Quando Vem A Chance, Se Pega
"MÃE, MAMÃE. OLHEM LÁ." Sasha correu pra proa do navio, se agarrando na grade e quase subindo nela. Mihoshi e Kiyone acordaram num sobressalto e ao verem sua filhinha ruiva pendurada, acharam que ela ia pular do navio, mas viram bem pra onde ela apontava: a Estátua da Liberdade. Era uma visão majestosa para quem via o grande monumento de início.
"Uau. Estão vendo? Isso dá no que pensar, não acha, Mihoshi?"
"Sim, claro. Tipo, se ela tá nua debaixo daquela toga."
Kiyone mal pôde se conter de vergonha do que sua noiva tinha dito. "Mihoshi, toma jeito. O que a Sasha vai pensar?"
"Eu? Nada, mãe. Já me acostumei com que a mamãe Mihoshi diz e não quero que ela mude de jeito nenhum, e nem você. Eu as amo como são."
"E nós a você, carinho, e saiba que também amo a Mihoshi. Por ela ser honesta e autêntica, além de ser muito engraçada. Não tenho um dia de tédio com ela."
"E eu te amo também, Kiyone, porque sempre foi compreensiva e paciente o bastante pra aguentar minhas trapalhadas. Qualquer outro já teria me largado na hora."
As três sorriram e juntaram-se num forte abraço, percebendo o inquebrável elo afetuoso que as envolvia, elo este que as ajudou a superar as diversidades e as encorajaram, podendo assim virem para uma nova terra em busca de uma nova chance de viver e terem a família feliz que queriam.
Depois de desembarcarem e passarem pela vistoria, classificadas como refugiadas e obtendo novos documentos, Mihoshi, Kiyone e Sasha foram andando a esmo pela grande metrópole que era Nova York. Cada prédio, cada esquina, não era como na Alemanha, ao menos, não como a cidade onde moravam antes da guerra estourar e reduzi-la a escombros, resultado da insanidade de um tirano. Todavia, era hora de abandonar o doloroso passado e buscar um novo e belo futuro. Pelo bem de sua menina, as duas mulheres iria se esforçar pela realização desse sonho.
"Caramba. Diziam que Nova York era imensa e maravilhosa, e vejo que estavam corretos. Vamos ter uma nova vida aqui, certo, Kiyone?" Mihoshi mal continha seu entusiasmo.
"Certo, certo, vai segurando os rojões, querida. Também me animo por estarmos num novo país pra chamarmos de lar, mas devemos ir com calma. Temos pouco dinheiro e a primeira coisa vai ser encontrarmos uma casa. Espero que dê para..." A filha de Kiyone he deu um puxão no vestido como que pedindo sua atenção. Ao se virar, a moça de cabeço verde escuro notou uma carteira de couro na mão dela.
"Mãe. Está vendo isto? Achei caída ali na sarjeta. Deve ter dinheiro " Sasha deu a carteira para suas mães. As moças examinaram-na e viram como tinha uma boa quantia de dinheiro nela. Mais do que elas carregavam nas bolsas.
"Nossa. Mal chegamos e já ganhamos uma boa oportunidade. Acho que alguém lá em cima gosta da gente."
"Escuta, Kiyone. Não acha que isso pode fazer falta pro verdadeiro dono? Sei que parece uma chance de ouro, mas se pensar bem..."
"Concordo com a mamãe. Se tem dono, é preciso devolver."
Embora aquela parecesse a chance dourada de suas vidas, Kiyone não podia questionar as intenções delas, ainda mais que ela lhes mostrou o conceito correto da honestidade e decência. Pra falar a verdade, ela se orgulhava da atitude de sua companheira e da filha adotiva.
"Vocês estão certas. Mesmo sendo tentador, o lugar disto é com o dono verdadeiro. Deixa ver se tem algo que dê pra identificar." E verificando os bolsos, Kiyone localizou uma carteira de identidade com o nome Silvana Barrymore escrito, mais um cartão de um restaurante.
"Hmmm. Diz aqui Silvana Barrymore e pela data, tem uns 40 anos. Não tem endereço, mas este cartão de restaurante já deve nos dar uma dica. Vamos procurar."
"Será que iremos ganhar uma recompensa?" Quis saber Sasha.
"Talvez, e não duvido que consigamos. Afinal, honestidade é sempre apreciada." Mihoshi afagou a menina com leveza. Kiyone pegou nas mãos delas e juntas, seguiram mais pra dentro da grande cidade americana, seu novo lar.
Não demoraram para acharem o restaurante chamado 'A Moda Da Casa', conforme escrito no cartão. Era um café-restaurante de esquina e apesar de simples, era limpo e bem cuidado. Não havia muitos clientes lá dentro além da balconista, uma senhora de meia-idade com cabelo castanho, embora apresentasse mechas brancas e um pouco rechonchuda, porém com ares de simpática. Ela logo veio atender as recém-chegadas.
"Bom dia. Posso lhes servir algo?"
"Sim, pode. Na verdade, nós estamos aqui pra servi-la. É Silvana Barrymore?" Perguntou Mihoshi.
"Sim, essa sou eu. O que desejam?"
"Senhora. Por acaso, deu por falta de algo em sua bolsa ou nos bolsos de sua roupa?"
"Se dei por falta? Não sei por que perguntam, mas..." Silvana revistou sua bolsa e os bolsos e na hora, ficou assustada. "MEU DEUS. MINHA CARTEIRA."
"Ela está aqui." Falou Sasha, entregando o objeto para a mulher. Confirmando seu conteúdo, o pânico se transformou em alívio." Ufa. Graças ao bom Deus. Era todo o dinheiro que ia usar para as contas do mês. Obrigada, meus anjos. Me salvaram de uma tragédia."
"Não precisa agradecer. Só porque estamos sem muito no momento, não significa que devamos ser desonestas com o próximo. Era isso que meu avô sempre me dizia." Mihoshi falou confiante.
"E concordo com ela. Qualquer boa ação feita terá sua retribuição uma hora ou outra." Kiyone prosseguiu ao pôr as mãos nos ombros de sua companheira e filha.
"Posso garantir que essa retribuição logo se dará e pra começar, lhes ofereço um almoço de graça. Podem pedir o que quiser por minha conta."
"Sério? Não vai ficar chato pro dono do lugar?"
"Jovenzinha," Silvana sorriu para a pequena ruiva. "eu sou a dona do lugar e se quero lhes oferecer uma boa comida, é de bom grado."
Kiyone, Mihoshi e Sasha desfrutaram daquela vasta refeição. Não era a toa que o 'A Moda Da Casa' era bem conhecido na cidade. Uma comida simples, mas apetitosa. Durante a refeição, as três contaram para a mulher castanha sobre os apertos sofridos durante a guerra, incluindo o que precisaram fazer quanto aos soldados nazistas e da chance de poderem começar uma vida mais segura e próspera nos EUA. Silvana não conseguiu conter sua emoção.
"Pobrezinhas. Lamento que tenham perdido suas famílias naquele terrível confronto e obrigadas a deixar suas casas, mas me alegro por terem tido força e coragem para enfrentarem o pior e buscarem por uma vida melhor, especialmente por se disporem a serem as mães dessa gracinha." Silvana puxou a bochecha de Sasha com leveza. A menina apreciou o gesto.
"E é mais por ela que devemos buscar por uma chance da viver." Kiyone falou decidida,
Silvana ponderou por alguns segundos e logo lhe veio algo em mente. "Garotas. Tenho uma ideia. Vocês entendem de gerenciar estabelecimentos ou de cozinhar?"
"Bom, eu cuidava do bar do amigo do meu pai onde me escondi antes de procurar Mihoshi. Aprendi bastante sobre gerenciamento e também cuidava do caixa."
"E eu sou boa na cozinha. Não exatamente uma chef, mas...até que eu dou pro gasto."
"Dar pro gasto? Mamãe, não precisa ser modesta. Sua culinária é a melhor que já provei, ainda mais os pratos feitos de peixes. Seu ensopado ma dava água na boca só pelo cheiro."
"Acho isso ótimo. Estou precisando de novos chef e gerente. Os que tinha aqui foram demitidos e não encontro substitutos a altura. Necessito de um gerente honesto e um cozinheiro decente. Se for o caso de vocês, posso contratá-las agora."
Mihoshi e Kiyone sentiram-se tomadas por uma luz caloroso pelas palavras escutadas. Tão comovida que ficou por tal gentileza, a loira de pele bronzeada abraçou Silvana, ficando assim por instantes. Logo a soltou, se sentindo embaraçada.
"Opa. Me desculpe. Acho que me excedi."
"Não tem nada, querida. Devo supor que aceitam os empregos. Estou certa?"
"Aceitamos sim, senhora. Não vai se arrepender. Daremos duro e faremos um serviço bom e decente." Kiyone respondeu orgulhosa.
"Sei que irão, e podem me chamar só de Silvana. Não gosto muito da conotação de 'senhora'. Gosto de me sentir jovem e dinâmica e ficar me chamando de senhora..."
"Certo, a gente compreende. Ao menos, minhas mães tem emprego e só vai faltar acharmos uma casa agora." Sasha falou olhando pra Silvana.
"Quanto a moradia, creio ter uma solução. Me sigam, sim?" Pediu Silvana, saindo para uma porta lateral com acesso a uma escada. As duas moças e sua filha adotiva a seguiram até chegarem ao andar superior do prédio. Lá, a dona do restaurante abriu uma porta e pediu para elas entrarem. Era um apartamento bem mobiliado com sofá, poltronas, iluminarias e assim por diante. Via-se a cozinha por outra porta ao leste, além de ter banheiro e dois quartos, tudo em ótimo estado.
"UAU. Vejam esta casa. Bem espaçosa, eu diria."
"Bem dito, Kiyone. Comparado a velha cabana, é quase um palácio. Mora aqui?"
"Meus avós moraram aqui por mais de 70 anos. Vovó morreu há um ano. Foi difícil pro vovô, pois ele amava muito ela. Fiz o que pude por ele, mas o coitado faleceu. Eu ia desocupar o espaço, mas quero ajudá-las e aqui, poderão ficar mais sossegadas. Podem ficar morando aqui e antes que perguntem, não vou cobrar aluguel nem nada disso. A casa é de vocês."
"Não vai nos cobrar pela moradia?"
"Claro que não, Kiyone. Não tem sentido exigir pagamento de minhas funcionárias. Se ajeitem e amanhã, quero que me mostrem seus talentos. Se corresponderem às expectativas como disseram, estarão empregadas. Até amanhã, queridas." Silvana se retirou do apartamento, deixando a família feminina se acomodar na nova casa.
"Puxa. Mal chegamos na América e tivemos uma chance fabulosa. Tai algo que não acontece todos os dias." Mihoshi falou bem otimista.
"E tudo porque fizemos um gesto de honestidade. Que sempre nos lembremos disso daqui por diante: vale a pena agir certo."
"Falou bem, mamãe." Sasha sorriu para sua mãe de cabelo verde escuro, lhe dando um abraço. Mihoshi se juntou à elas, certa das coisas boas que haveriam de vir nos dias vindouros.
A dupla demonstrou estar a altura das expectativas de Silvana, já que Kiyone revelou-se uma excelente gerente e caixa, organizando os pedidos e garantindo o devido tratamento para cada cliente, independente de parecerem abonados ou não, algo que deixou Silvana plenamente contente, sendo que seu último gerente preferia julgar ao bater o olho nas pessoas, resultando em perdas de clientes, motivo pelo qual a dona do restaurante o colocou pra fora.
Mihoshi não ficou nada atrás em seu desempenho como cozinheira, em especial com sua culinária a base de peixes e frutos do mar em geral. Seu ensopado de peixe era o mais saboroso que já haviam provado. Segundo ela, o tempero especial era 'o amor pelo que ama e por quem ama'.
Sasha por fim conseguiu frequentar a escola e se destacava nos estudos. Sua timidez inicial logo sumiu ao fazer amizade com as crianças, várias delas também como ela refugiadas. Algumas com famílias e outras sem, vivendo com amigos ou de assistência social e na última hipótese, em orfanatos. A ruiva sentia pena delas e por tal fato, era grata por ter suas amorosas mães ao seu lado. Até Silvana ela via como um tipo de avó.
A dona do 'A Moda Da Casa' sentia-se feliz na companhia daquela nova família. Kiyone e Mihoshi eram as filhas que tanto desejou e a filha delas, como sua própria neta. Nem ligou pela relação íntima das duas mulheres tinham e ainda deu seu apoio. Quando chegaram a idade legal para se casarem, foi um desafio poder encontrar alguém que realizasse o casamento. Por sorte, Silvana tinha um amigo sacerdote budista que não fechava os olhos para tal relação e concordou de bom grado com a união delas. Era o mais belo casamento que tinha assistido e reconheceu: nunca tinha visto duas noivas tão lindas e apaixonadas em toda sua vida.
"Eu te amo, Mihoshi." "Eu também te amo, Kiyone." O beijo era algo como um vulcão explodindo com toda sua força. Silvana chorava emocionada e Sasha se enchia de felicidade pela união de suas mães.
"Preciso dizer, minhas queridas. Poucas vezes vi duas pessoas tão cheias de amor para dar. Dá até a impressão de que são duas metades opostas que se complementam."
"Err, talvez sejamos. Onde Mihoshi é despreocupada, eu sou atenta. Onde sou trabalhadora, ela é...um pouquinho menos trabalhadora, mas não mudaria nada."
"Verdade. Admito que também faço das minhas, e qualquer um já teria me botado pra correr, mas Kiyone nunca. Ela é continuamente paciente comigo e perdoa tudo que faço. Deve ser por isso que nos damos tão bem."
"A família que toda criança devia ter. Eu amo vocês, mãe e mamãe. Eu feliz de estarem juntas." A menina de cabelo vermelho se achegou nas duas moças, abraçando-as.
"E vai ser mais feliz quando legalizarmos sua adoção. Seu advogado vai poder dar conta do recado, Silvana?"
"Eu confio nele e podem confiar também. Até o fim da semana, serão a família legal dessa coisinha linda e agora, pro restaurante para celebrar seu casamento." E com tais palavras, as noivas, sua filha e sua chefe trataram de aproveitar a comemoração.
Os dias viraram meses e estes, anos e o sucesso do 'A Moda Da Casa' ia de vento em popa graças ao trabalho de Mihoshi e Kiyone com seu gerenciamento e os pratos maravilhosos servidos. E Kiyone mostrou-se excelente na culinária assim como sua esposa, embora sua especialidade fosse vegetais e carnes brancas, inclusive de galinha, seja frita, assada ou de outro modo de preparar.
Cada pessoa em Nova York atravessava a cidade somente pelo prazer de degustar os quitutes da incrível dupla. Foi tanto o rendimento que Silvana até pôde comprar o prédio onde fica o restaurante e obter mais espaço para os fregueses. Virou um tempo de prosperidade como nenhum já visto.
Entretanto, algumas vezes a tragédia assolava as famílias mais felizes e com esta não foi diferente, ao passo que Silvana caiu doente devido a uma pneumonia sem precedentes. Apesar dos recursos, não houve melhoras e pelas palavras do médico, era só uma questão de tempo até a velha senhora dar seu suspiro final. Kiyone, Mihoshi e Sasha a visitaram no hospital.
"Silvana? Como está indo?" Perguntou a loira.
"Já passei dias melhores e com vocês aqui, este é um deles."
"Isso é algo que amo em você, Silvana. Não importa a situação, sempre está de bom humor."
"Ou passa a vida chorando ou rindo, era o lema da mamãe e tem seus fundamentos. He, he." Ela riu devagar devido ao seu estado. Sasha veio pra perto dela e lhe deu a mão. A outrora dona de cabelos castanhos sentiu-se bem por aquele toque tão terno.
"Minhas queridas. Sinto que estejam me vendo neste jeito tão decaído, mas saibam que me animo por vê-las. As amo como minhas filhas, as filhas que nunca pude ter e esta gracinha é a neta que tanto desejei."
"Obrigada. Eu amo você, vovó."
"Que lindo. Escutem...cof, cof...receio não me restar muito tempo e assim, preciso agilizar as coisas. Kiyone, pode abrir a minha bolsa ali no cadeira?" Olhando ao redor a jovem de cabeço verde escuro achou a bolsa e abrindo-a, retirou um envelope, passando-o para Silvana. Ao abri-lo, entregou seu conteúdo para o casal feminino. Lendo com atenção os papéis, ficaram de queixo caído e mudas pelo que tinham lido. Não demorou para recuperarem a voz e olharem com surpresa para a mulher no leito.
"Silvana? É verdade? Cada linha escrita? Está passando bem?"
"Mais do que jamais falei sério em toda minha vida, Mihoshi. Estou passando para vocês o prédio, o restaurante, o dinheiro, tudo para suas mãos e não recusem, pois merecem muito mais, além das outras propriedades na cidade e fora dela. Fiz um bom investimento nestes anos todos e devo tudo à vocês."
"Nós que lhe devemos, Silvana. Viu duas mulheres e uma garotinha sem rumo na vida e as acolheu como sua família, dando-nos uma chance de prosperar. Hoje temos tudo..."
"Por um ato generoso, Kiyone. Nunca esqueci de quando me devolveram a carteira, provando o quanto eram honestas e íntegras e pessoas com tais atributos merecem uma... recompensa. Cof, cof, cof." As tossidas ficaram mais fortes e intensas, causando algo similar a convulsões. Sasha correu pra chamar o médico que estivesse mais próximo. Ao fim do ataque, Silvana parou quieta e já quase não se movia. O médico chegou no quarto e a examinou com precisão, mas nada mais tinha o que fazer.
Faltando um pouco para morrer, Silvana ainda tomou as mãos das duas mulheres e da meninas, murmurando suas últimas palavras num sorriso, dizendo algo como que as amava e lhes desejava viverem felizes pro toda a vida e nunca se deixarem abater pela angústia e tristeza, e elas prometeram.
Sasha chorou pela perda de sua avó adotiva, consolada depois por suas mães. Após o enterro, pareciam não ter mais razão para sorrirem, mas bastou o olhar simpático e cheio de vida de Mihoshi para mudarem de humor. Kiyone retribuiu o gesto e a beijou, vendo o motivo por ter se apaixonado pela mulher de pele bronzeada. Sasha também ficou de feição positiva por estar ao lado daquelas duas moças e com a certeza total de de nunca a abandonariam, e nem faria o mesmo à elas.
30 anos depois
"Hmmm. Que cheiro saboroso. Devo crer que esta é uma ocasião especial, não é?" Perguntou Kiyone ao entrar na cozinha e ver Mihoshi diante da panela contendo ensopado fervente.
"Mas é claro, ou se esqueceu? Sasha está vindo nos visitar com a família toda. Estou dando o melhor de mim para preparar a melhor refeição de todas."
"Eu sei disso, meu anjo. Só estou brincando. Viu? Após tanto tempo, aprimorei e muito meu senso de humor." Kiyone sorriu ao colocar a mão no ombro da esposa e lhe beijar na bochecha. A loira ficou contente por esse gesto. "Nem dá pra acreditar? São 30 anos de um bem sucedido casamento. Sem brigas, violência, apenas umas discordâncias menores, mas é normal haver isso em qualquer família. Fora isso, tudo é só felicidade, seja nos negócios ou emocionais. Não pensa assim, paixão?"
Kiyone tinha de concordar com sua companheira. Ao herdarem as propriedades de sua velha amiga e patroa, Silvana, as duas decidiram firmar o passo na realização de uma vida mais próspera nos EUA. Como sua comida era extremamente apreciada na cidade, chamando a atenção dos que vinham de fora, puseram em prática o plano de expansão, reformando o prédio do restaurante 'A Moda Da Casa' para acomodar mais clientes e as demais propriedades de Silvana também foram convertidas em mais restaurantes e lanchonetes.
Com o sucesso e o aumento dos lucros, puderam contratar garçons, atendentes e aspirantes à cozinheiros para ajudar nas filiais. Com o curso prático fornecido por Kiyone, boa parte dos candidatos ao cargo de cozinheiro pegaram o jeito da culinária da dupla, recriando as receitas e até podendo dar uma melhoradas, mas estando avisados que as receitas eram de posse legalizada de Kiyone e Mihoshi e não tinham permissão de vendê-las para concorrentes. Somente os mais qualificados e de confiança eram aceitos no emprego e eram autorizados de poderem fazer os pratos em seus lares e só para as famílias degustarem.
Por respeito e memória a sua querida chefe, a loira bronzeada e a moça de cabelo esverdeado mantiveram o nome 'A Moda Da Casa' como o logotipo de sua cadeia de restaurantes e lanchonetes, virando uma das mais famosas não apenas no estado de Nova York, mas de boa parte do país. A fama delas era comparada à das estrelas de cinema, embora trabalhassem com comida.
Ainda que tenham vencido na vida, Mihoshi e sua esposa não permitiram que a fama lhes subisse a cabeça, vivendo de maneira mais modesta fora do ambiente de trabalho. Agiram dessa forma também com Sasha, lhe educando para cultivar atributos como humildade, modéstia e honestidade. Felizmente, a jovem filha ruiva exerceu bem essas qualidades, sendo uma pessoa de bom caráter e orgulhosa por ter suas mães, não se sentindo nada embaraçada ou envergonhada pelas duas formarem um casal.
Sasha soube se virar bem na vida. Apaixonou-se pela arte, tornando-se uma mestra em pintura e escultura, tendo diversas obras suas expostas em vários museus do país. Em uma de suas exposições, conheceu um aspirante a cineasta, Timmons, e começaram a sair. Ela o apresentou para suas mães e Timmons ficou honrado de conhecê-las, dizendo respeitar a escolha conjugal delas. Ambas se encantaram com o namorado de Sasha e viram ser alguém com quem sua filha tinha de tudo para ter uma vida familiar amorosa.
Após 6 meses de namoro e bem sucedido na carreira de filmes, Timmons pediu Sasha em casamento, recebendo um sim dela. Mihoshi e Kiyone choraram emocionadas pela união deles, ganhando mais um membro na família e que depois de 10 anos de casados, lhes deu também uma menina.
"Uau. Nem parece que se deu 3 décadas. Foi como se tivéssemos chegado ontem aqui e por uma mão do destino, nos foi dada uma imensa oportunidade na vida. Hoje, somos bem-sucedidas, ricas, famosas, temos uma linda família e a coisa mais importante: uma à outra."
"Estou contigo e não abro, Kiyone. Demos duro, sobrevivemos à aquela horrível guerra, descobrimos o amor, ganhamos uma filha e aqui estamos, recompensadas por todo nosso esforço."
"Será que isso ainda poderia ficar melhor?" Indagou Kiyone quando olhava para sua linda esposa. Neste momento, a campainha da frente tocou.
"Ei, escutou? Deve ser Sasha?"
"Não pode ser, Mihoshi. Ela ligou falando estar a meia hora de distância. Tá esperando correio ou algo?"
"Eu não. Não aguardo ninguém. Vou lá atender. Fica de olho que o assado do forno já deve estar no ponto." E saiu para ver a porta.
Ao atender, Mihoshi não soube de imediato quem era, já que o chapéu lhe cobria boa parte do rosto, mas sentia algo familiar no homem diante dela. "Sim? No que posso ajudar?"
"Estou perante Mihoshi Kuramitsu?"
"Sim, essa sou eu. O que deseja? Se for repórter ou fotógrafo, volte outro dia. Estou esperando minha família para o almoço."
"Sim, estou percebendo pelo aroma, e muito bom por sinal, mas serei breve." Ele puxou um cordão contendo um triângulo prateado, o exibindo para a loira. "Suponho que deve reconhecer isto, não?"
Mihoshi não conseguia tirar os olhos do objeto. Imediatamente, puxou de dentro de sua blusa um cordão contendo um triângulo exatamente igual e cujos encaixes eram perfeitos. A mulher bronzeada pareceu paralisada.
"Isto aqui...não dá pra acreditar. É meu amuleto favorito e quando fui mandada pro campo, o dividi e dei a metade para..." Ela fixou mais o olhar e na hora, exibiu um imenso sorriso. "Alec? É você. É VOCÊ."
"Sim, maninha. Sou eu, seu irmão mais velho, vivo e chutando." Ele tirou o chapéu e apresentou sua face, revelando quase que uma versão masculina da mulher à sua frente. Mihoshi, sem hesitar, o abraçou com emoção, chorando a toda.
"Alec, meu irmãozinho. Você está vivo. Voltou para mim."
"Claro, irmã. Prometi que te acharia e sempre cumpro minhas promessas."
"Mihoshi? O que está acontecendo? Por que você...Alec? Não dá pra crer. É você, em carne e osso?"
"Sim, o próprio, Kiyone. Também é um prazer te ver de novo, e estou certo de quem está comigo vai dizer o mesmo." Alec gesticulou e uma mulher sentada no carro na frente da casa saiu, indo na direção da entrada. A mulher parou diante de Kiyone e lhe deu a mão.
"Nossa. Depois de trinta anos, continua tão conservada. Se me perguntassem, achariam isso um milagre. Não está de acordo, Kiki?"
"Kiki? Há anos que não ouço esse meu apelido. Só quem me chamava assim era..." E antes de falar algo, reparou bem no rosto da moça, bem similar ao seu, mas bem mais jovem e uma pequena pinta abaixo do olho direito, marca esse que só pertencia a uma pessoa. A mesma que desde criança, a chamava por aquele apelido. "Najara? Irmãzinha?"
"Sim, irmãzona. Sua mana mais nova está de volta e como vê, indo bem de saúde e outras coisinhas."
Kiyone mal reparou na umidade formada em seus olhos, se concentrando em abraçar a mulher recém-chegada. Sua irmã que acreditava ter morrido no incêndio estava bem ali, viva e com os braços ao redor do corpo, segurando-a bem e firme para ter certeza não se tratar de um sonho. Mihoshi se emocionou também, juntando ela e seu irmão ao abraço coletivo.
"Isso é um milagre, um verdadeiro milagre. Achávamos tê-los perdido na guerra e após tantos anos, estão aqui, de pé perante a gente. Mal dá pra acreditar."
"Então, acreditem logo e se não for incômodo, nos forneça um lugar para sentar, pois viajamos para caramba pra reencontrá-las." Alec pediu em tom de brincadeira.
"Sentar-se? Vão é almoçar conosco e não iremos aceitar um 'não, obrigado. não queremos dar trabalho.' como resposta. Venham pra dentro." Mihoshi segurou firme os dois e num solavanco, os puxou para dentro de casa. Kiyone achou bem engraçado aquilo, mas não podia censurar sua mulher, uma vez que provavelmente, iria ter feito a mesma ação. Assim sendo, só deu de ombros e entrou, indo atrás dos convidados.
"...e depois de tanto trabalho árduo e esforço, chegamos aqui onde vocês estão vendo: donas de uma das maiores franquias de restaurantes e lanchonetes dos Estados Unidos, e continuamos crescendo." Kiyone respondeu com uma piscada.
"E mesmo tendo alcançado o topo, não nos deixamos levar pela vaidade da fama. Como prova disso, veem que vivemos nuna casa bem modesta? Nada ostentosa e fácil de limpar e arrumar."
"Modéstia sempre foi seu segundo nome, irmã, ou era distraída?" Falou Alec ao pegar mais um biscoito. "Ei, tô brincando, Mihoshi. Ficamos felizes de terem conseguido se dar bem nada vida."
"Nos desculpe por não tê-las encontrado antes. Foi uma luta pra chegarmos aqui, mas valeu a pena. Se a gente tivesse ciência de que eram as donas da cadeia 'A Moda Da Casa'..."
"Tranquila, Najara. Antes um atraso do que nunca chegar, era o lema do vovô. Triste que ele, a mamãe e o papai não puderam fugir. Mas agora nos conte: como escaparam dos nazistas?"
"Sim, sim, contem logo. Também estou seca de curiosidade."
"Paciência, maninha, que vamos contar tintim por tintim de tudo. Foi assim..." Alec começou a contar o acontecido.
Flashback
Najara: Quando os soldados invadiram a casa e mamãe tentou segurá-los e acabou morta, sabíamos que ia ser nossa vez. Papai pegou uma espingarda e vovô me levou pro porão. Abriu a portinhola do chão onde armazenamos lenha e carvão e mandou eu me esconder, e só sair caso tudo estivesse bem. Daí, ele voltou lá pra cima. Os nazistas entraram quebrando e atirando para todo lado que viam. Pude escutar os gritos do papai e do vovô lutando com eles, mas foi por pouco tempo, já que os tiros que ouvi me levaram a só um resultado: eles morreram. Quis chorar, mas precisava ficar quieta pra não me acharem.
Os soldados desceram o porão pra procurar por mais gente, porém nada encontraram. Depois, quis sair, mas tinha algo pesado em cima. Usei toda a força e notei ser a caixa de ferramentas. Vovô pôs em cima pra ninguém notar a portinhola. Ao sair, chorei quando vi o papai e o vovô mortos. Não deu pra ficar por mais tempo pois havia fogo na casa, tendo que fugir. Na rua, vi a mamãe morta e quis chorar de novo, mas sabia que aqueles monstros sem alma poderiam voltar e daí, peguei umas roupas, comida e fugi. Tive que andar pelos becos e casas derrubadas pra escapar de vista, não vi mais ninguém da vizinhança, pensando que tinham fugido. Tive esperança de que ao menos você, Kiyone, tivesse escapado e saí pra te procurar. Em lugar de você, achei Alec.
Alec: após terem nos feito prisioneiros, buscamos ficar os mais próximos naquele momento agonizante, sem saber o que nos aguardava. O caminhão onde nos jogaram ia por um caminho bem desastroso, nos lançando de um lado ao outro e os malditos somente riam e nos apontavam suas drogas de rifles. minha vontade era de arrancar as armas deles e crava-los de balas, mas não ia dar certo naquela hora, porém jurei que iriam levar o deles.
Ao pararmos no campo de Dachau, vi Mihoshi e vários outros serem tirados do caminhão. Papai e eu tentamos descer, mas não nos permitiram. Os canalhas viram que éramos família e decidiram nos separar. Era como se sentissem poderosos e onipotentes com tal sensação, como se não bastasse o quanto tinham. Não ligavam pra quem machucassem, desde que ficassem por cima. Após sairmos do campo, busquei decorar o nome do lugar e a direção para poder voltar aqui e te encontrar, Mihoshi, e essa chance se deu quando o pneu estourou e o motorista perdeu o controle, indo parar direto num barranco. O caminhão foi virando colina abaixo e pensei que seria nosso fim.
Ao terminar de girar, senti como se o mundo tivesse desabado numa chuva de pedras. Notei que os soldados tinham morrido no acidente e os prisioneiros, escapado, exceto por dois que tinham morrido, o papai e eu. Devem ter pensado que tínhamos morrido também e fugiram. Por sorte, encontrei um dos fuzis dos nazistas. Quis levantar o papai, mas por infelicidade, um pedaço da traseira havia se soltado e o atingido em cheio no peito. Não foi no coração, mas era bem grave e ele estava sangrando muito.
Tratei da ferida na medida do possível e o tirei de lá. Fomos pela mata na direção da cidade, esperando achar auxílio. Papai sentia dor demais e o sangramento era maior do que pude tratar. Ele me pediu pra deixá-lo, mas não podia fazê-lo. Papai insistiu, sabendo que não tinha mais tempo de vida e dava para ver que era verdade. Antes dele morrer, prometi te encontrar e levá-la para um lugar seguro. Tudo que pude fazer por ele foi enterrá-lo, longe de vista pra que os nazistas não profanassem seu túmulo. Dali, saí decidido a te achar, irmã.
Najara: Saí da cidade por meio das casas arruinadas, esperançosa de não ser vista pelas nazistas. Segui longe da estrada pois sabia que poderia ser vista. Andei por meio da densa vegetação, ganhando assim uma vantagem. Porém, não ser vista não era o mesmo que não ser escutada e tinha coisas na minha mochila causando barulho. Não podia dispensar nada pois não tinha ideia de quanto tempo se daria minha busca ou para onde ir. De repente, escutei algo se mexendo no mato. Me escondi atrás de uma pedra e por sorte, era só um gato. Suspirei de alívio, mas sem aviso, notei uma mão me tocando o ombro. Quase gritei, entretanto por sorte, era Alec.
Ao ver aquele rosto bronzeado, o qual era idêntico a Mihoshi, fiquei eufórica em rever um amigo e o abracei.
Alec: Preciso dizer que jamais tive tamanha emoção num reencontro. Najara chorou contente de ver que era eu. Perguntei sobre sua família e fiquei triste pelo fim que tiveram, bem parecida com a minha. Contudo, ainda tínhamos esperança de reencontrarmos Kiyone e Mihoshi, mesmo minha irmã estando confinada num campo de concentração e a dela, sumida sem deixar rastros. Prometi acharmos as duas, mas tínhamos de nos esconder em algum lugar. Andando pela vegetação e totalmente longe de vista, buscávamos nos manter distantes de qualquer sinal de confronto, até do som de uma única bala. Foram dias de caminhada árdua e houve vezes que precisamos nos esconder em troncos caídos e cavernas, só pra não nos acharem.
Depois de uma semana de busca, encontramos abrigo numa velha serraria e pelos sinais, já tinha sido visitada por nazistas, o que levava a crer que não iriam voltar. Era um bom lugar para nos esconder, especialmente por haver um rio abundante em peixes, bastante cobertores guardados no sótão e um acesso ao porão que dava para ocultar com algum feno, ou seja, era o esconderijo perfeito.
Najara: Demos o melhor de nós e fizemos daquele nosso lar. Os dias aumentaram para semanas e meses e por milagre, nunca tivemos nenhuma visita desagradável e uma vez que éramos um homem e uma mulher, podemos dizer que...bem, nossa amizade cresceu para algo mais.
Alec: Juro que nunca tinha me sentido tão atraído por uma mulher. Najara não só era linda, mas simpática, amável, carinhosa. Nos ajudamos em cada aperto que veio, levando nosso amor a ficar mais forte por cada dia que passava. No inverno, em lugar de frio, era o calor do amor que nos envolvia. Decidimos que quando achássemos vocês, iríamos deixar a Alemanha e rumar para a América. Ao menos lá, havia maior chance de uma vida livre e próspera.
Quando o inverno cessou, resolvemos seguir com nossa busca, principalmente porque os sons de aviões estava cada vez mais perto, nos levando a crer que cedo ou tarde, iriam achar a serraria.
Seguimos pelo rio, onde era maior a chance de fugirmos e nos manter fora de vista, mais a proteção das árvores. Ao terminar a floresta, fomos obrigados a nos arriscar pela estrada. E foi quando nos acharam, mas por sorte, eram americanos.
Najara: Eles viram que éramos civis e nos ajudaram. Ao nos informar que iam na direção do campo de Dachau, pedimos para nos levarem, uma vez que havia chance de não só Mihoshi, mas também de Kiyone poder estar lá.
Alec: Ao chegarmos ao campo, descobrimos estar vazio por completo, exceto por uma tropa de americanos e alguns corpos de nazistas. Haviam recebido o informe da localização do lugar e o atacaram. Boa parte dos prisioneiros já tinha escapado e a maioria dos soldados, deserdado, exceto por uns poucos que ficaram e morreram. Fiquei arrasado ao pensar que nunca mais iria rever minha irmã, mas uma patrulha tinha chegado nesse meio tempo e um dos soldados americanos disse ter visto duas garotas, uma parecida comigo e a outra um pouco mais velha que Najara rumando na direção dos portos. Meu coração se encheu de esperança novamente.
Najara: suplicamos aos americanos que nos levassem pra lá. Com muita insistência, o que disse ter visto Mihoshi e Kiyone nos deu uma carona pro porto. Ao chegarmos, soubemos que tinham visto vocês num navio que zarpou há uma semana para os EUA. Com pressa de vê-las, embarcamos no primeiro barco rumo à América. Após semanas de viagem, chegamos a costa do estado da Califórnia.
Alec: Ao chegarmos, tivemos de passar por vários procedimentos para obter cidadania americana e ao completar todo o processo, nossa prioridade atual era de arranjar trabalho. Afinal, não ia dar para procurarmos vocês sem antes termos algum dinheiro.
Nos estabelecemos em Hollywood e por sorte, o que não faltava lá era trabalho. É claro, não é porque o lugar é a terra das estrelas de cinema que significa termos conseguimos empregos glamorosos. Fomos fazendo um pouco de tudo, de servir mesas até alguns papéis como dublês. Teve vários bem arriscados, mas valeram cada centavo e também a emoção de estarmos num filme.
Najara: Tão logo economizamos o bastante para uma casa própria, mesmo sendo pequena, finalmente realizamos nosso sonho de nos casarmos. Queríamos que estivessem lá para ver, mas de coração, notávamos sua presença. Começamos nossa própria família quando depois de 20 anos de casados, nasceram nossas gêmeas e as batizamos em honra de vocês: Miyone e Kihoshi.
Alec: Por 30 anos, buscamos cada informação sobre o paradeiro de vocês duas, mas no geral, eram bem escassas. Quando pensamos em desistir, vimos um dos seus comerciais da sua franquia de restaurantes. Ao vê-las na TV, não havia dúvida de que eram vocês. Todavia, por cautela e de certa forma, temendo achar ser um alarme falso, nos informamos sobre a agência que fez o comercial e dissemos que queríamos falar com você sobre negócios. Devido a essa desculpa, achamos seu endereço e pusemos o pé na estrada e aqui estamos, dando graças a Deus por nossa busca ter sido frutífera.
Fim do flashback
"Não imaginam como estamos emocionados por reencontrá-las. Assim como você, Mihoshi, que marcou como sendo o otimismo em pessoa, procurei ter pensamento positivo e nunca achar que não iríamos nos encontrar de novo, maninha." Alec avançou para sua irmã e a acolheu em seu braços. A loira chorou por tal gesto. Kiyone imitou a esposa e foi de encontro com sua irmã.
Nisso que a porta da frente abriu e duas meninas entraram e viram curiosas aquela situação. Mihoshi e Kiyone as viram e notaram como eram parecidas com elas na infância. A mulher de cabelo verde, ao olhar pra irmã e o cunhado, já tinham deduzido de quem se tratava. Najara as trouxe pra perto.
"Mana, quero que conheçam suas sobrinhas, Miyone e Kihoshi. Não são umas graionhas?
"Mas que bonitinhas. Olá, sou sua tia Kiyone."
"E eu, a tia Mihoshi. Vem aqui para..." Contudo, Mihoshi não viu o tapete e caiu de cara no chão. Miyone foi pra ajudá-la e caiu também da mesma forma.
"AIII. Isso doeu." Falaram as duas na mesma hora. Kiyone e Kihoshi só viraram a cabeça em desaprovação e as ajudaram a se erguer. Alec e sau esposa simplesmente sorriram.
"Vejo que puxaram bastante as tias."
"Eu sempre pensei dessa forma, querido."
"Mihoshi pode ser um tanto desastrada, mas nunca ia querer que fosse diferente. Eu a amo por ser autêntica."
"Sei bem como é isso, tia Kiyone. Kihoshi me dá uma baita trabalho, mas é minha irmã e gosto dela, independente de ser ou não uma distraída."
"Seja como for, ter a família toda aqui é uma benção. Nos lembra da importância da fé e da esperança. Notaram a grande árvore plantada lá no jardim?" Concordando com a pergunta, todos seguiram Mihoshi para o jardim da frente da casa, mostrando a grande cerejeira com sua folhagem rosa.
"Plantamos esta árvore no dia em que viemos morar aqui. Ganhei a semente dela do vovô antes de fugirmos da Alemanha. Ele a ganhou de um amigo do oriente e me contou sobre o significado de seu nome, Sakura, quer significa esperança e como era importante a preservarmos como uma planta. Quanto mais lhe dermos atenção e cuidados, mais forte e vigorosa ela será. A plantamos com o pensamento de um dia voltarmos a ter nossa família reunida novamente e deu frutos."
"Com toda razão me apaixonei por você, querida. Por mais escuro que esteja o túnel onde nos perdemos, haverá sempre uma luz para nos guiar pra saída." Kiyone se achegou pra perto da esposa e a beijou. Alec, Najara e suas gêmeas viram ternamente a grande emoção e paixão envolta nas duas mulheres.
"Não importa quantas vezes eu as veja se beijando, são o casal mais fofo que pode haver." Ouviu-se uma voz por trás da árvore e ao se virarem, o grupo notou ser uma mulher de cabelo ruivo curto ao lado de um homem moreno com uma bebê no colo. O casal feminino se entusiasmou ao verem se trata de sua filha adotiva com sua família.
"Sasha. Seja bem vinda, querida. Você também, Timmons, e vejam só nossa netinha. Chuti-chuti, Silvaninha." Kiyone acariciou a bochecha da nenê. Ela riu como todo bebê ri ao achar graça. Mihoshi lhe pegou no nariz. "Se adiantaram, não? Achei que iam só chegar em uma hora."
"Timmons pegou um atalho e não, nada que possa nos render uma multa. Portanto, mãe, não precisa perder se estressar. Já tem a mamãe pra cuidar desse departamento."
"Ha, ha, ha, ha. Seu senso de humor não muda, filha." Mihoshi encarou a filha. "Nem dá pra acreditar. Até ontem, era uma garotinha e hoje, está uma mulher crescida, linda, com uma excelente marido e uma filhinha."
"E tudo isso foi possível graças as mães mais carinhosas e divertidas que eu poderia desejar. E estou vendo que temos muita companhia. Eles são quem penso que são?"
"Acertou em cheio, florzinha. Vamos todos lá pra dentro que temos comida para um batalhão."
"Mas acho que tudo isso não vai ser o bastante pra satisfazer minha cabecinha de bolha e se sua mini versão tiver apetite igual..." A moça de cabeço esverdeado viu como lhe olhavam e pareceu se encabular. "Opa. Gente, foi brincadeirinha. Temos comida de sobra aqui. Mihoshi, Miyone, não se ofendam com isso, tá?"
"Claro que não. Quando me chama de cabeça de bolha, vindo de você, amor, é um elogio."
"Kihoshi diz o mesmo de mim e sei que ela só está brincando. Não é verdade?" A garotinha sorriu em aprovação à pergunta de sua irmã.
Todos sorriram e sem delongas, deram mais uma olhada naquela bela árvore de 30 anos e seguiram para dentro de casa, comemorar um grande reencontro que jamais perdeu a força e a luz do que realmente significa...esperança.
FIM.
Podem ter pensado que parei, mas continuei no trabalho. Só demorou pros capítulos ficarem prontos. Os 3 últimos me levaram quase um mês cada pra ficarem prontos.
Sempre pensei em escrever um conto da época da Segunda Guerra e como iria afetar as vidas de Mihoshi e Kiyone ao viverem naquela terrível época.
Em termos culturais e históricos, o campo Dachau existiu mesmo e foi um dos lugares mais sofríveis e cruéis já construídos.
Quis citar algo que desse sentido ao título do conto e como tal, pesquisei sobre alguma planta ou árvore que significasse esperança, me levando até a cerejeira, representada como uma árvore de tal entendimento no nome.
Tentarei não mais demorar em escrever novas histórias, uma vez que há muitas que tenho em mente pra passar no papel ou melhor dizendo, no documento de texto.
