Capítulo 9 – Barreiras rompidas

Gina, como Kally pediu, permaneceu aquele tempo todo caminhando pelo jardim, colhendo algumas folhas, ou apenas sentindo o gelado vento de outono batendo em seu rosto.

Quando achou que estava na hora de voltar, caminhou devagar até a cozinha, vendo que já não havia toda aquela bagunça, mas que os dois elfos continuavam a correr. Assim que Kally a viu, pegou Gina pelo braço e começou a puxá-la em direção ao quarto.

-Calma, Kally! – ela dizia enquanto era levada correndo – Por que disso tudo?

-Logo que chegarmos no quarto eu lhe contarei.

Gina teve impressão de que não estava correndo, estava voando de tão rápido que Kally a levou até o quarto.

-Vá para o banho, senhorita. Vá! – o elfo falava.

Kally estava empurrando Gina pra dentro do banheiro, mas a garota parou dura na porta.

-Por que eu tenho tanta pressa pra um banho? – ela perguntou.

-Porque a senhorita tem um jantar, oras! – disse como se Gina tivesse que saber.

-Jantar? – disse fazendo uma careta.

-Sim, jantar. Meu senhor não avisou? – Gina balançou a cabeça negativamente – Mas haverá sim um jantar, e a senhorita tem que estar pronta logo!

-Mas por que  Malfoy resolveu me convidar para um jantar se nunca fizemos nenhuma refeição juntos? – Gina insistiu.

-Porque ele quer agradecer o esforço que a senhorita fez o salvando.

-Está bem, está bem! – a ruiva disse enquanto entrava no banheiro. Não quis admitir nem a si mesma, mas adorou saber que Malfoy queria agradecê-la.

Algum tempo depois, Gina saiu enrolada em uma toalha. Foi aí que ela se tocou.

-Eu não tenho nada pra vestir pra um jantar! Aliás, eu não tenho roupa nenhuma já que estas são emprestadas. – disse se referindo as roupas que usava no dia-a-dia.

-Tem sim! – disse uma Kally sorridente mostrando o vestido que Gina havia admirado naquela manhã.

-E... Eu vou usar este vestido? – ela perguntou incrédula. – Ele pertence a quem?

-Era da Sra. Malfoy... – o elfo falou com um pingo de tristeza nos olhos – Ela nem usou, já que chegou poucos dias antes de... de...

-De ela morrer. – Gina completou.

-Sim, senhorita. A senhorita irá usá-lo?

Gina pensou um pouco. Já que estava sendo convidada pra um jantar, por que não usar uma veste como aquela? "Mas será que Malfoy não se importaria?" ela se perguntou.

-Está bem, eu uso. Mas espero que Malfoy não se incomode.

-Oh, ele não vai. A senhorita vai ver como vai gostar de vê-la vestida assim!

Draco batia o pé. Estava sentado esperando por Weasley havia meia hora e nada da garota aparecer. "Mulheres... Será tão difícil assim vestir uma veste feminina? Por que sempre demoram tanto?" ele pensou se lembrando das vezes em que sua mãe também o deixava e seu pai esperando. Até que ouviu um "uh-hum" na porta da sala.

Olhou para trás preparando-se pra fazer uma cara feia e dizer que ela estava atrasada, mas no momento que a viu com o vestido, os brilhos azuis e perolados cintilando contra a luz da lareira, Draco esqueceu totalmente todo seu discurso machista sobre a arrumação das mulheres.

No geral, Gina não estava tão diferente. Mas vendo-a agora com outra roupa que não as largas vestes bruxas que ela usava emprestadas, Draco pode notar as leves formas do corpo de Gina, que o vestido deixava mais definidas. Também pode admirar mais o contorno de seu rosto, já que os fios de cabelo ruivo estavam presos em uma trança, ao invés de estarem soltos sobre suas bochechas, como Gina sempre deixava.

O modo que Draco se sentiu foi o mesmo de Gina ao vê-lo sorrindo na cama. Um calor bom lhe invadiu o corpo, dando a sensação de bem estar, de desarmamento. Só por estar ali, a vendo linda e com um sorriso tímido no rosto, como se o convidasse ao seu lado.

Ele soltou um sorriso a meio fio e caminhou até ela. Pela primeira vez ficou com receio de chegar perto, algo que nunca tinha sentido quando estava com a garota. Era uma barreira rompida.

Gina olhou pra baixo, nervosa, no momento em que Draco começou a caminhar em sua direção. Não pensou que uma simples veste podia fazer tanta diferença em alguém como estava fazendo em Malfoy naquele momento. Ele usava uma calça de tecido leve, diferente da veste habitual bruxa, que às vezes poderia ser parecida com vestidos trouxas; um smoking de veludo fino, que cobria uma camisa sem botões e com alguns bordados – provavelmente uma veste feita por fadas também. A cor continuava a mesma de sempre: negra, mas o simples vestir de uma peça de veludo fazia toda diferença, ainda mais com o andar sempre seguro de Draco.

Ela continuava a olhar pra baixo; não conseguia encarar Malfoy! Não por ter desprezo a sua cicatriz, Gina já nem ligava mais para ela, apesar de que era impossível não vê-la, mas sim porque havia um brilho nos olhos dele que Gina não conseguia decifrar, e pior, esse brilho a deixava fascinada, e não tinha tanta certeza se realmente queria ficar fascinada por Malfoy.

Ele não disse nada ao se postar ao lado dela, mas estendeu um braço e se Gina não estivesse tão nervosa, sorriria em agradecimento ao apoiar seu braço. Eles então, saíram da sala de visitas e Draco a conduziu a sala de jantar.

-Belo vestido – ele disse enquanto chegavam a porta.

-Era de sua mãe – ela murmurou envergonhada.

-Pois fique com ele então. Não poderei usá-lo mesmo.

-Vejo que a perna melhorou.

-Sim, eu tive um bom tratamento.

Os dois não ousaram se olhar enquanto caminhavam, parecia que aquele clima estava constrangendo a ambos, mas nenhum admitiria que estava gostando.

Chegaram à sala de jantar. Gina quase abriu a boca de admiração à mesa na sua frente. Eram vários pratos de comidas variadas e com aparência muito saborosa, o que a deixou com água na boca, já que não havia posto mais do que água em seu estômago naquele dia. Mas o que mais a impressionou foi o efeito delicado que algumas velas acesas, sobre a mesa, faziam na sala, dando um clima: "Romântico..." ela pensou consigo mesma, ao se sentar.

Então Kally e Dippy apareceram e começaram a servi-los e Gina não sabia onde colocava as mãos, se ajudava ou se simplesmente ficava quieta. Mas ela não conseguia permanecer calma enquanto os elfos preparavam os pratos, já que sabia, mesmo com a distância que os separava, que  os olhos de Draco estavam postos sobre ela.

Assim que os elfos saíram da sala, ele falou:

-Estou curioso. – disse, fazendo uma pausa – Como você conseguiu preparar aquelas poções?

Gina o encarou por entre as velas. Os olhos dele pareciam avaliá-la e ela quis sair correndo dali pra não ter que contar que foi até o lugar onde ele a impedira de entrar.

-Eu... Eu usei o laboratório.

-Como você o achou?

"Diabos ele me chamou aqui pra me interrogar?".

-Perguntei a Kally. E não brigue com ela por isso, já que me dizendo o local ela o ajudou também.

-Meus elfos estão tendo muita liberdade desde que você está por aqui, Weasley...

Ela abriu a boca, hesitante.

-Virginia. Parece-me estranho estarmos jantando juntos e você me chamar de Weasley. Meu primeiro nome é Virginia, ou simplesmente Gina.

-Está bem, Virginia, ou simplesmente Gina; eu não te chamarei de Weasley.

Começaram a comer em silêncio. Um silêncio constrangedor, pois queriam falar, nem que fosse pra terminar com a quietude, só pra não continuar com vazio que o silêncio estava trazendo.

-Hum, Malfoy? – ela chamou – Vo...

-Draco. – ele disse indiferente, mas de algum modo Gina gostou daquilo.

-Você pensou sobre a carta? – ela continuou – Chegou a alguma conclusão?

-Não mais do que já tinha chegado. Meu pai me lançou uma maldição e por isso eu estou assim. – ele falou, apontando com um gesto seu rosto – Com certeza eu já estaria morto, se minha mãe não tivesse feito algum encantamento pra cancelar a maldição; e de algum modo, esse encantamento envolve você.

-Mas não há nada pra que possamos acelerar isso, pra que... – ela parou, hesitante.

-Pra que você possa sair daqui? – ele perguntou, sem um pingo de insatisfação ou alegria na voz.

-Também. – ela respondeu baixo – Mas eu gostaria que você ficasse bem.

-Ficar bem é não ter essa cicatriz? – ele perguntou novamente, e desta vez ela pode notar uma ponta de mágoa disfarçada.

-Não, Draco. – respondeu conseguindo olhar fundo - Ficar bem é não ter sua vida correndo risco.

Draco sentiu um leve arrepio na nuca, mas não demonstrou nada disso quando falou, também os olhos grudados nos dela.

-Então você não está bem, já que a maldição se transferiu, já que você também está envolvida.

-Talvez, mas eu ainda acho que quem corre mais perigo é você.

Continuaram agora a conversar sobre a maldição. Gina às vezes tomava goles da bebida avermelhada e adocicada que estava em sua taça, nem se preocupando em saber realmente o que era.

-Mas você não se lembra mesmo de nada?

-Não – ele respondeu num suspiro – Só lembro de meu pai me acusando, e também lembro do momento que minha mãe chegou. Depois disso nada... Até que acordei confuso em meu quarto, e Dippy estava do meu lado. Disse que meus pais haviam morrido e me entregou o primeiro pergaminho.

Os dois já haviam terminado o jantar e estavam sentados perto da lareira, na sala de visitas. Uma garrafa da bebida avermelhada, que agora Gina sabia que era vinho, estava junto deles e era esvaziada enquanto conversavam.

-Ele lhe acusava do quê? – ela perguntou.

Draco não gostava de lembrar daqueles dias passados, mas naquela hora ele poderia falar tudo, talvez por causa da beleza que ele tinha percebido em Gina, ou simplesmente porque a bebida os estava deixando mais à vontade.

-Você não sabe? Eu entreguei o esconderijo de Voldemort – Gina tentou esconder o leve arrepio que sentiu – Eu traí meu pai.

-Não – ela falou – Você só foi sincero a si mesmo. Fez o que achava certo.

Draco não disse que só fez aquilo por não agüentar mais o clima da guerra, por se sentir sufocado com as pressões de seu pai. Ele estava um pouco mais solto por ter tomado alguns goles da bebida, mas ainda sabia do que estava falando e com quem.

-Talvez. – ele respondeu.

Ficaram em silêncio novamente. Até que perceberam um som baixo vindo de longe, uma música. Era uma melodia suave, aquelas de encher o coração de vontades e suspiros.

-Vem da cozinha. – Gina comentou – Devem ser Kally e Dippy dançando.

-Eles sabem dançar? – perguntou.

-Sabem. Eu os ensinei esses dias atrás. São muito engraçados e desajeitados, mas os dois formam uma bela dupla.

-Bah... – fez Draco, imaginando dois elfos dançando.

-Eu gostaria de dançar... – ela murmurou baixinho.

-Gostaria? – ele perguntou.

Ela o olhou, envergonhada. "Alto demais, Gina. Você falou alto demais...".

-Eu, hum... Gostaria.

Ele se levantou e postou-se em sua frente, lhe estendendo a mão. Gina corou e agradeceu por estar escuro. Ela segurou a mão de Draco e um leve tremor percorreu seu corpo. Já o havia tocado quando estava passando poção em seu ferimento, mas naquele momento, o contato com a pele dele era diferente, era eletrizante.

Draco a puxou até o meio da sala e envolveu seus braços na cintura de Gina, que timidamente levou as mãos nos ombros dele. A presença dela, seu toque quente, seu olhar doce, o deixavam meio tonto e involuntariamente ele a apertou mais contra si, fazendo-a soltar um leve suspiro e a apoiar a cabeça em seu ombro.

Davam passadas leves, conforme a baixa música ia conduzindo. Não falavam, estavam tão envolvidos em um momento que parecia tão irreal – um Malfoy e uma Weasley dançando? – que tinham receio de que ele acabasse caso alguma palavra fosse proferida ou se perdessem o contato.

Até que a música acabou. Quando Gina se deu conta disso, levantou sua cabeça e deu com Draco a encará-la. Os rostos estavam muito próximos e Gina podia sentir o peito de Draco subir e descer com a respiração ofegante que ela sabia também ter.

Seus olhos estavam brilhando como na hora em que ele a vira com o vestido, mas desta vez Gina conseguiu manter o olhar. Suas pernas estavam bambas e ela sabia que se não estivesse com ele a segurando e com os braços em volta dele, poderia perder o equilíbrio.

Notou então que Draco abaixou levemente a cabeça, mas antes que os seus lábios pudessem se encostar, Gina virou a cabeça para o lado e encostou novamente no ombro dele, só que desta vez o apertando forte em um abraço, sentindo também que ele a pressionava pela cintura.

Não havia nenhum pensamento, nenhuma idéia, nada na cabeça de Draco, a não ser a vontade que ele teve de tocar os lábios de Gina, de senti-los comprimidos juntos aos seus; mas um abraço estava bom.

-Devemos ir dormir – ela murmurou em seu ouvido.

Distanciaram-se um pouco e Gina colocou seu braço sobre o de Draco, e subiram para os quartos. Passaram pelo de Draco e Gina ficou feliz que ele a acompanharia até o dela, estava sendo mesmo um cavalheiro.      Estava sendo mesmo uma noite maravilhosa.

Pararam na porta, ela se sentia constrangida com aquela situação, com aquele clima, mas Draco parecia estar por demais seguro. Deu as costas pra ele, abrindo a porta. Quando se voltou para desejar boa-noite, sem ao menos pensar, ele a puxou e beijou-a.

Gina resistiu no começou, devido ao susto, mas logo se derreteu ao toque macio dos lábios dele, a sensação boa de sua língua explorando sua boca, ao leve tremor que seu corpo tinha quando ele encaixava mais e mais os dedos nos seus cabelos e desmanchava sua trança.

Até que ela tomou consciência do que estava fazendo e o afastou. Ele tinha um sorriso malicioso no rosto e Gina sabia que se não se afastasse ela mesma poderia agarrá-lo novamente. Sorriu timidamente enquanto se afastava pra dentro do quarto.

-Boa noite... – ele murmurou enquanto ainda sorria.

-Boa noite. – ela disse antes de fechar a porta.

Gina deitou-se na cama sorridente. Ela não estava pensando no que aconteceria depois, se o que fizera foi certo, ou se Draco só estava zombando com a cara dela. Ela só sabia que estava se sentindo imensamente feliz, como nunca tinha estado, e tinha certeza de que isso não era efeito do vinho.

"N/A: Então? O que você acharam? Críticas, comentários, etc: review! E obrigada pelas reviews anteriores!".