Título da Fic: A Sabedoria De Um Tolo
Autora: Flora Fairfield
E-mail: florafairfield@yahoo.com


Categoria: Romance/Drama
Classificação: PG-13
Sinopse: Continuação de 'Amor da Vida Nossa': A Guerra toma conta do mundo mágico e
Draco Malfoy acaba se encontrando onde nunca se imaginou: no meio da tempestade. Ele quer
fazer a coisa certa, e está tentando fazer a coisa certa, mas... será que ele está preparado
para isso? D/G Pós-Hogwarts


Disclaimer: Eles não são meus. São da Rowling.


N/A: Bom, pessoal, aqui está o capítulo 4 (antes do dia 25, Didiquinha, como você pediu!).
Desculpem pela demora. Ele deveria ter sido postado terça, mas esse capítulo merecia o título
de 'o capítulo que não queria terminar'. Ele acabou ficando gigante, o maior de todos até agora.
Peço desculpas também pela falta de interação D/G, mas eu tinha avisado que a Gina não
apareceria em carne e osso. Mas ela aparece em pensamento. Espero também satisfazer vocês,
fãs do Lupin. Talvez ele não apareça tanto quanto vocês gostariam, mas ele tem um papel
importante agora e vai continuar tendo um papel importante no futuro. Espero que gostem!


N/A2: Como sempre, eu quero agradecer aos e-mails e reviews que recebi. Fico feliz, muito feliz
em saber que você estão gostando! Esta história está ganhando vida própria e é provável que ela
acabe ficando maior até do que eu tinha planejado. Provável não. Certo! Na realidade, ela vai
ter três capítulos a mais do que eu planejara. Pelo menos por enquanto. A gente nunca sabe o
que vai acontecer. Bom, muito obrigada mesmo por tudo! Vocês são uns amores e, por favor,
continuem mandando suas opiniões.


N/A3: Para todos que perguntaram, eu não devo colocar essa história na Harryoteca não. Nada
contra o site, pelo contrário. Eu gosto muito de lá, mas a fic já está aqui no fanfiction.net e
também está no Três Vassouras ( http://alianca3vassouras.kit.net/fanfics/index.html ) que é um
site do qual eu gosto muito e eu acho que é suficiente. Pelo menos por enquanto. Pode ser que
eu mude de idéia no futuro, mas por ora, estou satisfeita.


Boa leitura!!!


* * *


Capítulo 4: Ossos Do Ofício



25 de novembro

Draco estacionou cuidadosamente o carro que havia alugado. De todas as coisas que ele
tivera que aprender para se passar por um trouxa, dirigir foi provavelmente a que deu mais
trabalho. Não que ele estivesse pronto para admitir isso, é óbvio. Não há nada que qualquer
trouxa seja capaz de fazer que ele, Draco Malfoy, um bruxo graduado, não possa também
aprender. Ou pelo menos era isso que ele repetia para si mesmo todos os dias de manhã. Com
um suspiro resignado diante do seu próprio destino, ele saiu do automóvel, batendo a porta
displicentemente e depois apertando o botão no chaveiro para trancá-la e acionar o alarme do
carro. Dando uma olhada ao seu redor, Draco soltou outro suspiro. Nunca ele teria imaginado ao
sair da Inglaterra quase um ano antes que terminaria por se encontrar num lugar como aquele.
Vasculhando sua mente, ele procurou lembrar se já tinha ouvido falar daquele local antes da
conversa ao telefone daquela manhã, mas não encontrou nada. Lupin o repreendera levemente.
'Nós já estamos aqui há um ano' ele dissera 'Você deveria conhecer melhor o país onde
vivemos'. Mas Draco não se importava com isso. Ele conhecia o mínimo necessário, aprendia
apenas o suficiente para sobreviver e fazia sempre poucas perguntas. Procurava não se envolver,
mas era impossível. Se ele achara que saindo do Reino Unido se afastaria da tempestade,
enganara-se. Ele se encontrava agora bem no meio do furacão.

Com uma rápida olhada na direção do relógio de pulso, constatou que havia chegado um
pouco cedo. Não era a primeira vez que deveria desempenhar uma tarefa como aquela. Durante
os últimos onze meses que passara na Espanha, ele já estivera um punhado de vezes na mesma
situação. Normalmente, contudo, conseguia controlar bem os nervos, agir como se tudo estivesse
normal, como se fosse apenas um turista em férias, mas naquele dia em particular, Draco estava
inquieto. Nervoso quase. Talvez fosse o lugar, tão silencioso e solene, mesmo ali embaixo, que
o estivesse deixando preocupado. Independente do motivo, entretanto, ele sabia que precisava se
acalmar ou então não teria chance alguma.

Mantendo esse objetivo em mente, Draco abriu a porta da pequena lanchonete que havia
em frente à vaga onde o carro estava parado. O lugar estava praticamente vazio. Apenas um
senhor atrás do balcão e dois adolescentes parados, conversando animadamente em alemão
enquanto bebiam suas xícaras de café. Sem dar atenção a eles, Draco se dirigiu ao balcão,
pedindo também uma xícara de café forte, um 'italiano', como eles chamavam. Sua voz saiu da
boca praticamente irreconhecível. Ele falou em espanhol, com um sotaque americano carregado.
Vendo seu reflexo de relance no espelho que havia no fundo da loja, ele se contraiu
involuntariamente. Por mais que estivesse acostumado, era sempre um choque se enxergar assim,
com os cabelos e os olhos escuros e a pele ligeiramente bronzeada. Tudo - a voz, o sotaque, as
mudanças na aparência - fazia parte da sua nova identidade. Ali, ele não era Draco Malfoy,
bruxo puro-sangue, formado em Hogwarts, traidor dos ensinamentos do próprio pai, membro da
Ordem de Fênix. Ele era John Merivel, americano, mercenário especialista em explosivos que
poderia ser ligado a uma série de atentados em vários países nos últimos meses. Os feitiços que
permitiam o disfarce, incluindo o sotaque, eram complicados e a poção para alterar a voz
demorava para fazer efeito, por isso, era mais simples não voltar ao normal. Draco acabava,
então, passando a maior parte do tempo com essa aparência morena, mas não conseguia se
habituar. Aquele simplesmente não era ele.

Pouco depois, terminou de tomar o café, pagou e saiu da lanchonete. Ficar ali enrolando
não adiantaria de nada. Subindo, então, as escadarias, Draco chegou ao local que estava
procurando. A explanada se estendia por mais de trinta mil metros quadrados. Olhando para
frente, ele tinha uma vista verde privilegiada. Às suas costas, no alto da montanha, uma grande
cruz erguia-se, imponente. Estava frio ali. O vento gelado batia ligeiramente forte, obrigando
Draco a fechar o casaco e colocar as mãos enluvadas nos bolsos. O lugar era silencioso e estava
deserto, o que apenas contribuía para aumentar a sensação de perigo na mente dele. Havia
alguma coisa ali que simplesmente não estava certa.

Descartando, finalmente, a paisagem, Draco virou-se e se dirigiu para a entrada da igreja
que havia sido escavada dentro da montanha. A fachada era grandiosa, toda de pedra. O local
inteiro era cinzento: o chão, a construção, até mesmo a estátua que existia bem em cima da
porta. E o dia estava um dia cinzento, com nuvens escuras no céu e um vento que fazia Draco
tremer mesmo estando ele bem agasalhado. Tentando afastar os maus pensamentos, ele se
sacudiu mentalmente e conferiu nos bolsos se sua varinha estava bem guardada. Além disso,
verificou também a presença de uma outra coisa: uma caixinha preta pequena. Ela era o motivo
do encontro de hoje. Era ela que deveria ser trocada. Um pouco mais tranqüilo, ele subiu os
degraus que faltavam e entrou na igreja.

Passando por uma lojinha de souvenires, ele foi direto para os detectores de metais que
davam acessou ao interior. Retirando o casaco, ele o colocou na esteira enquanto passava pelo
arco detector. Não estava carregando nada que fosse acionar os alarmes. Sua única arma
passaria apenas por uma excentricidade ou por um brinquedo de crianças entre os trouxas. Sem
conseguir conter o sorriso superior, ele pegou de volta o casaco, colocou-o e seguiu em frente.
Não estava frio ali dentro, mas ele queria estar com a varinha ao alcance das mãos para quando
precisasse.

Um longo e amplo túnel levava à nave da igreja. Ao fundo, era possível ver uma grande
cruz, com Cristo crucificado erguida no que deveria ser o altar. Draco ainda não estava perto o
suficiente para saber. As paredes do túnel estavam bem iluminadas e eram cobertas de tanto em
tanto por tapeçarias com motivos religiosos. Aquela não era uma igreja antiga. Havia sido
construída neste século e fora inaugurada nos anos 50. A modernidade ficava óbvia nas paredes,
nas obras de arte, na arquitetura. Era um lugar bonito, mas Draco não conseguia se livrar da
sensação estranha de que algo estava fora do lugar. Havia algo de lúgubre naquele local. Como
ainda não havia realmente começado a alta temporada para o turismo, não havia muitas pessoas
visitando a igreja. Apenas um casal do oriente, provavelmente japoneses, um outro pequeno
grupo de alemães - Draco imaginou que talvez estivessem juntos com os dois, que estavam
tomando café - e mais duas pessoas ao longe, perto do altar. Andando devagar e fingindo
interesse nas obras de arte, Draco se dirigiu também para a nave. Era ali que deveria encontrar o
seu contato.

Chegando, finalmente, ao altar, ele pôde examinar de perto as duas pessoas que também
pareciam estar visitando a igreja. Uma delas era uma mulher de uns quarenta anos, de cabelos
loiros e óculos redondos. A outra era um homem mais novo, na casa dos trinta, de aparência
inegavelmente espanhola. Nenhum dos dois era o seu contato. Draco olhou de novo o relógio.
Passavam-se dez minutos da hora marcada. Ele tentou se convencer de que isso não era
necessariamente ruim, que o contato já tinha se atrasado outras vezes, mas a sensação de perigo
apenas aumentou. Afastando-se um pouco das duas pessoas, ele colocou-se logo abaixo da
cúpula da igreja, e fingiu estar examinando-a. Era bonita, é verdade. Mas ele estava com
preocupações demais na cabeça para notar.

- Linda, não é mesmo? - disse uma voz às suas costas. Draco virou-se imediatamente,
surpreso, e encontrou o homem espanhol que vira antes sorrindo na sua direção.

- Sim - ele respondeu após alguns segundos, procurando esconder sua irritação e sua
desconfiança - muito bonita - e virou-se novamente para a cúpula, tentando dispensar o estranho.

- Os pássaros vão para o sul no inverno - o homem falou, por fim, tomando
completamente a atenção de Draco. Ele falara a senha. A senha que teoricamente apenas o
Draco e o contato deveriam saber.

- Quem é você? - Malfoy perguntou, a expressão impossível de se ler, mas, por dentro,
ele tinha certeza agora de que algo estava muito errado.

- Um amigo do seu amigo. Ele não pôde vir e me enviou para buscar a encomenda - o
homem sussurrou.

- Sinto muito, mas meu amigo não enviaria um substituto. Eu não posso te entregar a
encomenda - Draco respondeu também em voz baixa, fazendo menção de se afastar.

- O depósito já foi feito. Você está se recusando a entregar a mercadoria? - o outro
perguntou, segurando-o de leve pelo braço.

- Eu entregarei quando o meu contato vier buscá-la. Foi isso que combinamos pelo
telefone hoje de manhã. Foi isso que fizemos todas as vezes. Por que agora seria diferente?

- Porque houve um imprevisto.

- Não havia imprevisto algum hoje de manhã.

- Ora, você sabe tanto quanto eu que, no nosso ramo, imprevistos acontecem de uma
hora para outra, de um minuto para o outro - o homem falou, sorrindo - Mas, prevendo a sua
recusa, seu amigo mandou isso - completou, entregando a Draco um pedaço de papel dobrado.
Malfoy pegou o papel e o abriu. Era um bilhete, escrito com a letra do contato. O
conteúdo da nota estava escrito em código, mas dizia que ele deveria cumprir sua parte no
acordo, que estava tudo bem. Draco sabia, entretanto, que não estava. O bilhete não tinha valor
algum sem que ele pudesse ter certeza de que fora escrito de livre e espontânea vontade. Além
disso, não havia como saber se esse homem que estava na sua frente conheceria o local do
próximo atentado, como o contato sempre sabia. Essa era a parte principal da troca. Draco só
estava ali para poder descobrir onde a bomba explodiria. Sem ter certeza de que iria obter essa
informação, ele não poderia simplesmente entregar a caixa preta que continha os dois frascos
com substâncias que, quando misturadas, tornavam-se altamente instáveis. Eram uma fórmula que
os trouxas não conheciam, obtida através da utilização de plantas mágicas e, por isso, podiam
passar despercebidas pela segurança de qualquer local. Poderiam ser utilizadas para fazer uma
bomba perfeita e era por isso que Draco as vendia.

Quando chegara à Espanha, ele se preparou para assumir essa nova identidade: John
Merivel, um bruxo americano, especialista em explosivos que estava disposto a vender seu
conhecimento. Ele se aliou a um pequeno grupo de bruxos ligados a Voldemort cujo objetivo era
prestar auxílio a organizações terroristas. Lupin tinha razão quanto aos métodos que o Lorde
das Trevas estava escolhendo empregar. Ele queria apenas propagar o caos.

- Sinto muito - Draco finalmente falou - mas mesmo assim eu não poderei entregar a
encomenda a você. Nada me garante que esse bilhete seja verdadeiro.

- É a letra dele.

- Sim, é. Mas poderia ser uma falsificação. Ou ele poderia ter sido coagido a escrevê-lo
da mesma forma que poderia ter sido coagido a te dizer a senha. Com licença, mas eu só
entregarei a mercadoria ao meu amigo em pessoa - Malfoy completou, virando-se e começando
a contornar o altar em direção ao túnel que levava à saída.

- Sr. Merivel - o homem o chamou novamente - tem certeza de que não quer
reconsiderar? - havia um brilho no olhar dele que deixava óbvia a ameaça implícita nessas
palavras. Draco quase riu alto. O contato que ele deveria encontrar era um bruxo. Um dos
bruxos que fazia parte dos seguidores de Voldemort. Eles não eram todos ingleses, é verdade,
mas esse homem que se encontrava parado na sua frente não era um deles, Draco sabia.
Duvidava, inclusive, que ele fosse sequer um bruxo. Era provavelmente um trouxa e não havia
nada que um trouxa pudesse fazer que ele, um Malfoy, fosse temer.

- Sim, eu tenho certeza - respondeu, então, sem hesitar e continuou caminhando para fora
da nave da igreja. Podia sentir ainda o olhar do homem queimando nas suas costas, mas procurou
não dar atenção a ele. A mulher que estava perto do altar antes já havia ido embora e apenas o
grupo de alemães continuava na igreja, mas eles estavam longe, perto da saída. Suas vozes e os
passos de Draco eram as únicas coisas que podiam ser ouvidas. Subitamente, a sensação de
perigo voltou com toda a força. Um medo irracional tomou conta da mente de Malfoy, e ele
instintivamente colocou a mão no bolso procurando a varinha. Era tarde demais, contudo, para
que ele pudesse fazer qualquer coisa.

Primeiro, ele ouviu os passos do homem se movendo na sua direção. Depois, logo em
seguida, ele ouviu o estrondo. Um barulho alto, que preencheu toda a igreja e fez com que os
turistas e os funcionários na entrada se virassem para ver o que estava acontecendo. Ele
escutou ainda o homem gritando alguma coisa em espanhol, mas não entendeu o que era, porque
foi nesse momento que ele começou a sentir a dor. Uma dor profunda que começou em algum
ponto nas suas costas e se expandiu para todo o corpo. Olhando para baixo, ele notou o sangue
saindo do seu peito. Por um segundo, se perguntou como isso era possível se a dor havia
começado nas costas, mas, no segundo seguinte, todo pensamento consciente foi varrido da sua
mente enquanto ele caía no chão.

Com um baque seco, sua cabeça bateu de encontro ao piso. Ele havia conseguido tirar a
mão do bolso e estava segurando sua varinha, mas não sabia o que fazer. Aquilo não era como
ser atingido por um feitiço. Draco estava atordoado, confuso. Sua visão estava embaçada. Ele
podia sentir seu sangue escorrendo. Podia sentir o gosto do sangue na sua boa e, antes que
pudesse esboçar qualquer reação, o homem estava de novo, em pé, perto da sua cabeça e
chutara para longe a varinha que não estava muito firme em sua mão. Draco a viu rolar para
longe com um sentimento distante de terror. Aquilo não podia estar acontecendo. Ele se
recusava a acreditar.

O homem falou mais alguma coisa em espanhol, mas Malfoy novamente não entendeu.
Talvez seja verdade que, quando nos encontramos em um momento difícil, pensamos e falamos
instintivamente na nossa língua natal. Naquele instante, Draco Malfoy não conseguia entender
uma palavra em espanhol. Ele também não compreendia por que ninguém estava fazendo nada.
Eleainda podia vislumbrar os turistas e os funcionários, parados, assistindo. Seria comum
que um homem começasse a atirar em outro assim, em pleno ponto turístico? Draco sabia que não.
Realmente, havia algo errado naquilo tudo.

Ele fechou os olhos por um segundo. Estava cansado. Foi acordado em seguida, contudo, por
uma voz sussurrando em seu ouvido:

- Você acha que eu não sei quem você é? - o homem inclinara-se sobre ele, enquanto
procurava algo em seus bolsos. Malfoy tentou se mexer, tentou reagir, mas não tinha forças. Não
conseguia respirar direito. Suas mãos e suas pernas não obedeciam aos comandos do cérebro -
Você precisa saber - o homem continuou depois de ter finalmente encontrado a caixa preta que
procurava - por que está morrendo. Você acha que é por causa disso? - perguntou ele,
colocando a caixinha diante dos olhos de Draco - Está enganado. Você morrerá hoje como o
traidor que é, Draco Malfoy.

Mesmo com o cansaço, as últimas palavras do homem foram suficientes para clarear um
pouco a mente dele. Então era isso. Ele havia sido exposto. Voldemort havia descoberto tudo.
Alguém o reconhecera. E era por isso que ele morreria.

Ele ouviu o homem se levantar. Sabia o que viria a seguir. Mais um tiro, provavelmente.
E, dessa vez, ele não estaria consciente quando a dor fosse começar a aparecer. Não. Dessa vez,
não haveria chance de pensar nem mais um segundo. Seria inútil reagir, Draco sabia. Inútil.
Pela primeira vez desde que chegara à Espanha, ele se permitiu realmente pensar nela e no que
havia acontecido entre eles. Se ele não tivesse sido tão estúpido, ainda estaria com ela, a
salvo na Inglaterra. E não morrendo em uma emboscada na Espanha. 'Agora, é tarde demais' ele
disse mentalmente. Depois, se repreendeu. Como era possível que ele escolhera gastar seus
últimos instantes de consciência pensando em Virgínia Weasley? Não, não era possível, mas,
aparentemente, era o que estava acontecendo. Finalmente, Draco fechou os olhos, ainda com a
imagem dos olhos dela como ele os vira pela última vez, tristes e feridos, na cabeça, esperando
pelo último tiro. Aquele foi o segundo mais longo da sua vida. Um segundo que pareceu durar
para sempre.

Subitamente, outro estrondo foi ouvido dentro da igreja. 'É agora', ele pensou, se
preparando. Mas não perdeu a consciência. A dor continuava a castigá-lo. Sua respiração estava
cada vez mais difícil. Ele havia perdido muito sangue. Não havia, contudo, nenhuma nova dor.
Nenhum novo impacto. Confuso, Draco abriu novamente os olhos. Dessa vez, entretanto, não
conseguiu ver os turistas e os funcionários parados, observando, porque entre eles se
interpuseram vários pares de pernas que não estavam ali antes. Fazendo um esforço quase
impossível diante do seu ferimento, Draco virou a cabeça e, ao seu lado, pôde ver caído o
homem que o atacara. Ele não sabia exatamente o que estava acontecendo. Não deveria haver
nenhum grupo de resgate. Apenas Lupin sabia onde ele estava e não havia razão para que ele
achasse que algo estava errado.

Antes que pudesse chegar a qualquer conclusão, contudo, Malfoy se sentiu ser puxado e
virado cuidadosamente. Suas costas estavam apoiadas em algo agora. Não era no chão. Talvez
uma maca. Seus pensamentos estavam ficando mais confusos. A respiração, mais difícil. Ele
piscou uma vez e, quando abriu de novo os olhos, deparou com o semblante preocupado de
Lupin o encarando. 'Então ele soube que havia algo errado!', Draco ainda pensou antes que o
cansaço começasse a se tornar muito grande.

- Não! - ele ouviu a voz do ex-professor falando, mas ela estava tão distante que Malfoy
quase não a escutou - Não feche os olhos, Draco. Entendeu? Fique comigo - ele completou.
Draco tentou obedecer. Sabia que era importante obedecer por algum motivo que ele não
conseguia lembrar. Ele tentou, mas o cansaço estava grande demais. Suas pálpebras estavam
pesadas demais. Lupin tentou dizer mais alguma coisa, mas Draco não ouviu. Não escutou mais
nada até que a escuridão o envolveu e todos os pensamentos foram varridos da sua mente.




- Draco - alguém o estava chamando. Ele podia ouvir, mas não tinha certeza se queria
abrir os olhos - Draco - repetiu novamente a voz, dessa vez mais alto. Malfoy conhecia aquela
voz. Ele sabia de quem era, mas não estava conseguindo identificar agora. Por um segundo,
imaginou se não seria a voz dela, como costumava acontecer nos seus sonhos, mas, em seguida,
a voz o chamou de novo e era claramente masculina. Além disso, era uma voz mais autoritária.
Não uma voz doce como a de Virgínia. Xingando-se mentalmente por ter pensado as palavras
'doce' e 'Virgínia' na mesma sentença, Draco decidiu finalmente abrir os olhos.
Parecia simples. Ao menos, pensar era simples, mas executar o pensamento não era tão
fácil. A primeira coisa que Malfoy sentiu foi a dor. Dor por todo o seu corpo. Num instante,
todas as lembranças do que acontecera voltaram a sua mente. Ele havia levado um tiro. Um tiro.
De um trouxa qualquer. Ele, Draco Edward Malfoy, quase morrera porque um trouxa, alguém
sem nenhuma habilidade mágica, simplesmente atirara nele. Isso era um absurdo. Um ultraje.
Humilhante demais. Muito pior do que a dor física.

Tentando esquecer pelo menos por um segundo o que ele considerava a pior coisa que
poderia ter lhe acontecido, Malfoy tentou descobrir onde estava e de quem era a voz que lhe
estava chamando.

- Finalmente! - a voz falou de novo. Virando o rosto na sua direção, Draco descobriu um
Lupin preocupado e com uma aparência cansada olhando-o - Você nos deu um grande susto.

- Você está horrível - Malfoy não pôde deixar de dizer ao notar os círculos pretos ao
redor dos olhos do ex-professor, sua expressão exausta e suas roupas amassadas.

- Você leva o tiro e ainda diz que eu estou horrível? - Lupin perguntou - Bom, acho que
eu não poderia mesmo esperar nada melhor de um Malfoy - ele completou usando um tom
divertido - Você é um caso perdido.

- E só agora que você descobriu? - Draco perguntou, tossindo ao final.

- A sua recuperação completa ainda deve levar alguns dias - Lupin falou, subitamente
sério, como se a tosse do outro tivesse servido para lembrar-lhe do que ocorrera - A bala
perfurou o pulmão esquerdo. Sua sorte foi não ter sido levado para um hospital trouxa. Nesse
caso, a recuperação seria bem mais longa.

- Onde eu estou?

- Em Madrid de novo. Não se preocupe. O esconderijo é seguro. Nós não poderemos
permanecer aqui por muito tempo, mas por enquanto, não há nada com que se preocupar.

- Voldemort sabe - Draco afirmou, lembrando-se das últimas palavras do homem que o
atacara.

- Sim, eu sei. Por que você acha que eu fui lá?

- Como você descobriu?

- Tem havido alguns sinais.

- Sinais? Que sinais?

- Nada muito concreto. Apenas pequenas coisas, pequenos indícios. Eu estava
desconfiado. Quando você saiu ontem de manhã, alguma coisa estava errada. Eu podia sentir.

- Intuição feminina? - Draco perguntou, tentando sorrir com um pouco de malícia. Lupin
estava acostumado com ele o suficiente para não levar a mal o comentário.

- Intuição de lobo, se você preferir - o ex-professor respondeu, devolvendo o sorriso só
que sem malícia - Quando eu recebi, então, a coruja de Dumbledore avisando que Voldemort
descobrira sobre a nossa missão aqui, não pensei duas vezes.

- Como ele descobriu? - Malfoy perguntou, intrigado.

- Essa é uma boa pergunta, mas eu não tenho certeza da resposta - o outro disse,
puxando uma cadeira para sentar ao lado da cama - Se eu tivesse que apostar, contudo, diria que
foram os feitiços da memória que nos denunciaram.

- Não há nada de errado com os meus feitiços da memória - afirmou Draco, ofendido.

- E eu não estou dizendo que há. Mas você sabe como essas coisas podem ser
traiçoeiras. Na minha opinião, alguém deve ter finalmente percebido que a maioria dos ataques
nos quais você se envolveu ultimamente foi mal sucedida por um motivo ou outro. E que a
pequena parcela de bombas que efetivamente chegaram a explodir acabaram por causar um
estrago bem menor do que o esperado. Daí para interrogarem o seu contato e descobrirem os
feitiços que você usou nele para obter a informação sobre os locais dos atentados e os feitiços
depois para fazê-lo esquecer isso, deve ter sido um pulo. Não se culpe, Draco. Nós sabíamos
que esse tipo de ação não poderia durar para sempre. Cedo ou tarde, você seria exposto.

- Por que você acha que eu estou me culpando? - o outro perguntou, com desprezo na
voz.

- Bom, seria algo natural.

- Natural para quem? Talvez para vocês, grifinórios, que gostam de carregar toda a culpa
do mundo nos ombros, mas sem dúvida não para mim!

- Malfoy, você não está mais na escola. Nem tudo tem a ver com a casa em que o
chapéu te colocou. Sentir culpa, por exemplo. Não importa se você estava na Sonserina ou na
Grifinória. Sentir culpa tem apenas a ver com ser humano. E todos nós sentimos da mesma forma.

- Se isso fosse verdade, não haveria dois exércitos lutando nessa Guerra.

- Isso é verdade - retrucou Lupin - quer você queira ou não. Poderiam existir dez
exércitos lutando nessa Guerra e ainda assim todos sentiriam da mesma forma.

- Não tem importância - Draco respondeu com uma risada seca - No fundo, nada disso
importa. Afinal de contas, qual a diferença? Se as coisas tivessem dado errado, eu seria o
único a morrer e ninguém sentiria minha falta.

- Ah! Agora você está falando besteira.

- Estou? Como você sabe? - ele perguntou cheio de ironia.

- Eu sei, porque eu sentiria a sua falta. Você tem sido um companheiro irritante, mau-
humorado, desleixado, desinteressado no mínimo. Mas ainda assim você faria falta. E eu estou
certo de que se você se preocupasse um pouco mais em ser menos... menos...

- Mal-educado?

- Arrogante. Se você se preocupasse em ser menos arrogante, um número maior de
pessoas também sentiria sua falta.

- Estou comovido - Draco disse com sarcasmo, mas ele não duvidava do que Lupin
falara. De alguma forma, nesses últimos onze meses, os dois haviam desenvolvido uma estranha
amizade. Malfoy desprezara o outro quando foi seu aluno. Desprezara-o porque ele era pobre.
Depois, porque ele era um lobisomem. Achava-o inferior, sujo, e nunca fizera questão de
esconder isso. E agora, esse mesmo homem estava ali, sem se preocupar em disfarçar sua
preocupação pelo estado de saúde dele. E, estranhamente, Draco não estava incomodado com a
sua presença. Ao contrário, ele se sentia reconfortado. Mais até do que estaria se fosse Snape
ao seu lado, já que o professor de poções nunca deixaria tão evidente o que pensava e sentia.

- Bom, você tem mais alguma pergunta sobre o que aconteceu ontem?

- Na realidade - começou Malfoy, lembrando-se de algo - eu gostaria de saber como ele
conseguiu entrar com uma arma lá e por que ninguém fez absolutamente nada quando ele atirou!

- Ah! Já estava demorando para você perguntar. Ele usou isso - respondeu Lupin,
entregando para Draco um distintivo policial.

- O homem era da polícia???

- Era. Mas não honesto, é óbvio. Não se preocupe. Ele está preso agora.

- Mas alguém com certeza vai querer terminar o serviço por ele, não é mesmo?

- Sim, com certeza. Por isso, você deve ficar escondido por uns tempos.

- Onde?

- Eu estava pensando em deixar você com um amigo meu - disse Lupin, demonstrando
um certo desconforto - Alguém acima de qualquer suspeita.

- E qual o problema com ele?

- Ele é trouxa. Eu não sei se você vai aceitar. Mas você com certeza estaria seguro -
Draco parou para pensar um instante. Talvez estivesse na hora dele começar a parar de
subestimar os trouxas. Afinal, quando o homem o ameaçara, ele não achara que haveria algo que
ele pudesse realmente fazer. Draco tivera vontade de rir e onde isso o levara? A uma cama de
hospital. Se fosse um bruxo na posição do homem, falando no mesmo tom, Malfoy teria se
colocado em alerta imediatamente. De certa forma, foi o seu próprio preconceito que o feriu.

- Está bem - ele falou por fim, contrariando boa parte dos seus sentimentos - Eu não me
importo de ficar com ele.

- Ótimo. Já que é assim, eu vou preparar tudo e você irá logo que o médi-bruxo te
liberar. Tente descansar agora, Draco.

- E você tente aceitar o próprio conselho - o outro respondeu, vendo Lupin se levantar -
Como eu disse: você está horrível.

- Eu irei, Draco, eu irei - ele falou, enquanto se dirigia para a porta. Em instantes, Malfoy
estava sozinho de novo, mas não teve tempo para pensar. Ainda estava cansado e o sono acabou
por vencê-lo quase que instantaneamente.




Draco acordou com a luz batendo em seu rosto. Sua cama ficava perto da janela e
sempre sofria com os primeiros raios do sol. Virando-se com mau-humor ele conferiu as horas no
relógio. Ainda eram seis da manhã. Era cedo, mas não havia muita opção. Draco nunca conseguia
dormir muito bem, principalmente depois do amanhecer, então jogou as cobertas para o lado e se
levantou. O quarto onde estava era praticamente estóico. Tinha a cama, uma pequena mesa de
cabeceira onde estavam apoiados seu relógio de pulso e sua varinha, uma cadeira na qual estava
pendurada uma camisa, um pequeno guarda-roupas e uma cruz de madeira na parede. Só isso. A
pequena casa seguia toda essa linha: não havia nada desnecessário. O lugar era simples, mas
bem limpo e organizado meticulosamente. Não era o que ele estava acostumado. Mesmo em
Hogwarts, a mobília era um tanto quanto exuberante. Não havia, contudo, nada que pudesse ser
feito.

A pior parte, entretanto, não eram os móveis. Quando Lupin dissera que ele ia ficar com
um amigo, Draco nunca poderia ter imaginado que acabaria tendo que morar, mesmo que
teoricamente por pouco tempo, com um velho padre trouxa que, na opinião dele, já estava
começando a ficar senil. E nem que iria ter que ficar trancafiado em um mesmo lugar sem livros
- além da Bíblia - ou sem um rádio mágico, enfim, sem absolutamente nada para distrair sua
atenção. Ele apenas não morrera de tédio ainda porque era obrigado a ouvir a constante ladainha
do padre sobre esse ou aquele assunto. E mesmo ela era menos ruim que o silêncio absoluto de
quando o velho padre estava fora, fazendo sabe lá Deus o quê.

Draco não tinha autorização para ir à rua sozinho sem nenhum disfarce. Ele não estava
com a aparência modificada, nem tinha achado necessário modificá-la já que não havia mesmo
nenhum lugar para se visitar. Ele também não podia receber corujas e isso eliminava suas
chances de ler algum jornal bruxo. Enfim, ele estava vegetando ali e só esperava a hora em
que o padre começasse a querer convencê-lo de que Deus existe para cortar os pulsos. Não.
Isso não. Só esse pensamento era suficiente para trazer de volta uma memória dolorosa demais
e, sempre que ele cruzava a sua cabeça, Draco procurava enterrá-lo de volta. Ele não podia,
simplesmente não podia voltar a pensar nela. Desde que chegara à Espanha, estivera sempre
tão ocupado que fora fácil colocá-la de lado, no fundo da sua mente, mas agora isso tornava-se
cada vez mais difícil. Desde que ele quase morrera, era impossível não pensar em Gina durante
cada minuto livre que ele tinha e Draco estava enlouquecendo com isso. Ele não sabia como, não
sabia por que, só sabia que queria vê-la, queria abraçá-la. Ele precisava disso como nunca
precisara de nada na sua vida e tornava-se cada vez mais difícil lutar contra esse sentimento.
Se ele não fizesse algo a respeito, acabaria enlouquecendo de verdade.

Com um suspiro cansado, ele tirou o pijama e colocou a roupa, sem se incomodar em
pôr os trajes bruxos, mas guardando a varinha cuidadosamente em um bolso especial da sua
calça. Ali, ele deveria parecer um trouxa comum. Depois, foi até o banheiro para lavar o rosto
e escovar os dentes. Com fome, se dirigiu para a cozinha para tomar o café da manhã e ficou
surpreso em encontrar o padre ainda em casa. A essa hora, normalmente ele já tinha saído.
- Ainda aqui? - ele perguntou no seu espanhol carregado com um forte sotaque britânico.
Ele não se preocupara em aprender a falar muito bem a língua. Bastava usar um simples feitiço
para consegui-lo, mas agora que ele não podia usar mágica, se arrependia por não ter se
esforçado mais.

- Ora, não há motivo para parecer tão desapontado - o padre respondeu num inglês
consideravelmente melhor do que o espanhol do outro - Eu irei logo, mas hoje não consegui
acordar muito cedo. Deve ser a idade. Quando eu era jovem, esse tipo de coisa não aconteceria,
mas agora acho que posso me permitir algumas indulgências, não é mesmo? - ele completou com
um sorriso. 'Pronto' Draco pensou 'Vai começar a ladainha' - Eu estava pensando, Sr. Malfoy,
se o senhor não gostaria de ir comigo algum dia desses? - Draco ficou paralisado um instante
diante da possibilidade de poder sair de casa.

- Lupin não lhe falou que eu não poderia sair? - ele disse, cuidadoso. Sabia que se
realmente quisesse sair, o velho nunca poderia impedi-lo, mas também sabia que Lupin deixara
instruções explícitas ao padre para vigiá-lo.

- Bom, com certeza quando Remo disse isso, não tinha idéia de como você ficaria
miserável só por ter que ficar trancado aqui dentro!

- Miserável?! - Draco repetiu ofendido. Como aquele velho tinha a audácia de conseguir
interpretar corretamente o seu estado de espírito?

- Ora, por favor, você parece um bicho enjaulado, andando de um lado para o outro,
sempre com a cara fechada. Um pouco de ar puro fará bem. E além disso, eu acho que posso
arranjar um disfarce perfeito. Então? O que me diz?

- Que tal hoje? - Draco perguntou, esquecendo-se de tentar não parecer desesperado.

- Está uma bela manhã para um passeio, meu filho - o padre respondeu com um sorriso e
com um brilho nos olhos que Malfoy não havia percebido antes. Fazia com que ele se lembrasse
de alguém. Ele não sabia exatamente de quem ainda, mas com certeza aquele brilho era familiar.
Uma hora depois, um relutante Draco Malfoy deixou a casa acompanhando o velho
padre. Ele não estava muito confortável com seu 'disfarce'. A cor até que não era o problema -
ele estava acostumado a usar preto - mas o colarinho é que incomodava. Nunca em toda a sua
vida Draco imaginara que teria que se vestir de padre. Graças a Deus ele não tinha sido
obrigado a colocar a batina comprida. Isso seria a morte. Ele estava, entretanto, de calças,
com um paletó e um casaco. Tudo preto. Apenas o colarinho mesmo o denunciava. Ao seu lado,
o Padre Pedro caminhava como se aquilo fosse a coisa mais natural do mundo.

- Você não tem medo, não? - Draco perguntou, por fim, em voz baixa.

- Medo de quê?

- Da ira do seu Deus, por exemplo.

- Só por que você está vestido de padre? Ora, não seja ridículo! Eu duvido que o meu
Deus fique ofendido por você se vestir assim para se proteger de quem quer que esteja te
perseguindo - ele respondeu, levantando uma das sobrancelhas.

- O que afinal o Lupin te contou? - Malfoy perguntou, intrigado. Não sabia até que ponto
o velho conhecia a sua história.

- Ele me contou o suficiente. Não se preocupe - Draco aceitou essa resposta com
relutância. Afinal, como a segurança da missão poderia ser assegurada se Lupin contava para
qualquer um o que deveria ser secreto? Ruminou esse pensamento por algum tempo e depois se
decidiu por perguntar ao ex-professor quando os dois se encontrassem novamente.
Parando um pouco para prestar atenção ao seu redor, Malfoy notou as ruas estreitas e
inclinadas e os prédios e casas velhos. Ele estava em uma cidade perto de Madrid que mantinha
praticamente todas as suas características medievais. O nome do lugar era Toledo, famosa pelas
espadas que saíam daqui na Idade Média.

- Para onde nós estamos indo? - ele perguntou para o padre.

- Ah! Eu quero te mostrar algo - o outro respondeu - o que eu considero o local mais
bonito dessa cidade.

Os dois seguiram, então, por entre as ruas tortuosas durante alguns minutos. A maior
parte das pessoas ainda não tinha saído de casa e as lojas ainda não haviam sido abertas. Por
fim, Draco chegou ao lugar que o padre mencionara. Não havia dúvida alguma quanto a isso.
Eles se encontravam diante de uma igreja. Não era uma igreja qualquer, óbvio. Era a
catedral. Draco não estivera dentro de muitas igrejas na sua vida, mas de alguma forma ele
sabia que, independente de em quantas entrasse dali para frente, aquela estaria sempre entre
as mais bonitas.

- Venha - o padre o interrompeu - vamos entrar - e os dois deram a volta para passar
por uma porta lateral. O interior estava vazio e era ainda mais impressionante. O sol de outono
penetrava pouco pelas janelas, deixando o local em uma penumbra que apenas tornava tudo mais
misterioso - Linda, não?

- Absolutamente magnífica - respondeu Draco sem conseguir tirar os olhos do altar
principal.

- Foi exatamente assim que eu me senti na primeira vez em que a vi.

- Faz muito tempo?

- Nossa! Foi há uma vida inteira atrás. Eu era uma criança e simplesmente me apaixonei
por essa catedral. Queria saber tudo sobre ela: como foi construída, quando, por quem, cada
detalhe ínfimo. Tudo. Foi amor à primeira vista.

-Amor à primeira vista? Você fala como se o lugar tivesse vida!

- Ora! mas ele tem vida! Faz parte da natureza humana personificar as coisas inanimadas
que nós amamos. É assim que lidamos com o mundo e, dessa perspectiva, esta catedral está viva.
No fundo, foi por causa dela que eu me tornei um padre. Incrível como os pequenos encontros
podem mudar uma vida inteira, não é mesmo?

- Sim - Draco respondeu pensativo - incrível.

- Isso já aconteceu com você, Sr. Malfoy?

- O quê? Me apaixonar por uma catedral? Não.

- Ora, não se faça de desentendido - o velho retrucou com um sorriso misterioso - Você
sabe muito bem do que eu estou falando, filho. No meu caso, foi amor à primeira vista, mas bem
sempre é assim. Às vezes, uma pessoa pode passar anos a fio olhando para outra sem ver nada
demais, até que, num dia em particular, tudo muda. Pode ser por causa de uma palavra, de um
gesto, de uma coincidência. Pode ser um olhar, um toque, um beijo e você sabe, simplesmente
sabe no seu coração que nada nunca mais vai ser igual - o padre continuou. Draco não o
encarava mais nos olhos e a cada palavra o nó na sua garganta aumentava - As coisas que você
julgava certas subitamente hesitam, tudo aquilo em que você acreditava é posto em xeque. As
pessoas que você conhecia se tornam estranhas e...

- ... e o seu mundo está de cabeça para baixo num piscar de olhos - ele completou,
baixando a cabeça para esconder uma lágrima que escorrera do seu olho. Draco não se lembrava
da última vez que chorara. Não se lembrava sequer da última vez que tivera que lutar contra as
lágrimas, mas havia algo na voz do velho ou na maneira como ele descrevia exatamente o que
Draco sentia que tornava simplesmente impossível manter as defesas levantadas.

- Ah! Você sabe do que eu estou falando, afinal! - o padre exclamou por fim, como
aquele mesmo brilho no olhar. Finalmente, Malfoy lembrou quem possuía essa mesma
característica: Dumbledore. Os olhos do velho brilhavam como os de Dumbledore - São incríveis
as coisas que se faz por amor, não é mesmo?

- Sim - Draco respondeu, dessa vez com uma gargalhada seca - incríveis - e após uma
pausa - Eu sou assim tão óbvio?

-Não, claro que não. Eu é que sou apenas um velho que já viu homens apaixonados
demais para deixar de reconhecer um.

- Eu não estou apaixonado - Malfoy negou, juntando todas as forças que restavam em
seu corpo.

- Não está apaixonado? - o padre perguntou num tom incrédulo - Muito bem, então, eu
quero que você me faça uma promessa.

- Qual?

- Muito simples: prometa trazer essa garota... qual o nome dela?

- Virgínia - o outro respondeu mau-humorado.

- Virgínia. Prometa trazer Virgínia, por quem você absolutamente não está apaixonado,
aqui quando vocês quiserem se casar e eu realizo a cerimônia. Não faço um casamento há muito
tempo e gostaria de realizar um último antes de morrer.

- Isso seria lindo se eu fosse me casar com ela, mas eu não vou.

- Então não há problema em me fazer uma promessa que você nunca vai precisar
cumprir, não é mesmo?

- Está bem - Draco concordou relutante - Eu prometo - ele disse, mas sabia em seu
coração que aquilo nunca aconteceria. Se algum homem ia levar Virgínia Weasley ao altar, esse
homem era Harry Potter.

Por um instante, Malfoy fechou os olhos. Ele não acreditava no que acabara de
acontecer. Um velho padre que ele mal conhecia tinha simplesmente conseguido penetrar todas as
suas defesas, ler a sua própria alma. De todas as coisas que lhe aconteceram nos últimos anos,
essa foi provavelmente a mais perturbadora.

- Afinal de contas - ele começou por fim, frustrado - de onde Lupin te conhece?

- Ora, ele não te contou? Bem, não é assim uma história tão interessante. Ele me ajudou
uma vez, quando eu precisei, há muitos anos e nós nos tornamos amigos. Você não deve se
enganar com essa aparência velha, filho. Um dia, eu já fui jovem como você e esse país viveu
anos demais sob uma ditadura para que eu não saiba o suficiente sobre lutar contra um tirano -
o padre completou com uma piscadela.

- Como você sabe?... O que você sabe sobre...

- Sobre Lorde Voldemort? Bom, eu sei o que Remo me contou. Agora, vamos - ele
acrescentou, se dirigindo para a porta antes que Draco pudesse perguntar qualquer outra coisa -
eu já te apresentei a minha dama. Vou esperar, então, para conhecer a sua...




Draco Malfoy estava atordoado. Em poucos momentos na sua vida, ele se sentira assim:
surpreso, frustrado, irritado e assombrado, tudo de uma vez. Agora que ele estava ao ar livre
de novo e longe da atmosfera imponente da catedral, parte do seu corpo queria simplesmente
esganar o velho por fazê-lo sentir tantas coisas ao mesmo tempo. Desnecessário dizer, Malfoy
não era muito bom com sentimentos e, por isso, estava irritado. Com o velho e consigo mesmo, é
claro, por permitir tal abuso.

Os dois já tinham se afastado bastante da igreja, em direção à casa. O padre andava ao
seu lado como se nada demais tivesse acontecido, o que só tornava tudo ainda mais irritante.
Draco estava com raiva. Mais até: estava furioso e, por isso, não estava raciocinando com
clareza, nem prestando muita atenção no caminho. Ele não tinha, portanto, percebido que estava
sendo seguido por dois homens vestidos de preto e com aparências suspeitas. E ele continuou
não percebendo, é lógico, até que foi tarde demais.

De repente, sem nenhum aviso e enquanto Malfoy ainda estava ocupado demais bufando,
o Padre Pedro simplesmente caiu. Primeiro, Draco pensou que ele tivesse desmaiado, mas,
olhando para trás, viu os dois homens andando rápido na sua direção, empunhando suas varinhas.
O coração dele se acelerou. Então era isso: ele havia sido descoberto. Rapidamente, pegou sua
varinha no bolso e se abaixou para desviar de um feitiço lançado por um dos bruxos. Eles
estavam chegando perto e não havia tempo para pensar. Draco colocou a mão no pescoço do
padre para verificar se ainda havia um pulso. O velho ainda estava vivo. Se estivesse sozinho,
Malfoy poderia simplesmente aparatar, mas, com o padre junto, isso não era uma opção. E ele
não podia também simplesmente deixá-lo para trás porque os comensais provavelmente iam
querer interrogá-lo e não seriam nem um pouco gentis.

O coração de Draco batia como se fosse sair do peito. Os homens estavam perto demais
agora e ele precisava tomar uma decisão. Olhou para os dois, depois olhou novamente para o
padre. Sem hesitar, então, passou um dois braços do velho ao redor dos seus ombros e o ergueu.
Ele não era pesado, mas o fato de que estava inconsciente tornava tudo mais difícil. Depois
disso, Draco correu. Correu o mais rápido que suas pernas e a situação permitiam, mas ele sabia
que isso não era rápido o bastante. Os bruxos se aproximavam.

Usando a varinha, então, ele se virou para a primeira porta que encontrou e murmurou
'alohomora'. Ao notar a presença dos estranhos, os donos da casa vieram correndo, mas
novamente sem hesitar e sem considerar as conseqüências, ele apontou a varinha para os dois e
gritou 'impedimenta' duas vezes. Depois, fechou a porta novamente. Sabia que ela não seria
suficiente para deter seus perseguidores, mas seria um obstáculo a mais.

Carregando, ainda, o padre até a sala da casa, ele constatou que o lugar possuía uma
lareira. 'Ainda bem' ele pensou, enquanto pegava no bolso um pote cujo conteúdo era mais
valioso que ouro no momento, 'Pelo menos uma vez na vida eu estou com sorte'. Depois, ele
apontou a varinha para a lareira e murmurou 'incendio'. O fogo se acendeu imediatamente. Draco
percebeu que seu tempo estava se esgotando quando ouviu os comensais entrando na casa. O
mais rápido que pôde, ele entrou na lareira jogando o pó de flu no fogo. Aquele era um pó
especial que ele recebera para o caso de precisar fugir assim. O pó possibilitaria que ele
usasse qualquer lareira, mesmo que ela não estivesse conectada à rede de flu, para chegar a
um local pré-determinado: o hospital em Madrid onde ele tinha sido tratado quando recebeu o
tiro.

- Vocês precisam ajudá-lo! - ele gritou assim que colocou os pés fora da lareira.

- Senhor, o que aconteceu? - perguntou uma médi-bruxa, ajudando a colocar o velho
sobre uma maca.

- Não interessa o que aconteceu!

- Mas se ele não é um bruxo... - praticamente não havia bruxos padres, por isso a
desconfiança dela era justificada.

- Escute - Draco falou, segurando-a pelos ombros. Ele estava transtornado - Esse
homem foi atingido por um feitiço e, bruxo ou não, se você não ajudá-lo, ele vai morrer e eu
vou te matar, entendeu? - ele gritou, assustando a mulher e todas as pessoas que estavam na
sala.

- Sim, claro - ela respondeu com uma vez fraca e os olhos arregalados. Draco se
arrependeu imediatamente pela explosão. Ele não deveria mostrar seu nervosismo assim tão
facilmente, mas ele estava desesperado. E, acontecesse o que acontecesse, não ia pedir
desculpas. De jeito nenhum.




- Como ele está? - Malfoy ouviu uma voz perguntar às suas costas. O padre havia sido
tratado e agora estava dormindo tranqüilamente.

- Ele vai ficar bem - respondeu sem se virar - Eu pensei que eles quisessem matá-lo, mas
aparentemente o feitiço era só para deixá-lo desacordado.

- Eu fico feliz que tudo vá terminar bem - Lupin afirmou - Qual vai ser a sua desculpa
dessa vez, Draco?

- Desculpa para quê? - o outro finalmente se virou, intrigado.

- Para essa boa ação. Eu pensei que Malfoys não se importassem com nada além de suas
próprias peles.

- E não se importam.

- Então por que você o trouxe para cá? Poderia muito bem tê-lo deixado lá e aparatado.
Ao invés disso, você invadiu uma casa trouxa, usou feitiços contra os donos, trouxe-o para um
hospital bruxo e ainda gritou com a médi-bruxa para que ele pudesse ser atendido. Os
funcionários do ministério bruxo espanhol tiveram trabalho para consertar tudo o que você fez e
apagar as memórias dos que viram o que ocorreu.

- Eu estava preocupado - Malfoy respondeu devagar - Se os comensais o pegassem e o
interrogassem, ele poderia falar demais e nos expor.

- Ele não sabia o suficiente para nos expor.

- Talvez. Mas eu não sabia disso, não é mesmo? - ele disse, por fim, se irritando. É
verdade que ele poderia ter abandonado o padre e é verdade que ele estivera preocupado com a
possibilidade dele ser interrogado, mas não porque tivesse medo do que ele poderia falar, e sim
porque estava com medo do que os comensais iriam fazer. Draco se importava com o padre.
Agora, é lógico, ele estava se repreendendo mentalmente por fazer tantas besteiras, por ser tão
fraco, mas, na hora, sem tempo para pensar, ele fizera apenas o que o seu coração mandara.

- Por que você continua fazendo isso? - Lupin perguntou, uma expressão confusa no
rosto.

- Fazendo o quê?

- Mentindo para você mesmo. Não seria muito mais fácil simplesmente admitir que você
fez o que achou certo porque se importava com o que iria acontecer com ele?
- Não, não seria - Draco respondeu após alguns segundos, em voz baixa - A mentira é a
única coisa que me mantém são.

- Você realmente acredita nisso?

- O que importa no que eu acredito ou não? É a minha vida!

- É a minha também! Ou você se esquece de que estamos todos juntos no mesmo
barco?!

- Não se preocupe, Lupin, eu não vou te colocar em risco - Draco respondeu friamente.

- Não foi isso o que eu quis dizer.

- Então o que foi que você quis dizer?

- Malfoy, o que você está fazendo aqui?

- Como assim o que eu estou fazendo aqui?

- Aqui, na Espanha, comigo? Você claramente não queria vir. Passou quase um ano
distante, sem se dedicar, sem se empenhar no que nós estávamos fazendo e, ao mesmo tempo,
sem se preocupar com nada mais! Por que você veio?

- Porque eu não podia ficar.

- Você não queria ficar e também não queria vir. Por que você sempre tem que tornar
tudo mais difícil?

- Eu não podia ficar! Será que você não entendeu? Não tinha a ver com querer ou não.
Eu-não-podia-ficar!

- Por causa dela? - Draco congelou diante da pergunta. Já era ruim o suficiente o padre
perceber, mas o Lupin também seria o fim da picada.

- Dela quem?

- Você sabe muito bem de quem eu estou falando! Eu duvido que ela teria me escrito se
você não soubesse!

- Ela te escreveu? - ele perguntou incrédulo - Você se corresponde com ela?

- Não, eu não me correspondo com ela - Lupin respondeu com um suspiro, se
acalmando - Mas desde que Gina soube que você tinha sido ferido, ela tem escrito perguntando
sobre o seu estado.

- Por que você não me falou isso antes? - havia algo no fato de saber que ela realmente
se importava com ele, que fez o coração de Draco bater mais rápido involuntariamente. Ele nunca
soube que algo tão simples poderia fazê-lo tão feliz.

- Porque ela me pediu para não contar.

- Então porque você está contando agora? - ele perguntou, com raiva. De que adiantava
ela estar preocupada se nem ao menos queria que ele soubesse?

- Porque pareceu ser algo que você estava precisando ouvir. Pelo tom das cartas, eu
realmente duvido que ela não fosse sentir sua falta caso você morresse.

- De que isso adianta? - Malfoy disse, por fim, com uma risada amarga, sentando-se em
uma poltrona e cobrindo o rosto com as mãos - Isso apenas me torna mais fraco.

- É isso que você acha? Que sentir algo por alguém te torna fraco?

- É claro que sim.

- Deus, Draco! Foi isso que o seu pai te ensinou? - Lupin perguntou, sentando-se
também numa poltrona de frente para o garoto - Entenda: todos nós temos as nossas fraquezas,
mas o amor definitivamente não é uma delas. Um sentimento assim apenas torna alguém mais
forte, não mais fraco.

- O que você sabe sobre isso? - Malfoy perguntou, descobrindo o rosto. A última coisa
que ele precisava era de uma lição de moral vinda de um lobisomem.

- Mais do que você imagina - foi a resposta e ela foi dita em um tom tão definitivo que
Draco não ousou contestá-la. Apenas abaixou novamente a cabeça. Ele estava se sentindo
completamente confuso e completamente exausto.

- O que foi que eu fiz - ele perguntou, por fim - para merecer que você se importasse
com o que aconteceria comigo? Porque eu tento achar algo na minha mente, mas eu simplesmente
não encontro.

- Você me lembra alguém - Lupin respondeu com um sorriso - De muitas maneiras, você
é parecido comigo, Draco. Não, não se ofenda. Eu não quis te insultar - ele acrescentou ao
notar a expressão ultrajada na cara do outro - Quantas pessoas você acha que estão interessadas
em se aproximar de um lobisomem? Quantas pessoas você acha que realmente ouviriam o que eu
digo se não fosse por Dumbledore? As mesmas pessoas que desconfiam de você porque seu pai
era um comensal da morte desconfiam de mim porque eu sou um lobisomem e a verdade é que,
não fosse pelos bons amigos que eu encontrei cedo na minha vida, eu poderia ter me tornado tão
arisco, tão indomável e tão amedrontado quanto você. É por isso que eu me importo. Mesmo
que você não mereça muito.

- Mas você desconfiava de mim da mesma forma que os outros! - Draco acusou,
indignado por ter ouvido que estava amedrontado.

- O que te faz pensar que eu desconfiava de você?

- Por que outro motivo eu deveria ter vindo com você para a Espanha senão para que
você pudesse me vigiar de perto?

- Você acha que foi por isso que eu te escolhi para vir comigo? - Lupin perguntou, sem
conseguir conter uma gargalhada.

- Claro!

- Mas é claro que não! Eu apenas queria viajar com alguém que soubesse produzir a
poção mata-cão que eu preciso tomar regularmente. Às vezes, pode ser bem constrangedor ter
que consegui-la pelo caminho.

- Então você não desconfiava de mim? - perguntou Draco, incrédulo.

- Você foi aceito na Ordem. Por que eu deveria desconfiar? - Malfoy estava chocado.
Ele simplesmente assumira que Lupin confiava nele tão pouco quanto os outros e sequer
questionara isso. De alguma forma, ele se sentiu bem em saber que alguém não tinha dúvidas
sobre sua posição naquela Guerra.

- Obrigado - ele falou por fim, antes que mudasse de idéia.

- De nada - o ex-professor respondeu com um sorriso - Agora, voltando ao assunto
principal aqui, o que você quer fazer?

- Como assim o que eu quero fazer?

- Sobre ela. Gina Weasley é uma das melhores pessoas que eu já conheci e, se ela gosta
de você como a minha intuição de lobo diz, você deveria se considerar um homem de sorte e não
sair por aí, mentindo para si mesmo.

- A sua intuição está errada. Ela não gosta de mim dessa forma.

- Não? Então por que ela me escreveu?

- Porque ela se sente em dívida comigo já que eu a salvei.

- Ah, é mesmo. Eu tinha esquecido disso. Foi assim que tudo começou, não é mesmo?
Foi assim que você entrou na Guerra do nosso lado.

- Sim, foi.

- Bom, eu não creio que seja apenas isso que ela sente, mas... você não acha que está na
hora de tirar a história a limpo?

- Como assim?

- A Espanha não é mais segura para você, Draco. Eu tenho que te mandar para algum
lugar. Pode ser para outro país na Europa onde você poderá continuar com a missão, ou eu
posso te mandar para casa. O que você me diz? - Malfoy não pôde deixar de prender a
respiração ao ouvir isso. Ir para casa. Vê-la novamente. Ele nunca soubera antes o que
significava sentir saudades, mas esse era o único nome que ele encontrava para o aperto no
peito que sentia sempre que pensava nela. Por um instante, ele quase abriu a boca para dizer
que queria ir para a Inglaterra, mas depois ele se lembrou da imagem de Gina abraçando Potter.
Ele não conseguiria suportar aquilo de novo. Ele não podia, simplesmente não podia encará-la
sabendo que ela nunca seria dele - Por mais que nós fujamos, Draco, os problemas têm a terrível
mania de nos perseguir. Não acha que é hora de parar de fugir? - Lupin perguntou de novo.
Malfoy sabia que havia alguma razão no que ouvira, mas ele não podia simplesmente voltar.
Cansado, ele deixou a cabeça cair, apoiando-a entre as mãos. Ele não podia. Simplesmente não
podia.

- Eu não posso - ele murmurou por fim, em voz baixa - não posso ir para casa.

Lupin ficou em silêncio por alguns instantes, deixando o peso da decisão preencher a sala,
envolvê-los, sufocá-los. Mas ainda assim, Draco não mudou de idéia. Ele não falou mais nada.

- Muito bem, então - o ex-professor falou, por fim, se levantando - Como você preferir -
e saiu da sala, deixando Draco sozinho para remoer a sua própria covardia e o seu próprio medo.



N/A4: A igreja onde o Draco levou o tiro fica em um lugar chamado Valle De Los Caídos e ela
foi escavada dentro da própria montanha. Foi construída em homenagem aos mortos na Guerra
Civil Espanhola que ocorreu entre 1936-39. As minhas descrições tanto do Valle De Los Caídos
quanto de Toledo e da sua Catedral foram muito pobres em comparação com a beleza dos
lugares, então se alguém estiver interessado em saber exatamente como eles são, é só me
mandar um e-mail pedindo que eu mando algumas fotos.

N/A5: Ainda estou decidindo se a Gina voltará no próximo capítulo... pode ser que sim, pode ser
que não... E para onde será que o Lupin vai mandar o Draquinho?... Bom, eu já sei a resposta,
mas vocês terão que esperar um pouquinho para descobrir... o próximo capítulo deve sair em uns
dez dias, mais ou menos... até a próxima!