18. DOIS CAMINHOS



Depois que Anne conseguiu se transformar em animago sem a poção, Sirius a treinou mais algumas vezes, pois ela ainda não conseguia controlar a mente animal.

- Isso está ficando chato! - Anne disse depois de mais uma tentativa sem sucesso.

- Se continuar assim, você nunca vai conseguir! - Sirius disse com paciência - Onde está aquela Annie que estava determinada a ser um animago?

- Ela voltou para as masmorras quando percebeu que nunca seria um animago - a garota resmungou, fazendo Sirius girar os olhos, impaciente.

- Então vá buscá-la! - o rapaz colocou a mão no ombro dela - Vamos lá, Annie, eu sei que você consegue!

A garota fechou os olhos, suspirando. Ser um animago era o seu grande sonho, e ela já tinha ultrapassado a parte mais difícil, não sentia mais dor quando se transformava em animago, então porque ela ainda não conseguia controlar a mente? Ela abriu os olhos, e pouco antes de se transformar em pantera, ouviu a voz de Sirius.

- Você só tem que confiar em si mesma.

- Eu sei disso - ela disse, mas não saiu nenhum som de sua boca, pelo menos nenhum som humano.

Anne voltou os olhos para Sirius, e pela expressão do rapaz, percebeu que havia se transformado em pantera. Então ela descobriu que também estava pensando, e se estivesse na forma humana, um sorriso de satisfação estaria em seu rosto, mas Anne era uma pantera, então, a única coisa que ela pôde fazer para que Sirius pudesse entender que ela havia conseguido foi levar uma das patas até a mão do rapaz, que olhou com surpresa para a pantera negra.

- Annie... Você conseguiu!

Anne voltou à forma humana, o rosto iluminado pela conquista.

- Sim, Sirius, eu consegui!

Os dois se abraçaram, e quando se separaram, ainda sorriam.

- Eu não teria conseguido sem você - Anne agradeceu. - Você foi um bom professor.

- Eu fiz o que eu pude... - o rapaz respondeu, pensando como tinha ficado furioso há dois anos atrás quando percebeu que a única saída para que ninguém descobrisse que ele, Tiago e Pedro eram animagos clandestinos seria dar aula para a garota arrogante da Sonserina.

Naquela época, ele nunca poderia imaginar que acabaria se apaixonando pela garota. Mas, pensando melhor, ele percebeu que sempre havia sentido algo por Anne, e que de qualquer forma, os dois teriam descoberto o sentimento que sentiam um pelo outro. E agora que as aulas haviam terminado, eles não tinham mais motivo nenhum para esconder isso. Pelo menos era o que Sirius achava.

- Bem, agora que as aulas acabaram, o que você acha de continuarmos a nos encontrar aqui todas as noites? - a garota perguntou, sem imaginar o que Sirius estava planejando.

Para Anne, tudo estava bem do jeito que as coisas estavam. Ela tinha Sirius e Severo não a ignorava, exatamente o contrário do que pensou que aconteceria quando descobriu que estava apaixonada por Sirius. Anne não queria que isso mudasse, e achava que o rapaz também iria pensar o mesmo. Ela não sabia o quanto estava enganada.

Sirius olhou para a garota com espanto.

- Eu pensei que enquanto as aulas continuassem, nós deveríamos manter os encontros em segredo, mas agora que você é um animago, então porque temos que continuar assim?

Anne mordeu o lábio, tentando manter a calma, e respondeu com severidade.

- Sirius, pensei que já tínhamos conversado sobre esse assunto.

- Eu pensei que você só estava falando aquilo por causa das aulas. - o rapaz afundou os dedos no cabelo escuro - Droga, Annie, estarmos namorando é uma coisa tão ruim que devemos esconder de todos?

- Por Merlin, Sirius, eu nunca quis dizer isso! Eu só quis evitar problemas, mas isso não quer dizer que é ruim você e eu namorarmos!

- Prova isso, então! Vamos sair dessa sala de mãos dadas, e enfrentar todos que forem contra.

A garota balançou a cabeça negativamente.

- Você está sendo imprudente.

- E você está com medo por uma bobagem. Você não precisa disso, eu não vou deixar nada acontecer com você.

- Sirius, isso envolve muitas coisas, nós não podemos simplesmente sair e dizer que estamos juntos, não agora!

- E então quando? - o rapaz disse levemente zangado, enquanto cruzava os braços.

- Você esqueceu que no fim do ano eu vou para sua casa?

- Isso não significa que tenhamos que fazer as coisas às escondidas. Eu não me sinto bem com isso.

Anne suspirou, relutante. Ela não gostava que Sirius se sentisse mal por causa dela, mas ela também não queria que todos soubessem sobre o namoro dos dois. Anne sabia muito bem quais seriam as conseqüências que eles teriam que enfrentar, e faria o possível para impedir isso. Até mentir para Sirius.

- Está bem, eu vou pensar sobre o assunto e depois digo o que eu decidi. Enquanto isso, podemos fazer outras coisas... - ela se aproximou do rapaz e tocou o rosto dele com o dedo, mas Sirius não demonstrou nenhum carinho. Ele conhecia a garota o bastante para saber que ela só estava adiando a decisão.

- Então pense, Annie, pense muito bem. Aí então você me procura.

Sirius olhou com decepção para a garota e saiu da sala, ignorando os chamados de Anne.

-x-x-x-

Anne acordou cedo, antes das três colegas de quarto, mas se levantou somente depois que ficou sozinha no quarto. Durante esse tempo, ela pensou na conversa que teve com Sirius na noite anterior. Ela sabia que ele estava com a razão, mas o medo que ela sentia não deixava que tomasse a decisão certa. E por saber que estava errada e Sirius certo, Anne saiu do dormitório mais tarde que o habitual. Ela não queria encarar o rapaz, mas quando Anne entrou no salão, seus olhos encontraram Sirius sentado na mesa da Grifinória.

A garota parou de andar, sem ter coragem para continuar firme, e só percebeu que Severo estava ao seu lado quando ele a sacudiu.

- Pensei que você não fosse mais sair do dormitório.

- Eu... - a garota olhou para Sirius e hesitou por uns segundos, mas logo recuperou a calma e continuou com frieza - estava com sono.

- Então você deve estar faminta, Anne, venha, vamos para a mesa. - Severo disse colocando a mão em torno do ombro da irmã, sem antes olhar com raiva para um certo rapaz na mesa da Grifinória.

Os irmãos Snape estavam perto da mesa da Sonserina quando o professor Carwell chamou Anne.

Como novo diretor da Sonserina, o professor de Poções havia marcado uma reunião com os alunos do time de quadribol. Exceto por Anne, só havia mais dois jogadores, Jewkes, o apanhador, e Hopkins, um artilheiro, e como Hopkins era mais experiente no time, ele foi escolhido capitão. Os testes para completar o time foram marcados, e com o time completo, os treinos começaram. Hopkins era um capitão exigente, queria ganhar a taça, pois aquele seria seu último ano em Hogwarts. Os treinos eram puxados, e por uma semana, Anne não conseguiu pensar em nada a não ser quadribol. Até que no sábado, depois que Jewkes pegou o pomo, Hopkins falou com o time.

- Vocês estão fazendo um ótimo trabalho. Continuem assim, e a taça será nossa. Não esqueçam, amanhã, aqui no campo, na mesma hora de hoje.

Por alguns instantes, Anne não soube o que fazer.Pela primeira vez naquela semana, ela tinha tempo livre. Ela ficou parada no campo, sozinha, até que percebeu que todos os seus músculos doíam, e antes que Hopkins mudasse de idéia, ela foi para o dormitório e dormiu tranqüilamente. Quando acordou, já era noite, e por não ter muitos alunos na sala comunal, Anne deduziu que o jantar deveria estar sendo servido, então foi para o salão principal.

Quando ela entrou no salão, seus olhos pararam na mesa da Grifinória, por costume, e ela procurou Sirius, mas não viu o rapaz na mesa. Só o que viu foi um grupo de garotas rindo ao redor de alguém. Ela deu de ombros e foi para a mesa da Sonserina. Não queria mesmo ver Sirius. Havia sido ele quem começara aquela briga quando disse que os dois deveriam dizer para todos que estavam juntos, então era ele quem deveria terminar a discussão.

Somente quando ela se sentou foi que percebeu quem as garotas estavam cercando. Por um segundo ela não acreditou, mas logo estava fechando o punho com força, zangada, e se perguntando o que Sirius estava fazendo cercado por aquelas garotas.

Quando viu que Anne olhava furiosa em sua direção, Sirius percebeu que seu plano havia dado certo. Desde que havia começado a ensinar animagia a Anne, ele tentava evitar que as garotas se aproximassem dele como elas faziam antes que ele conhecesse a garota. O rapaz não sabia direito o motivo que o levava a agir dessa forma, mas quando descobriu que estava apaixonado por Anne, descobriu que fazia isso para que a garota percebesse que ele queria ficar somente com ela, e quando os dois começaram a namorar, o rapaz ficou mais cuidadoso ainda. Mas quando ele viu que Anne não estava disposta a ceder e aceitar que os dois assumissem o namoro, Sirius pensou que talvez se Anne o visse com outras garotas, ela pudesse perceber que poderia perdê-lo. Ele não poderia chamar aquele plano de honesto, mas Sirius sabia com quem estava lidando, e não havia se enganado quando pensou no plano e achou que conseguiria o seu objetivo.

Anne levantou-se da mesa quase em seguida, porém, a garota passou direto pela mesa da Grifinória, mas minutos depois ela estava de volta, e segurava um pedaço de pergaminho na mão direita. Ela aproximou-se da mesa da Grifinória, sem se importar com o silêncio súbito que as garotas que rodeavam Sirius fizeram, e bateu a mão direita com força na mesa.

- Você não vai estar rindo assim depois que enfrentar o meu time - Anne disse entre dentes, e em seguida, ela deu as costas para o rapaz e o pequeno grupo que o rodeava.

Sirius deu um sorriso maroto sem conseguir tirar os olhos da garota, que caminhava decidida até a mesa da Sonserina.

- Que papel é esse? - uma das garotas perguntou, segurando o pedaço de pergaminho que Anne havia deixado.

Antes que a garota lesse o que estava escrito, Sirius pediu o pergaminho.

- Deixe-me ver - a garota entregou-o, e Sirius o leu em seguida.

"Black,

Se você quiser terminar aquela conversa, apareça na sala depois da meia-noite.

A. Snape."

Sirius guardou o envelope com um sorriso no rosto, e falou em seguida.

- Meninas, eu tenho que ir.

Um coro de garotas se lamentou.

- Nós tivemos uma adorável manhã, mas eu tenho que descansar agora, senão não poderemos continuar nossa conversa mais tarde - ele olhou para uma garota de cabelos cacheados e castanhos. - E, Maddie, eu quero ouvir mais sobre a poção que você está preparando, parece bem interessante - ele piscou, e em seguida, saiu do salão principal.

Enquanto Sirius ia para a torre da Grifinória, ele assobiava, e ao se ver sozinho no dormitório do sétimo ano, ele soltou o grito de vitória que estava preso na garganta. O plano havia sido um sucesso.

-x-x-x-

Pontualmente à meia-noite, Sirius entrou na sala. Ele não se surpreendeu quando viu que Anne já estava lá, nem com o ar solene no rosto dela.

- Antes que eu fale alguma coisa, eu queria fazer uma pergunta. - e sem esperar que o rapaz concordasse, ela continuou - Você pode me explicar o que você estava fazendo no salão com aquelas garotas?

O tom frio da voz de Anne fez Sirius achar por alguns segundos que o plano dele havia ido um pouco longe demais. Ele não esperava aquela reação de Anne.

- Eu... ahm... - a incerteza do sucesso fez ele hesitar por alguns instantes, mas ele continuou com firmeza - Estava só me divertindo. Foi você quem preferiu ficar escondida nas masmorras, e não eu. - ele se sentou em uma cadeira, ficando de frente para a garota.

Anne abaixou a cabeça, não queria que Sirius visse a decepção em seu rosto, pois ele havia confirmado o que ela achava. Sirius havia desistido dela, e agora estava retomando a vida que tinha antes dela aparecer. Mas esse gesto não durou muito. Logo ela voltou a encarar Sirius sem demonstrar que havia sido atingida.

- Pois muito bem. Eu não quero que você deixe de se divertir por minha culpa. Se você está se sentindo preso a mim, sinta-se livre. - ela se levantou - Nós vamos continuar em frente, cada um seguindo o seu caminho.

A garota foi até a porta, e enquanto ela caminhava, Sirius sentiu como se ele estivesse indo com ela. O rapaz se levantou. Não podia deixar que ela fosse embora sem lutar.

- Annie, espere.

Anne parou de andar.

- Merlin, não... - ela disse num murmúrio que Sirius não ouviu quando o rapaz a chamou pelo nome que ele havia dado a ela, e fechou os olhos antes de voltar-se para o rapaz - Sim?

- O que você queria falar comigo?

- Não era nada. Não parece ser mais importante, agora.

O rapaz andou até ela.

- Tem toda a importância do mundo para mim, Annie. - Sirius disse segurando as mãos da garota, e balançou a cabeça enquanto recomeçou a falar - Aquelas garotas não significam nada para mim, eu nem me lembro o nome delas! - ele olhou profundamente nos olhos de Anne - Eu sei que eu fui um pateta, mas pelo menos me diga o que você iria falar.

Anne piscou, e uma lágrima solitária caiu do olho dela.

- Sirius, eu odeio você!

Ela acariciou o rosto do rapaz antes que seu lábio tocasse o do rapaz com delicadeza. O toque gentil da mão de Sirius em sua cintura, a outra mão segurando sua cabeça, a língua do rapaz percorrendo a sua boca, tudo isso fazia com que a garota percebesse que ela nunca devia ter duvidado do sentimento que ele sentia por ela.

Somente um segundo antes de sentir os lábios de Anne foi que Sirius percebeu que ela não estava com raiva dele. E quando ela o beijou, ele teve certeza de que ela nunca deixaria de amá-lo. Anne não disse uma palavra que comprovasse isso, pelo contrário, mas para um sentimento como aquele, as palavras não eram necessárias, e Sirius não exigiria que ela dissesse o que sentia. Ter a certeza do que ela sentia era o suficiente para ele, e ele tinha a certeza de todo o amor que a garota sentia toda vez que a pele dela tocava a dele, em todas as vezes que ela o acariciava. Anne o amava. E era só disso que ele precisava.

Quando o beijo terminou, as mãos de Sirius e Anne tocavam suavemente o rosto um do outro, até que o rapaz falou.

- Se isso é ser odiado, eu queria ser odiado assim... - Anne ergueu as sobrancelhas, receosa do que o rapaz iria dizer, e Sirius sorriu antes de continuar -... somente por você.

- Eu também queria que só eu odiasse você dessa forma.

Os lábios dos dois se tocaram mais uma vez antes de Sirius perguntar.

- Mas o que você queria falar, Annie?

Anne, que sorria, ficou séria.

- Nós fomos longe demais, Sirius. - o rapaz olhou intrigado para ela antes que ela continuasse - Nós fomos longe demais para podermos voltar a ser o que éramos antes. E eu não sei se eu quero voltar. - ela fez uma pausa antes de continuar - O que estou querendo dizer, Sirius, é que você estava certo. Nós deveríamos deixar que todos soubessem sobre nós dois.

O rosto de Sirius se iluminou com um sorriso.

- Isso é... - ele sabia que ficaria contente quando a garota concordasse com ele, mas não imaginava que seria tanto como estava sentindo -... é ótimo, Annie! Amanhã você pode ir almoçar comigo na mesa da Grifinória, acho que a Lily e você serão ótimas amigas, e depois nós podemos...

- Ei, ei, ei, não tão rápido, garoto!

- O que foi?! - Sirius disse, intrigado, mas logo surgiu uma expressão de pânico no rosto do rapaz - Não me diga que mudou de idéia...

- Não, não, claro que não! Eu só acho que amanhã não será um bom dia para isso.

Sirius suspirou, zangado. Era bom demais para ser verdade. Anne estava só tentando adiar as coisas mais uma vez.

- Olha, se você est...

- Eu não estou adiando nada. - a garota disse com firmeza - Só acho que seria melhor que todos soubessem sobre nós no passeio para Hogsmeade! Vai ter o jogo contra a Lufa-lufa um dia antes da visita, e como nós vamos ganhar, talvez não fiquem tão zangados conosco. Ainda por cima, vamos estar em Hogsmeade, e quem vai querer brigar quando poderia estar se divertindo? Você só vai ter que esperar mais alguns dias. Você consegue?

- Foi você quem falou que não tem mais volta...

- Isso é um sim ou um não? - Anne perguntou, erguendo as sobrancelhas.

- Isso foi um sim. - ele sorriu e deslizou a mão pelo cabelo da garota - Definitivamente, isso foi um sim, baby.

-x-x-x-

No dia seguinte, Anne encontrou-se com Severo na sala comunal, e se aproximou do rapaz. Durante a última semana, ela também não tinha conversado muito com Severo, e não queria que o irmão pensasse que eles estavam brigados outra vez. Quando ela ficou ao lado de Severo, percebeu que ele segurava um papel.

- Você está indo mostrar a autorização para o professor Carwell? - a garota perguntou - Podemos ir juntos para a sala dele. Eu também estou ansiosa para entregar logo a autorização, afinal, os próximos passeios para o povoado talvez sejam os últimos.

Se Anne não tivesse feliz demais por causa da reconciliação com Sirius, teria notado que o rapaz não parecia nem um pouco contente. Severo parecia concentrado em outra coisa, tanto que só percebeu que a irmã estava ao lado quando ela começou a falar.

- O quê? - ele perguntou, olhando desorientado para Anne.

- A autorização para visitar Hogsmeade, não é isso que você está segurando? - a garota perguntou começando a ficar intrigada.

Severo olhou do papel para a irmã, entendendo o que ela perguntava.

- É, eu estou indo sim... - ele percebeu que Anne também segurava a autorização dela, e um brilho de pânico surgiu nos olhos do rapaz - Você não vai...?

Mas ele não terminou a frase, porque nesse instante, Anne saiu da sala comunal da Sonserina. Anne caminhava na frente, mas a mão de Severo em seu braço fez com que ela voltasse.

- Anne, você não pode ir para Hogsmeade!

A garota olhou aturdida para o irmão.

- Do que você está falando, claro que eu vou para Hogsmeade!

O rapaz balançou a cabeça antes de continuar.

- Anne, pelo menos uma vez na vida, faça o que eu estou dizendo!

Anne olhou com determinação para o irmão.

- Por quinze anos eu não fiz nada além do que você mandava, Severo Snape, mas eu tenho uma coisa para te dizer. Você não pode me dizer o que fazer. Eu vou para Hogsmeade sim, e se você não gosta disso, então é melhor começar a aceitar, porque você não manda em mim! - ela disse enfatizando as seis últimas palavras, e em seguida, deu as costas ao irmão e continuou o caminho em passos duros.

-x-x-x-

Aquela estava sendo a pior briga que os irmãos Snape tiveram. Anne não fazia questão de olhar para Severo, muitas vezes fingia que o irmão não existia. No começo, Severo tentou fazer com que a irmã escutasse o que ele tinha a dizer, mas depois da garota ameaçar azará-lo, ele achou que era melhor esperar Anne se acalmar antes de mais uma tentativa de reaproximação.

Anne parecia não estar abalada com a briga. Ela e Sirius faziam planos para a visita e para o que os dois fariam depois que todos soubessem sobre eles. A garota estava animada com os planos, e se sentia mais leve. Ela percebeu que Sirius estava certo quando dizia que os dois não deveriam manter o namoro deles em segredo. Ter que esconder isso só a deixava preocupada se alguém iria descobrir, e depois do passeio a Hogsmeade, não teria mais essa preocupação.

A garota não teve que esperar muito tempo para isso. Logo chegou o dia da partida do time da Sonserina contra o da Lufa-lufa, e como Anne havia dito, Sonserina venceu sem nenhuma dificuldade.

Quando Anne acordou no dia seguinte, não ficou irritada ao ver um grupo de garotas cercando Narcisa como sempre ficavam quando isso acontecia. Ela levantou-se, e assobiando o hino de Hogwarts, foi tomar o café da manhã no salão.

Depois de ter comido, a garota voltou ao dormitório, que agora estava deserto. Anne começou a vestir-se, mas quando penteava o cabelo, Severo entrou abruptamente no dormitório.

- Com que direito você entra no meu dormitório? - Anne perguntou em tom ofendido.

- Olha, Anne, você não pode ir para Hogsmeade! - o rapaz disse enquanto fechava a porta, decidido.

- Nem você vai me impedir de ir para aquele povoado! - a garota foi até o irmão - Agora, abra essa porta!

Severo olhou apreensivo para a irmã, e perguntou, tentando ganhar tempo.

- Por que você quer tanto ir para Hogsmeade? Você nunca se divertiu no povoado!

- Porque... - a garota hesitou, mas quando se lembrou do motivo pelo qual ela iria ao povoado, ela respondeu sem titubear - Eu e Sirius vamos juntos.

Severo arregalou os olhos. Isso só piorava as coisas. Anne não podia ir mesmo para Hogsmeade.

- Você. Não vai. Sair. Daqui.

- Você é quem pensa... - Anne disse, e apontou a varinha para Severo, dando um sorriso estranhamente frio antes de responder - Antes foram só ameaças, mas agora eu estou falando sério. Saia da minha frente, ou eu vou usar isso.

Os lábios de Severo tornaram-se uma fina linha, e antes que Anne pudesse reagir, o rapaz a empurrou contra a parede e disse num sussurro impaciente.

- Você não entende, se você for para Hogsmeade eles vão matar você!

A pressão que o rapaz fazia sobre o corpo da garota havia desaparecido, mas era como se Severo ainda a tivesse segurando.

- O que... - ela disse, sentindo-se aturdida e surpresa ao mesmo tempo - Do que você está falando?!

- Vai acontecer um ataque hoje em Hogsmeade, e Andrew disse para não pouparem você - Severo disse sem encarar a irmã, tanto por sentir vergonha de ser a pessoa que falava para a garota que o próprio pai a odiava, quanto por não querer que Anne percebesse que ele escondia o verdadeiro motivo daquele ataque.

A garota levou as mãos à cabeça, sem querer acreditar. Por alguns instantes, a única coisa que ela conseguiu pensar foi no ódio infinito que a garota sentia naquele momento, mas quando conseguiu pensar, Anne falou em tom urgente.

- Sirius... Eu tenho que falar com Sirius...

Anne empurrou Severo, pegou o Mapa do Maroto, e saiu das masmorras apressada. Enquanto caminhava, ela viu que o ponto indicando S. Black estava saindo da torre da Grifinória naquele momento. Rapidamente, ela se dirigiu para a torre.

-x-x-x-

Os alunos que estavam se preparando para a visita ao povoado olharam com estranheza quando uma garota com as vestes da Sonserina subiu as escadas que levavam à torre da Grifinória. Os que reconheceram a garota como Adrianne Snape olharam com mais estranheza ainda.

Anne não se importou com esses olhares. Na verdade, ela nem os percebeu. Em sua mente, só havia um propósito. Encontrar Sirius e impedir que ele fosse para Hogsmeade.

Sirius descia as escadas animado. Havia esperado muito tempo por aquele dia, e não achava que nada poderia dar errado. Nem o aparecimento inesperado de Anne mudou isso.

- Hey, baby. - ele disse beijando os lábios da garota - Pensei que só ficaríamos juntos em Hogsmeade!

- Sirius, precisamos conversar - o tom urgente da garota preocupou o rapaz.

- O que foi, Annie? Aconteceu alguma coisa?

- Nós não podemos ir para Hogsmeade hoje. Não me pergunte o motivo, só não vá! - ela disse, aflita.

Sirius olhou para a garota contrariado.

- Por que eu não posso perguntar o motivo? Para que você não tenha que esconder que o motivo para você não querer ir para Hogsmeade é que você não quer que nos vejam juntos? - ele balançou a cabeça negativamente - Eu estou cansado disso. Se você quiser ir comigo e deixar que todos saibam sobre nós, tudo bem, mas se você não quiser, eu é que não vou querer mais continuar nesse joguinho infantil.

Anne olhou apreensiva para Sirius. Não queria perdê-lo, mas se ela fosse para Hogsmeade, dificilmente ela escaparia dos Comensais.

- Não é isso, Sirius, é claro que eu quero que os outros saibam sobre nós, mas nós não podemos ir para Hogsmeade!

- Se não é isso, qual é o motivo? - ele perguntou, duvidando que houvesse outro motivo.

Anne mordeu o lábio. Não poderia falar sobre o ataque sem esconder que Severo era um Comensal. Ela duvidava que Sirius acreditaria se ela dissesse que escutara uma conversa sem querer, e não poderia dizer que um amigo havia falado sobre o ataque com ela porque ela não tinha amigos. Se ela falasse sobre o ataque, Sirius suspeitaria imediatamente de Severo.

- Eu não posso dizer, Sirius, mas eu garanto que não tem nada a ver conosco!

Sirius hesitou por alguns segundos. O olhar de Anne era quase desesperado, e ela parecia estar sendo sincera, mas ele conhecia a garota muito bem para achar que ela poderia estar fingindo.

- Você não quer me dizer o motivo e ainda acha que eu devo acreditar que esse motivo não é o nosso namoro? - toda a decepção que ele sentia estava em seus olhos, e ele deu uma risada incrédula antes de responder - Eu acho que não.

Sirius recomeçou a descer as escadas, mas Anne segurou a mão do rapaz, e disse numa tentativa desesperada de fazer com que ele não fosse para Hogsmeade.

- Por favor, não vá para Hogsmeade! Confie em mim!

- Eu confiaria minha vida a você. - ele disse, mas em seguida, olhou com desprezo para a garota - Mas isso foi antes de você tentar me enganar.

Sirius deus as costas para a garota, e continuou o caminho até o salão principal. Anne não tentou impedir o rapaz. Percebeu que nada adiantaria no momento em que ele disse que não confiava mais nela.

A garota ficou em pé sem se mover por um longo tempo. O som dos passos zangados de Sirius já havia desaparecido há muito tempo quando ela levou a mão ao rosto para secar uma lágrima, e em seguida, lembrando-se do ataque, ela correu para a sala secreta. Não queria estar num lugar onde pudesse ser encontrada quando o ataque começasse.

Mas por mais que tivesse desejado, Anne não pôde deixar de ouvir o grito de alerta dado por uma aluna depois que viu a marca de Voldemort no céu, sobre Hogsmeade. Um grito que continha todo o medo pelo que poderia acontecer com os que estavam no povoado.

Ela ouviu os passos apressados dos alunos que andavam em frente à sala, e quase podia ver as expressões de preocupação dos que passavam em frente à ela. Ela tentava fingir que aquilo não era real, mas a voz da diretora da Grifinória em tom nervoso era real demais para ser ignorada.

- Temos que avisar Dumbledore imediatamente! Existem membros da Ordem em Hogsmeade!

Anne encolheu-se no chão, sem se importar com o que seria a tal Ordem. Naquele momento, não pensou no que poderia ter acontecido a ela, só queria estar em Hogsmeade com Sirius. Não importava se estaria morta, mas pelo menos teria a certeza de que ele estaria bem, ao invés de estar encolhida em uma parede, com medo de abrir a porta e enfrentar seus próprios demônios.

Ela ficou somente alguns minutos sentada, abraçando as pernas dobradas, mas pareceu durar uma eternidade. Uma eternidade em que Anne viveu todos os prováveis destinos que poderia ter antes de se levantar e abrir a porta da sala decidida.

A garota entrou no corredor, unindo-se a vários alunos que andavam apressados em direção à primeira janela que avistavam. Sem controlar-se, Anne fez o mesmo, e olhou instintivamente na direção de Hogsmeade.

Ainda era dia, e o sol brilhava, mas uma caveira verde de cuja boca saía uma cobra era visível por todos. Uma pequena agitação era vista pelos alunos que estavam nas janelas, mas todos no castelo tentavam ignorar os gritos de pânico.

Anne deu pequenos passos para trás, tentando disfarçar o horror que sentia pelo que estava acontecendo, mas, principalmente, o horror que tinha da própria covardia.

Convencida de que deveria ter feito isso há mais tempo, ela começou a correr até a porta de saída, mas a professora Sprout a impediu de sair.

- Menina, eu sei como deve ser difícil ficar aqui, mas você não pode sair de Hogwarts! Aqui é mais seguro que lá fora.

Anne olhou com fúria para a professora, e dos olhos dela saíram faíscas quando ela disse em tom imperativo.

- Cale essa sua maldita boca e saia da minha frente!

A professora de Herbologia olhou levemente surpresa para a jovem aluna. A professora já havia impedido que inúmeros alunos tentassem sair da escola, mas nenhum deles parecia tão determinado quanto a aluna da Sonserina. Com dificuldade, a professora lançou um olhar severo à garota.

- Mocinha, eu sou uma professora cumprindo as ordens do diretor, e enquanto ele não ordenar outra coisa, nenhum aluno sairá desta escola!

- Pouco me importa o que Dumbledore disse! Ou você sai da minha frente e me deixa sair, ou então eu encontrarei outra forma de fazer isso!

A professora olhou ameaçadora para a aluna.

- Então você terá que encontrar outro jeito.

Anne fechou a mão com força, e começou a caminhar decidida para a sala secreta. Só de pensar em entrar na Floresta Proibida fazia seu corpo começar a suar, mas ela não iria ficar quieta. A garota estava prestes a entrar na sala quando uma mão em seu ombro fez ela voltar.

- Você não ouviu, garotinha, os alunos devem ficar nas salas comunais de suas casas!

Anne virou-se, e viu o zelador Filch a observando com um olhar astuto. Contra ele, a garota não poderia fazer coisa nenhuma, e ela sabia disso, por isso, foi para as masmorras.

A maioria dos alunos que estava na sala comunal era do primeiro e segundo ano, mas os alunos mais adiantados não pareciam preocupados. Era como se ao invés de um ataque, fosse um dia normal de aula, e os alunos estavam na sala comunal somente para passar o tempo. A garota segurou para não gritar contra aquela hipocrisia, mas se controlou e foi para o dormitório. Enquanto ficasse longe dos outros alunos, não perderia o controle.

Ela saiu do dormitório somente quando ouviu vozes vindas da sala comunal. Os outros alunos deveriam estar chegando. Anne abriu o mapa mais uma vez. Desde que ficou sozinha no dormitório, havia aberto o mapa várias vezes na esperança de ver que Sirius havia chegado, mas em nenhuma delas havia visto um ponto representando o rapaz. Naquela vez, porém, ela viu um ponto indicando Sirius entrar em Hogwarts e andar rapidamente ao lado de dois pontos, Emma Black e Julie Black. Anne suspirou aliviada. Sirius estava bem. Pelo menos foi o que ela achou até ver o rapaz indo para a enfermaria. Anne guardou o mapa debaixo do colchão da cama, e foi para a enfermaria.

Não foi difícil passar despercebida. No meio de vários alunos desesperados, um a mais, um a menos, não faria diferença. Era fácil ser ignorada quando todos só pensavam no próprio sofrimento. Anne não demorou a entrar na enfermaria, mas no momento que pôs os pés no lugar, preferiu que não o tivesse feito.

O número de alunos desmaiados era quase igual ao número de alunos em
cujas vestes havia o desenho de um leão. Dos alunos que estavam acordados, alguns gritavam de dor, outros pareciam ter sido estuporados, e os outros, faziam força para não gritar. Era quase impossível achar um aluno que não tivesse sangue nas vestes. Ou um aluno que não tivesse dor ou desejo de vingança no olhar.

Anne respirou fundo, mas até o ar parecia estar carregado com o que os alunos na enfermaria estavam sentindo, o que só fez aumentar o desejo de sair da sala, mas a necessidade de ter certeza de que Sirius estava bem era maior. Ela começou a procurar o rapaz com o olhar, mas foi ele quem a viu primeiro. Anne só o viu quando Sirius começou a caminhar na direção dela. Olhando bastante sério para a garota, ele a puxou para fora da enfermaria.

- Vamos para a sala.

E, sem que Sirius soltasse o braço de Anne, os dois foram para a sala secreta.

Quando entraram na sala, Anne olhou melhor para Sirius. O rosto dele estava arranhado, e havia um hematoma no braço, mas o que importava é que ele estava vivo. Ela fez um gesto para abraçá-lo, mas o rapaz a repudiou e perguntou em seguida com raiva no olhar.

- Era por causa do ataque que você não queria ir para o povoado, não era? O tempo todo você sabia sobre o ataque!

Anne olhou ofendida para Sirius, tentando disfarçar a surpresa que estava sentindo. Não havia imaginado que o rapaz pensaria nisso, mas quando ele falou, ela percebeu que deveria ter imaginado que essa seria a primeira pergunta que Sirius faria, já que o motivo que fez com que Anne não fosse para Hogsmeade não tinha a ver com os dois.

- Claro que não, eu não...

O rapaz a interrompeu com um gesto brusco.

- Você não acha que já mentiu para mim o bastante por um dia?! Que tal começar a dizer a verdade. Você. Sabia. Sobre. O ataque!

A garota balançou a cabeça, negando. Nunca confirmaria que sabia sobre o ataque, não enquanto tivesse que proteger Severo.

- Eu não sabia sobre o ataque! - a garota disse começando a ficar realmente furiosa, como ficava antes que ela e Sirius se tornassem amigos.

- Você sabia sim! Por que você não me disse? A Ordem poderia ter impedido o ataque, e minha irmã não teria se machucado!

Sirius se calou, percebendo o que havia dito, e como se tivesse encontrado a última peça de um quebra cabeça, Anne lembrou-se do que a professora de Transfiguração havia dito sobre a Ordem e sobre alguns de seus membros estarem no povoado. Subitamente, ela viu a verdade. Se ela enganou Sirius, ele a havia enganado da mesma forma.

- Você faz parte dessa Ordem? - a garota perguntou, incrédula - Porque você nunca falou sobre isso antes?

- Eu... Eu não sei do que você está falando... - o rapaz parecia tão sincero quanto Anne ao negar que sabia sobre o ataque.

- Não tente me enganar, Sirius Black! Eu ouvi o que a professora McGonagall disse sobre essa Ordem, e eu ouvi muito bem você falar sobre isso também!

- Você deve... ahm... estar imaginando coisas, não existe essa coisa de Ordem...

Sirius tentou convencer Anne mais uma vez, mas estava sendo em vão. Toda confiança que a garota sentia nele havia desaparecido no momento em que ela teve a certeza de que o rapaz fazia parte dessa Ordem, mesmo sem que Sirius tivesse dito uma palavra confirmando isso.

- Eu não acredito. - a garota disse sem emoção - Da mesma forma que você não acredita que eu não sabia sobre o ataque.

Como um raio, Sirius teve a certeza de que Anne sabia sobre o ataque, e de que forma ela havia descoberto sobre ele. Com certeza o irmão dela havia dito, e ela estava tentando protegê-lo da mesma forma como ele estava fazendo com a Ordem. Além disso, ele teve certeza de outra coisa que quase o fez desmoronar naquele instante. Anne não confiava mais nele, e ele não confiava mais nela. Sirius praguejou em pensamentos. Por causa dos segredos que os dois estavam escondendo, as coisas entre os dois nunca mais seriam as mesmas, e dessa forma, eles não poderiam continuar. Ele passou os dedos pelo cabelo, tentando criar coragem de dizer as últimas palavras que queria dizer, mas as únicas que poderiam ser ditas naquela situação.

- Entendo... - ele fez uma pausa antes de continuar - Então acho que não temos outra escolha. - ele abaixou o rosto - Isso é o fim.

Com dificuldade, ela continuou mantendo a pose de firmeza. Não queria que o rapaz percebesse o quanto aquele momento estava sendo difícil, e o quão fraca ela poderia ser, mas quando viu que não existia confiança entre eles, Anne percebeu que o relacionamento dos dois estava terminado. Enquanto um acreditava no outro, sempre haveria uma possibilidade, mas sem confiança, não havia como acreditar que o que eles falavam era verdade.

- Uhum. - a garota concordou com a cabeça - É o fim. E não há mais nada a dizer.

Sirius caminhou até a porta, nunca sentindo os pés tão pesados quanto naquele momento. Parecia que eles estavam grudados no chão. Mas o rapaz alcançou a porta, e saiu sem olhar para trás. Sabia que se olhasse para Anne, não conseguiria fazer o que era certo no momento certo. Só estaria adiando para a próxima vez que olhasse desconfiado para a garota, suspeitando dos segredos que ela estaria escondendo quando acontecesse mais um ataque, e aumentando a dor que sentiria quando tivesse que dizer adeus outra vez.

Anne não olhava para Sirius quando ele deixou a sala, mas sentiu que enquanto ele caminhava para a porta, todos os planos que os dois haviam feito estavam indo com ele. Ele tinha um futuro brilhante pela frente. Enquanto esteve com ele, ela também teve essa oportunidade. Mas agora só havia restado o destino negro que um Snape poderia ter, ainda mais uma garota Snape.

As lágrimas começaram a sair sem que ela impedisse, e mesmo que quisesse, não o faria. Aquela era a última oportunidade que ela dava a si mesma para demonstrar qualquer sentimento. Aquela era a última oportunidade que ela dava a si mesma para demonstrar um sentimento. Depois que ela saísse da sala, teria que voltar a usar o estigma de um Snape. Para nunca mais deixar.

-x-x-x-

Severo estava voltando do corujal, e quando começou a descer as escadas que levavam às masmorras, ele viu que a irmã caminhava mais à frente. Ele conhecia a garota muito bem para saber o que havia acontecido.

- Anne, eu sinto muito... - o rapaz disse em tom compreensivo, passando a mão no ombro dela - Mas essa era a única solução possível.

A garota concordou com a cabeça.

- Eu sei. Acho que na verdade eu sempre soube que tudo terminaria assim. Mas eu não quero falar sobre isso. Agora já é passado. De onde você está vindo, Severo?

- Do corujal. - ele disse parecendo pouco à vontade - Ele disse que queria receber uma coruja quando... - ele não poderia terminar a frase com a irmã ao lado.

- Eu sei. O que você disse para que ele não pensasse que você me protegeu?

- Eu disse que você ficou em detenção outra vez.

Enquanto caminhavam para as masmorras, cada um pensava nos acontecimentos daquele dia. Severo tentava esconder a felicidade que sentia pelo fim do namoro da irmã com Sirius Black, mas isso não era difícil. Ele só precisava lembrar que o ataque havia sido em vão. Tanto Potter quanto Anne estavam vivos. Andrew iria ficar furioso. Voldemort ficaria furioso. Severo não entendia porque o temível bruxo queria tanto a morte de um adolescente idiota. Mas essa era somente uma das milhares de coisas inexplicáveis nessa guerra, e Severo não iria se preocupar com isso. Potter que se preocupasse. Ele tinha preocupações o bastante.

Anne, por sua vez, pensava em quantas coisas podem acontecer em apenas algumas horas. De manhã, ela estava animada por causa da visita ao povoado, até que Severo apareceu dizendo que o próprio pai ordenara que a matassem. Ela nunca imaginou que Andrew seria capaz disso. Sabia que ele poderia machucá-la, mas não pensou que ele teria a audácia de ordenar a morte dela. O ódio que ela sentia pelo pai agora havia se tornado desprezo. Ele era um covarde. Mandava os serviçais fazer o serviço que ele deveria fazer. Ela não perdeu muito tempo pensando nele. Logo o rosto de Sirius dizendo que não confiava mais nela apareceu na mente da garota, mas ela ignorou esse pensamento. Ela só queria esquecer tudo aquilo, mas se continuasse pensando, dificilmente ela esqueceria. Então prometeu a si mesma que nunca mais pensaria em Sirius. Era a única maneira de esquecê-lo.

Os irmãos Snape caminharam em silêncio, até chegarem em frente ao muro de pedra.

- O que faremos agora? - a garota perguntou num sussurro.

- O que sempre fizemos. Ficaremos juntos e cuidaremos um do outro.

Os dois deram-se as mãos, e entraram juntos na sala comunal da Sonserina.

-x-x-x-

Faltavam apenas alguns dias para o Natal. Do lado de fora do castelo, nevava fortemente, a ponto de nenhum aluno se atrever a ir para fora, mas ninguém se preocupava com isso. Os alunos estavam ansiosos para rever os pais, ou receber os presentes. Alheia a tudo isso, Anne estudava sozinha em uma mesa na biblioteca, até que Severo entrou na biblioteca e sentou-se numa cadeira em frente à da irmã.

- Acabei de receber isso de Andrew. Veja.

Severo passou o pedaço de pergaminho para a irmã, que ao terminar de ler, ergueu a sobrancelha e perguntou, intrigada.

- Você tem certeza de que isso está certo?

Desde que Anne não estava mais com Sirius, os irmãos Snape voltaram a ser unidos como antes do rapaz entrar na vida da garota, e compartilhavam todos os segredos de um com o outro. Inclusive a correspondência que Severo recebia do pai.

- Eu estou entendendo tanto quanto você. Ele quer que eu vá para casa no Natal, mas ele não disse nada quanto a você.

- Ele deve estar com raiva de você por ter me protegido, e talvez ele queira que... você seja ... punido... - Anne não terminou. Só de imaginar que Severo seria punido por tê-la protegido fazia a garota sentir-se culpada.

- Ele não faria isso. Andrew me quer do lado dele, e não contra.

- Bem, talvez ele só não queira me ver depois do plano dele não ter dado certo - a garota disse com descaso.

- Eu não acho que seja isso, Anne. Ele não desistiria facilmente do plano dele. Deve ter outra coisa por trás disso...

- Ora, Severo, deixe de besteiras, talvez seja só... - ela se aproximou do rapaz, e sussurrou -...uma reunião... Nós somos gêmeos, mas não nascemos grudados. E além do mais, eu prefiro ficar no castelo mesmo.

Severo olhou novamente para o pergaminho. Sabia que Anne estava errada. O pai deveria ter suspeitado que ele havia protegido a irmã. Ele deveria estar planejando outra coisa, e o afastava propositalmente para que Severo não protegesse Anne quando o que quer que Andrew havia planejando fosse acontecer.

- Só tenha cuidado, Anne. Eu não vou estar aqui se algo acontecer.

- Eu sempre consegui cuidar de mim mesma muito bem - ela disse voltando a atenção para o livro de Herbologia. Depois que desafiou a professora Sprout no ataque, a turma dela havia recebido mais deveres que o habitual.

- Pode ser, mas você não vai perder nada se evitar sair do castelo.

- Você sabe muito bem que eu não costumo sair de Hogwarts. - ela olhou para o irmão - Pode deixar, Sev. Quando você voltar, eu ainda vou estar aqui.

- Está bem... - o rapaz disse, e saiu da biblioteca.

Anne continuou estudando até que, minutos depois um grupo de alunos entrou, fazendo barulho. A garota nem precisou levantar a cabeça para saber que era Sirius quem entrava, juntamente com os outros três amigos.

Ela sentiu que ele a observava, e como se os olhos azul-acinzentados do rapaz a atraíssem, Anne olhou de volta para Sirius.

Assim que entrou na biblioteca, Sirius olhou para Anne, e lembrou-se do que Julie havia dito enquanto ele cuidava dela quando estava se recuperando na enfermaria. Durante o tempo que ficou cuidando da irmã, Julie havia sido perspicaz o bastante para perceber o que o rapaz escondia até dele mesmo. Ele ainda amava Anne, e não estava satisfeito com aquela situação. Ela o aconselhou a procurar a garota para os dois conversarem e resolverem os assuntos pendentes. Sirius sabia que era isso que ele deveria fazer, mas a lembrança de que ela escondia algo o impedia de se aproximar de Anne.

Anne e Sirius se encararam até que a voz de Pedro chamou o rapaz de volta.

- O que foi, Almofadinhas? Alguma garota em vista?

Anne balançou a cabeça e começou a guardar seus livros. Ela pensou que Sirius ia falar com ela, mas quando ouviu Pettigrew falar, se sentiu uma estúpida por ter pensado nisso. A garota levantou-se e saiu da biblioteca, contrariada.

Enquanto caminhava a passos duros em direção às masmorras, Anne tentava ignorar todas as suas dúvidas. Não tinha mais certeza de que aquela era a vida que deveria ter, e ver Sirius só fazia suas dúvidas aumentarem. Ela começava a acreditar que talvez os dois ainda poderiam ficar juntos, mas isso não dependia somente dela. Sirius teria que aceitá-la como ela era.

Os passos apressados que Anne ouviu atrás de si fizeram a garota achar que isso estava prestes a acontecer.

- Espera, Anne.

Anne voltou-se e viu Sirius parado com esperança no olhar.

- O que é? - ela disse, tentando esconder a emoção que sentia.

- Nós precisamos conversar. Isso que está acontecendo entre nós... Eu não posso deixar que tudo termine assim...

Dois alunos da Corvinal passaram pelo corredor naquele momento, encarando o grifinório e a sonserina com estranheza.

- Encontre-me na sala em cinco minutos - Anne disse, por precaução. Não sabia que resultado a conversa teria.

Depois de ter guardado seus livros no dormitório, Anne foi para a sala. Sirius estava sentado, a cabeça apoiada nas mãos, que estavam sobre as pernas dele, mas ele se levantou quando a garota entrou.

- Anne, isso que está acontecendo não é justo. Eu sei que você sabe.

- Não importa o que eu sei. - ela disse com frieza - Importa o que você quer.

O rapaz engoliu em seco. De repente, todas as palavras que pensou em dizer para Anne haviam desaparecido.

- Você sabe sobre a Ordem... Não existe mais nenhum segredo da minha parte... Tudo depende de você. De uma única resposta. Como você ficou sabendo sobre o ataque?

As mãos da garota começaram a suar frio, e para que Sirius não percebesse, Anne ficou atrás de uma das cadeiras e apoiou as mãos nela enquanto pensava em qual seria sua decisão. O que ela havia desejado nas últimas semanas estava acontecendo. Uma segunda chance. Um novo começo. Mas em troca disso, ela teria que sacrificar o próprio irmão. O mesmo irmão que salvara a vida e em troca receberia um castigo inimaginável. Ela não seria capaz de fazer isso nem pela própria felicidade.

- Você não vai conseguir essa resposta de mim. Se você quiser continuar comigo, terá que confiar em mim.

Sirius olhou para Anne com uma mistura de raiva e decepção. O olhar do rapaz era intenso, e quase fez com que a garota dissesse a verdade, mas ela permaneceu forte.

- Eu sou mesmo um idiota por pensar que você poderia acreditar em nós! - ele saiu em seguida, mas sem estar arrependido.

Sirius havia feito o possível para que Anne tomasse a decisão certa. Só dependia dela, mas ela não quis. Ele não tinha mais nada a fazer.

Ao se ver sozinha na sala, Anne olhou na direção onde antes estava Sirius, e disse com firmeza.

- Você não faz idéia do quanto eu acredito.

-x-x-x-

Era noite, e o castelo estava silencioso. Silencioso e vazio. Os alunos que foram visitar os pais tinham viajado há três dias, e o castelo estava vazio como nunca. Eram poucos os alunos que estavam nos dormitórios da Grifinória, Lufa-lufa e Corvinal, mas os da Sonserina eram pouquíssimos. E todos eles dormiam. Por isso, ninguém notou o desenho verde que começava a se formar no céu sobre o castelo.

No dormitório feminino da Sonserina, Anne dormia quando ouviu alguém batendo na porta do dormitório. Ela era a única garota naquele quarto, mas havia duas outras garotas no dormitório, e Anne pensou que deveria ser uma delas quando foi abrir a porta. Mas ao invés de uma garota entrar em seu quarto, uma coruja invadiu o dormitório, que deixou um pergaminho cair no chão antes de sair do quarto, apressadamente.

Anne abaixou-se, e pegou o papel antes de lê-lo.

"Hoje à noite Hogwarts será atacada, e Andrew ordenou que os Comensais não deveriam ter piedade com você. Saia do castelo imediatamente. Severo."

Anne soltou um riso nervoso.

- Ora, Severo deve estar enlouquecendo. Ninguém seria louco de atacar uma escola!

Ela deitou-se novamente, mas não conseguiu dormir. O recado de Severo a deixara inquieta, mas ela ainda não acreditava nele. Tudo parecia tão calmo... Era difícil acreditar que aquela paz seria perturbada por um...

Nesse momento, Anne ouviu um eco de um barulho, e em seguida, um grito. O rosto da garota empalideceu, e sem perceber, ela se levantou de uma vez, e pegou o mapa do Maroto. A garota nunca pensou em devolvê-lo a Sirius. Era um mapa incrível demais para ela abrir mão, e no momento, estava provando ser muito útil.

Assim que o mapa foi aberto, as linhas começaram a se formar, mais rápido que o normal, como se soubessem da urgência que Anne sentia. Em pouco tempo, começaram a surgir seis pontos no terreno do castelo. A garota não sabia se ficava aliviada ou preocupada por ver que nem Andrew ou Severo estavam entre eles, mas não passou muito tempo pensando nisso. Com a certeza de que o castelo estava sendo atacado, Anne sabia que deveria deixá-lo imediatamente, então ela saiu apressada do quarto. Iria deixar Hogwarts pelo caminho mais secreto, mas também o mais obscuro. Através da passagem para a Floresta Proibida na sala secreta.

Quando a garota alcançou o corredor que levava ao salão principal, percebeu que não era a única que sabia sobre o ataque. Na verdade, parecia que todos já sabiam. Entre a professora de Adivinhação, o professor de Poções, alguns fantasmas e um monitor da Lufa-lufa e outro da Corvinal, ela viu Lílian Evans correr junto com Remo Lupin na direção da sala do diretor, os dois aparentando bastante apreensão.

- Eu espero que os feitiços de proteção impeçam a entrada deles - a ruiva disse com nervosismo.

- Eles vão segurá-los por algum tempo, mas não sabemos até quando, Lily.

Rapidamente, os dois passaram por ela continuando o caminho, e Anne foi para a sala, assustada e apressada. Mas quando a garota colocou a mão na maçaneta da porta da sala, sentiu-se observada, e virou-se. Atrás dela estava Sirius, olhando profundamente para ela.

Quando desceu as escadas, um pouco atrás de Lílian e Remo, Sirius planejava somente ficar protegendo Hogwarts, mas ao ver Anne indo para a sala, seguiu a garota. O rapaz sabia que ela estava indo esconder-se na Floresta, mas preferiu que ela não fizesse isso. Sirius estava preocupado com a garota, claro, mas não queria que ela se acovardasse. Queria que Anne o seguisse e fosse proteger Hogwarts com ele. Sirius pensava que Anne não teria outra oportunidade de mudar de idéia, mas em meio à situação improvável, uma nova chance aparecia. E foi com o pedido para aceitar essa nova chance que o rapaz olhou para a garota.

Ao ver Sirius, Anne viu nos olhos dele toda a vontade que ele sentia de que ela o seguisse, mas a garota sabia que não poderia fazer o que o rapaz pedia, por mais que ela quisesse. Anne não era corajosa a ponto de arriscar a própria vida, mas vendo Sirius, ela começou a pensar no que aconteceria com ele, e olhou da porta para o rosto do rapaz, pedindo que ele fosse com ela para longe do ataque.

O curto tempo que os dois se encararam parecia durar uma eternidade. Era como se os dois tivessem duelando, pois Anne e Sirius não queriam ceder, um querendo proteger o outro à sua maneira. Eles ficaram assim até que Lílian Evans voltou da diretoria, passando entre os dois.

- As proteções do castelo estão perdendo a força, Sirius! - ela disse ao ver o colega.

Sirius olhou de Lílian para Anne. Tinha que ir com a ruiva, mas não queria deixar Anne. O rapaz estava prestes a tomar uma decisão, quando a garota deu as costas para ele, e entrou na sala. Naquele momento, a promessa que fizera de que protegeria a garota de qualquer coisa estava sendo quebrada.

Dentro da sala, Anne empurrava o quadro e entrava na passagem. Do lado de fora, Sirius ia com Lílian para a porta de entrada do castelo, reforçar os feitiços de proteção.

A partir daquela noite, os dois iriam seguir cada um o seu caminho, separadamente. A partir daquela noite, cada um seguiria por dois caminhos distintos. E não havia mais volta.