CAPÍTULO 4 - CRIANDO E DESFAZENDO ENGANOS

Os dois permaneciam abraçados, sem se soltarem. Apenas a luz da Lua no quarto, até que ouviram batidas na porta. Kyoshi soltou Tomoyo, enxugaram as lágrimas e Tomoyo falou que podiam entrar.

Sonomi abriu a porta devagar, com muito cuidado. Depois, fechou-a, e caminhou até onde estavam, Kyoshi em uma cadeira, Tomoyo em uma poltrona.

- Meus filhos...

Abraçou-os, e, durante mais um enorme tempo, ficaram assim, até que Sonomi se levantou.

- Vamos jantar, meus queridos?

- Vamos, mãe. Você fica para o jantar, Kyoshi?

- Claro!

- Eu já vou indo. Não demorem, por favor.

- Tudo bem.

Sonomi saiu na frente, e os dois foram logo atrás. Kyoshi, de repente, levantou Tomoyo nos braços, e seguiu para o quarto dela.

- Kyoshi! Pode me colocar no chão!

- Não, claro que não! Eu esperei muito tempo para fazer isso! Vem, eu quero conversar uma coisa com você!

- No meu quarto?

- Isso!

Ele abriu a porta destrancada, tomando cuidado para não deixar a irmã cair. Em seguida, sentou-a na enorme cama, se acomodando no tapete à frente.

- Temos um problema, Tomoyo. As aulas.

- As aulas? O que tem?

- Bom, ninguém sabe que somos irmãos, certo?

- Certo.

- E as pessoas vão ter que continuar sem saber, entende?

- Sim, perfeitamente. E o que tem de problema nisso? Nós fingimos.

- Tudo bem, eu acho que isso era previsível. Mas o problema não é este, infelizmente.

- Não?

- Não. Você sabe, sua mãe me convidou para morar aqui, com ela e você.

- Que bom!! Você vai aceitar, não vai?

- Mas e se alguém da escola descobre?

Tomoyo desabou para trás, na cama.

- É mesmo... E agora, meu irmão querido?

- Bom, ou continuo morando no meu apartamento...

- Ah, não! Por favor, fique aqui em casa, Kyoshi! - Tomoyo desceu da cama e se ajoelhou ao lado dele.

- É o quero, Tomoyo. Ou então, vamos ter que fingir que somos namorados.

- Na-namorados?

- É.

Tomoyo ficou em silêncio.

- Nossa, isso vai ser uma coisa chocante.

- Com certeza. Por isso, quando conversei com sua mãe naquela noite, ela me disse que gostaria que eu morasse aqui, mas que tínhamos esse problema.

Tomoyo suspirou. O que ela não fazia pelo seu mais novo irmão?

- Kyoshi, se for o único meio que temos de você ficar aqui, aceito os termos.

- Maninha... - era muito meigo o jeito como ele a chamava - Isso... Tem certeza?

- Tenho. Mas não tem como você contar que é meu irmão na diretoria e fica tudo bem?

- Não, Tomoyo. Eu sabia disso, eu sabia que não era filho dos Sayuri. E utilizei o nome deles. Isso pode dar mais problema ainda. Mas, mesmo supondo que essa barreira fosse superada, ainda teríamos o grande problema de que jamais poderia dar aula para você. Ou eu teria de deixar a faculdade, ou você teria que fazer isso.

- Então, tudo bem. Mas prometa que vai tentar ser o menos chamativo possível, e avisar os diretores da escola disso.

- Certo.

- Eles vão deixar?

- Eu acho que sim. Conhece Hiroyuki Atsuhiro?

- Sim, conheço. Um dos meus amigos.

- E sabe da professora Suzuki Maeda?

- Sei, o que tem?

- Ela... - Kyoshi olhou para os lados, mesmo não tendo ninguém no quarto - Esta apaixonada por ele!

- Não acredito! - Tomoyo se espantou e depois sorriu.

- E disseram para ela, que, se o aluno demonstrasse algum tipo de correspondência, e o relacionamento não atrapalhasse os estudos e ocorresse longe da escola, ela não teria problemas. Portanto...

- Você se sente amparado com o caso da professora Maeda.

- Muito esperta! Mas acho melhor descermos, ou a... - ele parecia estranhar - Nossa mãe vai ficar preocupada.

Os dois desceram e encontraram Sonomi. Colocaram-na a par das novidades, e saborearam um delicioso jantar, com comida francesa. Tomoyo lembrou de Eriol, nessa hora, há muito tempo atrás, quando ele ainda mal tinha terminado de mudar-se. E agora não estava mais lá.

- Tomoyo?

- Hum?

- Você sabe alguma coisa de Eriol?

- Não, não sei de nada.

- Bom, hoje ele faltou à aula, você sabe, não?

- Sei, eu notei isso.

- Então, ele pediu para que seu curso na faculdade fosse trancado.

- Como?? - Tomoyo se levantou da mesa, alterada.

- Ele saiu da cidade... - Kyoshi olhava a irmã com pena - parece que você realmente não sabia de nada...

- E para onde ele foi? Para onde, Kyoshi?

- Ele? Parece que foi para Tóquio. De lá, pretende embarcar de volta para a Inglaterra.

Tomoyo se levantou, muito nervosa.

- Mãe, eu preciso impedir Eriol de fazer isso!!

- Mas, Tomoyo, você não pode interferir nas decisões dele...

- Mãe, é sério! Kyoshi, você me ajuda?

- Ajudo, Tomoyo, no que puder.

- Tomoyo, minha querida, isso...

- Mãe, é sério! Por favor... - Tomoyo deu a volta na mesa, se ajoelhando ao lado de sua mãe - Por favor...

Sonomi sorriu:

- Eriol é muito importante para você, não é mesmo?

Tomoyo concordou com a cabeça, uma lágrima solitária marcando seu rosto.

Ela sentiu uma mão suave enxugá-la:

- Não fique assim, minha irmã. Vamos achá-lo!

- Obrigada, Kyoshi.

- Faça os preparativos, Tomoyo. Amanhã mesmo sairá atrás de Eriol.

Tomoyo se levantou. Abraçou a mãe e o irmão.

- Eu amo vocês!

Subiu correndo para o quarto, a fim de arrumar suas coisas.

- Kyoshi, está certo disso?

- Sim...Mãe. Desculpe-me, mas ainda é estranho chamar a senhora Daidouji de mãe...

- Sim, chamar o professor Sayuri de filho também é estranho... - Sonomi sorriu - mas não é nada que não possamos nos acostumar!

- Verdade. Bom, eu vou até a escola, acertar a dispensa de Tomoyo e a minha. Ah, claro, inserir as idéias do "caso" também...

- Vá. Eu vou telefonar para a Mirai. Vocês vão com algum jatinho da empresa.

- Mas... A senhora não está com problemas na empresa?

- Mirai está resolvendo algumas coisas. Vamos provar nossa inocência nisso, pode ter certeza.

- Eu tenho. Estou saindo, mãe.

- Até mais, meu filho.

Tudo parecia novo, naquela noite. A mansão Daidouji nunca mais seria a mesma.

Enquanto estava arrumando as malas, Tomoyo pensava na fuga de Eriol. Ele tinha tirado conclusões sobre elas antes de conhecer melhor os fatos, e ela também tinha sido deveras dura com ele. E o aviso de Yue... Ninguém mais entendia, mas se ela e Eriol não se acertassem, coisas graves e cada vez mais perigosas iriam acontecer, com certeza. E já estavam colocando milhares de pessoas em perigo.

Yue sabia de alguma coisa... Com certeza valia a pena consultá-lo antes de ir embora. Chamou Yue e Kero, esperando que sua força mental fosse suficiente para isso.

Alguns momentos depois, um bichinho de pelúcia laranja alado e Yue apareceram. Tomoyo sempre se perguntava como eles não eram vistos.

- Oi, Tomoyo! Chamou a gente?

- Chamei, é sério.

- Algo a ver com Clow, não é mesmo?

- Sim, com Eriol.

Ela pediu que Kero e Yue se acomodassem. Kero resolveu voltar a sua forma natural para isso, embora não tivesse necessidade.

- Bom, vocês são meus amigos, conheço vocês há muito tempo... E agora, em tempos mais recentes, devo a minha vida a vocês. Mas eu gostaria de pedir um favor. Eriol está fugindo de mim devido a um julgamento precipitado... E eu preciso que ele volte.

Yue ergueu uma sobrancelha, e Kero suspirou. Yue murmurou alguma coisa:

- Eu avisei sobre Clow.

- Mas eu não sabia que eu tinha sido a culpada...

- Tomoyo, você não foi culpada... E, mesmo se fosse, não adiantaria ter remorso algum. O tempo corre. Agora, se o inimigo está atento, vai se aproveitar para atacar. Você não pode ir sozinha para achar Eriol!

- Ah, não se preocupem! Meu irmão vai comigo!

- Irmão?

- Anh...É uma história longa... - Tomoyo resumiu-a até onde conseguiu, e os dois guardiões ficaram espantados.

- Então tudo bem... Mas o que houve com Eriol?

- Achei as flores que tinha levado para ele, logo assim que ele tinha mudado... Achei-as no último quarto do corredor... O quarto estava abandonado, mas as flores, vistosas e brilhantes...Assim que olhei-as, murcharam e morreram. É...Como se fosse um aviso.

- É um aviso. - Yue disse.

- Com certeza, Tomoyo. E, ao mesmo tempo, uma pista.

- Uma pista junto com um aviso?

- Vamos por partes. Primeiro o aviso, certo? - Kero começou a colocar ordem nos pensamentos, posto geralmente assumido por Tomoyo, mas ela estava tão nervosa que não conseguiria. - O que o seu primeiro presente pode significar, sendo destruído, se é assim que podemos chamar o que aconteceu...

- Não sei... Talvez, o fim de uma amizade?

- Provável. - Kero concordou com a cabeça.

- Acham que seria tão simples assim?

- Por que você sempre quer complicar as coisas, Yue? - rosnou Kero.

- Eu não estou complicando, estou fazendo você enxergar mais longe que um palmo do seu focinho.

Tomoyo não pôde evitar a risada. Vindo de Yue, parecia uma piada muito boa.

- E você ri, Tomoyo?

- É que pareceu...Engraçado, muito engraçado para ser o Yue quem disse isso.

Tomoyo jurava ter visto um rascunho de um sorriso ser formado nos lábios de Yue, mas não tinha certeza.

- Então, o que acha, Yue? O que pode ser mais profundo que isso? - Kero estava contrariado.

- Para mim, a cesta onde estavam apoiadas as flores simbolizava sim, a amizade deles e toda a nossa união. As flores, os frutos dessa amizade. Ou seja, a eficácia contra o inimigo, divertimento, troca de experiências e outras coisas. Tomoyo, somente as flores murcharam?

Tomoyo pensou um pouco. É, somente as flores.

- Sim, só elas.

- Então é ainda mais fácil. A cesta, a amizade que une vocês dois, propriamente dita, não acabou. Ela continua, mas os frutos que ela deu...

- Se perderam...

- Não, não acho que seja assim. Acho que a cesta é uma metáfora. Eles podem ser perdidos, mas, se você correr, eles não sumirão. O mesmo acontecerá com a cesta. Daqui um tempo, estará impossível de ser usada. E a amizade de vocês terá simbolicamente chegado ao fim, claro. Mas é um aviso de Clow. Isso ainda não aconteceu, mas pode acontecer. Para isso, tem que mudar o presente.

A interpretação de Yue fora perfeita. Até Kero sentiu uma ponta de ciúmes do companheiro guardião. Tomoyo agradeceu os dois.

- Muito obrigado. Amanhã de manhã eu vou atrás de Eriol.

- Boa sorte, Tomoyo! Me traz um doce de Tóquio?

- Claro, Kero!

- Espero que consiga, Tomoyo. Dê meus cumprimentos a Clow.

- Será que você não esquece dele um minuto?

- Não, Kerberus. Sem ele, eu não estaria aqui.

A resposta pareceu calar o leão dourado.

- Tomoyo? Olha só, eu já cuidei das nossas coisas na es... - Kyoshi parou a porta, mudo de surpresa.

Os guardiões e Tomoyo se viraram.

- Ah, Kero, Yue! Este é o meu irmão, Kyoshi.

Tomoyo se levantou e puxou o irmão para dentro do quarto, meio que petrificado. Ele se sentou ao lado de Tomoyo, na cama. Cumprimentou-os, mas não conseguia deixar de olhar para os dois seres mágicos.

- Você é o irmão da Tomoyo? Legal! - Kero estava empolgado. Yue quieto, como sempre.

- Sim, sou eu. E eu que irei acompanhá-la nessa viagem.

- Está a par dos acontecimentos estranhos e do tipo de magia que Tomoyo usa? - indagou Yue, do lugar onde estava.

- Sim... - o jovem professor confirmou com a cabeça.

- Então não deveria estar tão surpreso conosco! - pensou Kero.

- É verdade... Eu sabia sobre vocês, mas ver com meus próprios olhos é muito diferente. Bom, está tudo arrumado, Tomoyo.

- Que bom, Kyoshi! Acho melhor você arrumar as coisas no seu apartamento!

- Já fiz isso, depois de passar na faculdade, atrasei um pouco devido a isso. Vou lá em baixo com a nossa mãe, já volto.

- Certo.

Kyoshi deixou Tomoyo novamente com os dois guardiões.

- Bom, muito obrigada por terem vindo. Eu vou pensar bastante no sinal que Eriol deixou e trazê-lo de volta.

- Faça isso! - Kero voltou a sua forma falsa, e saiu pela janela - Boa noite, Tomoyo!

- Tchau, Kero! Até a volta!

O bichinho laranja sumiu no céu noturno estrelado.

- Tomoyo, não se preocupe, você conseguirá.

- Obrigada, Yue. - Ela se levantou - Obrigada mesmo. Se não fosse por você, eu teria descoberto tudo mais tarde, e talvez, fosse tarde demais.

Yue sorriu. De verdade, em uma das únicas vezes na frente da garota. Tomoyo esfregou os olhos e se aproximou, como se quisesse certificar-se de que não sonhava acordada.

- Yue, você...

- Agora que Kerberus foi embora, quero dizer-lhe algumas palavras. - Yue se abaixou, colocando as mãos nos ombros de Tomoyo, lembrando muito Yukito. - Eu consigo sentir os sentimentos de Clow melhor do que ninguém neste mundo, Tomoyo. E eu sei que ele deixou uma pista para você, uma esperança. Ele quer se achado.

Tomoyo apenas ouvia, espantada com aquela atitude de Yue.

- Ele não se daria ao trabalho se realmente não se importasse com você, isso é certo. Portanto, não desperdice todo esse afeto, Tomoyo. Por você, por ele e por todos nós. Não deixe que a amizade de vocês seja destruída por um julgamento apressado.

Ela concordou com a cabeça.

- Obrigado, Tomoyo. - Yue ia se levantando, mas sentiu uma coisa que não deixou-o terminar sua ação. O braço de Tomoyo.

A garota abraçou-o fortemente, e enterrou a face em seu peito. Yue relaxou, acalmando Tomoyo.

- Eu é que te agradeço, Yue... Você fez muito por mim, e eu nunca conseguirei retribuir metade...

- Você realmente é digna do afeto de Clow , Tomoyo... - Yue tinha uma voz muito terna e meiga, completamente diferente da sua postura natural. Parece até que Yukito tinha assumido o controle involuntariamente.

- Não sei...

- É sim, Tomoyo. Eriol não erraria desse modo com as pessoas. Traga-o de volta, sei que consegue. É por isso que herdou os poderes da Lua de Kaho.

Tomoyo abraçou Yue mais fortemente, quase chorando. Não conseguia dizer muito, a não ser vários e vários agradecimentos.

- Obrigada, Yue.

- De nada. Agora, eu tenho que ir, senão Kerberus irá voltar.

Tomoyo soltou o belo guardião, que caminhou para a sacada aberta.

- Yue.

- Sim?

Yue foi surpreendido por um beijo no rosto de Tomoyo. Era um beijo carinhoso, de eterno agradecimento. Uma coisa incomum.

- Obrigada por tudo. Achei que merecia.

Yue estava meio estarrecido, ainda não compreendendo o ato de Tomoyo. Piscou algumas vezes, sacudiu a cabeça suavemente e abriu as asas, flutuando em instantes no céu. Tomoyo acenou para ele, e pode ouvir claramente em sua mente "vai dar tudo certo".

Tomoyo adentrou o quarto novamente. Havia um bilhete no chão, e Tomoyo apanhou-o. Era de seu irmão. Ele disse que não queria interrompê-la mais naquela noite, e dizia para terminar de arrumar as malas e deitar, o resto já tinha sido providenciado.

Tomoyo olhou o relógio. Era muito tarde, para quem tinha que acordar cedo para cumprir uma missão tão grande.

Trocou de roupa, colocando o pijama e caiu na sua cama, adormecendo quase que instantaneamente.

- Tomoyo? Levante, minha irmã.

- Anh?

Tomoyo virou de lado, na direção da voz. Tinha um rosto na sua frente. O rosto era muito familiar. Era...

- Professor Sayuri!! Meu pai, o que faz aqui?

Kyoshi riu.

- Tomoyo, Tomoyo...Você está realmente com sono, não se lembra de ontem à noite?

Tomoyo pensou, tentando acordar. Lembrou-se de tudo, e pediu desculpas:

- Ah, me desculpa, Kyoshi. Acho que é o sono.

- A que horas foi dormir ontem?

- Depois que Yue foi embora.

- Minha nossa, já era tarde. Bom, eu acho melhor se levantar. Temos pouco tempo para ir até o prédio da empresa e pegar um avião para Tóquio.

- Certo!

Tomoyo se levantou, e Kyoshi saiu do quarto, deixando-a sozinha para arrumar as coisas. Tomou banho, vestiu uma linda blusa roxa escura, de um tecido leve, com um corte na parte da manga, deixando a vista uma parte de seu braço. Colocou uma saia até os joelhos que mesclava o roxo da blusa com preto, sendo que tinha um pequeno babado na borda da saia. Vestiu uma meia-calça, prendou o cabelo numa trança cheia de fitas, e deixou alguns fios soltos. Apanhou os sapatos e desceu.

Tomou o café rapidamente, e saiu o mais rápido que pôde, depois de cumprimentar a mãe. Deu um abraço nela, dizendo que sem a ajuda dela jamais conseguiria ter uma chance de trazer Eriol de volta.

Entrou no carro, e Kyoshi já a esperava.

- E as malas?

- São malas pequenas, vão levar para o avião em outro carro. As minhas e as suas.

- Certo... - Tomoyo torcia as mãos, nervosa - Será que isso vai dar certo, irmão?

Ela sentiu uma mão na sua cabeça, fazendo carinho:

- Claro que vai, Tomoyo, claro que vai.

Em alguns instantes eles alcançaram o prédio da empresa. Subiram direto para o último andar, que dava em um gigantesco heliporto.

- Aqui só podem pousar helicópteros, Kyoshi! - Tomoyo tentava ser ouvida, com muita dificuldade, porque o vento assoprava forte.

Kyoshi franziu a testa, com dúvidas também. Chamou com a mão um dos funcionários que estava pelo heliporto.

- O que houve? A senhora Sonomi nos tinha dito que nós usaríamos um avião, no entanto, nos trouxeram para o heliporto da empresa!

- Mil perdões, senhor, não tivemos tempo de avisá-lo sobre a mudança de planos - o rapaz se inclinou, desculpando-se - a senhora Sonomi preferiu designar um helicóptero de grande porte, já que o caminho não é tão extenso assim. As malas já chegaram, e já foram embarcadas. Só faltam os senhores.

- Muito obrigada! - Tomoyo quase gritou, acompanhada de seu irmão, devido ao vento. Que coisa, as pessoas mal podiam se ouvir, e isso estava fazendo-os perder tempo.

Os dois começaram a andar para o aparelho, que já tinha as hélices ligadas. A blusa azul escura de Kyoshi já estava começando a desabotoar-se, devido ao vento forte. Não que isso fosse algo desastroso, afinal, o irmão era belíssimo.

Embarcaram no helicóptero, cumprimentaram o piloto mais o co-piloto e iniciaram o vôo. Durante a viagem, Kyoshi e Tomoyo conversaram muito, mas o assunto geral girava em torno dos poderes que cada um tinha agora, mas tudo conversado muito baixo, para que ninguém da frente ouvisse sobre o que falavam.

- Kyoshi, ajeita o seu cabelo. Assim... - Tomoyo foi um pouco para perto do irmão, considerando que era um banco grande para um helicóptero - Fica melhor.

- Mas, Tomoyo, eu não consigo enxergar direito desse lado, com o cabelo na frente!

Tomoyo tinha jogado um pouco da franja de Kyoshi no lado esquerdo do rosto, não deixando-a distribuída pelo rosto, como sempre. Ele deu uma ajeitada na camisa dele, e desabotoou os primeiros dois botões.

- Pronto.

- O que deu em você, Tomoyo?

- Se vamos fingir ser namorados, - ela sussurrou - pelo menos você vai ter que andar assim. Você é muito bonito, e não deveria fugir muito disso. Assim está melhor.

- Ah, olha quem está falando! A senhorita também é muitíssimo bonita, e nunca reconhece isso!

- Ah, para Kyoshi!

- É verdade, senhorita Daidouji.

- Não é não, senhor Sayuri.

- Senhorita Daidouji, Senhor Sayuri, chegamos. - uma vozinha anunciou por uma espécie de alto-falante minúsculo que estava na parte de trás da cabine do helicóptero.

O helicóptero começou a descer em um heliporto de um outro prédio das Corporações Daidouji. Alguns momentos depois, os dois já desciam e Kyoshi pegava as malas.

- Para onde vamos agora?

- Temos pouco tempo, Kyoshi. Precisamos deixar tudo isso em um hotel e temos que sair atrás do Eriol!

- Tomoyo, nossa mãe já nos mandou a reserva em um hotel da cidade.

- Ótimo. Leve as coisas para lá, por favor.

Os dois foram para o hotel onde Sonomi tinha reservado-lhe quartos. Logo na recepção, Tomoyo encarregou o irmão de ver os detalhes da ocupação do quarto e sobre a reserva, enquanto ela telefonava para o aeroporto.

- Bom dia.

- Bom dia. Por favor, eu gostaria de saber os horários dos vôos para Londres.

- Que companhia aérea?

- Todas, por favor.

- Para que dia?

- Hoje.

- Um instante, por favor.

A mulher do aeroporto pousou o telefone, e foi pegar os horários. Tomoyo já esperava com um lápis e papel na mão, para poder anotar as informações.

Kyoshi foi na direção dela, enquanto ela ainda esperava que a secretária do aeroporto lhe repassasse as informações.

- Tomoyo? Conseguiu?

Ela sacudiu a cabeça negativamente.

- Não, a moça que está falando comigo ainda não me deu os horários.

- Pediu de todas as companhias?

- Pedi.

- Bom, por que não tenta ver se alguma pessoa está registrada para embarcar hoje, com o sobrenome "Hiiragizawa"?

- É uma boa idéia, Kyoshi!

- Eu sempre tenho boas idéias! - riu o irmão.

- E também é sempre modesto desse jeito?

- Claro. A modéstia é uma das minhas virtudes.

- Sei, sei.

- Senhorita? Aqui estão os horários.

- Ah, pode falar, eu tenho onde anotar.

A mulher começou a ditar vários horários de decolagens, e as empresas responsáveis por elas. Eram muitos vôos, e muitos deles já tinham decolado de manhã bem cedo.

- Pode-me fazer outro favor?

- Claro.

- Poderia me dizer se alguém de sobrenome Hiiragizawa está registrado para embarcar hoje?

- Sim, isso é mais rápido, apenas basta efetuar uma busca no terminal... Bom, tem o nome completo da pessoa?

- Eriol Hiiragizawa.

- Um instante, por favor.

- Ai.

- O que foi, Tomoyo?

- Da última vez - Tomoyo tampou o fone - que ela me disse "um instante" não foi nada rápido...

Kyoshi riu.

- Que coisa!

- Não dê risada, é sério!!

Ele riu mais ainda.

- Tomoyo, estamos parecendo mesmo um casal de namorados. Até as brigas são parecidas.

- Nós não precisamos fingir aqui.

- Não, eu acho melhor praticarmos. Mas não vai ser nada chamativo, você me conhece.

- Muito bem, para o cargo de meu professor, mas como meu irmão muito pouco, senhor Sayuri.

- Prometo me comportar, maninha... - ele passou um braço por cima do ombro de Tomoyo, afagando os cabelos de leve dela e depois se separou. - Promessa de Kyoshi Daiouji e de Kyoshi Sayuri.

- Acho bom.

- É, aliás, eu também acho. Meu emprego está em jogo, se eu não for discreto, sou demitido.

- Que maravilha!

- Hum-hum. Mas sem o sarcasmo, por favor. - pediu ele.

- Tá bom, tá bom... Como estão registrados os quartos? Seu nome?

- Sim, estão no meu nome, afinal, você ainda é menor.

- Tinha me esquecido disso...

- Mas eu não! Estão no nome de Kyoshi Sayuri e Tomoyo Daidouji.

- Ah, então tá.

- Desculpe a demora, senhorita... - Tomoyo fez com a mão para que o irmão parasse um pouco de fazer palhaçadas, porque ela precisava escutar a funcionária do aeroporto um pouco.

- Imagina, não foi nada... Kyoshi, fica quieto. Ah, me desculpe.

- Não foi nada. Senhorita, ninguém com o nome de Hiiragizawa embarcou ou pretende embarcar hoje.

- O nome não foi registrado?

- Não, ninguém.

- É possível que isso tenha acontecido ontem?

- Ontem? Não, não, consultei os registros das passagens desta semana.

- Ah, muito obrigada, então...

- Disponha. Procurava esta pessoa com urgência?

- Sim, e muita. - ela tampou o fone - Kyoshi!! Para! - Kyoshi agora imitava Tomoyo no telefone, e ela quase não conseguia falar direito.

- Bom, ele pode ter comprado a passagem no nome de outra pessoa, a senhorita já considerou isso?

Tomoyo raciocinou um pouco: a moça estava certa. Deu uma ligeira cotovelada no irmão, que parou de brincar.

- É verdade. Bom, eu estou indo para aí, obrigada!

- De nada. Sempre às suas ordens.

Tomoyo desligou.

- Kyoshi! Em um assunto desses você fica me distraindo? - Tomoyo queria puxá-lo pelo colarinho.

- Eu? Eu estava tentando diminuir sua tensão. Você não aparenta, mas está muito nervosa, minha irmã.

- Tudo bem, me desculpe, mas da próxima vez, tente me dizer antes que tem boas intenções... Vamos, para o aeroporto de Narita.

- Como você tem tanta certeza de que vai conseguir achá-lo? A mulher te confirmou o que queria?

- Pelo contrário. Não tem registro nenhum de alguém com o nome "Hiiragizawa".

- Agora eu quero saber mais ainda por que acredita que vai encontrá-lo...

- Eu te explico no meio do caminho, vamos!

Os dois saíram às pressas do saguão do hotel, e entraram em um dos táxis que estavam sempre parados na frente do prédio majestoso. Kyoshi logo informou o destino ao motorista e disse que tinham muita pressa.

- Agora me explica...

Tomoyo mandou mentalmente um aviso antes, torcendo para que ele chegasse e seu irmão entendesse. Afinal, ainda não sabia se sua telepatia funcionava muito bem...

"Escuta, maninho, quem me disse isso foi o Yue, mas eu vou chamá-lo de Yukito, tá? É um nome estranho demais para o motorista não notar."

"Tá. Nossa, domina a telepatia tão bem assim?"

Tomoyo suspirou.

"É, acho que sim!"

- Bom, eu acho que vamos achá-lo por dois motivos. O primeiro: Yukito me disse algumas coisas que me deram esperança. Eu acho que ele tem toda a razão, e as coisas que ele falou fazem bastante sentido.

- Hum, plausível. O segundo.

- Esse você não entende.

- Por que não?

- Porque não entende.

- Qual é o problema?

- Você é homem.

- Esse é o problema?

- É.

- Ah, Tomoyo, fala logo.

- Eu já disse que não adianta e ainda sim quer saber?

- Claro, eu acho que consigo compreender também. Sexto sentido.

- Quase, tente de novo.

- Anhhhh...É o troco daquela hora do telefone, não é?

- Não exatamente...

- Fala, por favor!

- Tudo bem. Intuição feminina.

Kyoshi ficou mudo, sem nem piscar os olhos direito.

- É, você tinha razão.

Tomoyo sorriu:

- Eu avisei.

- Chegamos.

Os dois pagaram o motorista, e desceram. Se misturaram no meio da multidão, tomando cuidado para que não se perdessem um do outro. Quando iam entrar no aeroporto, foram surpreendidos por uma enorme fila.

- O que é isso?

- Não faço idéia, deixa eu perguntar.

Kyoshi foi até a fila imensa. Ainda arrumado do jeito que Tomoyo tinha feito no helicóptero, várias garotas mais novas da fila ficaram muito contentes em dar informações para ele. Tomoyo estava parada, esperando que seu irmão terminasse. Cruzou os braços, olhou o relógio... O relógio! Cada minuto perdido era um perigo!

Do nada, ela quase caiu para trás quando recebeu uma mensagem telepática de seu irmão. Ela estava bem mais acostumada com o procedimento de envio delas, não o de recebimento.

"Tomoyo!!! Me salva, essas garotas não me deixam ir embora!"

Tomoyo começou a enrolar a ponta do cabelo.

"Você tem vinte e três anos, pode se sair desta muito bem e sozinho, não?"

"Ah, maninha! Por favor, são...Espera, deixa eu contar..." - Tomoyo riu nessa hora - "São cinco! Me bombardeiam com perguntas o tempo todo!"

"Tá, tudo bem, estou indo."

Tomoyo caminhou até onde as cinco garotas riam e faziam Kyoshi responder a várias perguntas. Ele respondia solícito, mas Tomoyo percebia que ele estava desconfortável.

- Mas você chegou com quem aqui em Tóquio? - uma delas perguntou.

- Comigo. - Tomoyo apoiou-se no braço dele, e lançou um olhar apaixonado falso para seu irmão. Ele correspondeu, passando o braço pelo corpo de Tomoyo e agradecendo a informação.

- Minha namorada. Até mais.

As cinco murcharam rapidamente. Chegaria até a ser engraçado. De repente, a fila começou a andar bastante rápido, e os dois foram logo atrás.

- A polícia estava revistando todo mundo que entra no aeroporto. A revista é rápida, mas sabe, o aparelho deles quebrou há alguns minutos. Por isso a demora, tiveram que pegar um reserva do outro lado do terminal.

- Nossa...

Não demorara muito e os dois estavam dentro do saguão do aeroporto, depois de terem passado pela revista. O aeroporto estava lotado naquela hora.

- Tomoyo, como é que pretende encontrá-lo aqui dentro?

- Não sei, não sei... Só sei que preciso achá-lo!

- Certo, o que a sua intuição feminina lhe diz?

- Sem sarcasmo, lembra?

- Certo, não é hora para isso. Que tal fazermos assim: eu vou para o lado de lá, e você para lá, olhando dentro de cada loja e tudo mais. Menos no banheiro feminino, claro.

- Nos encontramos aqui?

- Ali, naquela máquina de refrigerantes, tá bom?

- Tudo bem. Sem limite de tempo.

- Sem limite. Boa sorte.

Os dois se abraçaram, e foram cada um para seu lado.

Tomoyo se desviava das pessoas com uma rapidez impressionante, tendo em mente apenas um único objetivo: encontrar Eriol.

Ela pensava em onde ele poderia estar naquele lugar tão grande, de onde pessoas do mundo inteiro apareciam.

Depois de procurar em muitos lugares, ela sentiu que um pouco de cansaço começava a dominá-la. Sentou-se em um banco, que estranhamente não estava ocupado.

Encostou a cabeça e fechou os olhos, levando a mão ao pingente. Não desejava ver o báculo, isso era certo, mas aquele gesto parecia conseguir concentrá-la melhor.

Pensou nas palavras de Yue. Eriol tinha deixado um aviso... E uma pista. Mas que pista era aquela? Ela deveria ter perguntado quando estava em Tomoeda, agora não o podia fazer. O que seria a pista? Seria algo tão complexo assim, digno de Clow? Tomoyo esperava que não, porque não conhecia o Mago Clow tão bem assim para conseguir decifrar.

No entanto, ela lembrou de um detalhe importante: não conhecia Clow, mas conhecia Eriol. E Yue disse que Eriol, Eriol mesmo, não Clow, desejava ser encontrado. Então, a pista deveria estar na frente dela e ela não deveria ter visto...

Uma cesta com flores. As flores murcham, a cesta fica. Algum tempo depois, se a cesta não for abastecida com flores novamente, acabará perdendo sua utilidade, e aí sendo jogada fora. Aquilo podia lhe dizer algo?

Então, num lampejo, Tomoyo achou a pista. Eram as flores! Ela precisava encher a cesta com as flores novamente! Mas não eram flores no sentido figurado, eram flores de verdade! Eriol deveria estar na floricultura do aeroporto!

Levantando num estalo, assustando algumas pessoas, inclusive, Tomoyo desandou a correr, tomando cuidado para não trombar nem machucar ninguém.

Por sorte, a floricultura ficava para aqueles lados, logo estaria lá. Pareciam os minutos mais longos da vida de Tomoyo.

Avistou ao longe um lindo vaso de rosas que enfeitava a porta do estabelecimento. Era bastante grande, e Tomoyo quase derrubou uma pessoa que saía com um enorme embrulho de flores, de tanta excitação. Poderia estar perto da solução?

Entrou, olhando tudo com atenção. Saindo do caminho das pessoas, olhava as vastas prateleiras com vasos de todos os tipos imaginários de flores.

Entrou na parte onde tinham algumas magnólias. Adorava aquela flor, e lembrou que tinha recebido um buquê delas, vindo de Eriol, há muito tempo... Bons tempos.

De repente, viu que não estava sozinha no corredor. Um jovem, de cabelos escuros, quase azuis e bem curtos, estava parado de costas para ele. Ele parecia usar óculos, dava para ver uma parte prateada do aro.

Tomoyo piscou algumas vezes e começou a andar até onde o jovem estava. Parou a alguns centímetros dele:

- Eriol...?

O jovem se virou, parecendo surpreso. No instante seguinte, abriu um imenso sorriso. Eriol Hiiragizawa se encontrava diante dela.

- Sim.

- Eriol!!! - Tomoyo jogou os braços ao redor dele, enterrando a face no ombro direito dele. Ele, por sua vez, confortou-a, dando um abraço e acariciando suavemente os cabelos de Tomoyo.

O nome do jovem mago devia ter sido pronunciado várias vezes, mas somente a última delas foi alta o suficiente para ser ouvidas entre os soluços incessantes da garota:

- Eriol...

FIM DA QUARTA PARTE

Olá para todos outra vez! Desculpem-me pela falta de atualização, mas a inspiração não anda me ajudando muito, meu Deus! =( Eu tentei não terminar "na melhor parte", escrevendo algumas linhas a mais do que eu geralmente estipulo! =)

Bom, como sempre, comentem sobre o novo capítulo! Os comentários podem ser enviados para o meu e-mail, que é mari-chan.mlg@bol.com.br, ou postados no próprio site.

Até a próxima! Super beijos para todos que me apoiaram até agora,

Mari-chan.