26. AINDA EM PÉ



O rosto de Sirius empalideceu quando ele viu que Pedro não estava no esconderijo, e então ele percebeu que havia se enganado o tempo todo. Remo não era o traidor, mas sim, Pedro. Por instantes, ele não soube o que fazer, até que, decidido, ele montou na moto e foi para Godric's Hollow. Pensava que ainda poderia salvar Tiago, Lílian e Harry, mas quando chegou lá, a casa estava praticamente destruída.

- Ah, não... Tiago, Lílian...Harry... O que eu fiz... Eu.... eu matei vocês... - ele disse com amargura, enquanto caía de joelhos no chão, chorando e tremendo.

Sirius permaneceu assim até que ouviu um choro insistente. Rapidamente ele se levantou, mas antes de entrar, Hagrid saiu dos escombros e se aproximou com Harry nos braços.

- Ah, Sirius, eu sinto muito... Tiago e Lily... - ele fungou - Eles não mereciam isso...

- Não é possível... - ele disse olhando para o infinito.

- Eu sei como é difícil acreditar, Sirius... Eu também mal consigo acreditar que eles estão mortos... - ele passou os dedos nos olhos - Pelo menos Harry está bem, apesar desse corte na testa...

Subitamente, como se somente naquele momento tivesse percebido o pequeno Harry nos braços de Hagrid, Sirius olhou para o afilhado, e dele para o gigante.

- Me dá o Harry, Hagrid. Sou o padrinho dele, vou cuidar dele... - ele dissse, sem se importar com o fato de estar chorando.

Hagrid balançou a cabeça negativamente.

- Não, Sirius, Dumbledore disse para eu levar o menino para a casa dos tios.

- Me dá ele, Hagrid, agora sou eu quem vai cuidar dele...

- Sirius, Dumbledore disse para eu levar Harry para a casa dos tios, e é isso que eu vou fazer - o gigante disse em tom decidido.

Sirius encarou o gigante, mas com um meneio de cabeça, concordou com ele, e acrescentou.

- Está bem... - ele parecia distraído - Você pode usar a moto. Eu não vou mais precisar dela.

E tranqüilamente, como se seus melhores amigos não tivessem sido mortos, ele aparatou, mas não voltou para casa. Não poderia olhar para Anne depois de, por culpa dele, Tiago e Lílian estarem mortos, pelo menos não antes do assassino ter sido punido.

-x-x-x-

Os boatos de que Voldemort havia desaparecido se espalhava por todo o mundo bruxo, e Sirius também já havia escutado sobre eles. Ainda não havia encontrado Pedro, mas pelo menos sabia onde não procurá-lo. Com certeza Pedrinho não gostaria de se encontrar com um Comensal furioso.

Enquanto procurava por Pedro, Sirius se lembrou do garoto que conheceu em Hogwarts, do antigo Rabicho. Ele nunca teve grande imaginação, por isso conseguia enganar os professores com suas mentiras, e por não ter imaginação, ele só poderia estar escondido no antigo esconderijo. Num piscar de olhos, Sirius desapareceu.

Sirius desaparatou em frente a um chalé, e entrou. Não havia ninguém na casa, e nada parecia fora do normal. Nada, até que Sirius viu um rato tentar sair pela porta.

- Pedro... - ele disse num murmúrio furioso, mas antes que pudesse alcançá-lo, o rato saiu do chalé.

Sirius foi até a porta andando em passos rápidos, a tempo de ver o rato se tornar Pedro Pettigrew. Pedro olhou assustado para Sirius. Como rato, não poderia aparatar, por isso havia se transformado em humano, mas agora, ele não conseguiria fugir de Sirius. A única solução que encontrou foi correr para a cidade.

Pedro era pequeno e ágil, mas Sirius o seguia incansavelmente, até que o encurralou numa rua sem saída. Sirius apontou a varinha para Pedro com determinação.

- Você não vai escapar impune, Rabicho! - ele disse com fúria.

Os olhos de Pedro iam da esquerda para a direita, tentando encontrar uma forma de escapar, mas não havia por onde fugir. Ele olhava desesperado para Sirius, até que se lembrou que estava segurando sua varinha, e um plano surgiu em sua mente. Era arriscado, mas Pedro sabia que funcionaria. Ele sempre conseguiu enganar as pessoas muito bem.

- Lílian e Tiago, Sirius! Como você pôde! - o bruxo miúdo disse em tom de desespero, mas seu olhar era de triunfo.

Enquanto falava, Pedro colocou a mão no bolso, como se fosse tirar a varinha, mas sorria astutamente.

- Como você ousa...

Sirius, porém, não terminou a frase. Ele olhava curioso para Pedro, que acabava de arrancar um dedo. Sirius se aproximou do bruxo, mas antes que o alcançasse, houve uma explosão.

No instante seguinte, uma névoa cobriu a visão de todos na rua, mas Sirius conseguiu sentir um rato passar por cima de seus pés, então ele começou a dar risadas. Não conseguia acreditar como havia sido tolo. Em Hogwarts, Rabicho sempre havia conseguido escapar de todas as encrencas, e mais uma vez, ele havia fugido.

Ao redor de Sirius, vários trouxas gritavam e choravam, desesperados. Havia um buraco na rua, tão profundo que fez um dos canos de esgoto estourar. A rua estava praticamente inundada, e o cheiro de esgoto era forte, mas nada disso parecia incomodar Sirius. Ele continuou rindo até que agentes do Ministério chegaram, e o levaram embora, sem nenhuma dificuldade.

-x-x-x-

Anne nunca se lembraria das palavras de Sirius quando ele foi embora, mas quando acordou na manhã seguinte, estava com a sensação de que algo grave havia acontecido durante a noite, e quando viu que Sirius não estava em casa, essa sensação aumentou.

Anne só descobriu o que havia acontecido quando se lembrou de Lílian e Harry em Godric's Hollow, e apesar de toda a angústia que sentia, não podia fazer nada, além de esperar. Sirius teria que voltar para casa, de qualquer forma.

Mas uma semana passou sem que Anne soubesse de qualquer coisa, até aquele sete de novembro, uma manhã fria de domingo, mas também aniversário de Anne.

Ela acordou com a esperança de que Sirius estivesse chegado, e atirou as cobertas para longe, mas não havia sinal da moto, ou de Sirius. Anne voltou para casa, e entrou na sala, onde o gato que Lílian havia dado estava esperando por ela. Durante a semana, ela havia encontrado o nome ideal para ele.

- Vem aqui, Snuffles... - Anne disse tentando permanecer calma, enquanto acariciava o pêlo acinzentado do gato - Seb, onde você está... - ela perguntou para si mesma, enquanto fechava a porta.

Anne se sentou no sofá, mas no instante seguinte, se levantou e foi para a cozinha, fazer algo para comer. Em pouco tempo o café da manhã ficou pronto, mas ela estava sem apetite, então só ficou sentada, olhando para a comida, até que ouviu alguém bater à porta.

- Seb! - ela se levantou apressada, mas olhou decepcionada para a coruja que voava em frente à porta.

Anne olhou para o maço que a coruja deixou cair no chão, e o apanhou.

- Ah, é só o Profeta Diário... - ela disse com decepção ao ver o nome do jornal impresso - Tinha me esquecido dessa assinatura semanal...

Em seguida, Anne fechou a porta e jogou o jornal no sofá.

Depois que comeu, Anne limpou a mesa e lavou a louça. Depois, ela foi para a sala, e ao ver o jornal no sofá, pensou que se tivesse acontecido algo com Lílian e Harry, deveria estar no jornal. Intrigada, Anne segurou o jornal, mas assim que pôs os olhos na manchete, seu rosto empalideceu.

"Depois da queda de Voldemort, Black é enviado para Azkaban sem ser julgado"

As pernas e as mãos da mulher tremeram, mas ela continuou lendo a matéria.

"Ministro aceitou a condenação e Black será punido com prisão perpétua em Azkaban.

Após ouvir depoimentos de trouxas e de alguns bruxos, o Ministério concluiu que Sirius Black foi culpado por assassinar o bruxo Pedro Pettigrew e mais doze trouxas no dia 1o de novembro. Black será mandado, sem direito a julgamento, para Azkaban, com prisão perpétua. Apesar dos pedidos dos familiares de Black, o Ministro não deixou que o Comensal fosse julgado, com apoio total da comunidade bruxa. 'O Lord das Trevas pode ter sido derrotado, mas suas idéias ainda estão muito vivas, e qualquer um que as siga deverá ser punido exemplarmente', declarou Bartolomeu Crouch ao Profeta Diário.

Black surpreendeu a muitos bruxos quando foi acusado de ter revelado o esconderijo dos Potter a Você-Sabe-Quem, causando a morte do casal Potter. Harry Potter, o pequeno filho dos Potter, sobreviveu ao ataque, no qual, ironicamente, Você-Sabe-Quem foi derrotado, desaparecendo em seguida.

Ao saber da derrota de seu mestre, Black fugiu, temendo a punição, mas o corajoso Pedro Pettigrew foi em busca do Comensal. Infelizmente, Pettigrew não conseguiu impedir Black, que sem se importar em estar em uma cidade trouxa, explodiu uma rua matando Pettigrew e mais outros doze trouxas, onde foi encontrado e preso pelos Aurores do Ministério. Black será enviado para Azkaban dentro de três dias. A família de Sirius Black negou-se a se pronunciar sobre o assunto."

- Isso... Isso não pode ser verdade! - Anne sussurrou com raiva, sem perceber que chorava - Isso não pode ter acontecido! - ela gritou, como se a pessoa que escreveu aquela matéria estivesse em sua frente e ela estivesse tentando convencê-la de que estava errada.

Anne sabia que Sirius nunca entregaria o esconderijo dos Potter. Ele nem deveria se lembrar por causa do feitiço Fidelius, a não ser se o fiel tivesse revelado o segredo... Então Anne percebeu porque conseguia se lembrar do esconderijo de Lílian, Tiago e Harry. Pedro disse a Voldemort onde os Potter estavam escondidos. Sirius deveria ter ido atrás dele, se vingar, e pelo que havia lido, ele conseguiu o que queria, ela pensou com sarcasmo, e uma ponta de raiva.

Subitamente, Anne sentiu-se tonta, a cabeça doía, e começou a caminhar lentamente para o quarto, deixando o jornal cair de sua mão enquanto ia para o quarto, seguida por Snuffles. Toda a apreensão que estava sentido nos últimos dias começava a fazer sentido, e ela se culpava por não ter feito algo. Por causa de sua omissão, tudo o que ela havia planejado deu errado. Num instante, tudo estava bem, nada parecia que ia dar errado, e de repente, tudo desapareceu, como se tivesse acordado depois de ter sonhado. Não, ela pensou. Aquilo não era a realidade. A realidade era só um sonho. Em poucos instantes, ela acordaria, e tudo estaria bem...

Nesse momento, o olhar dela foi atraído por sua própria imagem refletida no espelho, e como um raio, percebeu porque Sirius estava em Azkaban. Por sua culpa. Por estar grávida. Se não estivesse esperando um filho, ele teria sido o fiel dos Potter, se ele a tivesse deixado ir para Azkaban, ele não teria matado Pettigrew e aqueles trouxas...

Anne olhou com ódio para a imagem refletida no espelho, e com um urro de raiva, esmurrou o vidro, que se partiu, mas ela continuou batendo, sem se importar com os pedaços que machucavam a sua mão.

Subitamente, ela sentiu o chão girar sob seus pés. Anne ainda tentou esticar os braços para não cair, mas sua mente não obedeceu, da mesma forma que ignorou a forte dor um pouco abaixo do estômago. A última coisa que Anne sentiu antes de desmaiar foi o chão frio encostar-se a seu rosto.

-x-x-x-

- Eu bati na porta, mas você não abriu, então eu entrei - Julie disse entrando na sala - Snape?

Ninguém respondeu ao chamado de Julie, e ela foi para o quarto. Enquanto caminhava pelo corredor, viu as folhas do jornal espalhadas pelo chão.

- Essa não... - ela disse com apreensão - Adrianne?

Julie correu com urgência, mas estancou quando entrou no quarto.

- Ah, Merlin - ela exclamou levando a mão à boca.

Snuffles estava perto da cama, e ao lado dele, com sangue no robe e o rosto pálido, Anne estava caída.

-x-x-x-

Anne estava caminhando na praia, em Whitehaven. Sirius estava no mar, chamando-a, e ela entrou. Uma onda a cobriu, e ela engoliu água, mas ao contrário de estar salgada, a água tinha um estranho sabor de repolho. Anne piscou, um pouco tonta, e procurou Sirius com o olhar, mas ele havia desaparecido.

- Sirius!? - ela gritou em tom urgente - Sirius!

Uma nova onda a cobriu, e quando seu rosto saiu da água, ela ouviu uma voz ao longe.

- Calma, Adrianne... Calma...

Anne fechou os olhos, tentando se proteger de uma nova onda, mas quando os abriu novamente, não estava mais no mar. Estava num quarto limpo, deitada numa cama. Pela decoração, ela sabia que estava no hospital St. Mungus, e por estar novamente no corpo de Arabella Figg, sabia porque estava lá.

- Eu... eu perdi o bebê...

Anne não perguntou. Era uma afirmação, e toda a dor que ela sentia transparecia em seu olhar perdido, mas era assim que ela se sentia. Perdida.

- Eu sinto muito, mas quando eu cheguei, não pude fazer muita coisa - Julie, que estava ao lado de Anne, disse.

- Lílian e Tiago? - ela perguntou com veemência - Eles não estão mesmo mortos, estão?

Julie encarou Anne fixamente antes de responder.

- Sim. Eles estão mortos. Sirius é o responsável por isso.

- Você não pode acreditar nisso! - ela disse com fúria - Ele é seu irmão, você conhece ele!

- Ele era o Fiel dos Potter. Se não foi ele, quem foi, então? - ela perguntou olhando corajosamente para Anne.

- Foi o verdadeiro Fiel dos Potter. Pettigrew era o Fiel, e foi ele quem traiu os Potter, não Sirius - ela respondeu desafiadoramente.

- De onde você tirou essa idéia? Pettigrew não era o Fiel dos Potter, o Fiel era Sirius! Dumbledore me disse que Tiago insistiu nisso!

- Eu não estou mentindo, Julie! Pedro era o Fiel! Sirius fez com que Tiago mudasse de idéia.

- E porque ele faria isso? Porque Sirius iria querer que Tiago mudasse de idéia?

Anne respirou fundo, e disse lentamente.

- Por minha causa... Por eu estar grávida... Por isso ele está em Azkaban...

Anne julgou ter ouvido um soluço reprimido de Julie, mas não se importou com isso. Estava pensando em Sirius, no bebê perdido, e descobriu que não havia mais nada pelo que lutar.

- Está tudo acabado... - ela disse sem emoção - Não tem mais nada que me faça querer ir em frente. Eu vou me entregar, e irei para o lugar onde deveria ter ido desde o começo.

- Ah, você não vai de jeito nenhum! - ela disse com uma determinação que fez Anne se deitar - Antes de ir para Azkaban... - subitamente, ela não conseguia encontrar forças para falar - Sirius... ele me fez prometer que eu não deixaria você se entregar. - ela omitiu que ele disse para Anne ser forte pela criança que iria nascer - E acredite-me, eu acabo com você antes que você chegue ao Ministério. - o olhar de Julie era feroz, mas Anne não desviou o olhar do dela.

- Você não quer salvar o seu irmão? Talvez eu consiga - ela disse ferozmente.

- Pelo amor de Merlin, Pedro Pettigrew está morto, por mais que essa sua história seja verdade, eles nunca vão acreditar em você! Se você for para o Ministério, só estará incriminando Sirius mais ainda! Ou você acha que eles acreditariam que Sirius te salvou por amor? É claro que não! No mínimo, você e ele dividiriam uma cela em Azkaban!

Anne se calou, ficando pensativa por alguns instantes, e quando falou foi com tanta veemência que até Julie se assustou.

- O bebê! Você disse para Sirius que eu perdi o bebê?

Julie abaixou o olhar.

- Não... Eu não consegui.

- O que deu em você? - ela exclamou com irritação - Esqueceu o que os dementadores fazem com os pensamentos felizes? Eles sugam todos, até não sobrar nada além de sofrimento! Ele vai enlouquecer naquela maldita prisão!

- Eu não sabia que havia acontecido! Eu tentei falar com Sirius, mas ele já havia sido enviado para Azkaban!

Anne virou o rosto, tentando esconder as lágrimas, mas não conseguia parar de pensar em toda a dor que Sirius estava passando por causa dela.

- Quando eu vou receber alta?

- Acho que em uma semana. Por que?

- Eu não quero ficar aqui. Eu não sei se conseguiria...

Julie sentiu pena ao ver Anne tão desconsolada, e então percebeu que ela amava Sirius de verdade.

- Você não vai poder ir embora assim que receber alta. Dumbledore que falar com você.

- Comigo? - Anne perguntou, surpresa. Será que Sirius, Tiago ou Lílian haviam contado a verdade sobre ela?

- Sim, ele quer falar com você, Arabella Figg.

Anne piscou, se lembrando que estava no corpo de Arabella Figg.

Julie ficou no quarto de Arabella Figg por mais alguns minutos, e depois foi ver outros pacientes. Assim que ficou sozinha, Anne pensou, curiosa, sobre o que Dumbledore queria conversar com Arabella Figg.

-x-x-x-

Hagrid cumprimentou Arabella Figg respeitosamente quando ela chegou, e depois de murmurar que avisaria ao professor Dumbledore que ela havia chegado, ele saiu. Ao se ver sozinha, Anne repassou mentalmente as instruções que Julie havia passado sobre como se comportar como Arabella Figg, e quando viu Dumbledore ir a sua direção, Anne não deixou de sentir-se aliviada por Julie ter sido muito amiga de Arabella quando ela ensinou em Hogwarts.

Dumbledore recebeu Arabella Figg com felicidade, mas sem aparentar muita alegria.

- Boa noite, Arabella.

- Olá, Alvo.

O diretor sentou-se na cadeira atrás da mesa, enquanto indicava uma cadeira para a velha senhora se sentar.

- Fico feliz por ver você tão bem - o diretor de Hogwarts disse sem esconder a satisfação.

Arabella sorriu.

- Espero que você entenda o motivo pelo qual eu preferi me esconder. Infelizmente, Tiago e Lílian não conseguiram se salvar.

- Sim, foi uma grande perda para todos... Tiago e Lílian eram ótimas pessoas, e eles farão falta... - ele fez uma pausa antes de continuar - Era sobre Tiago e Lílian que eu chamei você, Arabella. Antes de morrer, Tiago deixou um testamento onde declarava que Sirius Black era o padrinho e tutor de Harry, mas visto os últimos acontecimentos...

- Eu soube o que aconteceu, mas o que o testamento dos Potter tem a ver comigo? - ela perguntou se aproximando da mesa de Dumbledore.

- Era da vontade de Tiago e de Lílian que se algo acontecesse com Sirius, você protegesse Harry.

Arabella Figg encostou-se na cadeira lentamente, e olhou surpresa para o diretor.

- Eu... eu não entendo...

Dumbledore piscou, e por instantes, olhou intrigado para a velha bruxa à sua frente.

- Tiago escreveu que pelo tempo que você ficou em Godric's Hollow, ele percebeu que além de Sirius, você era a única pessoa a qual ele confiaria Harry.

Arabella olhou hesitante para o diretor, mas ela falou em tom seguro.

- Sim, eu fiquei alguns dias em Godric's Hollow antes de ir para a Austrália. Julie me ajudou.

- Eu imaginei. - Dumbledore respondeu tranqüilamente - Bem, eu achei que deveria cumprir a vontade de Tiago e Lílian.

Anne, no corpo de Arabella Figg, olhou corajosamente para o diretor de Hogwarts. Havia encontrado o seu rumo. Cuidaria de Harry, o protegeria, e tentaria compensar Lílian e Tiago pelo mal que ela havia feito a eles.

- Eu cuidarei de Harry como se ele fosse meu filho, Alvo. - ela disse decididamente.

- Eu não estou pedindo tanto esforço, Arabella - o diretor sorriu gentilmente - Além do mais, Harry está na casa dos tios. Eu só queria alguém que o vigiasse, o protegesse, mas de forma nenhuma Harry deve saber que é um bruxo, não até a hora certa. Voldemort desapareceu, dizem que ele perdeu os poderes, mas eu duvido que ele esteja definitivamente derrotado, Arabella.

- Concordo inteiramente com você, Alvo. - Anne disse com a voz de Arabella, enquanto se lembrava da noite em que viu Voldemort pela primeira vez. Ele era poderoso o bastante para evitar que a morte o derrotasse - O que você quer que eu faça?

- Há uma casa na mesma rua em que os tios de Harry moram à venda, e eu a comprei. A casa está protegida, assim como a casa dos Dursley, a família que cuida de Harry. Você teria que viver como trouxa, e conquistar a confiança dos tios de Harry, assim poderia protegê-lo de perto. Isso, é claro, se você concordar.

- Eu já disse não a um desafio, Alvo? - Arabella sorriu - Quando eu poderei me mudar?

- Assim que estiver pronta. Hagrid poderá levá-la.

- Não precisa se incomodar, Alvo. Só me dê o endereço.

- Claro, deixe-me escrever... - Dumbledore molhou uma pena no tinteiro, escreveu em um pergaminho o endereço dos Dursley, e passou o papel para Arabella.

- Surrey, Rua dos Alfeneiros, número quatro... Eu vou morar em que casa?

- Na casa de frente, a número sete.

- Eu posso chegar lá. - Arabella disse, despreocupadamente.

- Acho que o Ministério não poderá oferecer um carro, Arabella.

- Ora, Alvo, eu não preciso de um carro para aparatar! - ela sorriu.

Dumbledore piscou com surpresa, e deu uma pequena risada.

- Claro, Arabella...

- Até sexta estarei lá, Dumbledore. Quando poderemos nos ver outra vez?

- A lareira da casa está ligada às lareiras de Hogwarts, exceto por isso, não haverá nenhuma forma de comunicação com o mundo mágico. Quantos menos souberem que você está protegendo Harry, será melhor. Espero que não seja um inconveniente.

- Perfeitamente, Alvo. Eu cumprirei o meu dever. - ela se levantou - Até breve, Alvo. Mande lembranças para Minnie.

- Eu falarei com Minerva. Até breve, Arabella.

Arabella cumprimentou o diretor de Hogwarts com um meneio de cabeça, e saiu. Dumbledore olhou distraído para a porta pela qual Arabella Figg saiu. Ele era um dos poucos amigos íntimos de Arabella Figg, talvez não tanto quanto Minerva McGonagall, mas Arabella Figg o considerou de confiança o bastante para que o diretor soubesse que ela não sabia aparatar.

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Sentada na sala de uma casa simpática, com um livro na mão e Snuffles no seu colo, Anne se lembrava da conversa com Dumbledore. Fazia quase doze anos que havia estado na sala do diretor de Hogwarts, e desde então, vigiava e protegia Harry sem que seus tios suspeitassem de nada.

Na verdade, Anne não teve nenhuma dificuldade em conquistar os tios de Harry. Assim que os viu pela primeira vez, soube exatamente como deveria agir para que eles confiassem nela. Petúnia e Válter Dursley, por mais irônico que isso fosse, pensavam exatamente como a tia de Anne, Violet, pensaria. O que importava era quão poderosa a pessoa parecia ser, e a pureza do sangue. No caso dos Dursley, quanto mais longe da magia, melhor.

Tendo conquistado a confiança dos Dursley, Anne, assumindo a identidade de Arabella Figg, pôde observar Harry com mais facilidade, e conheceu melhor os Dursley, mas ela não sentia o menor orgulho disso. Os Dursley eram a pior espécie de trouxas que ela já havia visto, e Anne quase não conseguia acreditar que aquela mulher preconceituosa e orgulhosa fora irmã de Lílian Potter. Era também inacreditável a forma como eles tratavam Harry. Se não fosse por ela ter dito que Harry estava pisando em seus gatos e não poderia mais cuidar dele, os Dursley nunca teriam comprado um par de óculos para ele.

Durante todo aquele tempo, esteve sob a identidade de Arabella Figg com a ajuda de uma poção que poucos bruxos conheciam o preparo, a poção Melissuco, uma poção muito mais delicada e difícil de preparar que a poção Polissuco, mas em compensação, seu efeito ia além das uma hora que a outra poção durava.

Anne fechou o livro que havia comprado em Whitehaven no dia anterior, antes de voltar para Surrey, e o colocou em cima da mesinha, ao lado da cadeira. Ela visitava a casa freqüentemente porque lá era o único lugar em que não precisava se esconder. Em Surrey, eram poucos os momentos em que ela não estava no corpo de Arabella Figg, graças à poção Melissuco.

Sentada na cadeira, Anne olhou para o número quatro da Rua dos Alfeneiros, e balançou a cabeça enquanto murmurava.

- Esses Dursley conseguem ser tão ruins quanto Andrew... - ela olhou para Snuffles. - Imagine, na semana do aniversário do Harry aquela irmã insuportável do Dursley chega de visita! Incrível! Eu juro, Snuffles, se eu pudesse, eles iriam aprender uma liçãozinha...

Nesse instante, Snuffles olhou tenso para o lado de fora da casa. Anne olhou intrigada para Snuffles. Depois dele, outros gatos haviam se juntado à casa, mas o filhote que Lílian havia dado a ela antes de morrer sempre foi fiel à Anne, tanto que uma vez, a atacou quando estava indo fazer compras, no corpo de Arabella Figg. O gato pensou que a dona estava sendo machucada, e atacou tentando protegê-la, mas só fez com que Anne quebrasse as pernas.

- O que foi, Snuffles? - Anne perguntou, tentando segurar Snuffles, mas o gato saltou e foi à porta, a arranhando.

Anne levantou-se da cadeira, e com a varinha na mão, abriu a porta vagarosamente, Snuffles a seguindo o tempo todo.

Anne observou a rua com atenção, mas não havia nada errado. As luzes das casas estavam apagadas, exceto a da casa número quatro. Fora isso, tudo parecia estar calmo.

- Snuffles... - ela olhou com severidade para o gato - Da próxima vez que você ver um cachorro, tente não me assustar, está bem?

Ela abaixou-se, e pegando o gato, fechou a porta, mas quando voltou-se para a sala, não conseguiu segurar uma exclamação de espanto quando viu o homem parado em pé no meio da sala, o reconhecendo imediatamente, apesar do rosto magro e sujo, do olhar inquieto, tão diferente, sem o brilho que costumava ter, e dos cabelos grandes e espessos que caíam até a altura do cotovelo.

- Sirius!