Capítulo Vinte e Três – O ataque a Hogsmeade

As férias transcorriam rapidamente. Faltava, agora, apenas uma semana para o Natal e Hogwarts estava em polvorosa com os preparativos. Como todos os anos anteriores, a escola estava sendo ricamente enfeitada, mesmo com a ausência de grande parte dos alunos e até mesmo do corpo docente. Essa última se devia à viagem de Hagrid e Dumbledore, alguns dias antes. Passados poucos dias depois da ida dos alunos para suas casas, o guarda-caça e o diretor de Hogwarts saíram em viagem, sem promessa de quando voltariam. Hagrid contou a Harry que demoraria muito mais do que Dumbledore, já que o diretor ansiava por estar de volta antes dos alunos. Por isso, os preparativos para o Natal ficavam por conta da Profª. McGonagall, a diretora substituta.

O clima estava rigorosamente frio este ano. A neve caía intensamente quase todos os dias e os alunos que permaneceram no castelo tinham poucos momentos de recreação nos jardins. Porém, quando era possível, em todos os lugares encontrava-se uma batalha de bolas de neve.

Harry e Rony aproveitavam o máximo que podiam, às vezes jogando xadrez (atividade que Harry não gostava muito, pois perdia todas as partidas), outras vezes em batalhas de neve ou ainda voando no campo de quadribol. Rony recebia cartas freqüentes de Hermione e respondia mais ainda, chegando até a pedir Edwiges a Harry uma certa ocasião, na qual o garoto mandou uma carta por Pichitinho de manhã e no fim da tarde decidiu mandar outra.

Durante esse tempo, os dois amigos não fugiram à promessa que fizeram ao Hagrid e sempre, no final das tardes, dirigiam-se à cabana do meio gigante, alimentar os Splooties e Canino. Foi na volta de uma dessas tardes que tudo começou. Harry e Rony estavam andando pelos corredores e, quando chegaram no Salão Comunal, viram um cartaz estampado no mural:

Devido às festividades do Natal, no próximo Sábado o povoado de Hogsmeade estará aberto para a visitação de todos os estudantes de Hogwarts. Pede-se aos alunos de primeiro e segundo anos que apresentem ao diretor da respectiva Casa, uma carta dos pais ou responsáveis, autorizando a visita.

Minerva McGonagall, vice diretora.

- Uow, que legal, pensei que eles nunca mais fossem promover uma visita a Hogsmeade! Já estava em tempo! – Rony exclamou animado. Harry, ao contrário, não estava nem um pouco feliz.

- Espero que você se divirta, Rony...

- Por quê? Ah... Esqueci que você não pode sair de Hogwarts...

- Mas... Dumbledore não disse que eu estava proibido, ele disse que era melhor que eu evitasse ir... – Harry começou a dizer.

- Ele disse, é? – Rony perguntou um pouco incrédulo. – Bem, é Natal e todos os alunos vão e...

- Não teria problema se eu fosse também, né?

- Acho que não... E nós não precisamos ficar muito tempo...

- E é minha única chance de comprar os presentes de Natal! Eu vou! – Harry disse, decidido.

Rony fez uma cara um pouco indecisa e disse hesitante: - Sabe, como monitor eu não devia te deixar ir...

- Ah, Rony você não vai dar uma de Hermione bem agora, né? Além disso, você sabe que eu não deveria ir porque você é meu amigo. Você e a Mione são os únicos monitores que sabem disso! Qualquer outro deixaria eu ir sem problemas!

- Por isso mesmo...

- O quê?

- Não, eu só estava falando sozinho. Quer saber, Harry? Você vai e pronto. Vamos nós dois, vai ser divertido!

- Mesmo assim, é melhor eu não facilitar. Eu vou com a minha capa de invisibilidade.

- Pela passagem secreta? – Rony baixou o tom de voz.

- Isso mesmo, daí eu te encontro lá em Hogsmeade.

- Mas toma cuidado pra não ser pego!

- Deixa comigo, eu tenho o Mapa do Maroto lá no meu malão.

- Certo, então Sábado que vem vamos para Hogsmeade!

Estava escuro e frio. A sala onde se encontrava era poeirenta e o ar estava impregnado de mofo. Poucos móveis e uma lareira, apagada e cheia de cinzas, se faziam presentes. Alguém andava de um lado para outro, esvoaçando a capa preta enquanto conversava com um outro ser, que rastejava deixando marcas no chão empoeirado.

- Tem que estar em algum lugar, tem que estar! – uma voz fria, pertencente àquele que dava voltas e mais voltas pela sala, gritou visivelmente exaltada.

- Por que você não tenta? Quem sabe não está lá? – outra voz, sibilante, sugeriu.

- Mas em que parte? Há tantos lugares a procurar que eu não sei por onde começo! – a voz fria soltou uma exclamação veemente e nada educada. – E esses incompetentes que não fazem nada certo! Onde estão esses imprestáveis?

Como resposta à pergunta, um barulho se fez ouvir na lareira apagada. Percebendo isso, o dono da voz fria apontou sua varinha para o lugar e exclamou:

- Incendio!

Imediatamente, chamas de um tom cinza, azulado e sombrio, apareceram na lareira. Um rosto começou a se formar, mas não era possível reconhecê-lo; metade deste estava encoberto por sombras enquanto a outra mostrava parte de uma face pálida com algumas mechas louras. O rosto começou a falar e sua voz, apesar de um pouco temerosa, escondia um tom arrogante e altivo:

- Aqui estou mestre, às suas ordens.

- Já não era sem tempo, pensei que esperaria a vida inteira! Sabe que não tenho tempo a perder! – a voz fria retrucou, com um quê de irritação.

- Perdão, mestre. Demorei, pois estava tentando fazer o melhor para o senhor.

- Se quer mesmo fazer o melhor, pare de dar voltas e vá direto ao assunto!

- Sinto muito. Descobri algo muito interessante, mestre, e acho que o senhor irá gostar.

- Não me importa sua opinião. Diga logo o que descobriu.

- Dumbledore se ausentou de Hogwarts e parece que não vai voltar até o recomeço do período letivo. Isso significa que Hogwarts está desprotegida...

- Ah, mas isso é muito, muito interessante... Uma oportunidade perfeita... – um sorriso se formou em seus lábios viperinos. – Quer dizer que o velho abandonou seu querido lar... Mas isso é lamentável, logo agora que eu estava pensando em visitá-lo... Mesmo assim eu tenho alguns velhos amigos lá, os quais ficariam felizes em me ver, com certeza...

Uma risada sombria se fez ouvir.

Harry acordou assustado. A cicatriz ardia intensamente, como há tempos não acontecia. Colocou a mão na testa. Estava suada e quente. Sentou-se na cama e pegou os óculos na mesa ao lado. O quarto entrou em foco assim que pousou as lentes nos olhos. Pôde, então, ver que Rony dormia a sono solto ao seu lado. Um sorriso feliz se formava nos lábios do amigo. "Provavelmente está sonhando com a Mione...", Harry pensou.

Levantou e andou até a janela. A lua cheia brilhava intensamente, fornecendo uma pálida claridade aos jardins, totalmente desertos, de Hogwarts. Devia ser alta madrugada ainda. Abriu a janela e sentiu a brisa leve e fria da noite no seu rosto, desalinhando os cabelos já rebeldes. Sentou no peitoril e ficou ali por um tempo que não saberia precisar, imerso em pensamentos.

A cicatriz ainda doía. Não. Latejava. Colocou novamente a mão na testa e, com a ponta dos dedos, massageou a forma do raio. Fervia. Isso só acontecia quando Voldemort estava perto ou quando sonhava com ele, sonhos como estes que estavam se tornando freqüentes.

Fechou os olhos e começou a repassar mentalmente o sonho. Veio-lhe à mente o quarto escuro e empoeirado. Voldemort estava nervoso e falava com alguém sobre procurar algo, mas o quê? O outro ser disse alguma coisa, tentar... Ele rastejava, sibilava... Seria uma cobra? Não tinha certeza. A lareira, apareceu alguém na lareira... Quem era? Conhecia-o de algum lugar... Disse que Dumbledore estava ausente... Voldemort lamentou, ou melhor, zombou não poder visitá-lo... Velhos amigos... Oportunidade perfeita... Mas, será que...?

- Voldemort vai invadir Hogwarts! – Harry exclamou.

- O que foi, Harry? Você tá estranho, parece nervoso...

Rony fez essa pergunta um pouco preocupado. Ele e Harry estavam descendo as escadas. Era o início da tarde de Sábado e Rony ia para Hogsmeade e, de acordo com o plano dos garotos, Harry iria logo depois, pela passagem que levava à Dedosdemel.

- Você acha? Não estou nervoso, Rony, é impressão sua. – era mentira. Harry passou de leve a ponta dos dedos na cicatriz, que conservava uma dor leve, porém insistente. Desde o momento em que acordara com a dor, não conseguira mais dormir, pois esta o incomodara por toda a noite. Além disso, não conseguia deixar de pensar no sonho que teve.

- Se você tá dizendo... Você quer desistir de ir pra Hogsmeade? Ainda tá em tempo...

Harry levou um susto quando o amigo disse isso, foi como sair de um transe. Sem pensar no que dizia, respondeu: - Não. Eu vou, Rony.

- Tá bem. – eles chegaram às portas de carvalho da entrada. Alguns alunos barulhentos do primeiro e segundo anos estavam lá. Com a voz baixa, Rony disse: – A gente se encontra lá, então. Tchau, Harry.

- Tchau, Rony. – Harry respondeu monotonamente. Antes de se virar para ir embora, ainda viu o amigo se juntar aos gêmeos Weasley.

Harry começou a subir as escadas, tendo a leve impressão de estar indo na direção do Salão Comunal. Não olhava por onde ia. Quando estava no terceiro andar, ouviu alguém chamá-lo:

- Harry?

O garoto virou para ver quem era. Uma senhora de cabelos brancos estava a alguns metros dele, com os braços cruzados sobre o peito. Era a Sra. Figg. Harry não disse nada.

- Venha até aqui, Harry.

Ele obedeceu. Ao aproximar-se, notou que a bruxa estava pálida e tinha olheiras profundas. Os cabelos em desalinho. Uma expressão preocupada.

- O que você está fazendo aqui a essa hora, Harry?

- Ahn... – ele protelou. – Estou com um pouco de dor de cabeça e achei melhor não ir para Hogsmeade...

Ela levantou a franja rebelde dele e colocou a mão enrugada em sua testa, sobre a cicatriz. Surpreendentemente, aquele toque o fazia se sentir bem e a dor na cicatriz diminuíra, quase sumindo.

- Está quente. – da testa, ela passou sua mão para as bochechas do garoto, sentindo sua temperatura. – Talvez esteja com febre. Por que não vai até a ala hospitalar? Madame Pomfrey pode fazê-lo se sentir melhor num instante, Harry.

Subitamente ele se lembrou da promessa que fez a Rony de ir a Hogsmeade. – Não precisa, Sra. Figg. Já estou melhor, só vou... descansar um pouco... Obrigado.

Ela o olhou com desconfiança. – Certo, se assim o diz... Descanse, então. Mas se precisar, não hesite em ir à ala hospitalar.

- Pode deixar, obrigado.

Ele tratou logo de ir embora. Sentia-se mal por estar mentindo, mas realmente queria ir a Hogsmeade. Olhou para trás e ainda viu a bruxa olhando-o de uma forma que não conseguia descrever. Virou o rosto e subiu as escadas. Colocou a mão na testa e sentiu que ela não mais ardia como antes. A cicatriz também não doía. Seja lá o que a Sra. Figg tenha feito, fez ele se sentir bem mais disposto. Finalmente chegara ao quadro da Mulher Gorda, que estava fofocando com sua amiga, Violeta.

Harry limpou a garganta. – "Canção da Fênix".

- Oh, olá querido. O que faz aqui, não deveria estar passeando? – ela perguntou.

- Eu não quis ir. Será que pode abrir a porta agora?

- Não precisa ter pressa. Vamos, entre! – ela disse e abriu a passagem.

O garoto entrou a passos largos e subiu os degraus que levavam ao dormitório masculino de dois em dois, com pressa. Logo chegou ao dormitório do quinto ano, entrou, abriu seu malão e pegou alguns itens que se faziam necessários: a capa de invisibilidade e o Mapa do Maroto. Vestiu-se com a capa, sumindo e colocou o mapa dentro das vestes, próximo à varinha. Desceu e novamente passou pela passagem do quadro.

- E agora, o que é isso? Hoje isso aqui está um movimento... – a Mulher Gorda comentou.

- Mas não vi ninguém passar... – foi a vez de Violeta. – Será que foi um fantasma?

- Ora, sua tola! Se fosse um fantasma, não precisaria abrir a passagem!

E as duas continuaram a discutir a aparição. Harry riu-se da discussão que provocou. O garoto desceu as escadas sem fazer barulho e procurou pela estátua da velha corcunda de um olho só, que escondia a passagem para Hogsmeade. Já fazia um bom tempo que não utilizava essa passagem e não conseguia se lembrar onde ficava. Resolveu utilizar o Mapa do Maroto.

- "Juro solenemente não fazer nada de bom." – ele disse a senha para revelar o conteúdo do mapa e tocou levemente o papel com a varinha. Magicamente, os corredores e passagens secretas do castelo apareceram no papel, assim como alguns pontinhos com os nomes de seus donos movimentando-se pelos lugares. O garoto achou a passagem marcada no mapa e verificou se não havia ninguém perto dela. Não, não havia ninguém; Filch e sua gata estavam na torre de astronomia, Snape nas masmorras, McGonagall na sala de Transfiguração. Contudo, ele notou um ponto desconhecido no mapa e, ao contrário dos outros que marcavam o nome e sobrenome das pessoas, este tinha apenas as iniciais: "A. F. E.". O garoto ficou intrigado, mas quando olhou no relógio, percebeu que estava atrasado e tratou logo de esquecer o ocorrido. Depois pensaria nisso, agora precisava achar a passagem.

Não demorou muito e logo estava em frente à velha corcunda. Tirou a varinha das vestes e apontou para a estátua: - Dissendium! – a passagem abriu e ele entrou. Por algum tempo, andou pelo corredor escuro até achar o açalpão. Abriu-o lentamente e, ao ver que não havia ninguém, saiu sem fazer barulho. Estava no porão da Dedosdemel. Andou lentamente, tomando cuidado para não esbarrar em nada. Assim que se viu na loja, procurou por Rony. Foi um pouco difícil, já que, ao que parecia, todos os alunos tinham decidido vir à loja ao mesmo tempo. Com dificuldade e tentando ao máximo não esbarrar em ninguém, Harry conseguiu encontrar o amigo, que estava mexendo em uma cesta com várias Delícias Gasosas. Harry cutucou-o, e este se virou assustado e perguntou em voz baixa:

- É você?

- Sim. Vamos sair daqui. – Harry respondeu no mesmo tom de voz.

Dessa forma, os dois saíram da loja. Dirigiram-se à um beco vazio. Assim que verificaram que não havia mesmo ninguém por perto, Harry abaixou o capuz, revelando apenas seu rosto. O corpo continuava invisível.

- Você demorou, Harry. Encontrou alguém no caminho? – Rony perguntou, com um tom preocupado.

- Mais ou menos... Encontrei a Sra. Figg.

- E ela desconfiou de você?

- Não, eu acho... Mas não liga pra isso, vamos dar uma volta por aí!

Assim, os dois começaram a andar pelo lugar. Harry, totalmente invisível como antes, caminhava ao lado de Rony, conversando baixinho com o amigo.

- Sabe, é muito estranho conversar com alguém invisível. Por que você não tira a capa?

- Melhor não, Rony.

- Tudo bem, aonde vamos primeiro?

- Vamos comprar os presentes!

E assim o fizeram. O primeiro lugar aonde foram foi uma loja feminina, pois Rony queria comprar "algo especial", como ele mesmo disse, para Hermione. Depois de muito escolher, ele optou por um perfume que quase esvaziou seus bolsos. Harry comprou um livro intitulado "Mil dicas para ser uma bruxa de sucesso". Ao menos ele achava que garotas gostassem de coisas assim e Rony concordou com ele. Harry passava as moedas para o amigo, que pagava como se tivesse ele mesmo comprado o presente. Dessa forma, Harry não se revelava.

A seguir foram a uma outra loja, onde Harry comprou uma moto em miniatura para Sirius. Certa vez, o padrinho contou-lhe que quando jovem tinha uma moto mágica e Harry se decidiu por esse presente. Combinou com Rony que ele diria que tinha comprado o presente no lugar de Harry, para Sirius não desconfiar que o afilhado tinha ido a Hogsmeade sem permissão.

Nessa mesma loja, sem Rony ver, Harry comprou uma coleção em miniatura dos jogadores do Chudley Cannons para o amigo. O problema foi na hora de pagar, já que o garoto não queria retirar a capa. Decidiu-se, então, em colocar o dinheiro no balcão da loja e escondeu o presente dentro das vestes.

A última loja que foram foi uma de meias, para Dobby, é claro. Harry comprou cinco pares, cada um mais estranho que o outro. Um deles era de um verde berrante, no sentindo da palavra, pois a meia berrava intensamente quando posta no pé.

- Totalmente inútil... – foi o que Rony disse.

- Mas ele vai gostar. – Harry respondeu.

Depois de feitas as compras, os garotos rumaram para o Três Vassouras. Rony pediu duas cervejas amanteigadas e sentiu-se extremamente idiota por estar bebendo e falando sozinho. Harry, porém, achava muita graça no amigo.

- Vamos pedir outra? – Harry sugeriu quando acabou com a bebida.

- Não mesmo. Eu é que não quero mais fazer papel de bobo aqui, nós vamos embora. – Rony respondeu, procurando algum dinheiro nos bolsos sem sucesso.

Harry riu. – Não tem ninguém olhando, Rony.

- Não, é? Pois aquele cara de capuz e mal encarado lá trás não tira os olhos da gente, quer dizer, de mim. – Rony indicou, apontando para atrás de si. O homem, que realmente vestia uma capa preta, pareceu notar o gesto de Rony, já que levantou e saiu.

- Ele já foi. – Harry disse. Notou que Rony agora batia nos bolsos e não encontrava nada, provavelmente o dinheiro tinha acabado. Harry jogou algumas moedas na mesa. – Já que eu te fiz passar por bobo, eu pago as cervejas.

Rony olhou para o amigo invisível, um pouco embaraçado. Levantou e pagou as cervejas para Madame Rosmerta. Os dois, então, saíram do estabelecimento e perceberam que tinha escurecido um pouco lá fora. Ambos estavam encasacados devido ao frio que fazia, mas parecia que agora estava mais frio que antes.

- Brrr. Tá mais frio ou é impressão minha? – Rony disse tremendo e se encolhendo.

- Não é impressão, esfriou mesmo... – Harry, tremendo também por baixo da capa, concordou. – Para aonde vamos?

- Para um lugar onde você não precise ficar invisível, não agüento mais falar com você sem te ver. Vamos para a Casa dos Gritos.

Os garotos se encaminharam para o lugar. Ficava cada vez mais frio enquanto andavam. Ao se aproximarem um pouco mais, repararam em uma movimentação estranha. Um raio cruzou o céu, que estava escuro mesmo sendo de tarde ainda. Gritos. Não só no ambiente, como também dentro da cabeça de Harry. Gritos que ele conhecia:

"Não o Harry, por favor!"

"Afaste-se menina tola!"

Harry tapou os ouvidos e sentiu que os joelhos começavam a ceder. A capa começou a escorrer pelo seu corpo, descobrindo-o no rosto e ombros. – Harry! – Rony o segurou para que não caísse. – O que está acontecendo?

Novos gritos. Alguém gritava desesperadamente. Tentando se manter de pé, Harry começou a correr naquela direção. Rony o seguiu. À medida que se aproximava, os gritos dentro de sua cabeça aumentavam e Harry tentava desviar o pensamento.

"Mate-me no lugar dele, faça o que quiser comigo, mas não mate meu filho!"

Eles estavam chegando. Harry sabia o que era aquilo...

Dementadores.

Pelo menos uma dúzia deles circundavam uma pessoa, que estava ajoelhada, tapando os ouvidos e gritando. Harry a reconheceu, assim como Rony:

- Gina! – o amigo bradou desesperado e correu em socorro da irmã. Passou pelo meio dos dementadores que fechavam o cerco e abraçou-se à irmã, tentando em vão protegê-la.

Harry sabia o que fazer. Pegou a varinha e apontou-a para os dementadores. Cerrou os olhos e tentou, angustiado, encontrar um pensamento feliz. Era difícil, os gritos ecoavam dentro de sua cabeça como espectros estridentes.

"Não, por favor, eu suplico!"

Finalmente encontrou. Lembrou da vitória sobre a Sonserina no quadribol. Com dificuldade, concentrou o pensamento no momento em que pegou o pomo, quando foi carregado pelos amigos grifinórios... Abriu os olhos e bradou com firmeza:

- Expecto Patronum!

Uma luz prateada começou a sair de sua varinha e tomar forma de um cervo, imponente e brilhante. Era a figura de Pontas, a forma animaga de seu pai, Tiago Potter. O cervo saiu da varinha e começou a correr na direção dos dementadores, que imediatamente se dispersaram por todos os lados, fugindo do patrono. Dentro de alguns minutos, todos tinham ido embora. Finalmente os gritos cessaram na cabeça de Harry. Ele olhou para seu patrono e o cervo se aproximou. O garoto estendeu a mão tentando tocá-lo, porém, ao fazer isso, o patrono se dissipou em uma névoa que sumiu logo após.

Harry olhou para Rony e Gina e se aproximou devagar deles. Rony ainda estava abraçado à irmã, tentando acalmá-la. Ela chorava e soluçava convulsivamente.

- Como ela está? – Harry perguntou.

- Fisicamente bem, mas emocionalmente... – Rony respondeu, com a voz ligeiramente abalada e depois voltou-se para ela. – Gina... Tá tudo bem agora... Eles foram embora. – contudo, ela continuava chorando descontrolada no peito do irmão.

Harry se ajoelhou ao lado deles e pousou sua mão no ombro dela. – Gina... – ela olhou para ele, soluçando, as lágrimas escorrendo pela face molhada. – Eles não vão voltar, fique tranqüila. Eu e o Rony vamos te proteger. – ela encostou a cabeça no ombro do irmão, soluçando ainda de vez em quando.

- Precisamos levá-la daqui. – Harry disse.

- Você está certo. – Rony respondeu, levantando o rosto da garota com os dedos. – Vamos, Gina...

- Ah, vocês não vão a lugar algum... – uma voz arrogante disse, atrás deles.

Harry se voltou para trás e tanto Rony, quanto Gina levantaram os olhos para ver quem era. Parado a alguns metros estava o homem encapuzado que encontraram no Três Vassouras. Ele apontava a varinha ameaçadoramente para os garotos.

- Vocês não sairão desse lugar, principalmente você, Harry Potter... – ele disse. – Só estou imaginando o que o Lord das Trevas irá dizer quando eu o levar para ele, Potter, entregue em uma bandeja... – ele se preparou para lançar uma maldição enquanto Harry já levantava a varinha, pronto para conjurar um feitiço que os protegesse quando uma outra voz gritou:

- Expelliarmus!

O Comensal da Morte saiu voando, entretanto não largou a varinha e caiu um pouco adiante, tentando se levantar com dificuldade. O capuz escorregou, revelando um rosto pálido de um homem loiro.

- Como vai, Lúcio? – Snape, o autor do feitiço de desarme disse com voz desdenhosa e a varinha em punho. Em seguida, voltando-se para os garotos, ordenou asperamente: - Saiam daqui, agora!

Rony se levantou rapidamente, e fez com que Gina levantasse também. Harry levantou, mas não tirava os olhos do professor e de Lúcio Malfoy.

- Vamos, Harry, anda logo! – Rony puxou o garoto pelas vestes.

- Mas...

- Vamos! – Rony deu outro puxão no amigo, que se virou e começou a correr junto com os dois irmãos Weasley. Ainda deu uma última olhada para trás e viu Lúcio Malfoy, já de pé, dizendo:

- Severo... Que decepção, você realmente se voltou contra nós... - Snape continuava impassível com a varinha apontada.

- Vamos, Harry, anda logo! – Rony apressou.

Harry decidiu, finalmente, seguir o amigo. Os três correram para dentro da Casa dos Gritos, que estava aberta, como sempre.

- Para aonde iremos? – Rony perguntou.

- A passagem do Salgueiro Lutador, vamos por lá! – Harry começou a correr, sendo seguido por Rony, este último um pouco surpreso.

- Você tá doido, Harry? Aquela árvore maluca vai nos massacrar em um instante!

- É a nossa única chance, Rony!

Os três subiram até o antigo quarto onde Remo Lupin passava seus dias de lua cheia, como lobisomem. Foi naquele quarto que conheceram Sirius. Correram pela passagem, em direção à saída, que dava no Salgueiro Lutador, uma árvore que com seus galhos, atacava qualquer um que se aproximasse. Harry ia na frente, sendo seguido de perto por Rony, que puxava Gina pela mão. A garota estava visivelmente assustada e atordoada, mas continuava correndo junto com eles.

Chegaram, finalmente, à saída. Harry tentou sair primeiro, mas os galhos do Salgueiro mexiam-se, intimidando-os. Não conseguiriam sair por ali.

- Não dá, ele tá muito arisco. – Harry disse. – Não vamos conseguir passar por ele...

- Eu te disse que não dava, Harry! O que faremos agora? – Rony perguntou, em desespero.

- Lumus Solem! – uma luz muito forte saiu da varinha de Gina. Rony e Harry olharam abasbacados para a garota, enquanto ela saía pela passagem sem nenhum problema. Os garotos a seguiram e foi com espanto que viram que o Salgueiro Lutador estava totalmente paralisado.

- Gina? O que, exatamente, foi isso? – Rony perguntou boquiaberto.

- A luz muito forte tem efeito paralisante em plantas mágicas que vivem no escuro, como o Visgo do Diabo, por isso resolvi tentar e deu certo. – ela respondeu e completou: - Aprendi na aula de Herbologia.

- Que bom que você presta atenção nas aulas, Gina. – Rony disse, incrédulo com o que via. A árvore, antes tão violenta, agora estava como uma planta normal, completamente paralisada.

- E esse efeito é permanente, Gina? – Harry perguntou.

- Não. É melhor corrermos.

Rony engoliu em seco e olhou para Harry assustado, este retribuiu o olhar e os três começaram a correr. Quando estavam a apenas alguns metros da planta, ela começou a se mover e bater os galhos para todos os lados. Continuaram a correr e, somente quando estavam bem longe, pararam para um descanso.

- Ufa! – Rony suspirou com as mãos nos joelhos, tentando recuperar o fôlego. – Finalmente!

- O que foi aquilo? Aqueles dementadores e aquele... – Gina começou.

- Comensal da Morte. – Harry completou.

- Vocês viram? Era Lúcio Malfoy, o pai de Draco Malfoy! – Rony disse.

- Então são mesmo verdadeiros os boatos de que ele é mesmo um seguidor de... de... – Gina parecia não conseguir falar a palavra.

- Você-sabe-quem! – Rony sussurrou.

Harry não disse nada, já sabia há muito tempo que Lúcio Malfoy era um seguidor de Voldemort. Da última vez que esteve com o Lord, viu vários comensais e entre eles estava o pai de Draco Malfoy. No momento, Harry estava mais preocupado com outra coisa que não sabia o que era. Olhou para o castelo, que estava escuro, e subitamente sentiu uma dor imensa em sua cicatriz que o fez cair ajoelhado no chão, apertando a testa e gritando de dor.