas primeiro. - as duas riram e começaram a conversar ignorando os alunos, até que a professora percebeu a falta de educação.
- Perdoe-nos, senhores! Gostaria de lhes apresentar a melhor aluna de Herbologia de Hogwarts, de todos os tempos. Nunca ninguém entendeu tão bem os princípios das plantas mágicas, sua utilização, propriedades...
- Professora Sprout! - disse a moça corando - Por favor, está me deixando constrangida. - a professora sorriu para ela - Bem, senhores, eu gostaria que me chamassem de Flora.
Os alunos sorriram cumprimentando a moça, que era muito bonita e simpática e deveria ter uns vinte e cinco anos. Ela trajava um belo e longo vestido verde, todo desenhado de florzinhas brancas. Seus cabelos estavam presos no alto, mas uma cascata de fios e flores brancas lhe caíam até os ombros. Ela tinha uma expressão de alegria e frescor que deixou os garotos encantados.
- Vamos, vamos, vamos, voltem ao trabalho, tentem tirar pelo menos uma sem quebrar. - disse Sprout fazendo-os voltar à aula - A diferença da Hormeophytea é que suas raízes também podem usadas como guarda-varinhas, mas trabalharemos com elas outro dia.
- Professora, agora devo ir a Dumbledore. Apenas queria vê-la antes.
- Tudo bem, querida, depois nos falaremos. - Sprout deu um beijo estalado em Flora e a moça saiu.
- Viu só que linda? - disse Simas puxando o caule de uma planta.
- Vi! Que princesa! - concordou Rony.
- Acho que já vi a foto dela em algum lugar. - disse Hermione pensativa.
- Deve ser de algum livro de ex-alunos Mione, você vive remexendo neles. - disse Harry - Sprout disse que ela estudou aqui.
- É. Deve ser.
- Neville, você já ouviu falar nela?
- Não, Rony, assim pelo primeiro nome não. Mas... agora vocês viram que há gente interessante que gosta de Herbologia.
- Interessante? - exclamou Dino - Põe interessante nisso!
- Flora, é muito bom tê-la conosco novamente. Que bom que pode vir antes, assim os alunos a conhecerão antes do fim de semana. Sei que lhes causará uma boa impressão. - disse Dumbledore fazendo a moça corar - Será apresentada logo mais, durante o jantar.
- Obrigada, professor Dumbledore. Mas antes eu gostaria de tratar de outro assunto, é importante.
- Eu sei, eu sei. Pode ir, fique à vontade. Ele foi avisado que chegou e irá para sua sala assim que terminar a aula. A senha é Olho de Basílico. Você sabe o caminho, não?
- Bem, se é o mesmo de quando estudei aqui, conheço sim. Com licença!
Flora deixou a sala de Dumbledore e foi pelo castelo. Realmente, estava tudo do mesmo modo de quando ela partiu de lá, há dez anos, para terminar seus estudos na Escola de Magia e Bruxaria da Amazônia, no Brasil. Ela sempre fora fascinada pelas plantas e no Brasil havia a maior diversidade delas em todo o mundo.
Flora se formara há oito anos e desde então vivia no Brasil e sempre viajava pelo mundo a trabalho, estudando, catalogando e descobrindo novas plantas e novos usos para elas. Agora ela voltava a Hogwarts para pesquisar algumas plantas agressivas na Floresta Proibida. Ela andou, andou e chegou a uma porta.
- Olho de Basílico. - a porta se abriu e ela entrou, pode constatar que tudo estava como o resto do castelo, exatamente igual. Ela andava se recordando do tempo que fora estudante e que morria de medo de ir até lá, assim como todos os seus colegas. Ela também pode ouvir a voz do dono daquela sala, ele dava aula na sala ao lado. A voz dele era forte e imperiosa, o que fazia todos os alunos ficarem em silêncio. Quantas vezes ela tremeu só em ouvi-la, ela ficava desconcertada quando ele a olhava na sala de aula e lhe dirigia a palavra.
- "Senhorita Fala-Com-As-Plantas-Sommer, deve se dedicar mais às aulas, não são apenas de ervas que são feitas as poções". - lembrava ela.
- "Como eu era boba. Tremia só em vê-lo. - pensava Flora observando a estante de livros - Mas agora... já estou crescida e não mais uma aluna avoada e desastrada. Sei me controlar".
- Senhorita Sommer! - uma voz fria chamou-a da porta.
Flora tremeu todinha, não podia acreditar naquilo, estava novamente com aquela sensação que a perseguiu durante anos. Ela tentou se controlar e se virou para ele.
- Professor Snape... boa tarde! Desculpe-me ter invadido, mas o diretor me deu a senha e disse que eu poderia...
- Tudo bem, senhorita. Eu já a esperava aqui. - Snape guardava alguns ingredientes em um armário, sem ao menos olhar para ela - Recebi sua carta, descobriu uma propriedade... interessante em uma planta, não foi? - ele sentiu um agradável cheiro de flores.
- Sim, professor. - afirmou Flora - A Associação de Herbologia me informou ano passado que, caso eu soubesse de alguma planta relacionada a lobisomens comunicasse ao senhor. Eu a conheço e como vinha a Hogwarts fazer uma pesquisa... - Snape se virou e finalmente a viu, ela se calou e esperou que ele falasse, mas ele não falou, apenas a olhou e fez uma expressão de surpresa e admiração. Ficou assim durante alguns instantes, percebeu que ela não era mais aquela garotinha de dezesseis anos que fora sua aluna. Ela crescera e muito.
- Mudou muito senhorita... Sommer.
- Bem... Depois de dez anos... - ela ficou constrangida e baixou a cabeça, como sempre fazia quando ele a repreendia nas aulas.
- Então... o que tem a me dizer sobre a planta? - ele foi direto ao assunto que a levara lá e parecia ansioso por aquilo.
- Bem eu... - hesitou ela - trouxe esses livros e tratados. - Snape lhe indicou uma grande mesa. Flora ia colocá-los na mesa, mas deixou que caíssem no chão. Snape a ajudou a recolhê-los
- "Desastrada. Continua desastrada" - pensou o professor. Após colocarem os livros sobre a mesa, Flora começou a falar.
- Há um ano atrás, quando estive no Uzbequistão, estudei a Pleuromeialia. - ela mostrou uma gravura da planta.
- Os nativos de lá, costumavam utilizá-la para espantar o lobisomem, o que, como pude constatar, não funcionava muito bem, pois a criatura às vezes atacava até mesmo com ela. Pesquisei um pouco mais e descobri que era por causa dos esporófitos finos dela, que saíam diretamente do caule e por ela ter esporos tipo trilete, o que a faz perder a força depois da primeira lua cheia que recebe. Mas, - ela pegou outro livro e o abriu - fiquei curiosa e estudando melhor a divisão das Licófitas, encontrei em outra ordem, a das Lepidodendrálias, um gênero muito interessante. O das Sigillarias, elas têm cerca de trinta metros de altura e um caule que chega até um metro de diâmetro. Os seus ramos terminam em tufos de folhas alongadas que podem ter um cordão vascular duplo, no caso Sigillariopse, ou um feixe vascular único, as Lepidonphylloide. - Flora falava e apontava as gravuras para Snape que a olhava sem entender nada - Suas almofadas foliares são hexagonais e... - Snape não se conteve.
- Senhorita Sommer, agradeço sua ajuda, mas... será que pode falar minha língua? - pediu ele impaciente.
Flora corou, depois de tanto tempo entre estudiosos e pesquisadores, usava termos técnicos e complicados como se fossem língua comum.
- Perdoe-me, professor Snape eu... - Flora pensou um pouco e enfim disse - Esta planta, talvez possa ajudá-lo. - ela indicou uma gravura da planta no livro - As folhas dela, quando cozidas em infusão de losna doce, desprendem uma substância que inibe o lobisomem, mas se tomada em grande quantidade pode matá-lo... É isso que quer? - indagou receosa.
- Não! Absolutamente! Quero apenas descobrir um meio de fazê-lo controlar melhor a transformação. Ele... pode tomar uma poção que o faz controlar seus instintos assassinos, mas seu corpo sofre muito.
- Bem, então é só tentar utilizar em pouca quantidade durante o processo. O senhor fez a infusão que pedi na carta?
- Sim, fiz. Ela está bem aqui. - Snape pegou no armário um vidro com um líquido vermelho escuro, ia entregar a ela, mas achou melhor não - Deixei curtir durante duas noites, por sorte era lua-cheia quando me mandou a carta.
- Agora devemos misturar as folhas cozidas de Sigillaria a ela.
- Onde eu as encontro?
- Eu as trouxe. - a moça abriu a pequena valise que trouxera consigo e tirou várias folhas dela, mais do que caberia na valise, mas ela fora aumentada magicamente e parecia haver uma floresta inteira nela. - Veja, este maço é de um tipo e este de outro. - Flora se aproximou dele e mostrou a diferença - Consegue ver o cordão vascular? Aqui no meio... - Snape baixou a cabeça e viu um fio oco e fibroso - Este é único, o outro é duplo. - ele pode ver dois fios ocos no outro - A diferença na infusão é que o duplo é mais forte e deve ser cozido na luz minguante e não na nova, portanto deve-se ter bastante cuidado com ele.
Snape pegou os maços de folhas e as observou, eram iguaizinhas, exceto por aquele minúsculo detalhe que ninguém parecia notar, somente Flora e seus companheiros Herbólogos.
- Quanto tempo elas devem cozinhar?
- Por cinco noites seguidas. Depois devem cozinhar por mais duas noites de lua cheia como a infusão, aí poderá ser misturada a ela.
- Muito bem, tentarei então.
- Professor... é... para quem irá dá-la?
- Digamos que tenho um... amigo que sofre muito com isso e... eu gostaria de ajudá-lo.
- "Remo!" - pensou Flora - Ah! O senhor é um bom amigo então. Mas como ele consegue se controlar... digo, o senhor disse que ele toma uma poção.
- Sim! A Poção Mata-Cão. Ele tem que tomar todos os meses, assim não sai matando por aí, mas não é qualquer um que sabe fazê-la e... a vida dele é muito miserável, vive como homem e como fera. É realmente deprimente a situação dele. - Snape olhou para Flora e percebeu que ela lacrimejava, ela sempre fora sensível e chorona, parece que não mudara em relação a isso - Bem, senhorita, não quero aborrecê-la com esses assuntos, agradeço sua ajuda e... peço segredo, não quero que saibam sobre esse... meu amigo.
- Certamente, professor, não direi nada a ninguém. - afirmou Flora - Entendeu a diferença das duas então? - Snape ergueu os dois maços, um em cada mão.
- Este é na lua nova - disse sacudindo uma mão - e este na minguante. - agora sacudindo a outra.
- Não! - exclamou ela sorrindo - Este é na nova e este outro na minguante.
Snape franziu a testa, se confundira e não via mais a diferença entre elas.
- Acho melhor a senhorita etiquetar para mim. Quero começar a fazê-la hoje mesmo. Esta noite é a primeira lua minguante.
- Claro! Eu já deveria ter feito isso antes. - Flora abriu novamente sua valise, retirou de lá algumas etiquetas, uma pena e começou a escrever.
Sem que eles vissem, uma espécie de trepadeira começou a sair da valise e se agarrou ao vestido de Flora, ela subiu, subiu e se enroscou no cabelo dela.
- Jeanie! - exclamou Flora tentando desenroscar a planta de si, mas quanto mais ela puxava, mais a planta se agarrava a ela - Solte! Vamos, solte! - Snape a olhava confuso, ela poderia facilmente arrebentar a planta, mas ela parecia muito resistente e insistente - Vou ficar zangada... Vamos, desça, agora! - a planta obedeceu e desceu ao chão - Vamos! Saia já daí, quero vê- la. - disse Flora olhando para a valise.
Então um emaranhado de galhos e folhas foi saindo da valise e espalhando pelo chão da sala de Snape. Ele ficou admirado com o tamanho da planta, então viu um bulbo sair vagarosamente da valise e se aproximar de Flora, erguendo alguns galhos para ela.
- Que absurdo, Jeanie! Eu havia dito que você ficaria no Brasil até a minha volta. Como pôde fazer isso? Esconder-se na valise! Você está a três dias sem sol e sem água e se eu não a abrisse? Você poderia morrer aí dentro e o que eu diria a Duarte? Ele é o seu dono, sabia? Nunca mais faça isso entendeu? Não!!! De modo algum... Você não vai... Comporte-se, Jeanie... - ela ralhava séria com a planta que se abaixou e pareceu "envergonhada". Flora apontou para uma janela - Agora vá! Lá fora há um jardim com uma fonte, fique lá e se esconda, se eu ouvir alguém falar qualquer coisa sobre você, a despacho sozinha para Duarte... E não retruque!
A planta se arrastou até a janela, a abriu e deslizou pelas paredes do castelo até o jardim. Flora então não pode se conter começou a rir descontroladamente. Snape a olhava ainda espantado, aquela garota ainda tinha a mania de ficar falando com as plantas.
- Senhorita... - tentou dizer Snape, mas Flora ria sem parar - Senhorita... - ela nem percebia o professor lhe falando, Snape se zangou e falou alto e secamente:
- Senhorita Fala-Com-As-Plantas-Sommer!
Flora parou de rir. O chamado ríspido de Snape a chamara a razão.
- Perdoe-me professor... eu...
- Vejo que não perdeu a mania, senhorita, de ficar falando com as plantas.
Flora se zangou também, pôs as mãos na cintura e respondeu:
- E nem o senhor de ficar me chamando desse jeito. O que eu faço não é mania. Eu "falo", "converso" com as plantas e sou muito bem entendida. - Snape obviamente não acreditou, mas não disse nada e apenas entortou a boca. Ela percebeu sua grosseria e se envergonhou - Eu... desculpe-me professor... e-eu não queria gritar c-com o senhor.
- Tudo bem, senhorita. Não precisa se desculpar, não estuda mais em Hogwarts, não sou mais seu professor e não posso mais lhe dar detenção ou retirar pontos de sua casa.
Flora sorriu. Quantas vezes ele a pegara conversando com as plantas no jardim e só por isso lhe dava detenção.
- Eu disse algo engraçado, senhorita?
- Não, professor. Eu apenas me lembrava de quando estudei aqui. - Flora começou a recolher suas coisas e fechou a valise - Agora já que estão etiquetadas, não há como confundir. Espero que consiga professor. - eles ficaram se olhando durante longos segundos, até que Snape falou:
- O que era aquilo?
- Aquilo? O quê?
- Aquela planta! O que era?
- Ah! - Flora sorriu novamente e Snape achou que ela ficava muito bem assim. - Jeanie! Ela é uma Lupulélia Bulbensis Cycadeoideaceae, quero dizer... uma trepadeira de bulbo submerso. Ela pode ficar tanto fixa a terra, quanto em muros ou árvores. Geralmente elas não se movimentam muito, mas Jeanie é terrível. Fica sempre grudada a mim e me segue para onde vou.
- Por quê? - Snape estava curioso.
- É porque essas plantas são como as aves, acham que o primeiro ser vivo que vêm é sua mãe. Quando o bulbo de Jeanie floresceu a primeira vez eu estava próxima e... Ela me adotou, mas foi um engano. Duarte e eu não estávamos quando ela nasceu. Ele estava tão ansioso por Jeanie, queria ser o "pai" dela, mas ela se adiantou e quando floresceu ele não estava. Nós havíamos saído para fazer compras e quando chegamos, eu entrei primeiro em casa e ela me viu.
- Então a senhorita... é "mãe"? - disse Snape não contendo um pequenino sorriso. Flora sorriu mais ainda.
- Eu tento convencê-la que não, mas realmente ela parece um bebê. Duarte me pediu para que a afastasse, mas é tão difícil.
- Este... senhor Duarte, é... seu... - Snape sabia das modernidades dos bruxos brasileiros.
- Duarte é meu grande amigo. Ele também é brasileiro e eu o conheci assim que fui para lá estudar no Colégio da Amazônia. Ele além de conhecedor de plantas é quem faz as poções na nossa equipe de pesquisa.
- A senhorita teve muita sorte. Sempre foi boa em Herbologia e foi convidada para estudar lá onde há os melhores professores e pesquisadores do ramo. Sem falar nos espécimes. - observou Snape. Flora ficou meio sem jeito, baixou a cabeça e pigarreou tentando disfarçar.
- Realmente lá é incrível. - afirmou Flora - Há tantos tipos de plantas e descobri tantas propriedades maravilhosas. - Snape indicou uma cadeira a ela, ambos se sentaram. Flora começou a contar de tudo o que descobrira lá e dos lugares por onde andara. Ela falava com muito entusiasmo e sorria bastante.
Snape concluiu que ela realmente havia mudado, antigamente ela era tão quieta e calada. Ele jamais a vira lhe dirigir a palavra sem gaguejar, nem mesmo para responder as suas perguntas na sala de aula. Sem contar que ela vivia chorando pelos cantos do castelo. E agora ela sorria maravilhosamente. Fisicamente então parecia ser outra pessoa. Flora sempre fora bastante alta durante a infância e a adolescência e agora devia estar medindo pelo menos um metro e oitenta de altura, mas ao contrário de antes não parecia desengonçada e nem magricela. Seu rosto era quase o mesmo, mas estava mais harmonioso e sua boca já não parecia mais um rasgo enorme. Ela mudara sim e para melhor. Os dois ficaram lá por um bom tempo, contando pequenas histórias sobre seus estudos uma para o outro. Riram (Snape só sorria), trocaram impressões e descobertas, nem pareciam a aluna e o professor de dez anos atrás. Eles estavam totalmente envoltos na conversa, quando alguém bateu a porta. Snape se levantou e a atendeu, era a professora Sprout.
- Snape, por favor, Flora está aí? - perguntou a professora ansiosa.
- Sim, está! - afirmou ele. Sprout levou a mão à boca e arregalou os olhos.
- Ela está bem? Não houve nada? Você não a... - Sprout não pode continuar. Snape lhe lançou um olhar frio que quase a petrificou.
- Se acha que eu a prendi, a torturei e depois usei partes de seu corpo para fazer uma poção está enganada, Sprout. Ela está ali, no fundo da sala.
Sprout entrou, viu a moça mexendo em alguns frascos e ficou aliviada. Flora estava bem.
- Flora, querida! - exclamou Sprout indo até ela. Flora se assustou e derrubou vários vidros na mesa que por sorte não se quebraram. Ela se virou sorrindo sem jeito.
- Professora... é... desculpe-me, professor Snape. - Flora ajeitou tudo e foi sorrindo até Sprout - Veio me buscar para o jantar?
- Jantar? Onde está com a cabeça, querida? O jantar já foi servido há horas. - Flora e Snape se olharam admirados. Conversaram tempo demais.
- Mas... nós nem percebemos... ficamos conversando e perdemos a hora.
Sprout a achou estranha, pegou em sua mão e a levou para porta.
- Já é tarde, querida, quase duas horas da manhã. Vou levá-la a seu dormitório. Obrigada Snape por... cuidar dela. - Sprout na realidade quis dizer: "por não matá-la".
- Espere professora, tenho que pegar minha valise. - Flora voltou ao fundo da sala pegou a valise, os livros, deixou-os cair umas duas vezes e enfim voltou até Sprout - Obrigada, professor Snape... boa noite!
- Boa noite, senhorita Sommer, Sprout.
Sprout levou Flora até a casa de Lufa-Lufa e a acomodou em um belo quarto.
- Está mesmo bem, querida?
- Sim, professora, estou.
- O que você... fazia lá? Digo... ele brigou com você? Tocou naquele assunto da árvore? De quando se machucaram? Ele quis a...
- Professora... eu fui apenas... pegar algumas informações com o professor sobre... as necessidades das plantas nas poções... Ele não me fez mal algum. - Flora sorriu e Sprout acreditou.
- Bem, no próximo fim de semana iremos à Floresta! - vibrou Sprout - Quero lhe mostrar as coisas incríveis que encontrei lá. Você vai adorar!
- Claro que vou! Sempre quis entrar na Floresta Proibida, mas nunca pude, nem mesmo por detenção me mandaram lá.
- Porque sabíamos que se você entrasse não ia querer mais sair, Flora. Você ficava tentando conversar com as plantas.
- Professora, eu não tentava... eu falava com as plantas e ainda falo.
- Ah, querida... ainda com isso? - Sprout a abraçou - Quando você era pequena nós entendíamos porque você era sozinha, ficou órfã muito cedo e era tão retraída... Mas agora você já é uma adulta, linda, inteligente, tem um trabalho maravilhoso, não precisa inventar amigos e nem tentar falar com as plantas como se as entendesse. Você deveria arrumar alguns amigos e se divertir um pouco.
- Professora, acredite, tenho amigos e me divirto muito. Eu mudei, mas... entenda que eu nunca inventei histórias sobre as plantas. Eu as compreendo e elas a mim..
- Oh, querida! - Sprout a abraçou novamente - Está bem, está bem! - ela dava tapinhas nas costas de Flora. Era óbvio que ela também não acreditou - Agora descanse, amanhã teremos muito que fazer.
