CAPÍTULO 7 – SOMBRA DE UMA RESPOSTA

Tomoyo desligou o aparelho, devolvendo-o a base na mesinha, e se apressou em vestir a primeira roupa que viu pela frente. Por um golpe do destino, mesmo nas horas críticas, a roupa de Tomoyo era sempre bonita. Se tratava de uma calça preta com uma blusa de manga três quartos esvoaçante. Prendeu o cabelo em um rabo folgado logo abaixo da nuca, apanhou sapatilhas negras e desceu voando pelo lado de fora, com ajuda de magia. Com o maior cuidado, só faltava atravessar o portão principal.

Quando ia saindo para a rua, uma mão que prendeu seu braço fez Tomoyo gelar, mas ao ouvir a voz da pessoa, se acalmou.

- Não pense em ir sem mim.

- Certo, então. Vamos, Kyoshi. Estamos perdendo tempo.

Transpuseram com efeito o portão, e mal começaram a andar, deram de cara com Eriol, Nakuru e Suppi, que estava flutuando, na sua forma falsa. Todos ali pareciam ter uma ligação, pois era Tomoyo ser avisada para todos darem as caras, sem que qualquer contato entre eles tivesse acontecido de fato.

- Vão à casa dos Kinomoto, não?

- Vamos. Vai com a gente, Eriol?

- Vou sim. Desta vez é importante.

- E Nakuru e Suppi? Vão também?

Eriol soltou um suspiro pesaroso. Tomoyo olhou melhor, e Eriol tinha um semblante cansado, como se não agüentasse mais aquilo.

- Tente impedir Nakuru de visitar seu "Touyazinho", não importa a hora. Eu não descobri ninguém até hoje que fosse capaz disso. Acho que dou até um doce para a pessoa.

Tomoyo e Kyoshi riram, e ela se voltou para o irmão com um olhar estranho, voltando-se novamente para Eriol.

- Acho que sei de alguém.

- Heeeeey!!! Vamos ou não vemos ver o Touya? Vamos, vamos!!

Nakuru dava pulinhos e quase gritava, apressando todos. Suppi também parecia bastante entediado com aquela situação.

- Nakuru, se você não ficar quieta, vão nos descobrir!

- Então não fiquem aí parados, sem fazer nada! Que agonia que me dá! Vamooooooooos logo, o Touya está esperando a gente! Vamos Suppi!

- Suppi? Quem é Suppi?

Ante as brigas que eram quase impossíveis de serem apartadas, os outros três decidiram ir o mais rápido possível, afinal, segundo contara Tomoyo posteriormente, o tom que Touya tinha lhe falado no telefone era um incomum tom de urgência, que ela ouvira pouquíssimas vezes.

Os cinco dispararam pelas ruas, correndo o mais rápido que podiam. Por diversas vezes Tomoyo pensara em recorrer à magia, mas o fato de ser uma sexta-feira fazia com que algumas pessoas ficassem até mais tarde nas ruas, impossibilitando esse método. Restava a corrida.

Não demoraram muito, já estavam no destino desejado. No entanto, havia o problema de Fujitaka estar em casa, e ele não poderia ver Suppi. Nakuru escondeu a criatura, que estava novamente revoltada, como conseqüência de ficar sendo entalada em lugares quase sempre quentes e pouco espaçosos.

Quando Kyoshi ia tocar a campainha, deram de cara com Touya, que abria a porta. Por mais que tivesse dado seus poderes para Yukito não desaparecer há anos atrás, parecia que um tipo estranho de sensibilidade nunca o abandonava. Era certo que a voz estridente de Nakuru era suficiente para que qualquer um percebesse a presença deles, mas naquele momento, Nakuru estava particularmente quieta. Estava.

- TOOOOOUYAAAA!!!!!!! – a garota se adiantou, pulando de fato no pescoço do rapaz, que foi para trás com os peso inesperado, sacudindo os braços.

- Me solta, Akizuki! – Reclamava Touya no seu tom normal de irritação que tinha, parecendo até reservado para ela. Ele nunca gostara desses ataques de Nakuru, e dificilmente a chamava pelo nome, evidenciando uma má vontade tremenda em relação a alguma aproximação entre os dois.

- Que saudade, Touyazinho! Não diga que não ficou feliz em me ver? – Nakuru não dava mostras de se soltar, deixando os outros três perplexos do lado de fora. Eriol era o mais cômico, com uma cara de profunda exasperação.

- Não me chame desse jeito! E não senti a sua falta coisa nenhuma. Agora me SOLTA! – Touya estava ficando bravo de verdade, e Nakuru resolveu descer, chateada.

- Insensível! – Nakuru desceu do pescoço do rapaz, que ficou massageando-o, enquanto conversava com os outros três seres abobados, mesmo Eriol e Tomoyo, depois de terem visto aquelas ações de Nakuru tantas vezes. O que mais parecia estarrecido era o jovem professor, meio que não acreditando no que tinha visto, ainda do lado de fora da casa.

- Por favor, entrem. Preciso muito falar com vocês.

- Obrigado, Touya. Com licença. – os três adentraram a casa, e sentaram-se nos sofás, após serem convidados por Touya. No entanto, Nakuru já estava folgadamente sentada, como se a casa lhe pertencesse.

Kero surgiu descendo as escadas, voando para Tomoyo. A garota cumprimentou o bichinho amarelo, e prometeu que da próxima vez traria um delicioso doce para ele.

Ao ver que Kero se encontrava na casa, Suppi imediatamente saiu de dentro do bolso da blusa de Nakuru, indo reclamar que Kero tinha alterado o placar de algum jogo de videogame, e contestava veementemente a sua superioridade.

- O senhor Fujitaka não está em casa? – estranhou Tomoyo

- Não, ele está viajando a trabalho. Só deve voltar na segunda-feira, mesmo. – terminou Touya.

- Foi o que imaginei. – falou Eriol.

- Caso contrário, Kerberus e Spinnel não poderiam estar voando desse jeito por aí, claro. – terminou Kyoshi, vendo que os dois se dirigiam perigosamente em direção a um vaso apoiado em uma mesa. Ele fez menção de contê-los, mas uma voz o deteve.

- Não se preocupe, senhor Kyoshi. Eles não vão bater.

Yukito acabava de ter falado isso, e vinha da cozinha, com chá e biscoitos. Sorridente, cumprimentou a todos com sua natural cordialidade, e ofereceu chá e biscoitos, mais as desculpas por tê-lo chamados tão tarde e causar tantos problemas.

- Então... Foi você que nos chamou, Yukito? – perguntou Tomoyo.

- Sim, fui eu.

Touya tomou a palavra:

- Em parte. Depois que vocês foram embora, eu estava conversando com Yukito que vocês tiveram esse problema, e não conseguiam lembrar de algumas coisas que tinham acontecido. Então, Yukito comentou que estava se sentindo estranho desde que viera para minha casa, que era quando Yue havia voltado de Tóquio. Certo?

Yukito concordou com um aceno de cabeça e continuou:

- Além dos desmaios, eu estava tendo alguns problemas. Eu tinha lembranças de certas experiências. Vagas, mas estranhas, das quais eu não lembrava de ter tido.

- Tomoyo se lembrou que, há muito tempo, logo que recebeu seus poderes, ela fazia movimentos em relação à magia e falava coisas que nunca havia escutado ou aprendido antes. Tinha as recordações, mas ela nunca tinha vivido as mesmas, eram na maioria, de Kaho Mizuki. Será que poderia ser algo desse tipo que estaria acontecendo com Yukito?

Todos se inclinaram levemente para a frente, interessados no que deveria se seguir.

- E então? O que aconteceu? – a pergunta partiu de Kyoshi, cujos olhos ameaçavam saltar das órbitas, e brilhavam intensamente, devido a curiosidade.

- Bom, eu achei que podiam ser minhas, já que eu não me lembrava de certas coisas devido aos desmaios. Pensei que deviam ser as sombras de algumas respostas para o preencher as partes negras das quais não lembro, mesmo sabendo que isso acontece quando o meu outro eu aparece. No entanto...

Yukito fez uma pausa. A tensão era tanta na sala que um fio de cabelo poderia cortá-la. Até Nakuru estava mortalmente quieta.

- No entanto... – repetiu o jovem – Achava que essas imagens deveriam ser familiares de algum modo para mim, mas não são. Tenho várias de Nakuru, Tomoyo, Eriol... Da casa de Tomoyo, de lugares que não conheço, de uma sala de aula... Mas, no entanto, o que me assustou mais foram...As lembranças que eu tenho de Kyoshi.

Todos se entreolharam. Aquilo realmente era estranho.

- Kyoshi...Me perdoe a pergunta que pode parecer estranha, mas você é professor?

O mesmo assentiu, pasmo. Como Yukito poderia saber?

- Mas...Mas...Yukito, nós nos conhecemos hoje, mais cedo.

Ele confirmou com a cabeça.

- Exato. A sua visita fez com que eu pensasse mais nas minhas lembranças. Como posso ter lembranças suas se não o conhecia? Aí falei para Touya, e ele ligou imediatamente para Tomoyo...

Agora fazia sentido o tom de urgência na voz de Touya.

- Mas é bem estranho isso... Lembranças assim, na sua mente... Por que você as teria? Não faz sentido! Quero dizer...Eu também tive certas lembranças e sabia fazer certas coisas há um tempo atrás, mas eram reflexos da memória da pessoa que me passou os poderes que tenho agora. Eu sabia que não tinha vivido aquilo, mas pelo menos, sabia de onde eram. – murmurou Tomoyo.

- Agora parece diferente com Yukito, não? – perguntou Kero. O companheiro de todas as tardes de videogame, Spinnel, apenas concordou.

Porém, Eriol e Touya se olharam no mesmo momento, com um sorriso quase imperceptível nos lábios. Falaram ao mesmo tempo:

- Entendi.

Os outros se voltaram para os dois.

- Entenderam o quê? – perguntaram Nakuru e Tomoyo juntas

- Como? – foi a vez dos outros dois rapazes falarem em uníssono.

Todos riram, e a tensão foi cortada. Pararam de falar aos pares, e Eriol tomou a palavra a discussão, depois de pedir esse favor para Touya.

- Acho que todos nós nos esquecemos de um detalhe importante. Yukito tem outra forma, assim como Yue também. Nós esquecemos que não foi apenas Yue quem esteve em Tóquio, mas também Yukito, em um estado de dormência, enquanto Yue agia. Entretanto, é possível que durante a troca dos corpos, a parte da memória que procuramos não estivesse na memória de Yue. E sim na de Yukito, afinal, são as mesma pessoa. – Eriol sorriu.

Todos pareceram ponderar o sentido do que Eriol acabava de falar. Era verdade... Como tinham deixado esse detalhe escapar? Bom, agora pelo menos sabiam onde elas estavam.

- Bom, de quem mais você lembra, ou de que lugares? – perguntou Tomoyo.

- Eu...Eu lembro de mais algumas pessoas... Uma garota loira, de olhos azuis, com um rapaz que lembra bastante os traços dessa mesma garota... Também loiro...

- Pode ser alguém que conhecemos? – indagou Eriol.

- As duas únicas pessoas que me lembram por serem diferentes de nós são Nathalia e Vincent. É esse o nome do irmão, não?

- Hum-hum, Vincent e Nathalia O'hana. Pode ser, Kyoshi.

- Mais algo, Yuki? – perguntou Touya.

- Hum... Muito vago, pessoas que não apareceram tanto assim, só contornos difusos... As pessoas que mais aparecem são Tomoyo e essa menina loira, que vocês acham que se chama Nathalia. E... Muitas imagens de uma lua, estranha e bastante brilhante.

- E quanto a lugares?

- Lugares... Tomoeda, bem claro. No entanto, algumas cidades, acho eu... Não são japonesas, uma parece inglesa... Londres, acho. E algumas outras, que não sei quais são. São apenas casas e regiões próximas delas, mas não existe ponto turístico algum que ajude a decifrar isso...

Todos ficaram em silêncio por um período de tempo, tentando entender aquilo. Eram respostas vagas, sem dúvidas, mas dava para traçar de leve o perfil daquela pessoa.

- Bom, me parece... Que essa pessoa segue nossos passos.

- Isso já é sabido. Aliás, ela sempre está por perto quando estamos em apuros. Ela é a responsável por esses apuros, e para nos envolver, tem que saber onde estamos, não é mesmo?

- É, pode ser, Tomoyo. Mas eu ainda não tenho idéia de quem é... Pode ser qualquer pessoa que tenha contato com a gente durante as aulas! Alguém em que nunca prestamos atenção... – ponderava Kyoshi.

- Pode ser um completo desconhecido sim, Kyoshi. Mas que sentido isso faria? Lembra-se que hoje mesmo falou que deveria ser conhecido nosso, porque senão não teria tantas preocupações em ocultar a identidade, agindo por outras pessoas?

- É...É verdade. Bom, acho melhor irmos embora. Já está ficando muito mais tarde, e aposto que vocês devem querer descansar. – disse Eriol, se levantando, e lançando um olhar a Nakuru, que no meio da conversa tinha mudado de lugar e agarrava o braço direito de Touya.

- Vamos, Nakuru.

- Anh...

- Vamos. Agora. – Eriol tinha que ser enérgico para que Nakuru deixasse Touya em paz.

- Tá bom... – soltou vagarosamente Touya, que assim que se viu livre de Nakuru, massegeou o braço também, dolorido. Yukito tinha um sorriso no rosto.

- Boa noite. Eu acompanho vocês até a porta. – Touya se levantou, e manteve uma distância considerável de Nakuru.

- Boa noite para todos, e obrigada por chamarem! – agradeceu Tomoyo – Até mais ver.

Todos se despediram e foram embora, bastante confusos. Era tudo muito estranho, aquelas andanças... E a pessoa sempre os seguindo...

- Eu me pergunto porque essas pessoa se lembra tanto da Tomoyo...E da Natahalia. Sem contar que para mim, a parte mais estranha foi a Lua.

- A Lua, Eriol? – perguntou Nakuru.

- Sim, a Lua. Isso quer dizer que talvez, para essa pessoa, a Lua tenha um significado especial, assim como para a Tomoyo, Yue ou até mesmo você, Nakuru. Mas no entanto...Não faço idéia do significado em si mesmo.

- Uma coisa que me intriga também é o fato dessa pessoa misteriosa conseguir com tanta rapidez os nossos passos. Se é uma pessoa da escola, nunca falamos abertamente sobre isso lá, e a tal pessoa está sempre atrás de nós.

- Deve nos conhecer muito bem para adivinhar desse jeito.

- Não, não me parece simples adivinhação, Nakuru. – completou Eriol – Esse indivíduo calcula suas ações meticulosamente.

- Até as viagens, que coisa... – murmurou Kyoshi.

- Sim, até mesmo essas, sendo que a vez de Tóquio, por exemplo, foi uma coisa completamente sem aviso, sem data marcada nem nada... – falou Eriol.

- Sem data marcada para alguns. – sorriu Tomoyo em resposta.

Continuaram andando, e chegaram logo nas duas casas.

- Outra coisa que chega a me assustar é a disponibilidade dessa pessoa. Sempre tão colada em nós, parece que nem faz outra coisa! – resmungou Kyoshi – Ai que raiva...

- Senhores? São a senhorita e o senhor Daidouji?

Um homem vestido completamente de preto apareceu no portão, chamando Tomoyo e Kyoshi. Os dois se viraram para Eriol e Nakuru, com Spinnel nas mãos e se despediram com o olhar. Quando olharam de volta, parecia que tinham sumido nas sombras.

- Sim, somos nós. – Kyoshi passou um braço em volta de Tomoyo e os dois andaram para a luz que vinha entrecortada pelos vãos que haviam no portão.

- O que os senhores fazem tão tarde aí fora? Vamos, entrem, entrem! A senhora Sonomi está deveras preocupada com os senhores, desde que tinha chamado a senhorita para entregar algo...Entrem!

Trocando olhares, os dois entraram na casa, imaginando a desculpa que teriam de inventar para Sonomi. Todas as vezes que saíram da mansão, não tinham sido pegos, mas agora deparavam-se com um segurança na porta. Que situação...

Adentram a casa, descalçaram os sapatos e foram rapidamente ao encontro da mãe, que estava andando em círculos na sala. Foram anunciados pela voz potente do homem que os tinha achado.

- Estão aqui, senhora.

- Ah, graças a Deus! – Sonomi correu e os abraçou, unindo os dois em um grande abraço. Tomoyo sentia a mãe muito preocupada. – Obrigada, pode se retirar, Hiroshi.

O homem saiu, e não demorou para que apitos soassem e de acordo com algum código, as buscas por Tomoyo e Kyoshi cessaram.

Sonomi soltou os dois, e se sentou em um dos grandes sofás. Os outros dois fizeram o mesmo.

- O que aconteceu, meus filhos? Vocês não imaginam o que aconteceu aqui...Eu havia esquecido de entregar uma carta para Tomoyo, e quando fui ao quarto dela...Sumida! Quando vou chamá-lo, Kyoshi...Não o encontro. As empregadas da casa não ouviram nada, nem viram os dois. Os seguranças também não relataram nada de anormal.

Tomoyo e Kyoshi trocaram olhares. Que não os tivessem visto dentro de casa era uma coisa. Mas não terem sido vistos no portão...Aí já era demais. Precisavam trocar aqueles guardas, que não vigiavam nada.

- Me desculpe, mãe. Foi tudo culpa minha. – respondeu Tomoyo.

- Como assim, minha filha? Sua culpa?

- Sim, foi. Eu recebi um telefone de Touya, ele disse que precisava da minha ajuda, porque Yukito tinha desmaiado, e o senhor Fujitaka estava viajando. Como já era tarde, ele pediu desculpas, mas eu fui assim mesmo.

Os olhos de Sonomi faíscaram:

- Viajando! Quando se tem problemas assim em casa! É um irresponsável, não deveria ter casado nunca com a minha querida Nadeshiko! – mas logo voltou ao normal – Mas, continue.

- Quando estava saindo, Tomoyo fez barulho, e eu a achei no corredor. – Kyoshi engatou na mentira de Tomoyo. Bom, não tão mentira assim. – E eu falei que iria com ela de qualquer jeito, porque era perigoso ela sair àquela hora da noite para a rua, mas achei que se era para ajudar o senhor Tsukishiro, valia à pena.

- Você o conhece, meu filho?

- Sim, de hoje à tarde.

- Entendo. Bom, devem ter tomado muito cuidado ao sair, porque ninguém os viu... Entendo, estão perdoados, têm seus motivos, mas poderiam muito bem ter me avisado antes de saírem assim. Não façam isso novamente, por favor. – Sonomi estava realmente aliviada de ter os dois filhos de volta na casa, mas não escondia os recentes traços de preocupação.

- Desculpe. – os dois se desculparam juntos.

- Não vamos fazer isso de novo, minha mãe. Eu lhe garanto. – falou Kyoshi.

- Acredito em vocês. Acho melhor irem dormir, boa noite.

- Boa noite. – despediram-se os dois.

Tomoyo já ia pela metade da escada quando lembrou:

- Mãe! E o que tinha para me entrgar?

- Ah, sim! É uma carta que chegou anteontem, senão me engano! É urgem, mas esqueci de entregá-la antes a você. Desculpe, Tomoyo. Receio que a resposta é só até amanhã.

- Ah, tudo bem! – Tomoyo desceu as escadas e apanhou a carta, deu mais um beijo em sua mãe e tornou a subir as escadas, acompanhada por Kyoshi.

- O que é isso? – perguntou Kyoshi, olhando por cima do ombro da irmã.

- Sei tanto quanto você. – Tomoyo abriu a carta, e viu que era de um clube deveras imponente e famoso, além de caro e chique. Sua mãe já a tinha levado lá quando era pequena, mas como os negócios tinham crescido, não renovaram como sócios do clube novamente, e perderam o direito de freqüentá-lo.

- Não de um clube que você e a mamãe iam? – perguntou Kyoshi.

- É sim... Será que querem renovar o contrato, depois de tanto tempo?

- Abre logo e para com o suspense! – os dois estavam na frente do quarto de Tomoyo, e entraram.

- Ah, olha quem fala! A carta nem é para você, e como se fosse algo super espetacular e como se eu estivesse enrolando para abrir o papel e descobrir sobre o que se trata essa carta que foi...

- Tá, tá, tá! O que é? – Kyoshi sentou de frente para Tomoyo, no chão, sendo que ela tinha deitado em cima da cama, de frente para ele.

- Minha nossa! É um convite!

- Um convite? Para voltar a ser sócio?

Tomoyo sentou o envelope na cabeça do irmão.

- Parece que só tem ar aí dentro, às vezes! Não, Kyoshi! Para um concerto!

- Ueba! Para a família inteira!

- Não, não é para assistir...É para que eu toque piano! E tenho que responder até amanhã! – Tomoyo saltou da cama e apanhou uma caneta, para escrever a resposta.

- Nossa! Dá-lhe maninha! Amanhã...Ah, amanhã não tenho aula com você... Bom, eu falo para alguém contar isso na escola.

- Não! Eu não quero que espalhe isso, só para alguns.

- Não acredito! Não vou poder ficar me achando porque você é demais?

- Não, oras... – Respondeu Tomoyo enquanto respondia.

- Ah...Que pena... – Kyoshi fez uma cara de abandono total.

- Tá bom, tá bom...Não ainda. – sorriu Tomoyo.

- Tá! – o irmão sorriu e se levantou. – Até amanhã, maninha. – beijou a testa de Tomoyo e foi embora.

Tomoyo terminou de responder, dizendo que aceitava com prazer, e queria saber quando seria o concerto. Colocou o envelope na mesa de cabeceira e deitou rapidamente, após por o pijama. Olhou no relógio. Quase 1:00 da manhã. Não imaginava que tinha gasto tanto tempo assim. Mal virou para o outro lado, adormeceu.

- Bom dia! – Tomoyo desceu as escadas com o material da faculdade e com a carta na mão, para enviá-la.

- Bom dia! - Cumprimentou Sonomi da mesa do café – Seu irmão saiu sem tomar o café?

- Não sei... – Tomoyo se sentou, colocando o material em uma cadeira ao lado – Ele apenas me disse que tinha uma reunião mais cedo hoje, e que ia embora antes de mim.

- Bom, eu não o vi hoje, se bem que parece impossível de achá-los, não é mesmo? Parecem que somem no ar, ou descem voando pelas sacadas!

Tomoyo riu:

- Se pudéssemos!

- E o que era a carta?

- Ah! Um convite! – Tomoyo explicou tudo rapidamente, dizendo que aceitava, e ia postar logo a resposta no correio.

- Meu Deus, Tomoyo! Parabéns! – sorriu Sonomi, orgulhosa do prodígio da filha.

Tomoyo e Sonomi se viraram para a direção da escada, de onde ouviram um barulho que parecia aumentar. Parecia alguém correndo rapidamente.

- Que é isso? Alguém a essa hora da manhã fazendo tanto baru...

- ESTOU ATRASADO!!!

Tomoyo observou a figura de Kyoshi entrar feito um raio na sala de jantar, com o cabelo semi-penteado e a camisa ainda não inteiramente abotoada. Colocou um sanduíche na boca, apanhou uma pasta que estava sobre o móvel atrás da mesa e saiu porta afora, afobado. Tomoyo e Sonomi assistiram a tudo atônitas, e só ouviram ele gritar:

- Até mais, mãe, Tomoyo!

Sonomi se virou para a filha:

- É, parece que Kyoshi não tinha saído ainda... Agora, porque ele levou a pasta das provas...

- Provas?

Sonomi confirmou com a cabeça.

- Sim. Ele levou a pasta onde estavam as provas que ele corrigiu da sua sala. Me falou ontem, em algum momento. A com os planejamentos dele fica no escritório dele...

Tomoyo engasgou:

- Dele? É só dele?

Sonomi riu:

- Ora, temos tantos cômodos vagos que eu fiz um escritório para ele. Kyoshi anda atarefado, não quer nem mesmo que as empregadas arrumem lá, porque senão "não vai achar nada nunca". Acho o contrário. Deve estar uma bagunça... – Sonomi fez uma cara não muito animadora.

- Então eu vou levar a pasta para ele... É melhor eu ir embora. Tchau, mamãe. – Tomoyo beijou Sonomi, pegou as suas coisas e subiu correndo até o recém-descoberto escritório do irmão, onde apanhou a pasta. Realmente estava uma bagunça o lugar. Ainda bem que a tal pasta estava em cima da mesa, com um adesivo colado nela, escrito com letras garrafais "PLANEJAMENTO". Ainda bem. Senão só iria achar a bendita pasta um mês depois.

Foi o mais rápido que pôde para a escola, sendo que ainda tinha um certo tempo para que as aulas começassem de fato. Ao entrar pelo portão, deu de cara com Natahalia.

- Tomoyo! Bom-dia!

- Bom-dia, Nathalia! Tudo bem? – Tomoyo estava ofegante da corrida. – Eu preciso fazer algumas coisas, com licença. Nos vemos mais tarde! - e entrou feito um raio no prédio da escola. Nathalia não entendeu nada, ficou apenas olhando.

Tomoyo vôou entre os corredores, e descobriu que não fazia idéia de onde era a sala de reunião dos professores, afinal, nunca fora chamada lá ou coisa do gênero... Ótimo. E como era mais cedo, funcionário algum estava trabalhando, nem mesmo os responsáveis pela secretaria ou pela limpeza.

E agora? Tomoyo bateu com a mão na própria cabeça, que coisa mais óbvia! Nessas horas, poderes telepáticos eram realmente uma coisa boa!

"Kyoshi! Kyoshi, onde você está?"

"Tomoyo?"

"É sim! Onde é a sala de reunião dos professores?"

"Terceira sala da direita, no segundo andar. Por quê?"

"Olha a pasta que você tem no seu colo."

O irmão demorou para responder.

"A pasta das provas...Que coisa, chego atrasado e ainda troco as pastas! E agora?"

"Estou com a sua pasta correta. Estou indo aí. Se você sair, será pior."

"Tá bom...Eeeei! Você entrou no meu escritório! Isso não se faz!"

"Esquece, está me devendo um agradecimento, não uma reprimenda!"

Tomoyo subiu voando para a tal sala que o irmão, mal-agradecido, por sinal, mencionara. Não acreditava. Tinha uma placa colossal escrita "Sala de Reunião", e ela nunca tinha visto. Ela e o irmão andavam precisando de óculos.

Bateu suavemente na porta. Ouviu que as vozes pararam de conversar, e recebeu uma confirmação de que poderia entrar.

Entreabriu a porta devagar. Era estranha, a cena. Todas os professores reunidos num só local. E seu irmão com cara de bobo no meio, embora ninguém soubesse do que se tratava, muito menos que ele era irmão dela.

- Pois não, senhorita Daidouji?

- Desculpe incomodá-los, mas eu gostaria de falar com o professor Sayuri por alguns instantes.

Kyoshi se levantou e fechou a porta sem ruído atrás dele.

- Aqui está a pasta. Vê se coloca a sua cabeça no lugar.

- Sim senhora. Eu vou entrar, já cheguei atrasado hoje e com metade do sanduíche na boca. Não foi legal.

- Foi merecido. E fecha essa camisa! – Tomoyo falou irritada de brincadeirinha. – Até mais.

Kyoshi deu um beijo na testa da irmã, e os dois se separaram. Tomoyo desceu voando as escadas, e reencontrou Nathalia, com a qual ficou conversando até a hora da aula chegar. Aos poucos, seus outros colegas foram chegando. O único que faltava era justamente Hiroyuki. Nathalia disse que o tinha visto pouco depois de Tomoyo ter entrado avoada no prédio.

O dia de aula ia se acabando normalmente, como sempre. No fim da aula de professora Maeda, um recado chegou para a professora. Ela leu em silêncio e depois pediu a atenção da classe:

- Silêncio, por favor. Acabo de ser informada pela escola que uma aluna nossa recebeu um convite para um concerto em um importante clube da cidade. Senhorita Daidouji, por favor, receba nossos cumprimentos.

A classe inteira se virou com assombro e aplaudiu Tomoyo, que sorriu e agradeceu, ao mesmo tempo que tentava se controlar para não pular no pescoço do irmão, que nem Nakuru costumava fazer. E ela tinha pedido que não contasse!

A professora silenciou mais uma vez a classe. Pelo visto, o comunicado não tinha sido terminado ainda.

- E também gostaria de informar que um aluno desta faculdade recebeu o mesmo convite para repetirem um dueto feito há algum tempo. Portanto, senhor Atsuhiro, receba o senhor também os nossos cumprimentos.

Tomoyo aplaudiu Hiroyuki dessa vez, que não parecia surpreso, mas agradecia aos cumprimentos. Tomoyo se repreendeu por ter feito mau julgamento de Kyoshi, porque ele não sabia de Hiroyuki.

Assim que a aula terminou, Tomoyo parabenizou pessoalmente Hiroyuki.

- Meus parabéns! Você finalmente recebeu um convite à altura de seu talento, Hiroyuki! – Tomoyo fez uma pequena reverência.

- Imagino que não, Tomoyo. O convite está apenas à sua altura. – Hiroyuki dessa vez foi quem fez a reverência e beijou a mão de Tomoyo.

- Acha que o convite para o dueto se deve à nossa participação aquele dia, quando seus pais passaram a ser sócios da minha mãe?

- Não sei, pode ser que sim.

Tomoyo então se lembrou que o violino de Hiroyuki tinha sido destruído no incêndio que ela mesma provocara no salão da empresa. Na hora, foi a única solução que encontrara.

- Hiroyuki! E o seu violino? Ele não tinha sido totalmente destruído pelo incêndio?

O jovem pareceu ter esquecido aquele detalhe, mas lembrou-se e comentou:

- Ah, sim, me lembro dessa parte. Bom, ele acabou mesmo sendo destruído, mas eu vou comprar um outro. – sorriu o jovem.

- O concerto é domingo que vem, não? Você tem pouco tempo para comprar um violino para que possamos ensaiar! – exclamou Tomoyo.

- Irei amanhã mesmo. Assim marcaremos logo uma data. Você ainda está tendo aulas de piano?

- Sim, estou, mas minha mãe suspendeu-as por um tempo, quando soube do concerto no clube. Isso foi ontem, ela contatou o professor hoje de manha.

- Então todas as suas tardes estão livres?

- Sim, estão. Podemos ensaiar de novo lá em casa, na sala de música.

- Se não incomodar...

- Claro que não!

- Ah, que bom! Então, assim que comprar o violino amanhã, marcamos o ensaio. Até lá! – Hiroyuki se despediu e foi andando. Tomoyo viu de relance que ele foi ter com Nathalia. Tomoyo ainda não tinha notado mudanças no comportamento da garota para melhor, e estava muito agarrada a Hiroyuki. Tudo bem que ele fosse a pessoa que mais a apoiou, mas isso já estava ficando estranho.

Tomoyo fez menção de se virar quando sentiu uma mão no seu ombro.

- E pensar que ela já foi minha melhor amiga...

Tomoyo se virou:

- Sakin! Ainda aqui?

- Hum-hum. A Nathalia está realmente chateada comigo, não? Eu devo ser a responsável pela mudança dela, com certeza.

- Sakin, não se culpe desse jeito. Só porque você namora com o irmão dela?

- Não é só isso, Tomoyo. Sabe, de repente, de uma hora para a outra, ela vê que a melhor amiga dela não passa mais tanto tempo com ela como antes, e que seu irmão, ao mesmo tempo, te deixa mais sozinha do que em vários anos. Você não acha que ela tem motivos suficientes para não querer olhar na minha cara? – comentou Sakin desanimada.

- Bom, Nathalia tem que aceitar melhor esse fato.

- Mas pense, é horrível. E e você tivesse um irmão, por exemplo? Já imaginou, além disso, sua melhor amiga te deixa mais solitária. Não ia ser legal.

Um sorriso triste apareceu no rosto de Tomoyo. Em parte, pela lembrança de Sakura que Sakin havia despertado sem querer nela. Se achava cada vez mais parecida com Sakin e Sakura com Nathalia, as vezes. No entanto, Sakura não tinha feito o mesmo? Não, não tinha. Sakura nunca faria isso.

E também sorriu porque ela tinha um irmão de fato, não precisa imaginar.

- Ah! Lembrei agora. O Kyoshi quer falar com você.

- O professor Sayuri, Sakin.

- Ah, você entendeu. Posso ir junto?

- Não, claro que não! É para falar comigo, você não tem nada a ver! Ciumenta, é? – riu Tomoyo, logo depois afirmando – Brincadeira, Sakin. Mas olha só, não acho que seria muito bom isso para o seu namoro. Lembre da confusão que isso já deu.

- É verdade. Bom, eu vou embora. Tchau, Tomoyo! Até segunda-feira!

- Até! E obrigada pela mensagem.

Tomoyo arrumou suas coisas, para procurar Kyoshi, para ver que "mensagem" seria aquela. Pegou todos os livros e o resto do material e foi.

Enquanto andava pelos corredores até a sala do irmão, ficou pensando naquela pessoa misteriosa que estavam procurando, e que sempre dava um jeito de escapar.

Por que era tão difícil? Que coisa mais chata... Nem no tempo das Cartas Clow ou de Eriol havia sido tão complicado ou até mesmo letal. Os ataques não eram de pura advertência, eram sérios. E, ainda por cima, tudo isso tinha envolvido sentimentos pessoais de cada um dos envolvidos. De um jeito ou de outro, quase todos que estavam sendo envolvidos se machucaram. Tomoyo tinha um belo exemplo todos os dias na aula, sentado atrás dela, Eriol.

No entanto, achava que a pessoa que mais sofria era Yue. Ele tinha sido a pessoa atacada com maior fulgor, e as seqüelas não eram fracas. Ele também tinha grandes preocupações com Eriol, e cada vez que Eriol ficava em um remoto perigo que fosse, Yue deveria se sentir realmente mal. E Kyoshi, que ficou tanto tempo longe da verdadeira família... Para ele também deveria ser difícil.

Será que aquela criatura, quem quer que seja, não tinha noção do mal e do sofrimento que estava causando? Será que ela deveria ter um coração de pedra, sem sentimentos. Não parecia sequer alguém humano.

Humano... Talvez... Talvez não fosse mesmo! A mente de Tomoyo deu u estalo. Não tinham cogitado que a pessoa em questão talvez não fosse humana. Tinha que discutir isso mais tarde com Eriol, e mais detalhadamente.

Bateu na porta da sala dos professores. Não se escutava nada pelos corredores, parecia que todos os seres vivos dali já tinham ido embora. Só mesmo ela e Kyoshi. Olhou o relógio. Já ficava tarde, e Sonomi iria começar a se preocupar.

E nada de Kyoshi abrir a porta. Bateu mais uma vez. Nada. Começou a escutar sussurros, e a porta se abriu do nada, com um tranco.

A professora Arakami saiu, e deu de cara com Tomoyo na porta, com a mão no ar, pronta para bater novamente na porta. Ao ver a professora, Tomoyo se inclinou e a cumprimentou:

- Olá, professora Arakami.

- Se-senhorita Daidouji! Ainda aqui?

- Sim, senhora. A senhorita Iwano me disse que o professor Sayuri gostaria de falar comigo.

- É sim! Eu pedi para que a senhorita Iwano a avisasse! – gritou seu irmão de algum lugar.

A professora saiu e se despediu:

- Nesse caso, eu vou embora. Até segunda-feira, senhorita Daidouji, professor Sayuri.

- Até, professora.

- Tchau, Kazumi!

A professora corou furiosamente e foi andando com passos rápidos, até que o ruído cessou. Kyoshi apareceu na porta, carregando uma pasta, e depois trancou a sala.

- Pronto, podemos ir. Acho que só estamos nós aqui.

- Ir? Não queria falar comigo? – estranhou Tomoyo.

- Ah, sim. Muito obrigado pela pasta. Eu teria sido fritado em óleo quente sem ela.

- Disponha. O que seria de você sem mim...

- Não sei. Obrigado maninha. – Kyoshi deu um beijo na testa de Tomoyo, e bagunçou de leve o cabelo dela. – Vamos.

Os dois se viraram e seguiram pelo mesmo lado do corredor por onde Kazumi Arakami tinha ido. Quando os passos morreram no corredor, uma pessoa que se encontrava próxima nas sombras abriu um sorriso sinistro.

- Então era isso mesmo...Sayuri é uma farsa...

E seguida veio uma gargalhada, destinada a ninguém, apenas ao próprio ego da pessoa, talvez. Ele estava pronto para dar início ao fim...

FIM DA SÉTIMA PARTE

Olá para todos! Ligeiramente dramático o capítulo, não? ^^ Peço desculpas pela demora, mas eu andei ocupada com os capítulos de Verdade ou Desafio?. Também estive viajando, e o capítulo só ficou pronto agora! Peço para todos que deixem seus comentários, elogios e críticas para que eu possa lê-los, seja deixando uma review ou mandando e-mails. O endereço é mari-chan.mlg@bol.com.br!

Nota: Estamos nos aproximando do final de Rumos Inesperados, o final de verdade. Provavelmente , ele deverá terminar no capítulo 10 dessa segunda fase, a não ser que ocorram imprevistos!

Kissu para todos vocês e obrigada pelo apoio!

Mari-chan.