Olá turma!

Este capítulo é dedicado ao meu amigo Gandalf, certamente um autor de estilo único e característico.

Felipe, esse foi o capítulo que envolve uma certa carga dramática. Sei que estou longe de sua qualidade e sensibilidade ao escrever, mas confesso que o seu trabalho me estimula a tentar melhorar cada vez mais. Pelo seu talento e por sua amizade, esse capítulo é seu.


QUARTO DE HOTEL

2002 – Egito

Cidade do Cairo

O dia da chegada - 09h12

Enquanto ia do aeroporto para o hotel, Sonomi se impressionava com a quantidade de pessoas que circulavam na rua. Eram muitos homens e mulheres andando de um lado para o outro, rapidamente, freneticamente, quase formando um paredão humano nas ruas da cidade do Cairo.

Em alguns trechos do caminho, avistava homens usando túnicas e turbantes. Podia perceber mulheres vestidas com túnica e véu. Com certeza estava na parte islâmica da cidade, uma das etnias mais importantes no Egito atual. Um pouco mais além, homens e mulheres com roupas bem ocidentais, mas todos muito morenos, certamente por causa do sol sempre forte.

E as crianças? Avistou várias delas, sempre acompanhadas de adultos, pelo jeito a criação ali era bem conservadora. Não pôde deixar de perceber outras crianças nas ruas, pedindo esmolas e vendendo bugigangas. "Realmente, a miséria não escolhe rosto" — pensou ela, enquanto prosseguia ao hotel. Um aperto grande em seu coração evidenciava o grande afeto por aquelas pessoinhas tão ternas e carentes que tinha visto, o que certamente a credenciava para o trabalho que lhe fora proposto pela ONU. "Graças a os céus, eu consegui evitar isso para minha Tomoyo" — o pensamento vinha de encontro a outro sentimento até mesquinho, de que sua filha jamais chegaria àquela condição. Mas como evitar de sentir um pouco da dor que se manifestava dentro dela ao ver aquelas cenas de abandono?

No interior da limusine, ela percebeu que estava em outra parte da cidade, com ruas mais largas, mais bem cuidadas. Com certeza chegava à região rica da cidade, onde estava o hotel no qual já tinha reservas feitas.

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Mesmo tendo chegado a algumas horas, Fujitaka sempre ficava espantado com o Cairo. O contraste do clima de civilização antiga com as facilidades da vida moderna era simplesmente fascinante. Por força de sua profissão, Fujitaka se impressionava com esse encontro do antigo com o atual. O homem, porém, o agente causador destas mudanças, continuava ali.

Lembrou-se das ruas em que haviam apenas grades separando a calçada das praças, prédios, monumentos... Tudo ficava acessível para a admiração alheia. O governo egípcio realmente explorava ao máximo esse recurso natural tão abundante na cidade do Cairo: os pontos turísticos.

Ele se deleitava com aquilo. Já viera várias vezes ao Egito, mas nunca se cansava de averiguar, esquadrinhar, pesquisar tudo o que pudesse sobre a história, a geografia, os monumentos e construções daquele país tão enigmático, único no mundo. Acabou se tornando uma autoridade em tudo o que se referia a este país. Tornou-se, além de arqueólogo, egiptólogo. E não era qualquer um, o professor Fujitaka Kinomoto era respeitadíssimo em todo o mundo quando o assunto era Egito Antigo, até entre seus colegas arqueólogos...

Da sacada do quarto do hotel onde estava hospedado, Fujitaka sentia aquele clima quente e seco da cidade, somente contrabalançado com a umidade causada pela evaporação do Rio Nilo. O Marriot Hotel ficava em uma ilha no meio do rio, uma idéia muito interessante de se aproveitar para um hotel. Na verdade, antigamente ali era um palácio, que foi comprado e readaptado para funcionar como hotel, e que hotel! Classificação 5 estrelas AA, uma das maiores no cenário internacional.

O hotel conta com um serviço de limusine para trazer os hóspedes VIP, e estava chegando com mais um. Ou seria mais uma?

Nesse exato momento, uma brisa leve e um perfume floral que ele conhecia muito bem desviaram sua atenção para o interior do quarto. Fujitaka virou-se, e ficou cara a cara com uma pessoa muito querida.

— Nadeshiko, como é bom te rever! — Fujitaka expressava imensa ternura sempre que via sua esposa.

— Olá Fujitaka! — o sorriso encantador de Nadeshiko anunciava que boas notícias ela trazia.

— Você também estará comigo aqui? Que bom! — Fujitaka animou-se, como sempre ocorria quando via a esposa, apesar de somente em espírito.

— Fujitaka, eu vim te dizer que vou te ver menos a partir de agora. — a expressão séria, porém terna de Nadeshiko não deixavam dúvidas quanto à seriedade desta afirmação.

Fujitaka olhou pra ela, e ficou imóvel durante alguns segundos. Sem tirar os olhos dela, seu rosto foi perdendo aquele sorriso que o iluminava até tomar uma expressão mais séria, levemente triste. Sabia que esse dia logo chegaria, só não queria que fosse agora...

— Sim, eu já esperava. Você não ficará mais neste mundo, não é?

— Sim e não. Minhas prioridades no mundo espiritual mudaram, e elas não podem incluir mais você, querido.

Novo momento de silêncio. Esse foi mais pesado, duro. Fujitaka tentou amenizar um pouco:

— Está me pedindo divórcio por acaso? — Fujitaka baixou os olhos, num sorriso curto e triste...

— Não, claro que não, querido! — Nadeshiko voltou a sorrir, melhorando um pouco o clima. — Sabe porque eu ficava perto de vocês e das crianças?

— Porque nós precisávamos de você com a gente, querida. Eu ainda preciso... — Fujitaka já falava com a voz embargada, mais entristecido ainda.

— Tem certeza, Fujitaka? — Nadeshiko aproximou-se dele, olhou nos olhos de seu esposo viúvo, só que a cinco centímetros deles. Sabia que seu esposo não era mentiroso, apenas não admitia a realidade.

Fujitaka calou-se, envolvido por um tremendo sentimento de culpa, que não passou despercebido a ela. Nadeshiko olhava para ele como se quisesse desvendar sua alma.

— Até eu sei que vocês gostam um do outro, querido. — Nadeshiko ficou só olhando a cara de perplexidade e surpresa de seu marido, e não pôde deixar de rir. Ante o silêncio de seu viúvo querido, continuou: — Sei hoje que o houve entre nós cumpriu seu propósito. Eu nasci para amar você, Touya e Sakura, e isso não vai mudar, onde quer que eu vá. Mas você...

Fujitaka já sabia o que iria ouvir, e olhando nos olhos dela, esmagado pela culpa da traição, começou a chorar, sem conseguir pronunciar uma palavra. As lágrimas rolavam, ou melhor dizendo, jorravam em profusão...

— Não fique assim, querido... Eu a amo também, e fico feliz por vocês! — a alegria de Nadeshiko o fez chorar menos copiosamente. Continuou: — Todo o amor que ela achava que sentia por mim, na verdade nunca foi pra mim... E ela logo vai querer entregar esse presente para o verdadeiro objeto do seu desejo. — fazendo um tremendo esforço, Nadeshiko alisou o cabelo daquele homem que a fizera tão mulher, tão completamente satisfeita e amada. — Sim, querido, vais amar outra vez, e eu quero muito que tudo dê certo para ti!

— Mas... mas...

— Não vim aqui pra ouvir, querido, vim pra falar. Nos veremos mais outras vezes, mas vou te dar espaço para sua privacidade. Quando você precisar, saiba que estarei sempre por perto, e jamais deixarei de amar nenhum de vocês que são parte de mim, inclusive ela... — e Nadeshiko se pegou quase chorando, por saudade de sua querida família, e inclusive a que seria sua substituta como a mulher que conquistaria o coração de Fujitaka.

— Eu te amo, Nadeshiko. O que sinto por você não se apagará. — com muito custo ele se pronunciou.

— Eu também te amo, querido. Mas o que você sente e sentirá por ela é muito mais forte do que o que sentiste por mim. E eu adoro isso!!! — Nadeshiko continuava surpreendendo, até a ela mesma. — Adeus, meu amor. Mande lembranças minhas a Beep. — não conteve um sorriso aberto nesta última palavra.

— Adeus, meu amor... — Fujitaka soluçava forte, muito triste pra se surpreender, enquanto sua esposa afastou-se dois passos para trás, e sumiu ante seus olhos, levando seu perfume consigo. Imediatamente após, ele caiu ajoelhado no chão, e chorou amargamente, liberando de dentro de si aquela culpa que sentia por aprisionar em seu coração o amor por outra mulher que não fosse sua Nadeshiko.

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Chegando no seu quarto, Sonomi conferiu sua agenda e o que já suspeitava confirmou-se: tinha dois dias inteiros livres! Como uma criança que quer brinquedo, correu até o telefone e discou para a recepção, solicitando um pequeno lanche, não queria almoçar. Enquanto o lanche não chegava, decidiu que iria fazer um passeio à tarde, só restava saber onde. Pegou o guia do hotel Marriot, que continha os principais pontos turísticos de Cairo, e começou a escolher. "Pirâmides, não. Museus, também não. Monumentos, não. A Cidadela, não. Mesquitas, não também. Quem ia gostar disso tudo era o Fujit..." parou o pensamento no meio, e ficou vermelha e com raiva ao mesmo tempo, na verdade ficou furiosa! Levantou-se, começou a andar de um lado para o outro sem parar, com vontade de esmurrar a si mesma até cair. "DROGA! DROGA! DROGA!"

Depois de cinco minutos, sentou-se novamente diante da pequena mesa de estar, já mais calma, e continuou escolhendo. "Achei!!!!!! UM BAZAR!!!!!!" — lembrando-se de que sua querida Tomoyo tinha pedido várias coisas pitorescas da cidade. Certamente encontraria lá!

Um dos bazares mais tradicionais e famosos do Cairo: KHAN EL KHALILI, esse era o nome do lugar. Ligou para a recepção e confirmou que o hotel poderia prover condução e guia a qualquer hora em que quisesse ir lá. Achou o máximo, já que estava sem suas guarda-costas e queria fazer algumas coisas sozinha, sem olhos atentos sobre si. Foi para o banho, muito contente e animada com a idéia. Seria um ótimo passeio!


Well, nem sempre as coisas são como queremos... snif...

Triste, não? O que acharam? Digam-me! Comentem! Eu quero saber!

Até o próximo capítulo!