Promessas
Quando uma simples promessa pode ser o seu maior pesadelo.




Capítulo 8 – Quebrando barreiras


- Tem alguém em casa? – uma voz grave e austera retumbou pelo tumular silêncio da casa, quebrando nas paredes, fazendo-se perceber.

Nada foi ouvido de volta.

- Tem alguém em casa? – insistiu, fazendo sua voz ouvir-se ainda mais alto.

Mais uma vez, não houve resposta.

Ele sabia que não haveria.

Há muito tempo não havia.

Passos leves foram ouvidos por trás dos seus, seguindo o mesmo caminho lar adentro, quietos, como se quase não tocassem o chão.

O rapaz olhou para trás, apenas para ver uma figura aproximando-se de si, em meio a escuridão.

Ela parecia emanar uma luz prateada, suave. Como se possuísse luz própria.

E ele sentia magia ali. De que maneira, ele não sabia. Mas havia magia ali. Ele podia farejar no ar.

- O que houve, Touya? – outra voz grave, porém gentil, indagou-lhe, afastando-o das conclusões.

- Nada. – rispidamente, foi assim que ele disse.

- Tem certeza? – foi a voz dele insistir.

- Yuki... – e então ele se aproximou, de modo que seus rostos estavam próximos o suficiente para que respirações quentes fossem sentidas a soprar - ... Tudo está muito estranho...

- Estranho de que modo? – ele parecia confuso.

- Você não vê? Eu posso sentir meus nervos gritando... – e sua voz parecia mais séria que o costume – Algo não está bem... Algo está errado.

- Touya... – uma única palavra escapou-lhe pelos lábios, terna.

- Precisamos conversar! – era como se houvesse pressa e urgência.

Desse modo, eles dirigiram-se até a sala.

Onde encontraram a tv ligada.

E uma criatura sentada.

Um monstro.

- Olá... Touya... Yukito... – a voz maléfica e cheia de intenções soou, causando arrepios pela espinha dos rapazes.

- Olá... – foi a resposta que o segundo conseguiu dar, tremendo de um medo inexplicável.

- Ei... Por que as luzes não estão acesas? – ao invés de uma recepção amigável, ele começou com suas reclamações.

- Antigamente você costumava ser mais receptivo, irmãozão... – a ironia e o cinismo presentes eram tão insuportáveis que o rapaz teve de respirar fundo para não perder a calma e dar a lição que ela merecia.

- E você antigamente costumava ser alguém... Agora não passa de um monte de bosta! – mesmo doendo-lhe a alma, ele dizia coisas do gênero.

- Essa passou perto... – e um sorriso irônico aflorou-lhe nos lábios, irritante – Você quase conseguiu me atingir... Se continuar desse jeito, qualquer dia desses vai me fazer chorar...

- Sakura... – o outro rapaz interrompeu; sua voz parecia morrer – O que há com você?

- Nada... – ela respondeu, secamente – Mas se essa conversa continuar, aí sim haverá algo...

- Nós sabemos que há algo errado com você, mesmo que você queira esconder. Não adianta mentir, fingir... Nós já percebemos há muito tempo. – o rapaz recobrou o equilíbrio psicológico.

- Claro que há algo errado! Vocês dois estão me enchendo o saco! – e, levantando-se, começou a se retirar.

- Não. – uma voz fria e impessoal manifestou-se, enquanto um braço segurou-a e impediu-a de ir-se – Mestra... Nós precisamos conversar.

- Yue... – subitamente, os olhos verdes arregalaram-se, em surpresa, e um sentimento perverso pôde ser visto.

- Mestra... – os olhos azuis pareciam estupefatos com o que sentiam aqueles outros olhos claros – Já... faz... tanto... tempo...

- É mesmo... – agora ela parecia mais mansa que um carneirinho.

- Eu vejo que as coisas não estão boas... – e abriu os braços, convidativo.

- É... não estão.. – ela correu e abraçou-o, passional, como há muito tempo não era.

- Vamos... – o tão sério guardião então sorriu, satisfeito em amolecer sua mestra, se não totalmente, pelo menos um pouco – Conte-me o que está acontecendo...

A garota afastou-se daqueles braços fortes e confortáveis, sentindo-se novamente amada por alguém. Apenas para encarar um par de olhos a fitá-la, um sentimento belíssimo estampado.

Aquele sentimento...

Ela queria tanto sentir-se daquele jeito...

Ela queria estar em braços fortes e seguros.

Ela queria entregar-se.

Mas...

Assim como da outra vez, ela seria deixada para trás.

Esquecida...

Ela estaria só no final...

Sofreria.

Então ela lembrou-se do porquê de ter proibido seu fiel guardião e amigo de aparecer.

Ela sabia que naqueles olhos havia algo que ela queria sentir desesperadamente.

Uma mão delicada segurou-lhe pelo rosto, gentil. Parecia nervosa. Estava trêmula. Isso era nítido.

Pelo jeito, o ser estava nervoso. Era algo raro.

Olhou o lugar ao seu redor e percebeu que não havia mais ninguém além dele. Aquela criatura angelical à sua frente. Um sentimento transbordando. Isso tinha dedo de seu irmão. Ela podia perceber.

Novamente sua atenção voltou-se a ele.

Já fazia tanto tempo...

Ela esquecera-se de como ele era belo.

Seus longos cabelos, prateados, pareciam macios. Exalavam um perfume inebriante. Cheiro de Lua.

A pele tão alva quanto à sua.

O toque delicado. Suave, carinhoso, terno...

Transmitiam-lhe segurança.

As feições... Marcantes, sérias, fortes. Os traços másculos. Misteriosos.

Os olhos...

Ela podia perder-se naquela imensidão azul, para nunca mais achar-se.

Imersa em um mundo controverso de sensações a lhe brotarem do peito, acabou por fechar seus olhos. Era tão bom sentir-se amada novamente.

Há quanto tempo...

Tanto tempo...

Um suspiro escapou de seus lábios. Pareci que a parede de ferro estava cedendo aos poucos.

O tão sério guardião mirava-a, assombrado. Já fazia tanto tempo que ele desejava algo do gênero... Já fazia tanto tempo que ela guardava aquele segredo apenas para si...

Corroendo-o.

Matando-o.

Os olhos piscaram, e lágrimas afloraram-lhe, sem que pudesse segurar mais aquilo. Ele não podia manter segredo... Era tão grandioso! Era tão profundo!

Aproximou-se.

E, de repente, os lábios encontraram-se.

Como mágica.

Em um primeiro momento tímidos.

Mas repleto de emoção.

Depois ele quis provar mais. Tanto, mas tanto, que seu ar angelical invadiu o ser daquela jovem como um sopro de vida. Reanimando o já falecido.

Como eram macios! E delicados... E sublimes...

Ela, por sua vez, deliciava-se naquele gosto de vida a lhe demonstrar algo que ela tanto precisara. Algo que era necessário para mantê-la viva.

Muitos momentos passaram-se, até que vassalo e senhora se separassem, sem fôlego. Para encararem-se, ainda inebriados pelo sentimento forte e imponente que brotava de seus peitos.

Mas ela percebeu que não era aquilo o que ela queria. Não era exatamente aquilo.

Ela precisava dele sim. Não daquela maneira. Ela precisava dele ao seu lado, fazendo-a forte. Encorajando-a a ir atrás daquilo que verdadeiramente devia ser seu.

Daquilo pelo qual ela tanto esperara.

O contato visual então foi interrompido. A garota levantou-se, ainda trêmula por tudo. Pegou sua bolsa e saiu correndo porta afora. Sem nem ao menos olhar para trás.

Deixando um anjo sonhador. Suspirando. Morrendo de amores por sua mestra.

- Minha mestra... – sua voz falhada morreu, em um sussurro longínquo.