CAPÍTULO 7 – O PIANO E O VIOLINO
A garota levantou e recuou para a parede, assustada com aquilo. Não dava para saber o que era devido à escuridão do quarto. Ela começou a se esgueirar pelas paredes até seu abajur, para poder encarar quem quer que ali estivesse.
Tomoyo percebeu que o vulto não se mexia. Porém, na metade do caminho, o vulto soluçou. Soluçou?
Tomoyo parou de andar e pensou consigo mesma que raio de pessoa era aquela que invadia o quarto dos outros à noite, quebrava a janela, e a jogava para trás sem ao menos um pedido de desculpas. Sem tanto medo ou receio, andou rapidamente até o abajur. Assim que acendeu, Tomoyo não conteve uma exclamação de espanto:
- Suppi!!!
O guardião estava deitado, soluçando, com as bochechas rosadas. Estava na sua verdadeira forma, a pantera negra com asas de borboleta. Decerto, deveria ter comido algum doce.
Tomoyo sacudiu o imenso animal, que olhou para Tomoyo e soluçou outra vez. Rolando os olhos, já um pouco cansada devido ao horário presente e os soluços.
Dirigiu-se até uma mesinha, discando o número da casa de Eriol:
- Ahh... Alô?
- Alô, quem fala?
- É...É... Espere um pouco, é... Ah, lem-lem – a voz foi interrompida por um bocejo – Lembrei. Nakuru Akizuki.
Tomoyo conteve um risinho para não enraivecer a outra:
- Nakuru? Sou eu, Tomoyo. Posso falar com o Eriol?
- Nessa hora? Tudo bem, acho que ele n-não – outro bocejo – não está dormindo, não. Eu vou ver.
Tomoyo escutou os passos arrastados e sonolentos de Nakuru pela escada, e bater na porta. Ouviu Nakuru mencionar seu nome.
- Tomoyo?
- Eriol! Me desculpe por ligar tão tarde! Mas... Houve um problema aqui.
- Problema? Hum, sei. Diga o que aconteceu.
- Pode me falar se Suppi possui um quarto só para ele?
- Não, dorme junto com Nakuru, mas ela o expulsou temporariamente. Está dormindo na biblioteca.
- E a biblioteca fica no segundo andar, do lado esquerdo da casa, de quem olha de fora?
- Sim, fica. Por quê? – Tomoyo percebeu um tom de leve espanto na voz do jovem mago.
- Bom, acho que Suppi saiu para um passeio noturno, só que comeu algo doce. E... Digamos que ele confundiu a casa, e entrou pela minha janela. Está soluçando no chão do quarto.
Ela ouviu Eriol suspirar:
- Mil perdões, Tomoyo, eu não sei o que dizer. Realmente deve ter acontecido o que falou, mas não posso entrar aí neste horário sem ser visto ou acordar alguém. Acho que teremos de esperar o amanhecer. Se importa de tomar conta dele até o amanhecer?
- Não claro, que não. Mas posso perguntar uma coisa?
- De fato.
- Ele fica na forma normal dele?
- Na forma normal?
- Sim, ele está na verdadeira forma dele.
- Estarei aí em dois minutos.
Tomoyo ouviu Eriol desligar o telefone e ela fez o mesmo. Caminhou até o pobre animal, parecendo bêbado. Era estranho o fato de Eriol mudar de idéia tão rápido, mas se alguém visse a pantera em seu quarto, teria problemas. Mas, se fosse um bichinho de pelúcia, ninguém acharia estranho.
Tomoyo ia desligar a luz de seu abajur mas se conteve. Assim, Eriol poderia achar seu quarto. Realmente, após alguns minutos, Ruby Moon aparecia na varanda, carregando Eriol. Tomoyo notou que Eriol tinha trocado rapidamente de roupa, e seus cabelos estavam ligeiramente despenteados. Só então ela notou que estava de camisola. Apanhou rapidamente um casaco e vestiu-o por cima de seu pijama, indo ajudar Ruby Moon a soltar a barra de sua roupa dos espinhos de uma flor.
- Onde ele está? – perguntou Eriol
- Ali. – Tomoyo apontou e os dois seguiram para ver Suppi. Eriol tinha uma expressão estranha no rosto, que Tomoyo desconhecia. Contudo, parecia que um sorriso se formava no seu rosto.
- Spinnel, Spinnel... Bom, eu acho que vamos ter de dar um jeito para levá-lo de volta, mesmo sendo tarde e sabendo que você tem um importante recital amanhã, Tomoyo. – Ele acrescentou um pedido de desculpas, que Tomoyo aceitou – Mas acho que uma pantera que fala e ainda está bêbada não será bem vista na sua casa.
Sem perceber, Tomoyo já segurava seu báculo. Ela não achava que tinha pensado nele, mas de qualquer forma, ela iria precisar dele.
- Hum... Mestre Eriol? – Ruby Moon se dirigiu a Eriol. Era estranho o jeito formal de Ruby Moon, se comparado à sua forma falsa, Nakuru – Eu receio que não consigamos realizar tudo isto sem acordar alguém.
Eriol ponderou:
- É verdade. Vamos precisar colocar todos para dormir. Mesmo.
Fazendo o seu costumeiro discurso, a chave que tinha na mão começou a crescer e desapareceu, dando origem a um imenso báculo dourado com um Sol na ponta. Ele apontou para a janela da varanda, e uma nuvem de pó cintilante saiu da ponta dos raios do Sol. Imediatamente, mesmo sem estar vendo, Tomoyo sentiu que os habitantes que estavam próximos dali caíram em um sono profundo, em um raio de alguns quilômetros.
- Pronto. Agora, temos alguns problemas. Spinnel está bêbado, mas não creio que se deixará levar facilmente...
- Não mesmo. – ajuntou Ruby Moon – Bom, vamos tentar isto tudo de uma vez.
Ruby Moon ajoelhou-se ao lado de Spinnel Sun, e criou pequenas linhas que se amarraram no pescoço e patas dianteiras do guardião, colocando-o sobre duas patas. Ela moveu a mão, como se controlando um fantoche, e virou o corpo da imensa pantera na direção da janela. Mas quando o forçou a andar...
Spinnel soluçou, virou a cabeça e gritou:
- NÃÃÃÃO!!!!
Aquele grito certamente teria acordado todos, se não estivessem adormecidos pela magia de Eriol. Porém, o pior não foi o grito, e sim a rajada de energia que se seguiu depois, forçando uma separação dos três indivíduos sóbrios presentes no quarto, embora um pouco sonolentos.
A rajada acertou em cheio a porta do quarto de Tomoyo, fazendo um furo circular. Parecia que tinha atravessado a parede seguinte, e podia-se ver o começo do aposento próximo. Alguns segundos depois, o guardião caiu no chão, soluçando outra vez.
- Que estrago!
- Sem dúvida, Ruby. – ajuntou Tomoyo, suspirando – Mas acho que não tem problema. Conserto isso amanhã.
- Não, eu conserto isso assim que resolvermos tudo com Spinnel Sun. – a voz de Eriol era grave, num tom sério. – Temos de levá-lo para fora já, ou causará muitos danos aqui dentro.
Tomoyo se pôs a pensar. O único meio de Spinnel atacar era usando suas patas ou sua grande mandíbula, naquele ataque de energia. Então...
- Eriol, será que eu poderia tentar algo?
- Claro. Fique a vontade. Spinnel Sun irá agradecê-la se o poupar de mais vexames, sendo que Nakuru irá atormentá-lo por um bom tempo. – Ruby Moon sorriu nessa parte – Embora não saiba de sua vergonha, no seu atual estado de consciência. – Eriol finalizou, olhando a figura do guardião, que dessa vez murmurou "doooceess", com voz lenta e sibilante.
Tomoyo virou a gema do seu báculo para as patas de Spinnel, e ali começaram a aparecer faixas. As faixas foram se enrolando nas patas do guardião, cada vez mais forte, mais forte, mais forte e mais forte. Tomoyo não queria machucar Suppi, mas tinha de fazê-lo bem feito, senão as faixas seriam destruídas facilmente. Porém, ela esqueceu-se que eram mágicas. Bastava desejar que não se soltassem. A vontade dela contra a de um guardião bêbado. Não se precisava de muita esperteza para saber quem ganharia.
As faixas não se soltaram, e Eriol aprovou. Entendo o plano de Tomoyo, com um estalido, a grande boca de Suppi se fechou, como que grudada.
- O que fez, Mestre Eriol?
- Apenas colei a boca dele com algo. Ele não vai reclamar.
- E o que é?
Eriol sorriu inocentemente:
- Doces. Alguns grudam muito bem.
Tomoyo e Ruby Moon tiveram um acesso de risos, mas que logo foram silenciados.
Depois, com muita paciência, colocaram as linhas outra vez no corpo do animal. Ele se contorcia e protestava, mas não obtinha sucesso nenhum em se soltar. Meio desengonçado, passou pela grande varanda de Tomoyo, flutuando na frente de sua sacada. Ruby passou logo depois, controlando o guardião.
Eriol voltou-se para Tomoyo:
- Muito obrigado pelo aviso, Tomoyo.
- Disponha. E devo desculpas por ligar tão tarde.
- Não, não deve desculpas. Vou acompanhar os dois até minha casa e volto aqui para consertar os estragos. Será que posso sair normalmente?
Ela riu:
- Claro, claro.
Tomoyo desceu as escadas e abriu a porta para Eriol. Desligou o sistema de segurança noturno, muito eficaz, e ele se foi. Voltou a ligá-lo; era bom que o último modelo de sistemas de segurança não cogitavam sequer a possibilidade de alguém entrar voando. Ela ouviu Eriol bronquear com Ruby sobre como não era educado forçar Spinnel a dar cambalhotas no ar, e depois a voz sumiu.
Tomoyo subiu as escadas correndo, e trocou de roupa rapidamente, além de pentear os cabelos. Quando saiu do banheiro, ouviu um barulho no pedaço do vidro da varanda que ainda restava:
- Posso entrar?
- Claro que pode.
Eriol atravessou para o quarto de Tomoyo, passando por cima dos cacos de vidro com extremo cuidado. Tinha penteado os cabelos naquele ínterim. Caminhou até a porta e abriu. O círculo ali formado era suficientemente grande em seu diâmetro para que Eriol colocasse sua cabeça do outro lado. Tomoyo deu a volta e ajoelhou-se do lado oposto da porta, virada para Eriol.
- Como podemos consertar isso com magia, Eriol?
- Tomoyo, a magia não é para nos ajudar nos nossos deveres, sabe bem isso. – a garota assentiu com a cabeça – E isto me chega a ser um problema. Se fosse capaz de conhecer algum tipo de encantamento ou feitiço que restaurasse os objetos, eu estaria feliz agora.
A garota riu:
- Então, como podemos concertar isso hoje?
Eriol suspirou:
- Não podemos. Mas acho que posso dar um jeito até amanhã de manhã. Aí teremos de colocar a mão na massa ou chamar alguém que o faça. – e acrescentou, ao ver a cara de espanto de Tomoyo, ao mencionar que contratariam alguém – Me refiro a Nakuru e Spinnel.
Tomoyo riu. Ia sobrar para os dois outra vez.
- Se bem que Nakuru não merece. Só Spinnel dessa vez.
Eriol se levantou, e, apontando para onde Spinnel tinha estragado algo, – a janela, a porta e a parede - uma breve luz apareceu e sumiu, dando lugar a uma réplica perfeita dos pedaços dos objetos estragados.
- Nossa! – exclamou Tomoyo.
A garota tocou a porta com a mão, e viu que havia realmente algo sólido ali. Era perfeito!
- Usei algo parecido com a magia da carta Ilusão. Porém, é uma imagem sólida, apenas. As manterei com minha magia até amanhã, quando chamarei Spinnel para consertar.
- E as pessoas não perceberão?
- Não creio. Apenas alguém com vagos poderes mágicos.
- Entendi.
- Bom, desculpe por tudo, Tomoyo. Chame-me amanhã de manhã, quando estiver pronta. Agora, acho que deve ir dormir. Tem um importante compromisso amanhã, não é mesmo?
- Sim, obrigado.
Eriol ia saindo pela varanda quando ela o chamou de volta:
- Eriol!
- Sim?
- Eu queria saber se pode ser meu convidado de honra amanhã. Nakuru foi convidada por Hiroyuki. Eu gostaria que fosse.
As feições de Eriol revelaram um espanto súbito, logo transformado em um lindo sorriso.
- Claro, Tomoyo. Com prazer.
Ela sorriu:
- Então, até amanhã.
- Até amanhã.
Tomoyo recolocou seu pijama e se deitou. O sono veio mais rápido do que nunca, com sonhos alegres e calmos, aparentemente ignorando o nervosismo de todo o corpo e alma da garota.
Amanheceu. O Sol infiltrava-se sem pedir licença pela cortina da garota. Abriu os olhos bem devagar, ainda com um pouco de sono. Suppi tinha dado um trabalho... Nossa! Ela se lembrava do que acontecera na noite anterior! Isso era um progresso, devido ao seu estado de consciência, a mente começando a pegar no tranco.
Se levantou e foi andando para o banheiro. Regulou a água, e entrou no banho. No meio deste, o interfone tocou. Intrigada, Tomoyo enrolou-se em uma toalha e caminhou até o seu quarto, onde encontrava-se o aparelho.
- Alô?
- Senhorita Tomoyo? Já está acordada?
Era uma das empregadas da casa. Era um pouco óbvio que Tomoyo tinha acordado, caso contrário não estaria falando ao interfone. Ou, se estivesse dormindo, teria acordado com o alto volume da campainha deste. Porém, a moça deveria ter recebidos ordens de alguém, e não ia brigar com a empregada.
- Sim, há algum tempo. Estou no meio do banho.
Tomoyo ouviu uma exclamação de espanto seguida de uma explicação:
- Desculpe-me, senhorita. Sua mãe teve que sair para os últimos preparativos para o concerto, e quis se certificar se não tinha perdido a hora. Mil perdões!
- Imagine, está tudo bem. Vou voltar para o meu banho.
- Claro.
A moça desligou, e Tomoyo retornou para o seu banho. Não gostava que Sonomi pensasse que era uma criança; ela não iria perder a hora num dia importante como aquele! Ou poderia acontecer? De qualquer jeito, perdoou a mãe.
Saiu do banho e colocou uma roupa que se encontrava estendida sobre uma mesa. Era uma blusa branca, fechada com alguns botões na frente, com mangas compridas. Era uma blusa social, junto com uma saia preta, de um tecido fino. Serviam perfeitamente bem. Colocou a meia-calça, preta. Ótima. Faltavam apenas um lenço negro para colocar em volta do pescoço e os sapatos que calçaria mais tarde, e tinha certeza de que eram seu número. A roupa para a noite estava pronta. Tinha prometido que não provaria na última hora, para que imprevistos não acontecessem. As jóias estavam separadas.
Tirou a roupa da noite e colocou uma saia cor-de-rosa claro, com uma blusa branca, simples, com alguns bordados em rosa, da cor da saia. Trançou os cabelos rapidamente, passou o pingente por cima da blusa e desceu para tomar café.
Enquanto comia, reparou que tanto a corrente como a pequena Lua que usava, na verdade seu báculo, podiam ser expostos à água, e não oxidavam. Isso confortou a garota, já que não gostava da idéia de se separar do pingente. Terminou tudo rapidamente e se dirigiu para a sala de música.
Abrindo uma das gavetas, encontrou uma pasta, preta, com as letras em prateado, escrito "Tomoyo Daidouji & Hiroyuki Atsuhiro". Sua mãe tinha mandado fazer uma pasta para cada um, com os nomes, para usarem durante o concerto. Abriu a pasta, e se pôs a imprimir as partituras que usaria, sem tantas anotações, e mais bem cuidadas. As que usara durante os ensaios estavam um pouco deterioradas, e sua mãe não admitiria aquilo.
No meio de uma das gigantescas partituras, a tinta da impressora acabou. Constatou, com um suspiro, que não havia mais nenhum cartucho de tinta para a impressora na casa, e saiu para comprar.
Se dirigiu para a papelaria mais próxima de sua casa. Quando ia entrar, deu um encontrão em algum cliente que ia saindo da loja, que provavelmente não a tinha visto. Tomoyo acabou por cair sentada, do lado de fora da loja, e a outra pessoa do lado de dentro, com o conteúdo das sacolas espalhado.
Tomoyo balançou a cabeça. Antes que se levantasse, alguém perguntou:
- Quer ajuda?
Olhando para cima, Tomoyo viu a linda face sorridente de Hiroyuki contra o Sol da manhã, estendendo-lhe a mão. Ela aceitou, e se ergueu.
- Mil perdões, Tomoyo. Eu não a tinha visto.
- Imagine, Hiroyuki, está tudo bem.
Os dois se puseram a recolher as coisas espalhadas pelo chão. Alguns segundos depois, tinham acabado.
- Meu Deus, além de derrubá-la, ainda lhe dou trabalho! Bom, o que veio fazer aqui?
- Estava imprimindo partituras novas para hoje à noite. No meio de uma delas, a tinta acabou. Vim comprar um novo cartucho de impressora.
- Entendo.
- Recebeu a pasta de minha mãe?
- Sim, uma preta com letras prateadas?
- É, é essa.
- Então recebi. As partituras novas estão prontas, só falta um detalhe mínimo.
- Que bom, Hiroyuki! Bom, eu tenho que voltar para casa, tenho que ensaiar um pouco mais... O nervosismo aumentou.
- Eu sei. Mas sabia que temos de chegar antes para tirar as dúvidas, não? Pode ensaiar lá. O recomendável é descansar durante a tarde. Ah, sim! A garota de ontem, Nakuru Akizuki. É sua vizinha, não?
- É sim.
- Poderia dizer a ela que passarei às cinco e meia para pegá-la?
- Claro, falarei.
- Então até. Nos vemos às seis.
- Até às seis.
Hiroyuki se virou e passou a caminhar para sua casa. Ele carregava várias sacolas, e Tomoyo imaginava o que tanto tinha de comprar. Por fim, comprou o que precisava e voltou para casa.
Terminou de imprimir todas as folhas na hora do almoço, e comeu rapidamente. Em seguida, foi até a casa de Eriol. No meio do caminho, Tomoyo percebeu que poderia ter simplesmente ligado e passado o recado para Nakuru, mas decidira por vir sem avisar à casa do outro. Ignorando algumas perguntas insistentes sobre porque viera ali, Tomoyo apertou o botão do interfone no portão. Uma voz com chiados eletrônicos, devido ao aparelho respondeu:
- Quem é?
- Tomoyo Daidouji.
- Ah, Tomoyo! Eu vou abrir o portão. Para variar, ordens do Eriol. Espera só um pouco!
Tomoyo ouviu um estalo, e o portão foi aberto. Ela caminhou até a casa, e Nakuru a esperava na porta:
- Olá! Tudo bem, Tomoyo? – A jovem abraçou Tomoyo
- Claro! Vim trazer alguns recados.
- Entre, por favor!
Nakuru levou Tomoyo para a sala, onde Eriol estava com um livro nas mãos, com caracteres que Tomoyo desconhecia no título. Ele fechou o livro quando notou a aproximação das duas.
- Tomoyo! Que surpresa agradável! – sorriu-lhe Eriol, se levantando
- Vim trazer alguns recados, só isso. Coisa rápida. – Tomoyo retribuiu o sorriso.
- Sente-se, por favor.
Os três se sentaram, e Tomoyo começou:
- Nakuru. Encontrei com Hiroyuki hoje de manhã, e pediu-me para que esteja pronta às cinco e meia. Ele passa aqui nessa hora.
Nakuru abriu um sorriso, e deu um salto do sofá, pulando em Tomoyo, que acabou por afundar no sofá:
- Obrigada, Tomoyo! Obrigada, obrigada, obrigada, obrigadaaaa!!!!! – a garota se soltou de Tomoyo, que pôde respirar mais livremente. Em seguida, começou a subir a escada cantarolando, e pensando em voz alta qual vestido usaria. Tomoyo se virou para Eriol:
- Está bem empolgada... – o tronco de Tomoyo ainda doía devido ao apertado abraço de Nakuru – Eriol, o outro recado é para você. A minha mãe irá nos levar às cinco e meia também. Tudo bem para você?
- Claro, nenhum problema. Estarei pronto, embora não seja do meu feitio aceitar algo de uma dama e nem sequer levá-la ao lugar que precisa ir, – Eriol beijou a mão de Tomoyo – mas eu ainda não tenho permissão para dirigir, sabe como é. Creio que os guardas não me desculparão.
Tomoyo riu:
- Tudo bem, Eriol. Estará me devendo um passeio de carro, assim que estiver autorizado a dirigir.
- Combinado.
- Bom, tenho que arrumar o resto das minhas coisas e me aprontar. Costumo demorar menos que as outras garotas para me arrumar, mas ainda sim sou uma delas. – ela sorriu – Até mais, Eriol.
- Até. – Eriol se levantou e acompanhou Tomoyo até a porta, inclinando-se e beijando a mão da garota novamente, com um belo sorriso. Tomoyo sentiu que a sua face esquentava quando Eriol demonstrava um gesto assim, mesmo quando que educadamente.
Sua mãe já se encontrava em casa, dando ordens aos empregados, e meio vestida. A parte de cima de sua roupa era visivelmente informal, enquanto usava uma saia preta social. Era algo bem estranho, já que sua mãe sempre se vestia impecavelmente.
- Tomoyo! Ah, aí está você, minha filha! Eu já mandei algumas coisas para o salão de festas da empresa, mais algumas empregadas e parte das sobremesas. Querem que você esteja lá...
- Às seis, para acertar os últimos detalhes e ver se o piano está em boas condições. – respondeu Tomoyo prontamente.
- É, é verdade. Como descobriu?
- Hiroyuki. Encontrei-o hoje de manhã.
- Que ótimo! Bom, creio que convidou alguém, não?
- Sim, Eriol Hiiragizawa.
- E Nakuru?
- Irá com Hiroyuki.
- Certo. Passamos às cinco e meia na casa de Eriol. Nakuru irá conosco?
- Não, não vai.
- Certo. – Sonomi observou o relógio. Bom, esteja pronta em pouco tempo tempo, Tomoyo. Estaremos saindo daqui a pouco.
Tomoyo concordou com a cabeça, subindo as escadas. Entrou no quarto e vestiu a roupa que estava separada de manhã. Prendeu o lenço em volta do pescoço com um prendedor de prata lindo. Colocou o seu pingente, juntamente com um conjunto de brinco e anel de Lua que possuía. Maquiou-se com agilidade, e desceu, arrumando uma bolsa preta, muito brilhante no caminho. Olhou no relógio. Cinco horas. Faltava pouco para ir para o concerto. Sentiu que seu estômago dava uma volta, mas não era hora de nervosismo. Ajudou os pobres empregados da casa, tontos com tanto movimento, e às cinco e meia estava na casa de Eriol.
O rapaz esperava do lado fora. Eriol usava uma calça negra, como várias outras suas, mas parecia que o tecido desta era outro. Na parte de cima usava uma blusa de linho branco, segurando na mão um paletó. Estava ligeiramente abafado, e Eriol certamente não iria agüentar um casaco tão pesado. Penteara impecavelmente os cabelos como sempre, e os sapatos eram lustrosos de uma forma fantástica. Ele sorria, quando Tomoyo abriu a porta:
- Boa noite.
- Olá, Eriol! Vamos, pode entrar.
- Não, entre primeiro. – Eriol segurou a porta para Tomoyo, que agradeceu e sentou-se no banco do carro, seguida por Eriol, que fechou a porta suavemente. Dentro de poucos minutos estavam em movimento, indo para o lugar marcado.
- E Nakuru?
- Estava terminando a maquiagem. Hiroyuki Atsuhiro ainda não tinha chegado.
Eriol e Tomoyo conversaram animadamente durante todo o percurso, sendo que Eriol parecia mais comunicativo e alegre do que de costume, algo novo, porque Eriol sempre era mais fechado. Além disso, não se cansava de elogiar o talento de Tomoyo e a sua beleza. Mas parecia que o tempo corria mais do que o normal, e já tinham chegado ao destino. Tomoyo sentiu que o seu nervosismo parecia crescer ainda mais.
Desceram do carro, e um funcionário, designado por Sonomi, levou Eriol e Tomoyo até o camarim, onde esperariam Hiroyuki e Nakuru. A mãe de Tomoyo disse que só não levaria os dois porque tinha de ajeitar tudo para o resto dos convidados, grandes empresários, como ela. Tomoyo disse que não tinha problema.
Eriol e Tomoyo examinaram o camarim. Era espaçoso, com duas penteadeiras; uma para Tomoyo e outra para Hiroyuki. Ela encontrou um vaso de flores, com alguns envelopes.
No primeiro, a letra caprichosa de sua mãe desejava-lhe boa sorte, e parecia que escrevera aquilo com emoção. No segundo envelope, um bilhete para que tivesse uma boa apresentação veio de Hiroyuki e dos pais deles. Isso era óbvio, já que Tomoyo também escrevera um para o garoto. No terceiro envelope, achou vários elogios e pedidos para que ela tocasse novamente para...
- Sakura, Shaoran e Meilin! Eriol, esta mensagem é deles!
- Parece que sua mãe pensou em tudo, não é mesmo? – e ele sorriu
Tomoyo sorriu e guardou o bilhete com carinho, junto dos outros. A lembrança dos seus três amigos em Hong Kong fez com que parte de seu nervosismo parasse. Sakura estaria torcendo por ela. Faltava o último deles.
Uma caligrafia muito bem feita, escrita com visível paciência em um papel perfumado. Desejava-lhe boa sorte e lhe agradecia o convite para assisti-la ao vivo. Não precisou ler a assinatura para saber de quem se tratava.
- Eriol! Muito obrigada! Como colocou isto aqui? – levantou-se e deu um abraço no amigo, outra parte do nervosismo sumindo, porque sabia da torcida dos amigos que tinha.
- Não fui eu quem colocou aí. Foi a sua mãe.
- Mas...
- Ela tinha clara suspeitas de tudo, e pediu para que lhe escrevesse algo. É claro que eu teria feito isso antes até que sua mãe pedisse, embora não seja o suficiente para agradecer por tudo.
Neste exato momento, a porta do camarim se abriu, e Hiroyuki entrou, acompanhado de Nakuru, que ria. Ela trajava um longo vestido vermelho escuro, sem fendas, com uma pequena cauda que arrastava no chão. Exibia jóias muito bonitas, a maioria de ouro, e tinha o cabelo longo elegantemente trançado às suas costas. Tinha uma maquiagem mais forte que a de Tomoyo.
Hiroyuki por sua vez usava uma calça social preta, do mesmo tipo de tecido da saia de Tomoyo, com também sapatos negros. Na parte de cima, uma camisa de mangas longas branca, fechada com botões na frente. Era idêntica a de Tomoyo, só que a dela tinha alguns detalhes para ser mais feminina. Usava o cabelo negro preso em um rabo de cavalo na altura do pescoço. O jovem violinista estava extremamente belo, mais do que de costume. Tomoyo pensou na cara que Meilin faria se visse Hiroyuki vestido socialmente.
Todos cumprimentaram-se. Hiroyuki leu os vários envelopes que estavam em cima da sua penteadeira. Seguramente, por volta de uns dez ou onze envelopes eram de fãs suas, que ele não chegou a abrir, mas guardou. Agradeceu com um beijo o de Nakuru e Tomoyo, em seguida apertando a mão de Eriol, que tinha assinado juntamente com Nakuru um dos votos de boa sorte para ele.
Nakuru e Eriol foram direcionados para seus lugares no salão, e os dois músicos para uma sala para que afinassem os instrumentos, no caso de Hiroyuki. O piano encontrava-se no salão, e eles tiveram que usar outro para tirar as últimas dúvidas. Por fim, os dois foram aguardar a vez de tocar, atrás da porta do salão principal.
Tomoyo sabia que sua mãe tinha de recepcionar vários e vários sócios dela, e certamente aquilo demoraria um pouco. Ela se sentou numa cadeira que lhe foi oferecida, apoiando a sua pasta no colo. Hiroyuki recusou a cadeira e inclinou-se para conversar com Tomoyo.
- Acha que vamos entrar em pouco tempo?
- Não, sinceramente não acho. Minha mãe tem de recepcionar vários sócios da empresa, e sempre existe aquela conversa para saber como vão as coisas. É algo insuportável, diga-se de passagem, porque todos aproveitam para tentar saber da balança comercial e tentar uma nova estratégia antes da próxima reunião.
- Não me admira que não queira seguir a carreira de sua mãe.
- Não mesmo. Quero dizer, sei que terei de cuidar disso algum dia, mas... Ainda não chegou a minha hora, assim por dizer. Acho que designarei esta função para alguém que compreenda melhor do que eu sobre esse tipo de coisa.
- Entendo. Mas me diga uma coisa, Tomoyo. A sua mãe comanda tudo sozinha? Quero dizer... Sem ajuda de ninguém?
- Sem ajuda de ninguém.
- Que grande mulher. É realmente difícil de encontrar gente assim hoje em dia, num mercado usualmente dominado por homens. Não que eu tenha algum preconceito em relação a isso, - acrescentou rapidamente o rapaz, sorrindo para Tomoyo, que retribuiu o gesto – mas é tudo conseqüência de uma sociedade machista antiga. Isto é algo difícil para que eu entenda... Ouvi dizer que isso começou com algum filósofo grego.
Tomoyo se perguntava onde que Hiroyuki desejava chegar com aquilo, e mais uma vez a lembrança de seu pai lhe veio à mente. Ela começou a sentir que toda a sua ansiedade e nervosismo transformavam-se em ódio, e aquilo poderia arruinar toda a sua apresentação. Ela estremeceu, e começou a pensar nos votos de boa sorte que tinha recebido, em Nakuru, Shaoran, Meilin... E sobre Sakura e Eriol. Por que Eriol subia nos seus conceitos? Certamente por ser a única pessoa que estava com ela de sua infância, e tinha muito contato com ele, desde que recebera os seus poderes. Mas... Estranho, tudo era muito estranho...
- ... Em um livro de história. Tomoyo? Está me ouvindo?
- O quê?
- Acho que não estava prestando atenção no que dizia. Preocupada?
- Não, imagine. Estava pensando nos meus amigos que estão longe do Japão.
- Longe?
- Sim, três amigos meus com quem muitas coisas boas da minha infância foram compartilhadas... Sakura, Shaoran e Meilin.
- Shaoran e Meilin... Parecem nomes japoneses um tanto estranhos.
- Não, são chineses. Os dois moravam em Hong Kong. Aliás, moram.
- Entendo. Me pareciam nomes familiares...
- São do clã Li.
Os olhos de Hiroyuki se arregalaram:
- Do clã Li? Está falando sério?
- Sim, estou.
Os olhos de Hiroyuki demonstravam algum espanto, que não mais estava estampado em sua face. Será que Eriol estava certo quanto ao violinista?
Ele empurrou uma mecha de cabelos para trás do ombro e sorriu, de modo que Tomoyo julgava que muitas garotas teriam um ataque histérico.
- Por acaso esse garoto... Shoaran Li, tem irmãs?
- Sim, quatro.
Ele sorriu:
- Sei de quem se trata, agora.
- Sabe?
- Sim. Uma vez fui a casa deles, com meus pais, para uma pequena demonstração de minha afinidade com o violino. Depois que eu toquei, quase fui estrangulado por quatro garotas, um tanto mais velhas do que eu, puxando o meu rosto e me elogiando. Eu quase não conseguia respirar quando a mãe delas pediu para que eu fosse solto. Um garoto, com um aspecto meio... Enfezado, me observava de um canto.
Tomoyo riu:
- É, essas são as irmãs do Li. E ele realmente tem uma expressão de desconfiado. Demora para acreditar em alguém.
Tomoyo mal tinha acabado de falar quando um dos funcionários do lugar pediu que entrassem. Os dois se ajeitaram e entraram com as pastas na frente do corpo, como tinham prometido que iriam fazer para Sonomi. Pararam na frente dos instrumentos, enquanto um salão lotado de pessoas ricamente vestidas os aplaudia. Em um canto próximo de onde estavam, havia sido montada uma mesa longa com cinco cadeiras. A mesa tinha uma toalha bordada vermelha de veludo, e ali estavam Ayumi Atsuhiro, Kazuaki Atsuhiro, Sonomi Daidouji, Nakuru Akizuki e Eriol Hiiragizawa. Eles se sentaram quando os aplausos silenciaram.
Tomoyo se dirigiu para o piano, e abriu sua pasta. Hiroyuki apoiou-se no piano, desprezando a cadeira, colocando a sua pasta em um pedestal na sua frente. Ele sorriu para Tomoyo, e a garota fez o mesmo. Então, o casal começou a tocar para as várias mesas dispostas no salão.
Durante o concerto, Tomoyo reparou que todos os convidados pareciam muito entretidos com a música, e pareciam também estar gostando. Percebeu que Hiroyuki fechava os olhos durante alguns pedaços da música que decorara, acompanhando com a cabeça a melodia tocada pelo piano. Por algumas vezes, fios de cabelos caíam sobre o seu rosto, coisa que só contribuía para que ficasse mais encantador. Ele parecia ciente disso, porque durante os aplausos de uma das músicas, ele não demonstrou vontade alguma em consertar.
Tomoyo reparou que Nakuru freqüentemente sorria para Hiroyuki, e era correspondida. Eriol manteve um sorriso registrado seu durante toda a apresentação. Mas Tomoyo sabia que aquele sorriso era verdadeiro, e destinado à sua performance. Ela sentia que sua face queimava, mas logo concentrava-se e o fraco rubor sumia.
Quando o concerto acabou, todos aplaudiram de pé, e os dois foram instruídos para que saíssem rapidamente. Ainda ao som dos aplausos, Hiroyuki saiu, mas quando Tomoyo ia acompanhá-lo...
Ouviu um baque surdo. Um dos convidados tinha caído no chão. Alguns dos senhores e senhoras próximos se inclinaram para prestar socorro, mas rapidamente tombaram ao mesmo tempo.
Tomoyo observou a mesa de sua mãe. Ela não parecia ter notado nada, e ainda aplaudia freneticamente, assim como Ayumi e Kazuaki. A garota ouviu um novo barulho de copos quebrando, e percebeu que um dos garçons caíra. A cada minuto, mais convidados do extenso salão iam caindo, e o resto das pessoas aplaudia. Ela desceu do palco, chamando por Hiroyuki, mas parecia que este não se encontrava por perto, e já tinha se retirado.
Ajoelhou-se na frente de um dos convidados que conhecia, quando metade do salão estava já se encontrava caída. Não respondia a nenhum de seus chamados ou estímulos, enquanto a outra parte do salão ainda aplaudia com entusiasmo um concerto já acabado.
Tomoyo levantou-se, dirigindo-se a mesa onde sua mãe se encontrava. Ela estava caída sobre a mesa, porém, com um sorriso tranqüilo. No mesmo estado estavam Ayumi e Kazuaki. Porém, ninguém se encontrava nos lugares de Eriol e Nakuru
A garota sentou no chão, com medo. O que estava acontecendo? A cada minuto, mais gente tombava ao chão, aparentemente inconsciente. E onde estavam Eriol, Nakuru e Hiroyuki?
Tomoyo quase soltou um grito quando sentiu uma mão no seu ombro. Ao se virar, encontrou Eriol, com uma sombra no rosto. Mas não estava acompanhado por Nakuru, e sim por Ruby Moon...
FIM DA SÉTIMA PARTE
Hello, people! How are you? Aqui acaba mais uma parte e eu peço outra vez para que me escrevam sempre para contar as suas impressões, certo? Os seus comentários são fundamentais!! Mandem para mari-chan.mlg@bol.com.br!
Kisses for you,
Mari-chan.
