Promessas
Quando uma simples promessa pode virar o seu pior pesadelo




Capítulo 4 – Somente escuridão


Os passos apressados faziam-se ecoar por entre as vozes animadas e excitadas. Ele não escutava mais nada além do barulho de seus sapatos batendo no ladrilho. Como se o resto do mundo não mais existisse. Não fosse mais nada além de sombras remotas de um passado onde ele era vivo.

Porque agora ele morrera.

No momento em que seus olhos vislumbraram-na.

E constataram a verdade.

Enquanto sua mente era perturbada por mil pensamentos, seu coração tinha apenas uma determinação. Uma motivação. Um único objetivo.

Ele precisava falar com ela. Descobrir o que acontecera.

A verdade.

Como tudo acontecera?

Como ele fora capaz de deixá-la assim?

As respostas, eram todas incertas. Ele não sabia nada. Ele não podia respondê-las. Muito embora desejasse do fundo de seu coração. Seu frio coração. Seu falecido coração. Morto por desgosto de saber que ela já não era a mesma.

Suas pernas compridas mais uma vez o levavam a uma rapidez inacreditável por entre a multidão. Deixara um Eriol e uma Tomoyo para trás completamente atormentados. Eles sabiam o que ele faria. Até o mais idiota saberia o que ele estava fazendo.

Correndo atrás do que julgava ser seu.

Daquilo que deixara para trás naquela manhã ensolarada e quente.

Sua alma. Sua vida.

Ela.

Esbarrou em alguns, tropeçou em outros. E quase caiu. Mas seu espírito recusava-se a cair. Porque a necessidade de respostas era muito maior do que os obstáculos. A dor mental era mais profunda e mortal que a física.

Foi quando ele a viu.

Andando a passos largos para depois do portão de aço.

Estava muito diferente do que ele a deixara. E ele quase não a reconhecera. Se não fosse por algo em seu ser que apontasse a realidade, insistentemente. Se não fosse pelo amor em seu peito. O único capaz de enxergar a autentica.

As cenas passaram dolorosas por sua mente. Relembrava por uma eternidade todos aqueles infindáveis minutos. O tempo necessário para descobrir que seus medos tinham seus fundamentos. Eram para existir, realmente.

"E desde quando eu me importo com novatos idiotas?"

Aquela frase ecoava, como se nada mais estivesse em sua cabeça. Como se de repente ela tivesse ficado oca. Completamente vazia. Assim como seu ser estava. Vazio de esperanças. Vazio de boas emoções. Apenas sentimentos tristes e negros.

Os olhos borraram-se, e ele percebeu que estava prestes a chorar. Quando finalmente atingiu seu destino.

Os passos apressaram-se, até que ele conseguiu pegá-la pelo braço e virá-la para si, de modo que os olhares encontraram-se. E o que ele pôde ver fez as palavras sumirem de sua boca, e seu coração afogar-se em sua própria dor.

Ela era alta. Muito alta. Uns 5 centímetros mais baixa que ele, no máximo.

Havia crescido tanto!

O corpo de mulher era facilmente perceptível por baixo da roupa justa. Curvas, volumes, por ele nunca imaginados. Tudo ali. Tão perto de suas mãos. E tão longe ao mesmo tempo...

Era realmente bela!

As feições. Ele podia ver uma beleza extraordinária estampada. Em contornos delicados e suaves. Marcantes e inesquecíveis.

Mas contraídos em uma expressão de nojo e repulsa.

Os cabelos deviam estar mais longos. Muito embora ele não pudesse perceber. Estavam presos em pequenos e incontáveis coques.

Mesmo assim ela ainda era muito bela!

Os olhos, verdes... Da cor do oceano...

Mágoa. Ódio. Rancor. Toda espécie de sentimentos negros que pudesse ser imaginada. Estava tudo ali, claro como água.

Contornados por um traço grosso de lápis preto. Tão negro quanto sua amargura.

- Sakura... – foi a única palavra que conseguiu escapar de seus lábios, tristemente, como o sussurro da brisa de inverno.

Ela nada respondeu. Virou-se. Lançou-lhe um olhar que seria capaz de fazê-lo desistir do mundo. E foi por quase que assim não fez.

- Por favor... – conseguiu implorar, joelhos flexionando-se, incapazes de suportar o peso de sua melancolia.

Mais uma vez só teve um olhar apavorante como resposta.

- Eu lhe suplico... – sua voz era roca e falhada, da mais pura tristeza.

- O que você quer? – seca vieram suas palavras, enquanto ela fervia de ódio.

- Eu... – o rapaz tomou um pouco de ar, refazendo-se - ... eu quero conversar....

- Eu não tenho nada para dizer... – rude, ela tentou ir embora, mas foi impedida por um braço a lhe segurar firmemente.

- Eu tenho! – afirmou, olhando fundo em seus olhos claros e perdendo-se em uma negridão sem fim.

- E mesmo que você fosse a última pessoa da face da Terra eu não escutaria... – com força, soltou-se.

- O que lhe fizeram? – seus olhos ficaram rasos de lágrimas salobras

- E ainda me pergunta! – esse comentário foi feito mais para si mesma do que para ele.

- Por favor! Eu quero saber o que aconteceu, eu quero entender! – uma gota escorreu; ele não era mais capaz de segurar seu pranto.


- Entender? – os olhares se encontraram, ela firmando o contato com o mais intenso dos ódios – Você, antes de qualquer coisa, devia entender o que aconteceu.

- Olha... – agora as feições deles ficaram sérias, olhares ainda mais fixos que antes - ... Eu estou sendo franco com você. Estou abrindo o meu coração quando digo que não entendo nada do que está acontecendo. Eu não consigo entender o porquê de você ter mudado tanto...

- Por acaso você não achou que, depois de quase dez anos, eu estaria a mesma, achou? – a voz dela começava a se alterar, completamente incontrolável em uma fúria apaziguada apenas pelos anos – Você é mesmo mais idiota do que eu pensei...

- Idiota? Por que você me chama de idiota? Você não sabe pelo que eu passei! Você não sabe o quanto foi duro para mim chegar até aqui! – ele também parecia começar se alterar e perder o controle.

- E preferiria continuar não sabendo! Eu preferia continuar sabendo que você está a quilômetros de distância de mim! – praticamente gritou, perdendo de vez o controle.

- Sakura! – o rapaz a pegou rudemente pelo braço e a chacoalhou – Você não era assim! Vamos, eu quero saber o que lhe deixou assim!

- Vai à merda! Eu não preciso dar nenhuma satisfação à você, seu cretino! – seu descontrole havia chegado ao máximo, e ela sentiu as lágrimas formando-se em seus olhos.

O grito de horror finalmente saiu da garganta do jovem, na forma de uma exclamação pasma. Ele ouvira isso realmente?

- Surpreso com o que encontrou? – agora o tom por ela usado era irônico e maldoso – Surpreso com o que você deixou para trás quando simplesmente foi embora daqui?

- Eu estou mais que surpreso... – seu sussurro infelizmente foi ouvido.

- Pois então, vai à merda você e suas surpresas, e me deixe aqui sozinha! Volte para onde você devia ter ficado! – a jovem virou-se, mas novamente ele impediu-a.

- Eu não consigo acreditar... – mais uma vez seu sussurro desgostoso foi ouvido.

- Acredite, seu tratante! Acredite! Essa é a verdade! Aquela Sakura ridícula e fraca foi embora! Exatamente no dia em que você cometeu o maior erro da sua vida! – ela berrou, ferozmente, olhos obliquamente cerrados e fixos nos dele.

- Por que você age assim? Foi algo que eu fiz? – mais uma vez, uma lágrima escapou e escorreu face abaixo.

- Você mentiu! Agora me deixe em paz, de uma vez por todas! – e, dizendo, isso, ela se foi, sentida, deixando para trás um magoado jovem.

O amor de sua vida.