Perdendo a cabeça


ROUND 1 # DRACO

Ele sentiu o ambiente ao seu redor fechar-se como nuvens formando uma tempestade, mas ergueu a cabeça e adentrou pela sala comunal da Sonserina como se nada tivesse acontecido. Clima hostil, olhares raivosos, cochichos. Ele sabia o motivo: perderam de novo no quadribol. E adivinha só quem era o culpado? Ele, quem mais? Poderia ler os pensamentos sob a cara raivosa de Flint: perderam novamente e a culpa era da porcaria do apanhador do time que não era capaz de pegar nem uma gripe, que dirá o pomo. Ele olhou feio para Flint, também. Estava de saco cheio. Tudo era culpa dele! O que ele poderia fazer se não levava jeito pra coisa? Tá certo que quem começou com aquela porcaria toda foi ele próprio: fizera seu pai comprar a vaga no time só para encher o saco de Harry Potter. Mas todo mundo tem direito de fazer merda aos 12 anos, não tem? Fora só mais tarde, quando descobrira que não gostava e tampouco tinha talento para a coisa, que pensara em desistir. Mas o pai fora sucinto: cortava a mesada de vez. Sim, porque há séculos sua mesada fora cortada pela metade. O pai fora bem claro: só voltaria a receber a mesada completa quando vencesse Harry Potter no quadribol. Ele teve vontade mandar o pai ir tomar onde a galinha toma. Ia passar o resto da vida com metade da mesada. Ou o velho cretino achava que ele poderia vencer o Potter no quadribol? Nem se quisesse. E, na boa, ele não queria. Já estava de saco cheio de quadribol. E depois daquele dia em que fora escondido ao show dos Bruxos Rebelados e descobrira que rock bruxo, sim, era o bicho, o que ele mais queria da vida era mandar o quadribol para o mesmo lugar que quase mandara o pai.

Aliás, pensou Draco Malfoy, eu deveria tê-lo mandado, com todas as letras, ir tomar bem naquele lugar, porra! E devia ter mandado a vaga de apanhador lhe fazer companhia! E se ele cortasse a mesada de vez eu poderia comprar uma guitarra de bruxo, com o dinheiro da meio mesada que venho guardando, e ir fazer shows no Beco Diagonal. O velho iria morrer. Eu poderia fazer pior: viraria auror. Mas daí ele me expulsa de casa. Se bem que ele me expulsaria de qualquer forma... O droga de vida! Eu tô de saco cheio. De tudo! Quadribol é um saco! O Flint é um saco! Snape é um saco! A Sonserina é um saco! Hogwarts é um saco! Harry Potter é um saco! Meu pai é um saco! Minha mãe é um saco! Minha casa é um saco! Minha vida é um saco! Deveria arrumar minha mochila e fugir com a minha vassoura! Deveria quebrar a cara de alguém. E eu vou quebrar a cara de alguém. Do próximo que me olhar torto.

Flint olhou feio para Draco, novamente. Sem pensar no que estava fazendo, e muito menos considerar o fato de que o capitão do time de quadribol da Sonserina era bem maior do que ele, foi para cima deste com o dedo em riste:

-Tá olhando o quê, imbecil?

- Estou olhando para o imbecil que novamente levou a Sonserina à derrota. Nosso próximo jogo é contra a Lufa-lufa e eu acho bom você pegar a droga do pomo, porque eu estou me lixando se foi o seu pai quem nos deu essas vassouras e eu vou te tirar do time se perdermos novamente por sua culpa.

Foi como se escutasse o rufar dos tambores em sua cabeça. À guerra, então! Draco sorriu.

-Ótimo!- falou entre dentes. - Enfia a vaga de apanhador naquele lugar. Eu não vou esperar até o próximo jogo. Estou deixando o time. Agora!

Flint o encarou, incrédulo, como um jogador que vê seu blefe perfeito falhar.

- Você não ousaria! - disse, por fim. Draco lhe lançou um sorriso debochado.

- Não, eu não ousaria, Flint. Eu o fiz! - E deixou a sala comunal em meio a algazarra criada.

Got a good reason

For taking the easy way out

Got a good reason

For taking the easy way out, now

Pensando nas possíveis conseqüências de seus atos, saiu sem rumo pelos corredores do castelo.

Ah, ele estava com problemas, agora. Seu pai iria arrancar-lhe a pele. Não tinha mais volta. Quando Lúcio Malfoy descobrisse que ele havia abandonado o time (e Draco tinha certeza que isso aconteceria muito em breve e que o próprio Flint se encarregaria de contar) ia ser muito pior que aquele fatídico dia quando o pai lhe mostrara a marca dos comensais da morte no braço alegando que, um dia, ele também iria ter uma. Naquele dia Draco riu e disse que preferia tatuar uma borboleta azul na bunda a andar com aquele treco ridículo tatuado no braço. Tomara uma surra de cinto que nunca na vida pensara que um dia seria espancado daquela forma. Não adiantara argumentar com o pai que somente os trouxas castigavam seus filhos assim. Isso só o enfurecera mais ainda. Draco passou três dias sem sentar. Quase perdera os dentes também naquela ocasião, pois depois que o pai terminara de espancá-lo, comentou que no estado que sua bunda se encontrava no momento, tatuar ali uma borboleta estava fora de questão.

Ah, merda! O velho que fosse se danar. Será que não tinha nada melhor para fazer do que tirar seus recalques nele? Recalque de quadribol, recalque de comensal da morte, recalque de tudo. Seu pai era um recalcado e ele era uma besta por fazer o jogo do velho. Mas agora as coisas iriam mudar, o se iriam. Ele já largara o time, agora só faltava informar ao velho que esse papo decrépito de Lorde das Trevas já era e que ele não iria participar de um troço embolorado desses. Precisava informar também que a mesada iria voltar ao seu total ou ele iria TRABALHAR. Ah, se ia. Ia trabalhar para ganhar dinheiro porque meia mesada não pagava guitarras bruxas e quando ele terminasse Hogwarts ele não iria cuidar dos negócios da família nem ser comensal da morte. Se tinham tanta grana assim pagaria um administrador. Ele iria ser um roqueiro bruxo. Teria sua própria banda e nada nesta vida iria impedi-lo!

E assim, perdido em seus pensamentos ele foi chamado a realidade quando esbarrou em algo e caiu de cara no chão, sendo cumprimentado por uma chuva de livros na cabeça. Ergueu os olhos e percebeu que aquilo em que tinha esbarrado possuía um belo par de pernas. Ergueu a cabeça um pouco tentando descobrir quem era a dona das pernas: sapatos velhos, meias gastas e a saia curta demais foi tudo o que pode ver. A garota estava segurando uma imensa pilha de livros que não permitiam que lhe enxergasse o rosto.

- Você se machucou? - ele ouviu a voz da garota perguntar-lhe, abafada pela montanha de livros, enquanto admirava aquelas pernas. E, por Merlin, que pernas!

-Não! - ele respondeu algum tempo depois. Ela se inclinou um pouco, derrubando mais livros em sua cabeça e ele pode visualizar os longos cabelos vermelhos da menina.

"Cabelos vermelhos?" pensou Draco.

-Então porque você não levanta e sai do meu caminho, imbecil! - esbravejou a garota, zangada. Draco levantou-se num pulo.

-W...Weasley! - falou quando viu muitas sardas e um belo par de olhos castanhos o fuzilando.

- Não, cretino! Rasputin da Rússia!

-Nossa, Weasley! Como você cresceu! ^-^ E como ficou boca suja também. Você era tão... quietinha,

- E você sempre foi um idiota. Agora saia da minha frente!

- Não... Espera... Vamos conversar...

- Eu acho bom você visitar madame Pomfrey. Os livros que bateram na sua cabeça devem ter causado alguma contusão. Você está agindo estranho...

- Não...É que...Espera...Vamos conversar. Vamos sair... Tomar uma cerveja amanteigada em Hogsmead!

-Eu, hein! Você está é doido! - disse a garota contornando Draco, esquecendo os livros caídos e disparando pelo corredor.

She was a day tripper

One way ticket girl

It took me so long

To find out

But I found out

Gina entrou correndo na torre da Grifinória com Draco em seu encalço. Por pouco ele não entrou também. Mas ficou parado no corredor chamando por ela enquanto a mulher gorda do retrato o encarava como quem vê um animal raríssimo.

Draco ignorou o quadro e continuou chamando (ou seria mais correto berrando?) por Gina.

Alguns minutos e uma garganta arranhada depois, ele viu a passagem se abrir e Hermione Granger sair dela. A garota parou na sua frente e começou a olhar para ele com a mesma expressão da mulher gorda.

- Gina me falou que você havia enlouquecido - ela disse. - Mas eu precisava ver com meus próprios olhos.

- Ela falou?- respondeu, esperançoso.- Ela falou de mim?

- Falou. Falou que você tinha batido a cabeça e enlouquecido.

- É? E o que mais ela disse? Me conta!

- Eu, ehn! Acho que ela tem razão. Você está doidão mesmo! Foi a pancada na cabeça ou foi você quem andou roubando aquelas ervas da Prof. Sprout que sumiram durante a aula de herbologia?

- Hem?

- Você fumou as ervas da Prof. Sprout?

- Ah, Hermione! Eu não sei do que você está falando. Volte lá e chame a Gina!

- Hermione? - os olhos da garota estavam arregalados. - Você disse Hermione? Só pode estar louco mesmo. Você deveria ir visitar a enfermaria.

- Eu vou. Prometo! Agora vai lá e chama a Gina. Depois eu vou. Eu juro!

- Você jura? Eu vou é chamar o professor Snape. Você está com problemas mentais, garoto.

E Hermione disparou pelo corredor atras do professor de Poções enquanto Draco a chamava, desesperado. Mas ela não voltou. Agora sim ele estava com problemas. Snape arrancaria seu couro se o pegasse ali.

Ora, Snape que fosse se danar! Ele não arredaria o pé dali enquanto não falasse com Gina.

- Ei, garoto! -disse a mulher do retrato, piscando o olho. - Essa menina deve ser especial, né?

Draco sorriu.

She's a big teaser

She took me half the way there

She's a big teaser

She took me half the way there, now

She was a day tripper

One way ticket girl

It took me so long

To find out

But I found out

Não demorou muito e Hermione chegou, esbaforida, trazendo o professor Snape arrastado pela manga.

- Viu como era verdade, professor! - ela disse, satisfeita. - Eu falei que ele estava aqui e que estava doidão!

Snape fuzilou Hermione com um olhar gélido e então voltou sua atenção para Draco. Mediu-o dos pés até a cabeça, analisando-o. E, por fim, sibilou:

- Senhor Malfoy?! A senhorita Granger me atacou no corredor e me arrastou até aqui alegando sua preocupação com estado das sua faculdades mentais. Ela me disse que você está aterrorizando a quartanista Weasley da Grifinória! Que a perseguiu da biblioteca até aqui e ainda permaneceu na entrada da Torre fazendo escândalo. Isso é verdade?

- É claro que não...

- Muito bem! Então eu vou tirar 10 pontos da...

Mas Snape nunca conseguiria tirar aqueles 10 pontos da Grifinória por que Draco o interrompeu naquele momento.

- Eu não estava aterrorizando a Gina. Apenas tentava me declarar para ela!

Snape olhou para seu pupilo como se estivesse diante de um maníaco com uma machadinha. Então levantou uma sobrancelha, inquisidor:

- Senhor Malfoy! Por acaso você anda usando poções ilegais?

- Eu acho que ele fumou as ervas da professora Sprout, professor! - intrometeu-se Hermione. O professor de poções a encarou, quase em pânico. Hermione confirmou com a cabeça e explicou. - Alguém roubou algumas ervas mágicas que servem para chás, mas se forem fumadas deixam a pessoa doidona.

Nisso chegou Neville Longbottom, que olhou, admirado para a cena diante de seus olhos. Piscou uma, duas vezes. Então fez uma cara de deixa para lá e entrou pela passagem, jurando para si mesmo( e para o trasgo laranja de salto alto que estava ao seu lado) que nunca mais na vida iria fumar as ervas da prof. Sprout. Porque tudo bem passar a tarde inteira na beira do lago na companhia do trasgo laranja, vendo a lula gigante fazer malabarismo e assistindo uma turma de grindylows cantores, de cartola e tudo. Mas ver o professor Snape apoiando Hermione e brigando com o Malfoy era demais para sua cabeça.

Ignorando a chegada de Neville, Snape, mais do que irritado, pegou Draco pela orelha e o arrastou para as masmorras resmungando sobre adolescentes problemáticos.

Claro que Draco pegou uma detenção. Mas achou que por ela valeria a pena ficar estripando lesmas na sala de poções enquanto seu mestre permanecia sentado em sua mesa lendo um enorme livro entitulado Poções ilegais: como reconhecer os sintomas em um adolescente e olhando-o de soslaio de vez em quando. Era até engraçado. Provavelmente Snape perderia um bom tempo pesquisando, visto a tamanha pilha de livros que trouxera da biblioteca onde se encontravam, entre outros, os seguintes títulos: Como lidar com um adolescente doidão; Ervas mágicas: os prós e os contras; História das poções ilegais; Poções e ervas ilegais do século XX.

Draco terminou sua detenção e voltou para seu dormitório, não sem antes ser solenemente advertido que estava proibido de chegar a menos de 500 metros da Torre da Grifinória. E naquela noite ele obedeceu. Naquela noite.

Tried to please her

She only played for myself

Tried to please her

She only played for myself, now

She was a day tripper

Sunday driver, yeah

It took me so long

To find out

But I found out

Nas semanas que se seguiram Draco continuou perseguindo Gina como Pèpe, le gambá perseguia a gata. Por causa dela apanhou quatro vezes de Rony, três vezes dos gêmeos, duas vezes de Harry e até levou um socão de Neville. Isso sem contar que provavelmente já estava estéril devido aos inúmeros chutes que a própria Gina dera, digamos, na zona sul de sua anatomia.

Recebeu inúmeras detenções. Perdeu milhares de pontos para Sonserina. Recebeu três berradores consecutivos do seu pai: o primeiro, obra de Flint, por ter deixado o time; o segundo, mérito de Snape que escrevera a Lúcio falando que desconfiava que Draco estava se tornando um bruxo doidão; e o terceiro por causa da carta desaforada que ele próprio escrevera depois do primeiro berrador.

Os professores todos o olhavam como se fosse doente. A prof. Sprout ficava em cima dele o tempo todo (para a alegria de Neville que não cumpriu sua promessa) e o próprio Snape estava tirando pontos da Sonserina por sua causa.

Sua mesada fora cortada definitivamente (mas sua mãe lhe mandava escondido o equivalente a mesada inteira - Imagina só se o filhinho dela ia ficar sem dinheiro só por que o pai não o entendia!).

E ainda assim ele não desistiu. Quem sabe se uma hora dessas ela não resolvia dar valor aos seus sacrifícios? Ainda mais agora, que ele finalmente comprara sua guitarra de bruxo e pretendia subir na vassoura e fazer uma serenata diante da janela do dormitório dela. Só precisava descobrir qual era a janela.

Day tripper, day tripper, yeah

Day tripper, day tripper, day tripper.


Nota: A música citada nessa fic é Day Tripper, dos Beatles. Se eu estiver errada, me corrijam, mas a tradução seria mais ou menos o seguinte:

Tenho uma boa razão

Para tomar o caminho mais fácil

Tenho uma boa razão

Para tomar o caminho mais fácil agora

Ela era uma turista de um dia,

Aquelas de bilhete só de ida

Me tomou muito tempo descobrir isso,

E eu descobri

Ela é uma grande encrenca,

Me pegou na metade da estrada

Ela é uma grande encrenca,

Me pegou na metade da estrada

Ela era uma turista de um dia,

Aquelas de bilhete só de ida

Me tomou muito tempo descobrir isso,

E eu descobri

Tentando agradá-la,

Ela apenas brincou comigo

Tentando agradá-la,

Ela apenas brincou comigo

Ela era uma turista de um dia,

Motorista de domingo

Me tomou muito tempo descobrir isso,

E eu descobri

Turista de um dia

Turista de um dia