ROUND 2 # HARRY
Ele atirou-se na poltrona diante da lareira na sala comunal, sentindo sua cabeça doer e girar. Aquele, definitivamente, era um daqueles dias em que não deveria ter levantado da cama. Aliás, aquela semana toda ele deveria ter passado debaixo das cobertas. Parecia um pesadelo, mas sua cabeça latejando o informava do contrário. Podia escutar os ruídos e as conversas das pessoas ao seu redor, mas tudo era muito distante. Até mesmo Neville, sentado na poltrona ao seu lado, falando sozinho. E Hermione às suas costas discutindo com Ron.
Harry Potter tirou os óculos e esfregou os olhos. Quando tudo começara? Quando levara o fora de Cho ao convidá-la para o Baile da Primavera? Quando soubera que Gina beijara Draco depois da infame serenata que o cretino fizera na janela do dormitório feminino do quarto ano? Ou quando espancara Draco pela primeira vez? Quando mandara Snape ir tomar naquele lugar claramente, em alto e bom som no meio da aula? Ou teria sido quando meteu aquele socão no Duda, nas férias? Provavelmente foi isso, sim, o princípio: o dia em que mandou tudo pro espaço e deixou o primo com um enorme olho roxo. E quase batera no tio e na tia também. Só não saíra definitivamente de casa naquele dia porque fora barrado por bruxos do ministério. Porém sua tolerância com a família acabara: se não podia baixar a bola deles com magia, então baixaria na marra. Havia descoberto outra serventia para os punhos e a deixar a língua solta demais. Não fora uma boa idéia. Snape não gostara nem um pouco de ter sido mandado tomar no tal lugar. Isso apenas complicara sua vida. Talvez em outra época o mestre de poções houvesse apenas lhe dado uma bela detenção, mas depois do episódio "Malfoy dando escândalo na entrada da Grifinória" Snape andava nos cascos com meninos agindo de maneira estranha e concluíra que ele deveria estar sofrendo do mesmo mal que afligia Draco Malfoy, ou seja, estava usando as famigeradas poções ilegais. Então, além da bela detenção, agora tinha todos seus professores o cuidando de perto. Especialmente Snape. Limpar caldeirões ou cumprir qualquer tipo de detenção nas masmorras estava fora de cogitação. Valia o mesmo para as aulas de herbologia. Detenção agora era só limpando as comadres na enfermaria e, ainda assim, sem a varinha. Harry achava que isso era mais para garantir que não arrombasse o armário de remédios do que para garantir que limpasse as comadres sem usar magia.
Mas, afinal de contas, o que estava acontecendo com ele? Estava se tornando um delinqüente? Por que, de repente, o menino que sobreviveu tornou-se o menino de quem todos desconfiavam. A própria Cho dissera que não iria acompanhá-lo ao baile porque ele era muito mal-educado.
- Onde já se viu um aluno marotear o professor no meio da aula, Harry? Que coisa mais feia! Você anda muito estranho. Assim, eu não vou ao baile contigo, não! – ela dissera sem dó nem piedade, fazendo com que ele se sentisse a pior das criaturas e desejasse, ainda mais, quebrar o nariz grande de Snape.
Algo deveria estar errado com ele. Até mesmo Gina não lhe dava mais bola. E isso estava deixando-o louco. Será que, só por causa de uma serenatazinha à toa ela deixara de gostar dele para se interessar pela besta do Malfoy? Isso simplesmente não lhe parecia certo. Cho dar-lhe um fora tudo bem. Não seria o primeiro e provavelmente nem o último. Mas perder Gina para Draco já beirava a decadência.
Ele sentira que teria problemas pela frente no dia que soubera que Draco perseguira Gina, mas nunca imaginou que aquela menina tola e inocente iria cair na lábia do cretino do Malfoy. Todos diziam que Malfoy estava maluco, mas ele não era bobo para acreditar numa tolice destas. Malfoy estava mal-intencionado, isso sim. Mas quando dissera o que pensava para Hermione, ela rira e retrucara que ele estava com ciúmes de Gina.
Hermione, sim, era quem estava maluca. Isso só confirmava o que ele já desconfiava: anos e anos estudando como uma louca a havia feito perder o juízo. Ciúmes de Gina. Tinha cabimento tamanha besteira?
Harry, sem levantar de sua poltrona, olhou para Hermione, ressentido. A menina balançava a mão diante dos olhos de Neville que parecia hipnotizado pelo fogo, enquanto Rony se postava ao lado dela de cara torta.
- Será que ele está doente? – ela falou. Rony revirou os olhos.
- Pois sim! - respondeu mal-humorado. – Ele está é prá lá de Avalon de tanto fumar as ervas da professora Sprout!
- Ah, Ronald Weasley! – a garota protestou. – Não seja mau. Você sabe muito bem que quem rouba as ervas da professora Sprout é Draco Malfoy!
Harry quase engasgou ao ouvir o nome do desafeto. Estava farto de Draco Malfoy e mais farto ainda de ver Rony e Hermione batendo boca. Estava farto de tudo desde que essa loucura começara. Sua vida estava se tornando uma confusão. Sempre que lhe acontecia algo ruim, Draco Malfoy estava envolvido. Direta ou indiretamente. Poderia torcer aquele pescoço fino com as próprias mãos quando o enxergasse novamente. A idéia de vê-lo perto de Gina, simplesmente lhe dava idéias homicidas. Homicidas e com requintes de crueldade. E ainda tinha que ouvir Hermione dizendo asneiras e brigando com Rony? Não. Não tinha. Ele sabia o que estava errado. Tudo isso era, obviamente, obra de Voldemort. Só podia ser. E ele sabia como resolver isso. Era simples. Bastava manter Gina bem longe de Draco. E era o que faria nem que, para isso, fosse preciso matar Draco. Ou conquistar Gina.
Ela era apaixonada por ele uma vez, não era? Então ele faria com que ela se apaixonasse de novo.
Dear, I fear we're facing a problem
you love me no longer, I know
and maybe there is nothing
that I can do to make you do
Mama tells me I shouldn't bother
that I ought to stick to another man
a man that surely deserves me
but I think you do!
So I cry, I pray and I beg
Então ele levantou-se de sua poltrona, ignorando Rony e Hermione que pareciam prestes a se engalfinhar, e saiu do salão comunal da Grifinória disposto a encontrar Gina.
Demorou um pouco para encontrá-la, voltando da biblioteca carregada de livros, com Draco Malfoy em seu encalço.
- Droga, Gina! – ele resmungava, meio sem fôlego, correndo atras dela. – Porque você é tão difícil? Aquele beijo não significou nada pra você?
- Não, Malfoy! Não significou nada. Foi apenas um beijo que eu daria em qualquer um que fizesse uma serenata para mim! – ela respondeu, exasperada. – Agora larga do meu pé!
- Como larga do meu pé? Então você me beija, me usa e me abusa, pisa nos meus sentimentos e me joga fora como uma bola de pergaminho roto?
- É!
- Não, não é! Eu exijo discutir a relação!
- Que relação, Malfoy? Foram apenas uns beijinhos e ...
Nisso Harry alcançou os dois, metendo-se na conversa.
- Algum problema, Gina? Esse idiota está te encomodando?
- Sim, o idiota está me encomodando. Mas não é problema seu! Que merda! Será que eu não tenho irmãos o suficiente para ficarem se metendo na minha vida para arrumar mais um?
- Então esse é o problema! – falou Draco, compreensivo e um tanto melodramático. – São seus irmãos que não querem que nós fiquemos juntos? Mas não se preocupe! Meu pai me deserdou, mas minha mãe vai nos ajudar e...
Gina olhava para Draco, furiosa, pronta para lhe atirar um livro, quando Harry se adiantou:
- Não, seu cretino! Ela não quer ficar contigo porque é minha namorada, tá! E os irmãos dela não têm nada contra isso!
E antes que Gina pudesse dizer qualquer coisa em protesto, Harry a agarrou e beijou. Ela o empurrou com força, furiosa, dando-lhe aquele chute tão carinhoso que só reservava para Draco.
- Então era mentira, querida! – Draco vibrava. – Você não namora realmente esse asqueroso Potter. Você é obrigada pela sua família a namorar com ele?
Nesse momento ela enxergou vermelho e perdeu toda a compostura que ainda lhe restava. Todos que passavam pelo corredor pararam para vê-la gritar coisas irrepetíveis enquanto jogava todos os livros que tinha e mais o que encontrasse ao alcance de suas mãos em Harry e Draco, que corriam e tentavam desviar. Por fim alguém a segurou enquanto os dois se escondiam atrás de uma coluna.
- Viu só, idiota? – falou Draco. – Ela me ama!
- Você é mesmo patético, Malfoy! É a mim que ela ama. Ela só me chutou porque estava furiosa.
Claro que seus argumentos não convenceram Draco. Ele continuou correndo atrás de Gina. E ele, Harry, pelo bem de todos, resolveu fazer o mesmo.
A idéia pura e simples de que ela simplesmente não gostava mais dele era impossível de suportar. Ele jurou que faria com que ela se apaixonasse novamente. Faria o que fosse preciso. E ela diria o que ele queria ouvir.
Love me love me
say that you love me
fool me fool me
go on and fool me
love me love me
pretend that you love me
leave me leave me
just say that you need me
So I cry and I wait for you to
Love me love me
say that you love me
leave me leave me
just say that you need me
I can't care 'bout anything but you...
Ela não disse. Mas bateu tanto nele quanto em Draco. Foi proibida de retirar livros da biblioteca porque os usava como armas. Queria comer o fígado dos dois, e, de preferência, mal passado.
Ele, em contrapartida, perdeu a conta do número de vezes que foi lavar as comadres com Draco. Simplesmente não podia enxergar o outro sem que a coisa passasse por três etapas: na primeira eles se viam, se ofendiam e se engalfinhavam; na segunda um professor os acudia e os levava para a enfermaria; e na terceira o mesmo professor lhes aplicava sempre a mesma detenção: lavar as comadres da enfermaria.
As comadres nunca andaram tão limpas como naqueles dias. Toda noite, sem exceção, lá estavam os dois lavando as comadres. A coisa teria ido muito bem, obrigado, se numa dessas detenções - a última por coincidência - os dois não tivessem se pregado no porrete com as ditas comadres dentro da enfermaria, fazendo uma bruta sujeira e uma confusão dos diabos. Não fora nada de mais. Simplesmente Harry olhara para Draco, que olhara para Harry e, até hoje, nenhum dos dois soube dizer quem deu a primeira "comadrada" (que belo neologismo) no outro. O fato é que voou comadre para tudo que é lado e quando Madame Pomfrey chegou, sendo saudosamente recebida por uma comadre voadora, encontrou os dois rolando no chão, no meio das comadres, batendo um no outro com uma comadre diferente. Desse dia em diante passaram a lavar os banheiros e polir os troféus assistidos por Filch, toda noite. Também estavam proibidos de se olhar enquanto cumpriam detenção.
Mas as detenções continuaram e as noites em claro, em que Harry passava se revirando na cama tentando pensar numa maneira de se livrar de Draco e reconquistar Gina, também.
Lately I have desperately pondered,
spent my nights awake and I wonder
what I could do have done in another way
to make you stay
Reason will not lead to solution
I will end up lost in confusion
I don't care if you really care
as long as you don't go
Foi então que a idéia surgiu. Ele levantou-se cedo, tomou um caprichado e demorado banho, passou sua melhor poção aromática para bruxos, vestiu sua melhor roupa e despachou Edwiges para uma floricultura em Hogsmeade, com um bilhete encomendando um belo buquê de rosas.
Edwiges voltou com as rosas durante o café da manhã. Ele percebeu Draco na mesa da Sonserina, com um olhar assassino. Ele percebeu que Gina ficou inquieta. Então respirou fundo. Agora era só se desculpar com ela, entregar-lhe as rosas e convidá-la para o baile. Ela não iria resistir, não é?
NOTA: A música citada nessa fic é Lovefool, dos Cardigans, cuja tradução é mais ou menos a seguinte:
Querido, eu temo que estejamos enfrentando um problema
Você não me ama mais, eu sei
E talvez não haja nada
Que eu possa fazer para fazer você me amar
Mamãe diz que não deveria me chatear
Que eu deveria me amarrar em outro homem
Um homem que certamente me mereça
Mas eu acho que você me merece
Então eu choro, eu rezo e eu imploro
Me ame, me ame
Diga que você me ama
Me engane, me engane
Continue e me engane
Me ame, me ame
Finja que me ama
Me deixe, me deixe
Só diga que você precisa de mim
Então eu choro
E espero que você
Me ame, me ame
Diga que você me ama
Me deixe, me deixe
Só diga que você precisa de mim
Eu posso não me importar com nada além de você...
Ultimamente eu tenho ponderado desesperadamente
Passado minhas noites acordada e imagino
O que eu poderia ter feito de outra maneira
Para fazer você ficar
A razão não vai levar à solução
Eu vou acabar perdida na confusão
Eu não me importo
Se você realmente se importa
Desde que você não se vá
