Diana revidara o soco, para ganhar mais tempo. Estava zonza, parecia que o golpe de surpresa a atordoara mais ainda. Algo ainda a intrigava: como a hemorragia de um pulso cortado de lado a lado estancara? Parecia que nem mais dor sentia... Teve uma idéia luminosa, faltava tentar uma coisa que ela tinha descartado para aquela batalha. Teria que pensar muito bem em como usar isso.
Aletea, porém, não parecia disposta a dar trégua a ela. Partiu para cima dela numa luta marcial e desarmada, aparentemente tão vigorosa e perigosa quanto uma luta com o uso de armas. Diana defendia-se bem, com velocidade. Era mais alta que a inimiga, e isso lhe atrapalhava um pouco. Teria mais facilidade levando a luta para o chão, e foi isso que fez. Agarrou o braço da oponente e o torceu para trás, trazendo-a para baixo do seu corpo. Uma aparente imobilização, da qual a inimiga se desvencilhou com muita agilidade e rapidez, desferindo um chute no rosto na seqüência. Não funcionara a sua estratégia, e ainda tinha sido atacada de novo.
Mas já constatara sua desconfiança. Não era uma batalha comum, havia alguma coisa muito estranha por ali. E ela teria de descobrir o que era para vencer este duelo.
Uma dor maior do que a de seu pulso a derrubou. Aletea acabara de usar a adaga e a atingira do lado esquerdo de seu ventre. Caiu no chão sangrando, seus olhos azuis começaram a ficar com a vista embaçada. Respirar doía muito...
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O gênio do fogo atacou decisivamente. Liberou duas grandes labaredas sobre Clow, que invocou uma magia de defesa que não permitia que fosse tocado pelas chamas. Enquanto pensava que teria que tentar ser o mais breve possível, percebeu que o calor gerado não era evitado por seu encantamento defensivo. Isso o obrigou a atacar logo em seguida. Teletransportou-se para um outro ponto da sala. Como surpresa, viu as labaredas seguirem-no. Repetiu a ação mais três vezes, mas elas sempre o seguiam. Materializou-se no ar na última vez e agiu:
— CHUVA! Acabe com essas chamas! — a carta saiu de seu bolso e irrompeu num verdadeiro aguaceiro. As labaredas fugiram da chuva, inteligentes, mas a carta se dividiu também e as caçou até que elas fossem eliminadas. O gênio de fogo a tudo assistia surpreso, enquanto Clow prosseguiu o seu ataque: — Água! Ataque o gênio do fogo!
— Insolente! Como ousa me atac... O quê? AAAAAAAAAAAAAAAAAAAAHHHHH!!! — A surpresa transformou-se em dor e An-Hamed viu-se envolto em uma coluna de água. Esta carta é uma das mais guerreiras, implacável. Foi imobilizado em meio às águas e vencido.
Clow abriu um sorriso. Vencera o primeiro round.
Hiron se adiantou. Seria seu segundo oponente. De imediato, o chão tremeu embaixo do mago, o que o obrigou a levitar. Mesmo assim, o solo ondulava-se cada vez mais, até que um amontoado de terra irrompeu do piso do palácio para atingi-lo no ar.
— ALADA! Faça-me voar! — com isso, Clow agora podia se mover com bastante rapidez no ar. Para cada desvio, porém, um novo amontoado de terra surgia, como cobras atrás de uma presa. Logo havia seis deles a persegui-lo no ar.
Clow então desceu ao solo, com um plano na cabeça. Como previra, as colunas de terra convergiram para ele.
— Vento! Disperse a terra! — a carta surgiu sobre ele, num potente ciclone, e como um ralo foi absorvendo as colunas. Logo um raro espetáculo, um redemoinho repleto de terra e areia, podia ser visto no ar da grande sala.
O solo tremeu novamente, sinal de que Hiron não cometeria o mesmo erro de seu colega antecessor. E nem Clow faria o mesmo ataque. De maneira surpreendente, correu até o gênio e agarrou-o pelas vestes, driblando o chão cada vez mais instável. Levitou mais uma vez e atirou o adversário no pequeno tufão, que ao ser tocado pelo gênio desfez-se. A terra o rodeou, prendendo-o num bloco sólido de pedra, que era o que tinha sido planejado para o mago. Vento manteve a pedra ao lado do imobilizado An-Hamed, sem permitir que o monolito tocasse o chão.
— Uma tática surpreendente, mago. Vejamos como se sai contra mim! — era Kaazam, que atacou-o fisicamente. Clow teria que mostrar seus dotes marciais.
— LUTA! — invocou. A carta apareceu e começou a lutar contra o gênio que, surpreso, percebeu que tinha que se desdobrar além do que deveria. Começou a utilizar-se de descargas elétricas, sendo que desperdiçou várias até acertar. Luta caiu aparentemente desacordada.
— Que vergonha! Tem medo de duelar! — com o semblante enraivecido, o gênio aproximou-se de Clow.
— Talvez. Mas não vim aqui para lutar. Isso não me traz boas lembranças... — respondeu ele, para depois completar: — FLOR! BRILHO! Ataquem o gênio do trovão! — Flor começou a sua habitual chuva de botões de rosas, crisântemos e girassóis, enquanto Brilho encheu o ar com suas cintilantes gotas luminosas.
— Como espera me vencer com isso? — mais enraivecido ainda, Kaazam começou a abater tudo que se movia ou brilhava com raios elétricos de baixa intensidade. Como Flor produzia mais do que ele podia acertar, teve que liberar mais força e mais raios. Brilho duplicava o número de pontos luminosos a cada vez que o gênio os diminuía. E isso perdurou por vários minutos, irritando-o ainda mais.
— Você acabou de me dar a vitória. — e ante a surpresa do oponente, sentenciou: — LUTA! É sua vez de vencê-lo! — quase que anunciando, Clow ordenou que a carta até então enfraquecida encerrasse o combate. O inimigo extenuado pelos esforços com as outras duas cartas não conseguia atingi-la como antes, e sucumbiu aos fortes e precisos golpes recebidos sistematicamente, cada vez mais intensos e rápidos.
Somente o gênio das águas, Naamon, restara. Isso não parecia ser grande coisa, dada a tranqüilidade com que ele encarava o mago.
— Amadores... Será que sou sempre eu que tenho que resolver? — algo que já era esperado, certamente este seria o mais poderoso. Um poderoso gênio das águas numa terra cercada de deserto? Muito estranho... Isso não o impediu de começar a inundar a sala.
As cartas foram recolhidas, menos Alada. Com isso, o mago voava rapidamente em volta do inimigo, que atacava com jatos de água que criava quando julgava que ele poderia acertá-lo. A sala estava cada vez mais repleta, agora pela metade. E isso perdurou até que estivesse faltando somente um quarto dela seca.
Agora o mago quase andava por sobre a água, com a cabeça chegando ao teto, e o seu inimigo confortavelmente movia-se no elemento líquido. Submergia por vezes e ficava escondido até o momento que julgasse propício para ataques mais perigosos.
Mal sabia ele, mas também dessa forma construía sua própria derrota. A preocupação de Clow era uma outra pessoa. Mesmo assim, foi obrigado a usar a única estratégia que lhe daria a vitória.
— TROVÃO! Eletrifique a água! — a carta surgiu, descarregando seu poder. As águas pararam de subir, e o gênio surgiu revoltado, porém não teve tempo para retaliar. Clow prosseguiu, pois tudo seguia como planejara.
— FOGO! Evapore a água! — ao seu comando, a carta rapidamente elevou a temperatura, causando agora um desconforto enorme ao oponente. Desesperado, Naamon começou novamente a atirar rajadas sobre o mago e sobre a carta, abrindo caminho para o fim da prova.
— SOMBRA! Escureça a vista do meu inimigo! — confiante, proferiu a última ordem. A carta envolveu o gênio, que agora não podia nem continuar atacando. Simultaneamente, recebia agora diretamente ataques elétricos e de chamas. Em mais alguns minutos, caiu desacordado, assim que as águas se evaporaram.
Só um restava de pé. O vencedor era Reed Clow. Não comemorou, pelo contrário, duas mulheres o preocupavam neste exato momento...
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Diana estava desmaiada. Aletea a vencera. Conquistara, portanto, o direito de se tornar a nova Mulher Maravilha, sendo esta a honra mais alta que poderia haver entre as amazonas da ilha. Felicíssima, nem se importou com a condição física de sua adversária, queria mesmo é que ela morresse. Por isso, com surpresa notou que ela ainda vivia, apesar do constante sangramento.
— Você... Me... Venceu... — Diana sussurrava, quase sem forças.
— Sim. Você agora não teve ajuda da mamãe, princesa. — a alegria das vitórias se refletia em cada palavra.
— Uma última palavra, por favor... — pediu a guerreira derrotada.
— Diga princesa. Somente eu a ouvirei.
— É só você que deve ouvir mesmo... — um fio de voz, quase um sussurro.
— Diga então de uma vez! — irritada, porém curiosa, a vencedora aproximou-se. Diana esperou até que ela chegasse perto, mais perto, e então...
— LAÇO MÁGICO!!! — gritou a plenos pulmões, assustando e levando a inimiga ao último grau possível de ira que uma guerreira enganada e presa poderia exprimir em palavras. Foi uma sessão de dez minutos de xingamentos de todos os tipos e calibres. — Vejo que sua estadia na prisão não melhorou sua educação... — completou Diana, com um sorriso que nada tinha de derrota. Sentou-se, apalpou o ventre intacto, a adaga desaparecera de suas mãos, bem como o ferimento que ela tinha lhe feito. Colocou-se de pé, enquanto a inimiga caía presa pela corda mística.
— Como descobriu? —Aletea finalmente se rendia, cabisbaixa e enrolada completamente.
— Ferimentos não param de doer, não se curam sozinhos e nem melhoram de acordo com o desempenho na batalha. Isso não poderia ser mesmo verdade. Nem mesmo um duelo mágico. — ante aos olhos surpresos da guerreira vencida, completou: — Só existe uma única alternativa. É uma ilusão. Uma ilusão que testava os meus maiores medos. Dor, morte, família... Não é mesmo, minha irmã?— acrescentou, recolhendo a arma e libertando-a sem medo.
Pode contemplar o rosto duro de sua irmã derreter-se em um fio de lágrima. Como prêmio pela derrota, desvaneceu-se diante dos olhos de Diana, reaparecendo dentro de sua cela no calabouço. Ainda não era boa o bastante para se tornar a Mulher Maravilha. Faltava-lhe coragem, precisão, destreza, lealdade e algo que ainda teria que conquistar. Faltava um coração livre de maldade, com honra e integridade.
Isso Diana sempre teve, por isso fora a escolhida. Por isso vencera hoje. E por isso estava de volta ao palácio de Bagdá, ao lado de Reed Clow.
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Além de terrivelmente febril e em plena sudação, Sakura agora respirava com muita dificuldade. Aquele transe em que se encontrava exigia muito dela, Li começava realmente a temer por sua integridade física.
Reparara que o quarto tinha mudado levemente, fora preenchido por uma névoa que não o permitia enxergar além dos limites da cama. Isso apenas confirmava que o esforço dela para utilizar suas cartas já estava beirando o extremo. Por vezes, sentira que a pequena feiticeira era atraída para o centro da cama, região onde desapareciam as criaturas mágicas enviadas.
Essa análise fria dos fatos não tranqüilizava em nada Shoran Li. Muita coisa acontecera e ainda acontecia, e ele não conseguia atinar com nenhuma ação efetiva para ajudá-la. Repleto da mais pura impotência, o pequeno guerreiro fez o que podia fazer: agarrou-se mais ainda à dona do seu coração. Se ela sumisse, ele definitivamente iria junto.
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— Cartas libertem seus prisioneiros! — com este comando, os quatro oponentes vencidos foram libertos dos seus transes. Uma atitude perigosa de um mago autoconfiante?
— Como descobriu, Clow? — inquiriu Kaazam.
— Gênios deveriam ser bem mais poderosos do que vocês. Eu já enfrentei um. — confirmou, para surpresa geral dos quatro. — Vocês não passam de magos, mas estão controlados por outra força superior a vocês. A mesma força que levou você a enfrentar sua própria batalha, Diana. — olhando para a heroína, demonstrava seu contentamento pelo sucesso duplo.
— Muito bem. O que faremos agora? — inquiriu a guerreira.
— Primeiro eu enviarei estes feiticeiros de araque para seus locais de origem. Vão embora! — num gesto, eles foram desmaterializados. — Agora vem a parte mais difícil... resgataremos o Rubi Eternal.
— Onde ele está?
— Bem aqui, nesta sala. Eu vou forçá-lo a se mostrar, mas só você poderá pegá-lo. Seus poderes de defesa são muito fortes, não tenho condições de quebrá-los. Mas você poderá tocá-lo sem problemas.
— Por quê?
— Porque você já foi portadora dele, e porque você é mulher. Estranhamente, homens não podem tocar esta jóia.
— Como você explica isso, mago?
— Bom gosto, talvez... — sarcástico e enigmático como sempre, Clow respondeu quase como se estivesse cortejando-a descaradamente.
— Você é incorrigível mesmo... — resignou-se ela, com um sorriso comedido. — Diga-me o que fazer.
— Teremos que agir bem rápido. Eu não terei forças suficientes para manter a situação adequada para isso. Ele vai aparecer, então você memoriza onde ele está na sala. Logo após, escurecerei o ambiente; você deverá resgatá-lo no escuro. Assim que estiver com ele em suas mãos, grite e feche os olhos. Só abra-os quando eu disser. Entendeu?
— Sim. Entendido.
— Avise-me quando estiver pronta. — dito isto, caminhou para o canto da sala, deixando-a no centro.
— Tudo certo, Clow.
— Mais uma vez, querida... Será a última, eu prometo... — murmurou ele, levando mais uma vez a mão à testa.
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Continua...
