Capítulo XVI

            Li cavalgava devagar pela beirada do rio, Sakura ia calada entre os seus braços. Desde o incidente da briga entre o casal, ela ficara silenciosa. Ele não queria admitir, mas estava sentindo falta da voz dela, mesmo que fosse para irritá-lo. Ele puxou as rédeas do corcel e parou para descer um pouco, estava com sede. Saltou do animal e observou Sakura saltando com desenvoltura, apesar de que agora ela andava sempre vestida com quimono. A menina afastou-se um pouco sem falar nada.

'Aonde pensa que vai?' Perguntou Li, observado-a se afastar.

            Ela virou-se para ele com aquele mesmo olhar indiferente. 'Não se preocupe não vou tentar fugir.' A voz dela era fria. Li concordou com a cabeça, sem falar mais nada. Poucos minutos depois, ela aproximou-se do rio para beber um pouco de água. Li estava sentado embaixo de uma árvore com as costas apoiadas no tronco e observava a menina.

            Sakura levantou um pouco o quimono e molhou seus pezinhos na margem do rio, sorriu um pouco observando os peixinhos que vinham beliscá-los. Abaixou-se para beber um pouco da água limpa e fresca. Depois virou-se e saiu do rio, sentando-se na beirada, e mantendo-se o mais afastada possível de Li, aquilo já estava incomodando demais o general, aquela indiferença estava lhe fazendo um mal  terrível.

            Levantou-se e foi até ela, parando ao seu lado, Sakura nem ao menos se deu ao trabalho de virar para ele.

'Estamos próximos à cidade proibida.'

'Eu sei.' Foi a resposta seca dela.

'Iremos diretamente ao imperador.'

'Como quiser. Quanto antes melhor.'

            Li arregalou os olhos um pouco e virou-se para ela observando a pequena figura sentada no chão abraçando os joelhos. 'Droga! O que aconteceu com você?'

            Sakura assustou-se um pouco com a pergunta, levantou o rosto e o encarou ainda sentada no chão. 'Não houve nada, só não quero ficar protelando mais isso.'

'Você já parou para pensar no que vai acontecer com você, garota?'

'Hummm acho que devo receber cinqüenta chibatadas e logo depois eles arrancam a minha cabeça.'

'E você fala isso com esta calma?! Como se fosse a coisa mais natural do mundo?!'

            Ela levantou-se do chão e sem desviar os olhos dele disse: 'E a morte não é natural na lei dos homens? Além disso, antes morrer logo de uma vez do que ficar vivendo num mundo horrível como este!'

'Não acredito que ainda está pensando naquela mulher.'

'Vai tratar sua esposa assim, general? Vai humilhá-la e tratá-la como uma vaca reprodutora e saco de pancadas?'

'Está me desrespeitando, Kinomoto.'

'Eu vou morrer de qualquer maneira, não importa o que eu disser.'

'Coloque-se no seu lugar! É uma mulher, uma criminosa, porte-se como uma e respeite a minha presença.'

'Humph...' Soltou, afastando-se de Li, que a pegou pelo pulso com força.

'Não suporto esta sua arrogância, Kinomoto. Acha-se diferente de todas as mulheres só porque é louca!'

'Louca? Então uma mulher que pensa, é louca para você?'

'Sim, uma mulher não tem que pensar, não deve pensar em nada que não seja cuidar da sua família.'

'E rezar para sobreviver a um marido estúpido e ignorante que foi obrigada a aceitar!' Ela gritou puxando o pulso que ele prendia. 'Me deixa em paz, general! Assim que acabarmos esta viagem, o senhor se verá livre de mim.'

            Li abriu a boca para falar algo, mas ela já tinha se afastado.  Sem querer, chutou uma pedra que tinha no chão com força e soltou um palavrão. Sakura conseguia lhe tirar do sério, mas que se dane, ele a levaria para o imperador e ela seria julgada.

*~*~*

            Sakura conseguia ver as torres da cidade proibida a sua frente, sem querer tremeu. Não podia negar, estava com medo, medo de morrer. Por mais forte que tentasse parecer, agora, observando o seu matadouro, sentia um desespero lhe brotar no peito. Li sentiu isso. Sentiu-a tremendo entre os seus braços, apertou-a mais fazendo com que ela se aproximasse de seu peito. Abaixou os olhos, vendo-a olhar fixamente para a cidade proibida, respirou sentindo o perfume que emanava dos cabelos cor de mel daquela mulher. Não, ele não poderia denunciá-la. Não permitiria que ninguém fizesse mal a ela. Parou com o cavalo de súbito, fazendo com que Sakura se assustasse.

            Ela não falou nada, ficaram os dois parados, em cima do corcel em silêncio. Ela com medo e ele com dúvida se manteria o seu plano de entregá-la ao imperador. E se o imperador a condenasse? E se a prendessem naquela prisão fétida que ele conhecia? Não! Por Deus, não suportaria saber que algum ser nojento a tocasse, tocasse a sua flor.

"Deus no que estou pensando!" Ele exclamou para si próprio. "Meu dever é levá-la para julgamento, ela me fez de palhaço durante meses. O que está acontecendo comigo?" Pensava o General quase em desespero. Ele sabia exatamente o que fazer numa batalha, mas numa situação como aquela ele simplesmente sentia-se indeciso. Ao mesmo tempo que repudiava aquela mulher, queria que ela permanecesse ao seu lado. Rodou com o cavalo em círculos, pois o animal já estava ficando irritado em ficar parado no mesmo lugar.

'O que está fazendo?' Perguntou Sakura, não entendendo a hesitação de Li.

            Ele não respondeu, estava pensando, estava tentando raciocinar direito. 'Está na hora do almoço, vamos esperar um pouco. Não quero atrapalhar o imperador.' Falou como desculpa para ganhar tempo para si próprio. Cavalgou devagar com o seu corcel pela cidade que ficava ao redor do templo do imperador. Parou em frente a uma cantina. Saltou e se afastou para amarrar o cavalo junto com os outros. Olhou para Sakura que estava quietinha e com os ombros encolhidos. "Porque ela não foge, droga?" Pensava ele aflito. Se ela fugisse, ele não a perseguiria mais. Ficou olhando para ela que estava esperando-o em frente à cantina, parada, imóvel. Levantou um dos braços e comprimiu com uma das mãos a fronte tentando pensar, tentando entender o que acontecia com ele.

            Sakura virou-se para ele e o fitou, ficaram assim apenas se olhando. Ela rezando para que Deus não a fizesse sofrer tanto antes de sua morte e ele rezando para que Deus desse uma solução para o dilema que sofria.

            Foi quando um pequeno grupo saiu da cantina conversando, eram soldados, mas não eram chineses. Li arregalou os olhos, vendo-os se aproximar de Sakura e um esbarrando nela.

'Oh desculpe-me senhor, estava distraída.' Ela falou sem graça.

'Oras mulher, porque estava parada com uma tonta em frente à entrada?' Falou um soldado mais nervosinho.

            Ela levantou os olhos, não gostando do tom de voz dele, foi quando reparou no senhor que havia esbarrado. Ela sorriu sem graça e deu um passo para trás, a última coisa que queria era entrar em problemas. Foi quando o senhor puxou o rosto dela para cima, assustando tanto ela quanto Li, que caminhou rápido ao encontro da pequena tropa que rodeava Sakura.

            O senhor apertava o seu queixo para cima forçando a menina a olhá-lo, Sakura viu um sorriso brotar nos lábios daquele senhor, mas não era um sorriso malicioso. "O que este homem quer comigo? Porque não me solta?" Pensava começando a ficar nervosa com aquela situação.

'Solte-a!' Ordenou Li com voz altiva, enquanto literalmente empurrava os soldados para que chegasse até Sakura e o senhor.

            O senhor a soltou ainda com um sorriso nos lábios. 'Tem olhos lindos, minha jovem.' Falou de forma serena. 'Em toda minha vida, tinha visto olhos tão belos em uma única jovem.'

            Sakura franziu a testa e olhou com desconfiança para o senhor. Li parou ao lado dela e, involuntariamente, ela se agarrou ao braço do General. Li encarou o senhor com olhos em chamas, mas era muita petulância de um estrangeiro ficar cortejando as mulheres chinesas.

'Deveria respeitar as mulheres do país que visita senhor'. Falou de forma ameaçadora.

            O senhor deu um simpático sorriso e pediu para os soldados que ameaçaram atacar Li pararem. 'Perdoe-me se me aproximei demais de vossa esposa. Não era minha intenção desrespeitá-lo ainda mais que vejo que é um militar assim como eu.' Deduziu observando a farda do rapaz.

            Li ficou em silêncio apenas o encarando sério, porém, não estava gostando da maneira com que ele não conseguia tirar os olhos de Sakura. 'Deveria saber melhor os costumes de um país antes de visitá-lo, senhor...' Li tentava manter a diplomacia apesar de que sua vontade era dar um murro nele.

'Perdoe-me novamente, meu jovem. Sou o representante do governo japonês para negociar com seu imperador algumas questões que não devem ser mencionadas fora das muralhas da cidade proibida.'

            Li franziu a testa. Ele sabia que o imperador Wing estava querendo negociar a muito tempo com os japoneses, não só com relação a comércio quanto a problemas com alguns invasores. Respirou fundo tentando manter a calma. 'Sou o general Li Xiaolang.' Apresentou-se.

            O senhor sorriu. 'General? Penso que é muito jovem para ser um general, então imagino que seja um dos melhores guerreiros deste país. Ah, sim agora lembro-me do imperador Wing comentar sobre um jovem militar que chegaria por estes dias, ele e um capitão que particularmente tenho curiosidade enorme de conhecê-lo já que possui o mesmo sobrenome que o meu.'

            Sakura arregalou os olhos e apertou mais forte o braço de Li, o rapaz também não pode deixar de mostrar-se surpreso. 'O que disse?' Li perguntou franzindo a testa.

'Sou o General Kinomoto Fujitaka.' Falou inclinando levemente a cabeça à frente.

            Li sentiu a pressão no seu braço diminuir e virou-se para Sakura.  'Kinomoto?' Ele a chamou, tentando fazer com que ela não perdesse os sentidos, foi em vão, a única coisa que pode fazer foi pegá-la nos braços antes que atingisse o chão. Ele levantou-se com ela e encarou o general a sua frente surpreso. 'Acho que temos muito o que conversar, General Kinomoto. Por favor, me acompanhe.'

*~*~*

            Sakura sentia sua cabeça dar voltas, sim muitas voltas. Levantou um braço e levou até seus olhos tentando entender o que acontecera. Abriu-os e viu o teto de madeira. "O que aconteceu? Onde está Xiaolang?" Pensou, levantando-se ainda zonza. Foi quando avistou Li e o tal senhor sentados a uma mesa, ela estava deitada num divã. Olhou em volta e viu que estava num escritório. Sim... era o escritório de Li dentro da cidade proibida. "Deus, já entramos na cidade proibida!" Constatou assustada.

            Li levantou-se e foi até ela. Abaixou-se até tocar um dos joelhos no chão e ficar a altura da menina que ainda o olhava assustada. Ele sorriu para ela. Como era lindo o sorriso dele, ela pensou para si.

'Está melhor?' Perguntou. Ela apenas confirmou com a cabeça ainda sentindo-se um pouco assustada em saber onde estava. 'Acho que deveria conversar com o General Kinomoto agora.' Falou, levantando-se e a puxando junto.

            Sakura desviou os olhos de Li e fitou o rosto sorridente do senhor a sua frente. Ele levantou-se não conseguindo conter o sorriso e aproximou-se dela. 'O general Li me informou que o seu sobrenome é Kinomoto também.'

            Sakura olhou de relance para Li que apenas fez um gesto para que ela falasse. Voltou a fitar o senhor e confirmou com a cabeça em silêncio.

'Quantos anos realmente você tem, Kinomoto?' Li perguntou com o tom de voz sério. 'Não adianta mentir agora.'

            Ela virou-se rapidamente para ele e pode perceber que seu rosto estava duro. Talvez porque aquela simples pergunta o fez lembrar como ela mentiu para ele. Suspirou antes de responder. 'Agora estou com dezesseis.'

'E você sabe o nome de seus pais?' O senhor mal conseguia controlar o nervosismo, apertava as mãos de leve uma na outra enquanto devagar aproximava-se da menina que ainda permanecia ao lado de Li. Era incrível como apesar de tudo, estar ao lado de Li lhe deixava com a sensação de segurança.

'Minha mãe se chamava Nadeshiko... Amamiya Nadeshiko.' Começou a falar incerta. O senhor abriu mais o sorriso, mal conseguindo manter-se calmo. 'Mas eu não sei onde ela está agora.' Falou rapidamente.

'E o seu pai?' Ele perguntou segurando as mãos dela.

            Sakura desviou os olhos novamente dele por alguns segundos e fitou Li que havia se afastado e estava atrás da sua mesa observando-os em silêncio. 'Kinomoto Fujitaka... pelo menos foram estes os nomes que o senhor Yang me deu e realmente não...'

            Ela não conseguiu terminar de falar, pois sentiu o senhor abraçá-la forte contra o peito, tão forte que a fez sentir as costelas estalarem e de forma tão carinhosa que nunca pensou em um dia ser abraçada.

'Ah minha querida...' Ele sussurrou ainda apertando-a contra o peito. 'Deus sabe como eu procurei sua mãe... e agora....' Ele a afastou um pouco de si, mas tinha ainda os braços dela presos entre suas mãos trêmulas. 'Você é tão bela quanto sua mãe.'

'Eu não estou entendendo. O senhor quer dizer o quê?' Fitou-o e via-se em seus olhos verdes sua completa confusão. Arriscou a pergunta, mesmo sabendo que seria uma loucura se fosse respondida como afirmativa. 'Que é meu pai?' Ela falou um pouco incerta ainda, não conseguia acreditar no que estava acontecendo. Seu pai era tido como morto e agora, vendo aquele senhor sorrindo para ela com tanta doçura, com tanto carinho...

            Ele balançou a cabeça positivamente enquanto via as lágrimas saírem dos belos olhos de esmeralda, tão belos quanto os de sua amada Nadeshiko. Abraçaram-se novamente de forma carinhosa.

            Li deu um longo suspiro e saiu do escritório, mas ficou parado ao lado da porta, encostou-se na parede olhando para o belo lustre que enfeitava o corredor. Franziu a testa pensando no que fazer agora. "Não há mais nada a fazer agora. Ela não é mais sozinha no mundo". Pensou afastando-se do escritório.

*~*~*

            Sakura estava na sacada de um hotel onde observava o movimento da cidade. Depois que descobrira que tinha um pai e que ele estava disposto a levá-la para o Japão para viver com ele, tudo havia mudado. Li desistiu de entregá-la para o imperador e ela esperava apenas o pai terminar suas obrigações com o governo chinês para embarcar com ele para a terra do sol nascente. Lá, ela teria uma nova vida! Poderia até mesmo casar-se com um homem bom e quem sabe ele até se apaixonaria por ela, já que era filha de um japonês. Sorriu de pura felicidade em ver como a vida estava sendo maravilhosa com ela agora.

            A única coisa que ainda lhe doía no peito era o fato de não mais ter visto Li. Depois que saiu do escritório dele com o pai, não tinha mais encontrado-o. Ela sentia-se tentada a perguntar para o pai sobre ele, mas Fujitaka não gostava nem de mencionar o nome do general. Li ainda tinha poder para mandá-la para a prisão, e seria prudente ele esquecer que ela existia. Aí é que estava o ponto, ela não queria que ele a esquecesse.

            Sakura contou tudo sobre sua vida para o pai, sobre onde cresceu, o que sabia sobre sua família, sobre a venda para Dan e a fuga, mas não falou que fora Li o homem que teve que acertar para impedir de ser deflorada. Falou sobre sua entrada no exército, Fujitaka sorriu orgulhoso imaginando a menina enfrentando os húngaros, mas também temia saber que bem ou mal a vida da filha que acabara de encontrar estava nas mãos do General Li. Sakura teve que jurar ao pai que ele não havia tocado nela. O militar japonês estava correndo com suas obrigações para ir embora o quanto antes do país.

            Estava distraída quando avistou uma bela moça passeando sozinha pelas ruas fazendo algumas compras.

'Tomoyo...' Sussurrou sorrindo. Pegou a sombrinha rápido e saiu correndo para tentar alcançar a amiga. Um dos encarregados de sua segurança tentou impedi-la, mas não teve sucesso. Correu, chamando a amiga e parou a sua frente, pulando no pescoço da jovem que quase gritou assustada.

'Meu Deus! Sakura!' Exclamou surpresa, quase não reconhecendo a amiga. Depois de abraça-la, Sakura afastou-se dela sorrindo.

'Que saudades!' Ela falou ofegante.

            A concubina piscou algumas vezes ainda observando o rosto sorridente da agora bela jovem, a sua frente. Sakura estava com os cabelos um pouco mais compridos do que quando era Touya. Estava vestida com um belo quimono azul marinho finamente decorado e uma sombrinha mostrando que era uma mulher com status.

'Não me reconhece?' Perguntou Sakura, sorrindo meigamente.

'Claro que a reconheço, mas o que aconteceu? Por Deus, pensei que estivesse até morta!'

            Sakura enlaçou seu braço no dela e começou a caminhar. 'Tenho muita coisa para lhe contar, Tomoyo. Muita coisa. Encontrei o meu pai! Não sou sozinha agora.'

'Que maravilha! Não me diga que ele é um dos militares japoneses que estão visitando o imperador?'

            Sakura confirmou com a cabeça sorrindo.

'E o que está fazendo conversando comigo?' Ela perguntou brava.

'Oras, estava com saudades de você!'

'Por Deus Sakura, você agora é uma senhorita. Não pode ficar andando comigo!'

            Ela franziu a testa, mostrando que não tinha entendido nada. 'Você é minha amiga.'

            Tomoyo sorriu docemente para ela e passou a mão pelo rosto delicado da menina. 'Você agora é uma senhorita e eu sou uma concubina, não é bom para sua reputação que nos vejam juntas.'

            Sakura abriu um sorriso. 'Não, somos duas amigas. Agora vamos passear porque temos muito a conversar. Oras, ficamos muito tempo sem nos ver!'

            Tomoyo sentiu-se mal no começo, mas Sakura falava com aquela jovialidade tão própria dela que logo os olhares atravessados que as outras mulheres lançavam sobre elas não incomodavam mais.

'Nossa, pensei que o General fosse matá-la! Precisava ver como ele estava transtornado quando veio perguntar por você.'

'Ele bateu em você?!' Perguntou assustada.

            Tomoyo balançou a cabeça negando. 'Quase.'

'Ele é um grosso mesmo...' Falou de forma triste. Ela mordeu o lábio inferior mostrando claramente para a amiga que queria perguntar alguma coisa. 'Você... quer dizer, ele já foi... você o viu por estes dias?'

'Ele foi ao meu estabelecimento a dois dias atrás com alguns outros oficiais.' Tomoyo falou, observando a amiga que permanecia caminhando olhando para frente. Caminharam um tempo em silêncio. 'Você gosta dele, não é?' Ela perguntou de repente assustando Sakura, mas ela não ousou responder.

            Tomoyo sorriu e continuou a caminhar ao lado dela. 'Mas diferente das outras vezes, ele só bebeu. Nunca o vi bebendo tanto.'

'Deve estar comemorando que tenha se livrado de mim. No final, fizemos uma troca, eu salvei a vida dele e ele salvou a minha, não me entregando para o imperador.'

'Se as coisas fossem tão fáceis assim na vida.'

'Na minha vida tudo sempre foi difícil. Pelo menos isso tinha que ser simples, não?' Ela perguntou, piscando para Tomoyo que sorriu para ela.

            Conversando, as duas amigas voltaram a andar. Quando Sakura sentiu como se algo ardesse em suas costas, virou-se lentamente deparando-se com um par de olhos cor de âmbar, fitando-a do outro lado da rua. Lá estava ele, de farda, rodeado por seus soldados.

            Tomoyo reparou que a amiga ficou parada olhando como uma boba para o homem do outro lado da rua.  'Você o ama, Sakura. Está em seus olhos que você o ama.'

'Isso não importa. Ele me odeia.' Falou tristemente observando o General que invadia seus sonhos todas as noites.

'Será?' A concubina perguntou observando o casal que estava alheio a tudo que acontecia a sua volta.

Ficaram se olhando por um tempo, até um soldado chamá-lo. Li se voltou e trocaram algumas palavras.

'Vamos, Tomoyo, por favor...' Sakura suplicou virando-se e junto com a concubina caminhou afastando-se do local. Tornando a se voltar para ela, Li a viu se afastar devagar, acompanhada pela amiga. Observou-a até que desaparecesse de sua vista.

'Quem é a bela dama, senhor?' Perguntou o soldado reparando que seu supervisor estava distraído.

'Você não acreditaria, soldado. Você não acreditaria.' Falou virando-se e caminhando em direção ao centro do grupo de soldados.

*~*~*

            Era uma bela manhã chinesa. Sakura caminhava de braço dado com o pai pela cidade. Fujitaka não queria levá-la, porém a jovem insistia tanto em participar da festa do Yuan Xiao Jie que simplesmente o homem não teve como recusar. 

            Os palácios, assim como as ruas, estavam todos decorados com motivos chineses e flores. Desde os primeiros raios de sol, ouvia-se fogos de artifício explodindo a toda hora. Música, cores, alegria. Aquilo tudo fazia com que Sakura transbordasse de felicidade. Ela já havia participado da festa ano passado, mas estava ao lado de Li que fazia a segurança do imperador, não teve como aproveitar e tinha que fingir indiferença, mas agora ela estava livre para desfrutar de cada momento.

'Veja que lindo, papai!' Exclamou apontando para as luzes coloridas que riscavam no céu. 'Pena que o barulho pareçam de morteiros.'

            Fujitaka pousou sua mão no braço da filha e sorriu de forma meiga. 'Viu como nem tudo que parece realmente é?'

            Sakura franziu a testa. O que o pai queria lhe dizer com aquilo? Talvez só estivesse querendo fazer com que a filha parasse de pensar nas guerras que participou. Abriu um sorriso para o senhor e inclinou a cabeça até bater no braço dele. 'Estou muito feliz de estar aqui com o senhor, papai.'

'Eu também minha querida.' Ele respondeu. 'Mas ainda acho muito arriscado. Podemos encontrar com o...'

'Não se preocupe, papai. O Palácio é enorme. Não o encontraremos.' Ela falou tentando disfarçar que era justamente isso que mais queria, rever Li. Nem que fosse de longe, nem que fosse por alguns segundos.

'Os chineses são muito alegres.' Uma voz masculina chamou a atenção de Sakura. Ela virou-se para o lado e viu o Capitão Hiraguizawa Eriol. Sorriu para o belo rapaz que desde que foi apresentado a ela, não saiu de seu lado. Sakura era esperta o suficiente para saber que ele estava interessado nela. Oras, agora era a filha do General Kinomoto e não mais uma órfã de um soldado japonês. Sorriu para ele deixando-o encabulado.

'Sim, somos um povo alegre quando não estamos em guerra, capitão.'

'Agora é uma japonesa, querida. Verá que seu povo também é muito alegre.'

            Sakura virou-se para o pai. 'Ainda não consigo me ver como uma japonesa.'

'Mas fala tão bem nosso idioma.' Surpreendeu-se Eriol.

'Tomoyo me ensinou. Ela é japonesa. Ensinou-me japonês e inglês.'

'Tomoyo?' Eriol perguntou um pouco intrigado.

'Sim, uma amiga muito especial. Foi ela quem me ajudou a superar o momento mais difícil da minha vida.'

'Então eu também devo muito a esta senhorita.' Fujitaka sorriu para a filha.

            Sakura franziu a testa tendo uma idéia. 'Sabe, papai, acho que a senhorita Tomoyo adoraria voltar para o Japão conosco.'

'Se ela a ajudou tanto. Tem um lugar garantido no meu navio.'

            Sakura abriu um maravilhoso sorriso e deu um beijo estalado no rosto do pai.

            Fujitaka sorriu orgulhoso. 'Não lhe disse, Eriol. Minha filha vale muito mais que ouro.'

"Trezentas moedas". Sakura parou de caminhar quando a voz de Li invadiu sua cabeça. "Só espero que a sua vadia valha a pena".

'A senhorita está bem?' Eriol perguntou vendo que a pequena jovem ficou pálida de repente.

'Querida?' Fujitaka pegou o rosto da filha com carinho e estranhou os olhos brilhantes dela. Era claro que Sakura queria chorar, mas controlava-se. 'O que foi, meu bem?'

'Nada papai.' Ela falou tentando dissipar a preocupação do senhor. 'Acho que esta confusão toda me deixou um pouco zonza. Vamos...' Ela deu um passo a frente segurando o braço do pai. 'O imperador já vai falar com o povo.'

            Fujitaka e Eriol entreolharam-se apreensivos, mas seguiram a jovem que mudou de humor completamente. Seguiam pelas ruas para chegarem aos portões da cidade proibida. Foi quando um grupo chamou a atenção de Sakura. A jovem parou de repente e sorriu de forma feliz. Largou o braço do pai e correu até uma jovem que estava no meio do grupo. 'Cixi!' Ela chamou atrás da jovem.

            Cixi virou-se assustada e arregalou os olhos vendo a amiga a frente dela. 'Sakura?' Perguntou observando a jovem que agora vestia um belo quimono ricamente decorado. Sakura estava linda e perfumada, bem diferente do último encontro delas. 'É você mesma?'

'Oras claro que sou eu!' Falou abraçando-a com carinho. 'Que bom te encontrar!'

            Cixi recuperou-se do choque e abraçou apertado a amiga. 'Meu Deus, Sakura, o que aconteceu com você?'

            Sakura afastou-se dela, mas ainda a olhava com carinho. Abriu a boca para falar porém a voz grossa e rabugenta da senhora Yang a fez calar-se. 'Cixi! O que está fazendo conversando com estranhos?!'

            As duas jovens viraram-se para a mulher e Sakura não teve como não sorrir de lado. 'Como vai senhora Yang?' Falou em tom irônico.

            A velha arregalou os olhos fitando a garota. 'Ainda está viva, impura?'

'Para a sua infelicidade!' Ela falou divertindo-se.

'Sakura, não a irrite.' Sussurrou Cixi segurando mais forte o braço da amiga.

            Sakura, no entanto, levantou mais o rosto e encarou a senhora a sua frente. 'Não se preocupe, Cixi. Ela não pode fazer mais nada contra mim.'

'Então aquele general a fez sua amante?' A senhora falava com o tom de voz nocivo. As outras jovens que faziam parte do grupo fitaram Sakura com desprezo, porém a jovem não se abalou.

Ela já ia responder quando ouviu seu pai chamando-a. Os dois pararam ao lado da jovem. 'Por que se afastou de nós de repente? Há muita gente na rua, pode se perder.' Fujitaka tinha o tom de voz preocupado.

'Desculpe-me papai. Mas eu queria falar com Cixi. Fomos criadas juntas.'

            O homem desviou os olhos da filha e fitou uma bonita jovem ao lado dela. Sorriu e inclinou-se a frente cumprimentando-a. Sakura apresentou Cixi ao pai e fez questão de colocar o General na frente do seu sobrenome. Virou-se rapidamente para a senhora Yang e sorriu abertamente como o rosto espantado dela.

'Então foi esta senhora que a criou?' Perguntou Fujitaka virando-se para a senhora que inclinou a cabeça para baixo em respeito.

'Sim, papai, foi ela quem me criou.'

'Sinto-me honrada em ter podido educar vossa filha, general Kinomoto.' Yang falou ainda fitando o chão.

            Fujitaka virou-se rapidamente para Sakura e depois para o grupo de mulheres a sua frente. 'Realmente deve sentir-se honrada, senhora. Minha filha é uma jovem muito especial.'

'Tenho certeza disso.' Falou Yang.

'General. Senhorita.' Interrompeu Eriol. 'Precisamos nos apresar. O imperador já irá falar ao povo e pediu vossa presença.'

'Verdade. Precisamos ir agora.' Fujitaka falou. 'Vamos, querida.'

'Cixi pode ir conosco, papai? Tenho certeza que ela ficará feliz em conhecer a cidade proibida.'

            A jovem de olhos negros abriu um sorriso enorme e mal conteve a alegria.

'Sua amiga pode nos acompanhar com muito prazer, senhorita.' Falou o capitão.

            Sakura pegou a mão de Cixi e começou a puxar. 'Vamos Cixi. Vou lhe mostrar como é bela a morada de nosso imperador.'

            Os quatro afastaram-se do grupo de mulheres. Yang mantinha-se calada observando a sorridente jovem de cabelos castanhos.

'Cixi tirou a sorte grande.' Uma menina falou. 'Quando poderíamos imaginar que Sakura encontraria o pai?'

'Viu como ela está bela?'

'E o perfume que usava? Aposto como é um daqueles caros.'

'Será que aquele belo capitão é o pretendente dela?'

'Acho que sim. Reparou como ele olhava para ela?' As meninas riram baixinho. 'Eu queria um pretendente assim para mim.'

'Calem-se!' Gritou Yang com raiva. 'Sakura continua sendo um estorvo. Aposto como aquele general já a tornou indigna de qualquer casamento.'

            As jovens entreolharam-se assustadas com o descontrole da senhora que começou a caminhar empurrando quem quer que estivesse a sua frente.

'Mas aquele general que a prendeu também era muito bonito'.  Uma garota comentou com as outras antes de seguir a senhora que as criava.

Continua.

N/A: Atualizado antes do tempo! IUPI! Agradeçam as minhas maravilhosas revisoras que mandaram tudo para mim antes do tempo! Rô (Rosana) e Andréa Meiouh! Elas são demais!!!

Agora nossa Sakurinha não é mais sozinha e pelo jeito tirou a sorte grande! Para os que estavam querendo a vingança dela contra a maldosa senhora Yang, aí está! Inicialmente eu não ia fazer o reencontro com Cixi, mas recebi alguns e-mails e reviews pedindo isso, então resolvi fazê-lo. Por isso o capítulo está um pouquinho maior que os outros. Os próximos dois (que alias são os últimos) também estão mais ou menos deste tamanho.

Finalmente Kinomoto Fujitaka apareceu! Lembro-me que alguém mencionou-o num review nos primeiros capítulos! E foi bem na época que eu estava escrevendo este capitulo de reencontro! Acho que meu fator surpresa não funcionou em todos! Mas tudo bem! Hehehe

Para quem andava perguntando pela bendita correntinha de Sakura, só tenho uma coisa para falar: Aguarde e confie! Eu quase nunca deixo furos nos meus fics... tudo bem que a gente não pode ser perfeita, mas pelo menos tentamos. Ainda mais quando se tem duas revisoras para apontar tudo para você! Hehehehe

Ah gente, eu sei que não tem nada haver o que eu vou falar agora, mas eu não resisto! Alguém ai já viu as fotos do filme "The last Samurai"?! Gente, o Tom Cruise está TUDO DE BOM de armadura japonesa!!!! Ai-meu-deus! Eu perdi o ar quando eu o vi na capa da Premier acho que deste mês... não lembro (Kath dando uma de Dory). Pode ter certeza que eu vou estar na pré-estréia deste filme só para ver ele!!!!

E finalizando, pois estas notas estão enormes: OBRIGADA pelos reviews! Obrigada de coração a todos que sempre deixam suas opiniões sobre esta história. É uma pena, mas ele realmente está acabando! Buááááá!

Beijos a todos,

Kath