CAPÍTULO 3 – LEMBRANÇAS INEXISTENTES

Tomoyo largou a partitura, aflita com tudo aquilo. Correu imediatamente até o telefone do quarto e discou o número de Eriol.

- Tomoyo. Você sentiu essa presença, não? – Eriol já perguntava as coisas simplesmente ao pegar no fone.

- Sim, eu senti...Eriol, o que é aquilo? É muito forte! Quase desmaiei ao piano!

- Tomoyo, me encontre na frente de sua casa agora!

- Tá!

Os dois desligaram. Tomoyo desceu as escadas voando, dando graças a Deus que sua roupa era um vestido até os joelhos com uma blusa por baixo, facilitando a corrida.

Em alguns instantes, Eriol, Nakuru e Suppi se encontravam na frente da mansão de Tomoyo. Ela os alcançou rapidamente.

- Eriol, sabe o que está acontecendo? É muito forte!

- Sim, eu sei. Alguém com uma presença mágica forte está aqui em Tomoeda, e nem faz questão de esconder que está aqui.

- Temos que saber quem está causando isso, mestre Eriol. – lembrou-os Suppi.

- Certo. Tomoyo, concentre-se nessa presença que sente. Ela vai estar mais forte em direção a algum dos pontos cardeais. Você tem que descobrir onde ela está.

Tomoyo fechou os olhos, se concentrando naquela energia que sentia. Ela tentava se lembrar de como Sakura fazia, há sete anos. Pensando somente na energia desconhecida, Tomoyo sentiu que ela ficava mais forte na direção do...

- Templo Tsukimine!! Eriol, esta presença está vindo de lá!

Ele sorriu em aprovação. Em seguida, com um encantamento, seu báculo apareceu, e ele transformou Nakuru e Suppi em Ruby Moon e Spinnel Sun.

- Spinnel Sun, vá até a casa de Touya e traga Yue e Kerberus, rápido! Nos encontre no meio do caminho para o templo!

A pantera negra alada saiu voando pela noite, enquanto Eriol ordenou que Ruby Moon carregasse Tomoyo até o templo. Eriol fez um feitiço semelhante ao da carta Alada em Sakura, e partiram voando atrás de quem quer que seja que estava emitindo aquela energia.

Praticamente no meio do caminho, foram interceptados por Yue, Kerberus e Spinnel, que se juntaram aos outros três na caminhada até o templo.

- Quanto mais chegamos perto, mais aquela presença aumenta, Eriol! – Tomoyo estava voando tão rápido com Ruby Moon que quase precisava gritar para falar.

- Sim, é verdade! Espero que descubramos algo lá.

Os seis desceram em frente ao arco do Templo Tsukimine, onde Eriol fizera Sakura transformar as últimas Cartas Clow em Sakura. Tomoyo só sabia desse incidente porque Sakura havia contado isso; Eriol havia lançado um feitiço antes que colocara todas as pessoas que não possuíam poderes mágicos naquela época para dormir. Tomoyo tinha ficado triste por não filmar a amiga.

- É, definitivamente é aqui. – Todos chegaram ao chão, e Ruby Moon soltou Tomoyo, que agradeceu pela carona.

Eriol perguntou a todos:

- Esta presença é familiar a algum de vocês?

Todos os guardiões sacudiram a cabeça negativamente. Então os olhos de Tomoyo brilharam, e ela gritou:

- CUIDADO!!!

Todos andaram para trás rapidamente, quando uma espécie de bastão caiu no chão, no meio de todos.

Eles se aproximaram devagar, com cuidado. Ele era prateado, liso, semelhante a um bastão qualquer. Porém, era muito resistente, e parecia reluzir mesmo à sombra. Na ponta do bastão, uma gema em forma de lua estava fixada. A pedra lembrava muito um cristal de diamante.

- Isto é um artefato mágico, com certeza. – disse Yue

- Sim, e também usa a magia da lua como regência. – agregou Ruby Moon

Eriol olhou fixamente para o objeto, como se pudesse ver através dele. Todos estavam apreensivos. De repente, Kerberus e Spinnel falaram juntos:

- A presença sumiu!

Todos confirmaram o que os guardiões tinham falado. Era estranho, realmente a presença tinha desaparecido...

- Spinnel e Kerberus. Quero que vasculhem aquele lado. – Eriol apontou o lado esquerdo do bosque do templo E vocês, Yue e Ruby Moon, aquele. – e apontou o lado direito. Em instantes, os guardiões se embrenharam na vegetação.

- Eriol... Eu me pergunto para que serve este bastão...

- Eu também, Tomoyo. Por que parece relacionado com a lua, por que está aqui neste lugar, por que tinha uma presença tão forte... – Eriol lançou uma magia no objeto, fazendo com que ele flutuasse e girasse lentamente no ar, para que ele examinasse melhor – Para trás!!

Tomoyo pulou para trás com o susto, e Eriol invocou uma magia de fogo, lançando-a no misterioso objeto. O fogo pareceu que fora repelido pelo bastão, e se dissipou.

- O que houve?

- Não sei ao certo, mas parece que este objeto é realmente poderoso e foi projetado para suportar danos mágicos.

Tomoyo olhou para o bastão, que agora estava nas mãos de Eriol. Como que do nada, a garota começou a ouvir seu nome sendo chamado, por uma voz bastante familiar, embora Tomoyo não conseguisse decifrar a quem pertencia, por mais que se esforçasse.

- Tomoyo... Tomoyo... Tomoyo...

- Está ouvindo isso, Eriol?

- O quê? – Ele se voltou para a garota

- Alguém está me chamando... É um chamado contínuo e fraco, de alguém que já conheci...

- Não escuto nada.

Tomoyo franziu a testa. Só ela estava ouvindo? Não podiam ser os guardiões, porque senão Eriol os ouviria também... Deveria ser um chamado para ela, e que só ela poderia escutar, teoricamente. Então, teve uma idéia:

- Eriol, pode me emprestar este bastão por alguns segundos? – disse a garota, com um sorriso no rosto.

- Tudo bem, pegue. Mas tome cuidado.

- Sim, pode deixar.

No momento em que o bastão tocou as mãos de Tomoyo, uma luz imensa foi emitida em conjunto do corpo de Tomoyo e do bastão. Em seguida, o corpo de dela caiu, desfalecido no chão. Porém, os olhos da garota estavam abertos, mas sem as pupilas. Parecia que um transe tinha se efetuado. Por sua vez, parecia que o bastão estava preso à mão de Tomoyo, tanto que Eriol não queria removê-lo.

Eriol assustou-se, e chamou todos os quatro guardiões de volta. Eles voltaram correndo, e Eriol explicou o ocorrido. Então os cinco sentaram-se no chão do templo sob uma árvore, esperando que Tomoyo recobrasse a consciência e conseguisse vencer o transe.

Tomoyo abriu os olhos. Onde ela estava? Que esquisito, parecia uma cidade grande... Parecia ter algum tipo de névoa densa recobrindo aquele lugar. Tomoyo começou a andar pela cidade. Ela viu que era um lugar cheio de movimento e gente, cheio de lojas, casas, prédios, carros... Mas tudo em um idioma diferente. Tomoyo reparou que tudo era em inglês. Onde será que ela estava?

Ela reparou que estava ficando frio, e esperava que encontrasse logo alguém que pudesse ajudá-la. Estranhamente, ninguém parecia vê-la; Tomoyo tinha a impressão de que passava invisível por todos aqueles lugares.

Então, Tomoyo parou na frente de uma loja, com uma vitrine espelhada. E quase tomou um susto. Atrás dela estava uma pessoa... Professora Mizuki!!!

- Professora, eu não tinha visto a senhora!

Mizuki sorriu para Tomoyo. Em seguida falou:

- Tudo bem. Tomoyo, será que me acompanha em uma volta pela cidade? Precisamos conversar...

- Claro!

Tomoyo emparelhou com Mizuki, e ela começou a fazer um caminho pela cidade. Então, ela começou a falar:

- Faz idéia de onde esteja, Tomoyo?

- Não, professora.

- Você está na capital da Inglaterra, Londres.

- O quê? Como eu vim parar aqui? Há instantes eu estava em Tomoeda, no Templo Tsukimine...

- Eu sei. Tomoyo, acho que você já sabe o que aconteceu com o meu corpo, não sabe?

Então Tomoyo lembrou-se do que Eriol havia falado. A professora tinha falecido.

- Eriol me contou que a senhora tinha morrido...

Ela sorriu. Em seguida continuou falando com a garota:

- Sim, teoricamente, eu morri. Mas apenas o meu corpo realmente morreu. Eu consegui preservar a minha magia e consciência. A minha magia, embora eu não possa senti-la mais, sei que está em você. E a minha consciência, está guardada no coração de todos que me conheceram, e, especialmente neste báculo.

- Então quer dizer que...

- Sim. A sua consciência, assim como a minha, estão dentro daquele bastão, na verdade um báculo mágico, com quase as mesmas propriedades do de Sakura.

- Então o que estou vendo, a cidade, o movimento...

- São lembranças minhas.

- Entendi. E por que sua consciência está aqui?

- Sabe Tomoyo, quando eu comecei a desenvolver meus poderes mágicos, eu recebi o dom da profecia. Como trabalhava em um templo, tinha muito contato com este tipo de coisa, e sempre consegui saber o que me esperava. E um dia, há alguns meses, na Inglaterra com Eriol, tive um sonho muito forte. Nele, me diziam para passar a minha magia a um sucessor, porque eu tinha pouco tempo para a missão que tinham resolvido me designar...

- Missão?

- Sim. Neste sonho, eu vi o nosso mundo coberto de desgraças, vi a Inglaterra, o Japão, e mais o resto dos países com problemas graves, afetando toda a população mundial. Só que eu não podia fazer nada, porque não se pode interferir na linha do tempo.

Kaho suspirou e prosseguiu:

- Então, me falaram no mesmo sonho que eu deveria escolher alguém para me suceder na minha missão. As características que o meu sucessor precisava não estavam claras, poderia ser qualquer pessoa na Terra, mas achei melhor escolher alguém que realmente tivesse conhecido. A única restrição era: esta pessoa não poderia ter poderes mágicos.

Tomoyo olhou espantada para a sua antiga professora. As duas se sentaram em um banco, num parque bastante arborizado.

- Então achei que você tinha todas as características que alguém para uma missão como aquela precisaria. E passei a desenvolver um artefato que você pudesse usar como intermédio para a sua magia. Você não poderia usar o meu, já que os artefatos são feitos única e especialmente para o portador delas, não serve para qualquer outra pessoa. Então desenvolvi um báculo, simplesmente porque achei que se adaptaria melhor, já que viu Sakura usar o dela tantas vezes, além de um método de passar minha magia para você.

A garota confirmou com a cabeça, atenta às explicações da professora.

- O báculo tem afinidade total com você. Ninguém conseguirá usá-lo além de você. Mas tem que prestar atenção em uma coisa: você não conseguirá realizar magia sem ele. O que acontece é que a magia que está dentro de você está como que "trancada" no seu interior, e vai acabar precisando de um tipo de condutor para levar sua magia ao mundo. A sua magia passa através do metal normalmente, mas o que faz a diferença é o cristal na ponta. Ele consegue transformar a sua energia mágica em um feitiço que possa ser usado, senão, sua energia seria liberada e não surtiria efeito algum.

- Que nem a estrela no báculo de Sakura e o Sol no de Eriol?

- Isso mesmo.

- Mas por que os guardiões não precisam usar báculos? Eles também não precisariam converter a energia deles em um feitiço?

- Não, é diferente com os guardiões. Os guardiões são seres mágicos, ou seja, eles já são a magia em si. Lembre-se: os guardiões foram criados através de báculos, são energia convertida em magia. Porém, quando você lança uma criatura mágica, ao invés de um feitiço, esta criatura não precisa transformar energia em magia simplesmente porque ela é magia pura, e seus poderes estão prontos para serem usados.

- Entendi agora. Mas o único meio de se usar magia por humanos é esse?

- Dentre os que possuem magia, é o mais eficiente e poderoso. Mas nem todos utilizam a magia que têm dentro deles mesmos, como no caso de Shaoran. - Ele usa a magia que está dentro daqueles...Daqueles papelzinhos?

- Sim. A espada só libera a magia já pronta em algum feitiço. Repare que ele convoca seres para realizarem o que ele precisa.

Tomoyo relembrou que geralmente Shaoran dizia o nome da entidade e depois "venha a mim!".

- Quanto ao modo que usei para passar a minha magia a você – a professora continuou com a explicação – foi descoberto depois de algum tempo de pesquisas. Descobri que é possível reunir toda a magia de um ser numa pequena esfera, que brilha de acordo com o elemento regente. Prateado para a Lua, dourado para o Sol. Depois, tem-se alguns segundos para colocar a esfera em uma caixa encantada, que deve servir para impedir que a magia se dissipe antes de chegar ao futuro dono, assim por dizer. Uma vez aberta a caixa, a esfera vai entrar na alma da primeira pessoa que estiver a sua frente.

- Mas como foi possível a descoberta desse método? Até Eriol, que tem a alma de Clow Reed nele, não sabia...

- Eriol tinha a alma de Clow e algumas lembranças dele também, além da magia que estava junto com a alma do antigo mago. Mas Eriol não sabia de tudo com exatidão, não se lembrava com certeza de tudo o que Clow sabia ou tinha pesquisado. Este método fora usado no Egito antigo, há milênios.

- Então os faraós realmente tinham poderes divinos, como as lendas falam?

Mizuki sorriu para a garota que estava ao seu lado:

- Tomoyo, não devemos estragar crenças antigas nem perturbar aqueles que acreditam, mas eu só posso dizer que um dos faraós conseguiu realmente acumular sua magia no seu cetro, e passá-la a todos os seus sucessores.

- Entendo... Professora, eu tenho uma última pergunta.

- Diga.

- Sabe que missão me será designada? Detalhes dela, algo assim?

Kaho Mizuki deu um profundo suspiro.

- Infelizmente Tomoyo, eu não sei nada ao certo. Apenas que desgraças serão causadas. Tudo isso se assemelha um pouco àquela maldição das Cartas Clow... Mas acho que alguém realmente mau está por detrás de tudo isso...

Tomoyo estremeceu. A professora não possuía mais poderes mágicos, mas com certeza não estava brincando.

- Mas por que esta missão foi designada à senhora, professora?

Mizuki olhou com muita ternura para Tomoyo. Aquela garota não tinha idéia dos problemas que teria de enfrentar, a substituindo.

- Tomoyo, geralmente os seres que possuem magia têm a tarefa de guardar o mundo onde vivem, ajudando aqueles que não têm força suficiente para se defenderem. Podemos dizer que esta é a missão de Eriol, Sakura, do clã Li, e agora sua.

Ela continuou:

- Porém, às vezes toda a magia e poder acima dos demais pode acabar enlouquecendo alguém. Qualquer coisa em demasia é perigoso. E eu desconfio que alguém com poderes fortes teve sua mente transtornada. Todos os seus preceitos do que seria bom ou mau estão embaralhados, e ele não deve saber distinguir a diferença. Então deve fazer o que acha que está certo para a humanidade. Porquê foi designada a mim eu não sei.

Subitamente, a professora olhou no relógio. Se levantou, começando a caminhar de volta, e pediu para que Tomoyo a seguisse. Quando chegaram na loja com a vitrine envidraçada, a professora se despediu:

- Bom, adeus Tomoyo. Agora acho que já expliquei bastante e contei tudo o que você precisava saber para enfrentar sua nova missão. Mas seria crueldade se eu a largasse sem nada para se apoiar, mesmo com Yue e Ruby Moon ao seu lado. Por isso minha consciência e lembranças estão aqui, respondendo àquela pergunta. Quando estiver em sérios apuros, minhas lembranças serão suas lembranças. Inexistentes para seu corpo e mente, porque não são suas, mas a ajudarão. Adeus, e boa sorte! – Kaho inclinou-se e abraçou a garota – Talvez nos vejamos daqui a um tempo... E, por favor, diga a todos que estou bem e que não precisam se preocupar comigo...

Com essas palavras, a imagem das ruas, o movimento, da névoa e da professora começou a fazer um redemoinho na frente de Tomoyo, se misturando e se apagando aos poucos. Ela sentiu que iria perder a consciência e caiu.

- Diga a todos que estou bem e não... Eles não precisam... Não precisam se preocupar comigo...

- Spinnel, Kerberus!! Tomoyo está acordando!! – Ruby Moon acordava os dois guardiões que que estavam dormindo feito pedra atrás da árvore onde estavam. Yue e Eriol tinham uma expressão apreensiva no rosto, sendo que a de Yue só podia ser reconhecida por quem estivesse acostumado ao menor sinal do gélido guardião da Lua.

Tomoyo tinha sua cabeça no colo de Eriol, e seus olhos, antes sem pupilas, agora estavam fechados, e a garota parecia agoniada, falando sempre que "não precisam se preocupar comigo". Yue estava de pé ao lado do jovem mago quando os outros três guardiões voltaram.

- Ela está bem? – perguntou Kerberus

- Está começando a demonstrar sinais de reação. Antes não estava falando e parecia dura, fria. Agora parece normal, apenas parece que está tentando despertar de um pesadelo... – Observou Ruby Moon

Eriol tinha sua mão esquerda sobre o cabelo de Tomoyo, afagando suavemente. Ele não tinha muita noção que sua preocupação com a garota que estava deitada ali vinha aumentando. E não percebia que cada minuto que passava longe da garota lhe dava uma espécie de angústia terrível. Mas ele ainda não havia notado... Yue, por sua vez, permanecia impassível diante de tudo e todos.

- Estou bem, estou bem e... – Tomoyo se sentou num salto, com os olhos de volta ao normal, assustada e gritou:

- PROFESSORA MIZUUUKIIIII!!!!!!!

Ela colocou a mão na testa ofegante. Eriol a amparou por trás, e percebeu que sua mão esquerda ainda retinha o bastão.

- Tomoyo? – Todos os cinco perguntaram ao mesmo tempo.

- Anh? – ela olhou a sua volta – Pessoal! Me desculpem, eu devo ter assustado a todos vocês...

Os presentes manifestaram alguns murmúrios de "imagina, não foi nada!". Eriol se voltou para Tomoyo e perguntou:

- Está bem agora?

Tomoyo confirmou com um movimento de cabeça, e sua respiração tinha voltado ao ritmo normal:

- Estou, estou bem melhor agora... Vamos. Acho que não tem nada que possamos fazer aqui.

Ruby Moon ia fazer menção de perguntar algo, mas Eriol a conteve com um gesto. Todos se levantaram e começaram a caminhar de volta para as casas de Eriol e Tomoyo, sendo que esta última parou, olhou para o templo, e, com o báculo nas mãos agradeceu à professora por guiá-la nisso tudo. Fez uma reverência e pediu para que fossem todos a sua casa para que ela pudesse relatar o ocorrido.

Assumiram suas identidades falsas e em questão de minutos estavam na mansão de Tomoyo. A garota pediu que preparassem a janta para todos os cinco convidados, e não precisou de muito para convencer todos, especialmente Kero e Yukito. Subiram todos até o quarto de Tomoyo, onde algumas partituras de música clássica ainda estavam no chão. Ela convidou todos a se sentarem em uma sala anexa.

- Hum... Mozart, Bach...Vivaldi!! As Quatro Estações! Esta música é lindaaa!! – Nakuru estava tendo um ataque

- Não sabia que gostava de música clássica, Nakuru – comentou Tomoyo

- Nem eu – disseram Eriol e Suppi ao mesmo tempo. Suppi lançou um olhar meio torto a Nakuru, como se soubesse de algo que os outros desconheciam.

- Bem, eu vou tocar em um jantar para a minha mãe, mas eu quero falar antes sobre outra coisa...

Antes que terminasse de dizer sobre o que iria falar, duas criadas trouxeram chá e biscoitos para um batalhão, sem que Tomoyo tivesse ordenado nada. Se acomodaram na sala e prestaram atenção no que Tomoyo tinha para contar após seu "transe".

- Logo que toquei no báculo, a minha consciência foi "tragada" para dentro dele. Aí eu encontrei uma pessoa muito importante: a professora Mizuki.

Todos tiveram um espasmo de surpresa, mas deixaram que a garota continuasse. Ela contou sobre como a professora fez a transferência, como a consciência dela foi preservada, como ela passaria a ter lembranças que nunca existiram, como seu báculo funcionava, sua suposição do que estava para acontecer, tudo. A cada nova palavra que Tomoyo contava aos demais, mais eles ficavam espantados com o que provavelmente poderia acontecer. E mais preocupados, porque com certeza seria algo grande...

- E então, no adeus, ela falou: "Por favor, diga a todos que estou bem e não precisam se preocupar comigo..."

- Isso você falava direto antes de acordar – objetou Kero, com a boca cheia de doces

A garota estranhou:

- Sério? Eu não sabia, pensei que tudo que falava não podia ser ouvido aqui.

- E não podia. – completou Eriol – Mas acho que você devia estar para despertar, então podíamos ouvir, não sei ao certo.

De repente, Tomoyo teve um sobressalto.

- Meu Deus, é muito tarde, e eu tenho que treinar para o concerto... Acho que fiquei mais tempo inconsciente do que imaginava...

- É, ficou por uma hora e meia, não me admira que esteja cansada e tão tarde. – falou Suppi

- Bom, vamos indo!! Boa noite, Tomoyooo!!! – Nakuru puxou os demais e todos se despediram, sendo que Eriol ficou por último

- Boa noite, Tomoyo.

- Boa noite, Eriol, até amanhã.

Eriol ia saindo do quarto quando Tomoyo falou:

- Desculpe por ter ficado tanto tempo sobre...Hum...Sobre o seu colo... – a garota estava vermelha ao falar.

- Imagine, tudo bem. Você estava inconsciente. – Ele sorriu de um jeito que apenas ele conseguia – Boa noite, Tomoyo. Amanhã veremos o que fazer a respeito do báculo. – sorriu mais uma vez e encostou a porta delicadamente.

Tomoyo apoiou o báculo na cama e foi ao banheiro trocar de roupa. Gozado, uma hora e meia no colo de alguém não era brincadeira. Desmaiar em cima de Yue já tinha sido constrangedor, agora então... E por falar em Yue, tinha de se desculpar ainda com ele, não lembrou de fazer isso naquela noite.

Sentou-se na cama, imaginando como iria fazer para guardar aquele báculo prateado em algum lugar que sua mãe não descobrisse. Tinha segurado-o apenas há alguns instantes quando uma forte luz prateada apareceu e, na sua mão, havia uma fina corrente com um pingente em forma de lua pendurado. Tomoyo o colocou no pescoço, feliz em ter descoberto a resposta para a sua pergunta, e adormeceu rápido.

Do jardim da mansão de Eriol, Nakuru e Suppi avistaram a luz prateada no quarto da garota. Subiram para o quarto dele, a fim de avisar sobre o ocorrido. Quando alcançaram o quarto, ambos abriram a porta devagar. Porém, em vez de relatarem sobre o que tinham visto, encostaram a porta devagar e foram dormir, reparando que não era um momento oportuno. No caminho, Nakuru atiçou Suppi um pouco em silêncio, mas não passou disso.

Eriol estava sentado em sua poltrona favorita, ou melhor, a poltrona favorita do Mago Clow. Ele tinha seu báculo na forma normal, e os olhos fechados.

Naquele momento, todos os pensamentos de Eriol estavam concentrados nos seus sentimentos. O que ele realmente sentia por Mizuki? E por Tomoyo? Ele precisava analisar seus sentimentos. Claro, estar sentado na poltrona vermelha e com o báculo era apenas uma "fachada" para que Nakuru e Suppi não interrompessem a ordem de seus pensamentos.

Eriol repensou sobre tudo. Lembrou-se do dia que, ainda na sua quinta série, que propôs à professora que vivessem juntos, e da felicidade de quando ela aceitou. De todos os momentos felizes que passaram juntos na Inglaterra. Principalmente dos dias chuvosos, em que Kaho fazia um delicioso chá oriental, e os dois ficavam na sala da lareira, conversando sobre coisas fúteis, às vezes acompanhados dos guardiões. Ou nas noites de outono, quando a Lua e as estrelas eram vistas perfeitamente bem no céu de Londres. Os dois se sentavam no parapeito da janela de um cômodo pouco utilizado, no final da casa, devido a sua posição, que era a melhor para avistar qualquer coisa em um céu noturno.

Então pensou em um outro dia, também na quinta série. Um dos festivais que sempre aconteciam na Escola Tomoeda. E lembrou da belíssima apresentação de uma garota de cabelos negros e olhos violeta, com uma voz que parecia roubada de um anjo. Eriol assistira a todas as apresentações de Tomoyo, sempre maravilhado com todos os dons que a garota possuía. E claro, ela nunca soube disso. Embora fosse difícil admitir, Eriol sempre se alegrava ao vê-la, e adorava a sua companhia. Realmente eram muito parecidos, e até parecia que um completava o outro. Um dos dias mais memoráveis de Eriol junto de Tomoyo talvez tenha sido o dia em que fizeram um maravilhoso dueto na sala de música do colégio.

As lembranças de Eriol iam e voltavam cada vez mais rápido.

Eriol lembrou-se do dia em que a carta selada, que estava em sua antiga casa no Japão, fora libertada. Lembrava da aflição que sofreu por Sakura e, sobretudo Tomoyo. Mas ao mesmo tempo, cada palavra de consolo de Kaho fazia com que ele achasse que nada mesmo iria acontecer.

Kaho. Tomoyo. Kaho. Tomoyo. Kaho. Tomoyo. Kaho. Tomoyo. Kaho Tomoyo.

Eriol não conseguia chegar a uma conclusão exata do que sentia. Decerto, depois que Kaho morreu, e transferiu os poderes dela para Tomoyo, Eriol passou a querer ficar muito mais tempo junto da garota, que também parecia que apreciava a companhia dele. Mas... Será que ela não tinha ficado tempo demais sozinha, assim como ele? Ele não estava vendo um pouco de Kaho em Tomoyo e por isso estava achando que gostava dela?

Talvez fosse isso, e parecia que agora Eriol chegava a um ponto. O amor por Kaho ainda estava lá, enfraquecido, é verdade, mas agora estava forte outra vez, por sentir que tanto os poderes como a consciência dela ainda sobreviviam. Mas era diferente... Também tinha algo nesse sentimento próprio só de Tomoyo.

Ainda com muitas dúvidas, Eriol acabou por adormecer.

Finalmente amanheceu. Tomoyo se espreguiçou, e resolveu descer para tomar o café da manhã. Tomou banho e vestiu uma blusa de gola alta, sem mangas, azul escura, em conjunto com uma calça preta um pouco colada. Sobre a blusa, a corrente com o pingente de cristal em forma de Lua, e ela aproveitou para colocar seu par de brincos com a mesma forma do pingente.

Tomou o café normalmente, e, vendo que sua mãe não tinha chegado ainda, resolveu ensaiar um pouco ao piano.

Quando estava parada no meio de uma parte complicada de uma peça de Bach, Sonomi irrompeu quarto adentro. Tinha um lindo sorriso no rosto, e parecia cheia de novidades.

- Bom dia, filha!

- Bom dia, mamãe! Dormiu bem?

- Muito bem! E tenho uma notícia para lhe dar! Acho que descobri quem convidaram para fazer o dueto com você na reunião da empresa!

Tomoyo estava meio zonza com a notícia que viera tão de repente.

- Já sabe? E quem é?

A mãe de Tomoyo abriu um enorme sorriso:

- Será Hiroyuki Atsuhiro!! Tomoyo, vai ser um concerto lindo!

Tomoyo ficou muito empolgada. Hiroyuki Atsuhiro era um ótimo violinista, e estava treinando arduamente. Na verdade, com a fama que tinha, Tomoyo não acreditava que ele tinha aceitado participar de uma reunião como aquela. Quer dizer, pessoas poderosas, mas sem uma grande influência política ou algo do tipo.

- Nossa! Isso foi uma boa notícia! Agora vou me empenhar mais do que nunca para esse concerto!

Sonomi foi até a filha e a abraçou, com algumas lágrimas nos olhos.

- Filha, muito obrigada por tudo que está fazendo por mim!

- Imagina mãe! Eu é que fico feliz por ter me convidado!

- Ah, Tomoyo! Me disseram a data do concerto hoje. É na terça feira próxima!

- Então é...Daqui a três dias!!!

- Me desculpe, mas não tive como avisar antes...

- Tudo bem, mãe! Vai sair agora?

- Sim, estou indo. Bom ensaio filha. – Sonomi beijou a fronte de Tomoyo, e, sorrindo saiu do quarto.

Tomoyo voltou-se para o piano, e continuou a ensaiar. Durante toda a tarde de sexta-feira ela ficou ao piano. Todos os empregados da casa estavam estranhando, mas nada comentavam ou reclamavam. Além do que, Tomoyo Daidouji era extremamente competente no que fazia, e tocava muito bem.

Por volta da hora do jantar, Tomoyo deu-se por falta da partitura de Vivaldi. Por mais que procurasse, não conseguia achar "As Quatro Estações". Muito intrigada, Tomoyo voltou ao quarto dela, onde Nakuru tinha visto a partitura. Nada. Quando voltou sua atenção a uma janela, viu que a mesma estava aberta. Balançando a cabeça, descobrira como a partitura tinha sumido. Sem muito mais o que fazer, e precisando ensaiar aquela peça, Tomoyo lembrou-se de Hiroyuki, e decidiu ligar para o jovem violinista.

Assim que achou a agenda de telefones de sua mãe, a garota discou o número da casa do jovem. Ele deveria ter a partitura, e talvez pudesse copiá-la no sábado de manhã.

- Residência dos Atsuhiro.

- Bom dia, quem fala é Tomoyo Daidouji.

- Ah, bom dia, senhorita Daidouji. Será que posso ajudá-la?

- Eu gostaria de falar com o senhor Hiroyuki, por favor.

- Um instante, por favor.

Tomoyo ouviu o telefone ser pousado em algum lugar, em seguida a voz do homem que atendeu ao telefone ordenando a alguém que chamasse o jovem. Logo em seguida, uma voz jovial e melodiosa foi ouvida por Tomoyo:

- Senhorita Daidouji?

- Sim. Senhor Hiroyuki?

- Sou eu. Devo dizer que estou encantado em ouvir sua voz.

- Obrigada. Espero que nos encontremos em breve pessoalmente.

- De fato. Posso ajudá-la em algo?

- Ah, sim! Aconteceu algo terrível aqui. A minha partitura de "As Quatro Estações", de Vivaldi, voou pela janela. Eu precisava ensaiar no piano principalmente a parte da Primavera, mas não posso. Será que você não teria esta peça em seu poder?

- Certamente! Eu também estava ensaiando, então, será rápido. Posso copiá-la e enviar pelo correio como "urgente" ou pelo correio eletrônico agora. Prefere qual?

- Por favor, o eletrônico.

- Pode deixar. Estará aí em questão de segundos.

- Muito obrigada. Então até terça-feira.

- Até terça-feira.

Os dois desligaram, e Tomoyo retornou a seu quarto, para receber a partitura por e-mail. Não havia passado mais de dois minutos quando o e-mail chegou e ela pôde imprimir a partitura para ensaiar.

Por volta das quatro da tarde, Tomoyo terminou tudo. Como não tinha almoçado, saiu para comer fora. Naquele dia, um desejo estranho de sorvete tinha se apoderado dela. Ligou para Eriol, a fim de convidá-lo:

- Alô?

- Quem fala?

- Nakuru Akizuki, ao seu dispor, com toda graça e beleza!!

- Nakuru! Sou eu, Tomoyo! – a garota riu diante a inovadora apresentação

- Ah, oi Tomoyo!! Sabe como é, estou novamente como empregada...Ah... SUPPIII!!!! LAVE ISSO DIREITO!!!

Os ouvidos de Tomoyo doeram, mas ela suportou.

- Anh, Nakuru, será que você e Eriol não gostariam de tomar sorvete? Convidaria Spinnel também mas acho que doce nenhum faria bem a ele...

- Claro! 'Pera um pouco, acho que Eriol já terminou o interurbano com o plano superior...

Mais uma vez o telefone foi colocado sobre algo, e a voz estridente de Nakuru foi ouvida. Logo depois a resposta de Eriol veio, e ele mesmo assumiu o controle do aparelho, designando Nakuru para algum afazer doméstico.

- Tomoyo?

- Olá Eriol!

- Me desculpe pela gritaria mas...Bom, acho que Nakuru não vai poder, ela ainda não acabou o serviço de casa...

Tomoyo escutou um berro muito semelhante a "não é justo!!" de Nakuru.

- Ah, entendo. E você?

- Por mim, tudo bem, estou livre agora. E... Com licença. – Eriol pousou suavemente o telefone, enquanto bronqueava com a jovem de cabelos castanhos do outro lado da linha. A visão de Eriol bravo era inimaginável para a garota, mas parecia ser horrível para os membros da casa vizinha. – Desculpe Tomoyo. Nakuru não está muito solícita hoje... Bom, nos encontramos em 10 minutos no portão da sua casa ou da minha?

- Na minha, pode ser. Até lá!

- Até.

Tomoyo rapidamente foi até o seu quarto, trocou a blusa e desceu, amarrando o cabelo no meio do caminho. Comunicou a uma das criadas que já voltava e saiu. Por incrível que pareça, Eriol já estava a esperando. Usava uma calça negra, com uma blusa de mangas longas e gola alta verde bem escura. Seus sapatos estavam impecavelmente engraxados.

- Vamos? – ele gentilmente ofereceu seu braço para Tomoyo

- Claro! – a garota aceitou e começaram a caminhar para a sorveteria que sempre fora a preferida dos dois desde crianças. Eriol observou o "pingente" de Tomoyo.

- Este é o báculo?

- É, é sim. O que é um pouco estranho, até.

- Por que? Tem o formato da gema do báculo, e não é uma chave de nenhum livro.

- Sim, mas a transformação dela me foi esquisita. Eu estava pensando em como ia guardá-lo e escondê-lo das empregadas e da minha mãe quando uma luz ofuscante se deu e na minha mão, em vez do báculo, apenas este pingente na corrente apareceu.

- Deve ser uma obra de Kaho. Ela deve ter feito algo para que assim que você não precisasse do báculo, voltasse a ser um pingente. Como o da Sakura. Aliás, o seu e o dela são muito parecidos, como ela deve ter dito.

Em instantes chegaram a sorveteria. Os dois entraram, pediram os respectivos sorvetes e se sentaram, na varanda da loja.

Tomoyo e Eriol tinha acabado de sentar quando sentiram uma leve impressão de que alguém com poderes mágicos passara por ali.

Eriol achava que algo muito estranho se operara. Não sabia dizer se era mau, mas... De repente, voltou a atenção para Tomoyo. Ela deixou a colher cair, e levara a mão na altura da garganta, como que com dor, com a cabeça baixa. Quando Eriol chamou pela garota, ela levantou o rosto e Eriol notou o seu erro. Não era dor. Tomoyo estava sufocando...

FIM DA TERCEIRA PARTE

Nihao!! Aqui estamos de novo, em mais um capítulo! Peço que qualquer crítica, sugestão, elogio seja enviado, para que possa cada vez mais melhorar meu trabalho! E-mail? Mande para mari-chan.mlg@bol.com.br!

Mil obrigados a todos que estão lendo este fic,

Mari-chan