Capítulo Vinte e nove: Escolhas

A viagem para Londres foi tranqüila. Aline adormecera assim que eles pegaram a auto-estrada, de modo que Harry teve bastante tempo para pensar nas propostas que recebera. Quando enfim pararam em frente ao Caldeirão Furado, tinha tomado suas decisões. O sol estava se pondo, havia pouca gente na rua para se espantar com Harry entrando naquele prédio quase em ruínas. Chamou Tom, o estalajadeiro, para ajudá-lo com a bagagem. Aline estava completamente acordada ao lado do carro, tirando a gaiola de Edwiges e o saco com os presentes.

"Laurëtinwe manda lembranças!"

Ele e Tom levaram tudo para dentro e o velho bruxo foi verificar as reservas. Aline já estava hospedada há dois dias e tinha reservado um quarto para Harry. O Caldeirão Furado era a estalagem mais próxima à propriedade onde Rony e Hermione se casariam no dia seguinte. Harry e Aline, claro, eram padrinhos.

- Quarto doze para o senhor, Sr. Potter. Estamos muito honrados em tê-los como hóspedes.

Após instalarem Harry, Aline foi se lavar e desceu para jantar. Havia pedido uma mesa discreta ao Sr. Tom, sabendo que a fama deles por terem derrotado Lord Voldemort não os deixaria passar despercebidos. Ela se divertiu ao constatar que sua estratégia não funcionara. Harry parecia em apuros, cercado de bruxas e bruxos por todo lado querendo cumprimentá-lo.

"Socorro! Não posso suportar os holofotes sozinho, Srta. Hunter. Mandarei alguns pedirem autógrafos para a senhorita!"

- Pronto, senhores e senhoras, chegou a minha companhia. Peço gentilmente que nos deixem um pouco a sós. Estamos cansados da viagem. Quem sabe mais tarde, quando tivermos comido, poderemos falar com todos. Por favor.

Os curiosos pareceram não gostar do pedido, mas se retiraram por educação, tendo o cuidado de sentarem nas mesas próximas, os ouvidos atentos. Os pratos pedidos por Harry chegaram e eles começaram a comer em silêncio. Logo foram esquecidos pelos outros fregueses, pois não fizeram nada extraordinário.

"Você está bem mesmo? Quero dizer, recuperada?"

"Estou, mas agora não poderei voltar a ver minha mãe. Todas as lições que ela deveria me ensinar foram aprendidas. Ela me disse para viver a minha vida."

"Meu pai disse a mesma coisa. Enfim, parece que estamos por nossa conta. Você pelo menos ainda tem seu pai."

"E você tem seu padrinho e muitos amigos. Nunca se esqueça disso."

"Gostaria de falar sobre as resoluções que tomei, pois elas podem afetar seus planos também... Bem, decidi que jogarei a Copa pela Inglaterra no próximo ano. O treinador entrou em contato comigo mês passado... Vários times enviaram propostas, mas a seleção é o melhor, claro... Além disso, quero realmente ser Auror... É a carreira mais indicada para mim, pelo que pude notar. Você sabe que o treinamento é exaustivo e tem a história do confinamento..."

Harry não a encarava. Sabia que Aline compreendia o que ele estava tentando dizer. Eles não ficariam juntos agora, como ele sentia que era o desejo dela.

"Não quero ser irresponsável nem inconseqüente... Timoth estava certo quando me disse que eu precisava merecer você. Tenho que aprender a viver."

"Você vai morar com Sirius durante esse período?"

"Ele convidou e vou aceitar, aliás, já aceitei. Mandei Edwiges a ele ontem."

O salão esvaziara, as velas se gastando lentamente. Harry sentia o desapontamento de Aline como se pudesse tocá-lo. Ela pensou durante muito tempo. Realmente não esperava aquilo. Queria explodir, bater nele; apesar de saber que estaria sendo egoísta querendo prendê-lo justo quando ele conquistara a liberdade.

- Com licença, preciso ficar sozinha. - Sussurrou com a voz trêmula.

Harry sentiu o coração diminuir ao vê-la desaparecer no primeiro andar. Hesitou um instante antes de correr escada acima.

A porta do quarto não estava fechada. Abriu uma fresta para poder entrar e fechou tudo. Aline estava sentada na penteadeira perto da cama, o rosto escondido nos braços. Estremeceu quando uma mão cheia de culpa tocou sua cabeça.

- Desculpe, Harry. Não deveria agir assim... Não é certo... Pensei que estava tudo resolvido... Não tenho o direito...

- Você tem todo o direito do mundo, meu amor.

- Por favor, não se preocupe... Estou sendo egoísta...

- Elenna, isso não é uma guerra. Pare de tentar proteger os outros. Você tem o direito de sentir raiva. Sei que não foi isso que você planejou, eu também faria diferente, mas não posso. Um ano não é a eternidade. Não quero ficar com você sem poder oferecer condições de vida, de futuro. Não posso e não quero viver eternamente como "o menino que sobreviveu".

- Sei que não.

- Então, levante-se. - disse Harry, olhando firme para ela. Aline encarou aqueles olhos verdes. - Confie em mim.

Como resposta, ela deu um passo a frente, deixando que sentissem o calor da pele um do outro. Depois pegou as mãos dele e passou os braços pela cintura. Aproximou sua boca da dele. Aline sentiu-se leve e suave nos braços de Harry. As mãos percorrendo caminhos ainda não totalmente explorados, sem pressa de chegar.

Não havia mais culpa ou ressentimento.
Harry acordou com o sol batendo em seu rosto. Aline dormia apoiada em seu peito. Com cuidado para não acordá-la, saiu da cama, pegou os óculos e fechou as folhas da janela. Procurou o relógio e viu que já passava das nove. Foi para o chuveiro e tomou um banho completo. Quando voltou ao quarto, já vestido, a noiva começava a se mexer, sem querer acordar. Ele deitou ao lado dela e sussurrou:

- Que tal deixar o mundo ver essa beleza também? Não sou egoísta!

- Bom dia, Don Juan! Que horas são?

- Já são quase onze. Vou descer para ver o que consigo arranjar para o café, ok?

- Enquanto me arrumo. Não podemos nos atrasar!

O casamento de Rony e Hermione seria numa fazenda nas proximidades de Londres, afastada o suficiente para que os convidados bruxos não despertassem curiosidade. Estava marcado para às seis da tarde.

Quando Harry e Aline chegaram, as mesinhas espalhadas pelo jardim estavam repletas de variados tipos de pessoas. Alguns parentes de Hermione pareciam apavorados com seus vizinhos de mesa, mesmo tentando disfarçar o choque com as vestes em tons berrantes das tias de Rony; ou a decoração com flores flutuando pelo ar e as fadinhas escondidas em buquês de rosas.

O casal cumprimentou os irmãos de Rony. Fred estava com Angelina Johnson, Jorge convidou Kattie Bell, Gui trouxe Fleur Delacour, Carlinhos tinha um affair com uma colega de pesquisa, Judy Flame e Percy veio com a esposa Penelope. Mesmo com os pares, os quatro irmãos arrumavam tempo para vigiar Gina e Siegfried. Harry piscou para um Sig estrategicamente sentado entre Fred e Carlinhos, os mais ciumentos.

Os pais dos noivos estavam tão ocupados que o Sr. Granger quase atropelou Aline ao discutir com os garçons a colocação adequada das cadeiras no local da cerimônia. A Sra. Weasley gritava a plenos pulmões com os cozinheiros. O Sr. Weasley recebia os convidados.

Ansioso para falar com o amigo, Harry foi procurá-lo. Ronald Weasley afundara num sofá dentro da casa, sozinho, as orelhas tão vermelhas que pareciam duas fatias de beterraba. Elegante como estava, com um terno preto riscado de cinza, nem parecia o velho Rony.

Aline subiu a escada para ver Hermione. A Sra. Granger, Gina e duas primas ajudavam nos retoques finais. Mione escolhera um traje simples - um longo rosa claro, com luvas tricotadas e um pequeno buquê de flores do campo - porém lindo. Os cabelos caiam em cachos nada rebeldes.

Vários professores de Hogwarts estavam presentes, pois Hermione conseguira uma vaga lá. Hagrid também tinha arranjado companhia. Madame Maxime viera como acompanhante de Fleur, mas nem sabia onde a jovem estava.

Com Rony trabalhando no Ministério e o Sr. Weasley como Ministro, vários diplomatas e pessoas influentes compareceram.

Timoth e Sirius sentaram na mesma mesa de Remo e Fabian. Jasmin Brethil, Hannah e Ângela Bastian acompanhavam os rapazes.

Os ex-colegas de escola compareceram em peso. Lilá e Parvati dançaram como nunca. Para surpresa geral, Neville apresentou uma namorada, Annaclaire Bluesky.

A reunião foi absolutamente prazerosa. Os palestrantes - um bruxo e um trouxa - discursaram sobre a importância do intercâmbio entre as duas culturas; a comida estava deliciosa; a cerimônia da troca de alianças fez todo mundo chorar. O show de fogos de Fred e Jorge encantou os convidados. Após horas de conversa e diversão, a noite já alta, o jardim começou a esvaziar. Os noivos foram vistos sobrevoando a casa num carro voador, a caminho de aproveitar o presente dos padrinhos - uma lua de mel no Caribe.

Quando a sombra do carro desapareceu, Aline sentiu chamarem seu nome. Buscando ao redor, encontrou Harry esperando no começo de um caminho de terra, iluminado por dezenas de fadinhas.

- Observei que você esteve falando muito com meu pai mentalmente.

- Sim, estava contando a ele o que discutimos ontem. Tim concorda comigo. Sirius também.

- E eu concordo com os três, mas gostaria de esclarecer algumas coisas. Acredito que é melhor não haver encontros durante esse ano.

- Por que? Com certeza podemos arranjar um tempo para nós. Você também vai fazer o treinamento para Auror. E o quadribol...

- Não quero fazê-lo aqui. Irei para a Escócia.

- Qual é a utilidade dessa separação?

- Harry, ontem pensei em tudo que você me disse e mais ainda no que não disse. Você finalmente está livre, no seu verdadeiro mundo. Nós dois estamos. Queremos descobrir do que esse mundo é feito.

- Podemos descobrir juntos!

Harry estava desnorteado como se tivesse levado um soco no estômago.

- Você sabe que não. Sente isso tanto quanto eu. Temos dúvidas diferentes, experiências diferentes para viver antes de...

- Elenna, olhe para mim, você não está querendo... Você está propondo realmente...

Como era difícil explicar! Aline Hunter suspirou.

- Não estou rompendo nosso compromisso. Quero um ano para mim e um para você. Isso não significa traição ou desistência. Quero fortalecer nossa união.

- Mantendo-nos longe?!

- Um ano, Harry. Encontro você na final da Copa de Quadribol. Nós dois estaremos lá. Confie em mim.

A expressão firme da noiva não deixava saída. Entretanto, Harry não enxergava o motivo daquilo, por mais que ela fizesse. Para ele era só uma espécie de vingança.

"Você sabe que não se trata disso."

- Ok. Um ano. - disse ele ríspido. Soltou as mãos dela e voltou pelo caminho pisando forte. De repente Aline surgiu na sua frente.

"Não aja como um menino mimado, Harry Potter!"

Sem responder, o garoto foi despedir-se dos poucos convidados que restavam, embarcou no carro com Remo, Sirius, Ângela e Jasmin e desapareceu.
O ano seguinte à derrota de Lord Voldemort foi o mais feliz em séculos. Nenhuma memória viva lembrava-se de tantas festas e comemorações, a alegria fácil em todos os rostos. A comunidade mágica respirava aliviada e podia retomar suas atividades, incluindo aí a Copa Mundial de Quadribol. Mesmo com alguns seguidores de Voldemort soltos, o Peru montou um enorme circo para atrair fãs de todo o mundo. A altura dos Andes ajustava-se perfeitamente à necessidade de discrição do evento.

Hotéis para as delegações foram montados nas proximidades de Cuzco e Macchu Picchu, escondidos com eficácia por Feitiços Enganadores. Acampamentos tinham capacidade para milhares de barracas, as reservas esgotadas meses antes do início da Copa.

Hermione e Rony compraram uma casa agradável no campo, ao norte de Londres. Grande o bastante para dez pessoas (Rony fizera questão de uma residência espaçosa), estava sempre cheia com as visitas de irmãos, primos, pais, amigos. Mione ensinava Lógica Mágica em Hogwarts, disciplina sugerida por ela própria, além de freqüentar a especialização em Magia Ascendente em Edimburgo. Rony trabalhava com o pai no Ministério e era sócio de Fred e Jorge na loja de logros e brincadeiras. Prosperavam a olhos vistos.

Em meados de agosto, os preparativos para assistirem à final da Copa estavam a pleno vapor. Tinham lugares no camarote de honra e iriam assistir ao time da Inglaterra jogar contra os egípcios.

A seleção do Egito surpreendera a todos, vencendo favoritos como Bulgária, Irlanda e Eslovênia, sendo a grande zebra da competição. Seus artilheiros pareciam ter nascido montados em vassouras. Os ingleses finalmente tinham arrumado um time condizente com a tradição de inventores do esporte. Olívio Wood, o novo capitão, reunira jovens revelações e os fizera treinar praticamente todos os dias do ano. A maior estrela da seleção era o apanhador, Harry Potter, é claro.

Harry decidira passar o tempo em que não estava no treinamento para Auror aperfeiçoando seus mergulhos, prendendo a respiração dos espectadores em vários lances arriscados. Na partida contra a Bulgária enfrentou um Victor Krum inspiradíssimo, mas levou a melhor por ser mais leve e impetuoso.

Conseguira uma ótima colocação e entrara para o Ministério com louvor. A prova para resistir às Maldições Imperdoáveis fora criada especialmente para ele. Os examinadores decididamente queriam transformá-lo numa espécie de exemplo. Já havia uma lista de casos para resolver depois da Copa. Ele mal podia esperar.

Visitava sempre os amigos, mas ficava pouco. Evitava lugares onde Aline acontecesse estar, apesar de se interessar por qualquer notícia dela. Ele cumprira o acordo de não procurá-la. Quem quisesse encontrá-lo deveria procurar a casa de Sirius e Remo. Harry gostava da companhia dos dois e eles tornaram-se inseparáveis.

Soube primeiro que Aline do julgamento de Draco Malfoy. O canalha conseguiu convencer o júri, com os depoimentos de Pansy Parkinson e Cho Chang, de que fora enfeitiçado, fazendo um escândalo ao ouvir que seu pai era um Comensal. Mas não conseguiram reunir provas contra ele.

Nas últimas semanas sentira o peso da solidão quando a seleção mudou-se para o hotel em Cuzco. Uma sacada equilibrava-se na encosta da montanha e ele passava horas ali, tentando ler algum sinal no vento ou no vôo dos pássaros. O prazo havia terminado e ela não aparecera.

O treinamento de Auror pareceu brincadeira de criança para Aline. Quando ela descobriu que a prova final seria enfrentar um manticora não pôde segurar o riso. Manticoras eram uma ameaça para bruxos humanos, mas sua voz maliciosa não produzia efeito algum sobre uma meio-elfo. Apenas persuadiu a criatura a recitar poemas de Shakespeare, fazendo graça para os examinadores perplexos.

Dedicara algum tempo a ajudar o pai na caça a bruxos das trevas que permaneciam escondidos. Timoth Hunter capturara Lúcio Malfoy numa caverna do Monte Fuji. O influente Lúcio sucumbiu ao final de uma batalha dura, que se estendeu por seis dias e levou os dois à exaustão. Por fim conseguiram imobilizá-lo com um domínio duplo da mente e trancá-lo em Azkaban.

Aline passou um período, depois da prisão de Malfoy, na casa de Hermione e visitando ex-colegas. Numa passagem pela escola, a Profª McGonagall lhe oferecera o cargo de professora de Defesa Avançada contra as Artes das Trevas, mas a verdade é que ela ainda não decidira seu futuro. Acompanhava o desenvolvimento de Harry com orgulho, porém distante. A final de Quadribol levou-a direto para os Andes, junto com a turma. Foram de avião, como os trouxas, para satisfazer a curiosidade do Sr. Weasley.