Fantasmas do Passado

Por Suryia Tsukiyono e Bad Kitty

Parte VI

O espadachim saiu quase correndo do hotel, estava muito atrasado e aquela manhã iria abrir o Koneko com Ken. Foi embora rezando para que seu amante ainda estivesse dormindo ou teria muitos problemas. Quando estava quase chegando na floricultura viu que não havia tido sorte, seu koi estava encostado na parede do lado de fora do Koneko fumando. Pela postura do loiro percebeu que ele estava irritado.

"Onde você estava, Aya?", perguntou Yohji segurando o ruivo pelo braço.

"Fui correr no parque como sempre faço", respondeu Aya sem olhar para seu amante que o segurava com força.

Sem dizer mais nada Yohji puxou o espadachim para o quarto, Ken quando viu o que estava acontecendo tentou interferir e impedir que ficassem a sós, mas não conseguiu.

"Não se meta, Ken, não é de sua conta", rosnou Yohji furioso antes de fechar a porta na cara do jogador.

Yohji andava de um lado para outro enfurecido, parecia pensar no que estava por fazer. Aya permanecia de pé no meio do quarto esperando que o loiro tomasse alguma atitude. Decidido Yohji cruzou o quarto e parou na frente do ruivo. Ficaram se encarando por alguns segundos, Aya temia que ele descobrisse onde ele havia estado aquela manhã.

"Onde você estava, Aya?", repetiu Yohji.

"Fui correr...", recomeçou Aya, mas foi interrompido por um violento tapa de Yohji.

"Vamos tentar de novo. Onde você estava? E não minta que estava no parque porque eu fui lá atrás de você", disse Yohji entre dentes, furioso. "Quando vi que você não estava lá fui atrás de Ken, mas ele estava dormindo....sozinho".

Não sabia o que falar, estava sem saída. Se mentisse e Yohji descobrisse ele ficaria mais enfurecido, mas se contasse a verdade ele o mataria, não tinha o que fazer.

"Com quem você estava?", perguntou Yohji segurando o ruivo pelos braços. "Pelo menos agora sei que você não esta me traindo com Ken, ou você também esta traindo Ken?".

"Não estava com ninguém, Yohji", mentiu Aya trêmulo. "Fui caminhar um pouco e perdi a noção do tempo, por isso me atrasei".

"Não minta para mim", gritou Yohji empurrando Aya na cama. "Odeio quando você faz isso".

"Mas eu...", tentou se explicar Aya, mas o loiro não deixou que terminasse.

"Cale a boca, não quero ouvir nem mais uma palavra sua", falou Yohji ficando de costas para o ruivo. "Você vai ficar nesse quarto hoje e não vai sair".

"Mas tenho que ...", tentou Aya. Era seu dia na floricultura não podia deixar Ken sozinho.

"Sem mas, vou cobrir seu turno e você não saia daqui. Quando eu voltar quero uma boa explicação para o seu sumiço", avisou Yohji olhando para Aya com raiva.

Aya ficou deitado na cama onde Yohji o havia deixado, sabia o que aconteceria quando ele voltasse não importariam suas explicações, porque o playboy com certeza já havia tirado suas conclusões precipitadas como sempre. Deixou de lado seus problemas e voltou a pensar no loiro que havia deixado no hotel. Ao mesmo tempo em que gostava de ficar com ele sentia-se mal ao lado dele, porque o fazia lembrar do tempo em que era feliz com seu amante. Esses pensamentos não saiam de sua cabeça por mais que tentasse, ele era a razão da infelicidade de seus amigos.

Já havia pensando em abandonar tudo, mas enquanto Kritiker estivesse cuidando de Aya-chan não podia fazer isso. Estava preso aquela vida miserável e ao seu namorado abusivo. Yohji o havia alertado que se tentasse deixá-lo ele mataria sua irmã, esse era o real motivo pelo qual ainda não havia terminado tudo com o playboy. Nunca contaria aquilo para ninguém para não colocar sua irmã em perigo. Pagaria seus pecados sozinho. Não iria prejudicar outras pessoas por sua estupidez mais uma vez.

Na floricultura Yohji era de pouca ajuda para Ken, ele não fazia nada além de fumar e resmungar deixando o jogador irritado. Apesar disso estava aliviado porque pelo menos enquanto o playboy estivesse ali Aya estaria seguro.

"Algum problema, Kenken?", perguntou Yohji debochado vendo que o jogador não tirava os olhos dele. "Preocupado com Aya? Não precisa ficar, não fiz nada para ele...ainda".

Teria que dar um jeito de ajudar o espadachim, Yohji não havia ficado nem um pouco contente ao acordar e não encontrar seu amante e para piorar tudo Aya havia se atrasado. Tinha vontade de sacudir o loiro até o baka ver o que estava fazendo com Aya.

"Por que você faz isso com ele, Yohji?", perguntou Ken assim que ficaram sozinhos na loja.

"Por que a preocupação agora? Você nunca se importou com Aya, se não estou enganado vocês nunca se suportaram", rebateu Yohji intrigado. Aya e Ken estavam agindo de forma estranha há algum tempo e ele não estava gostando nada daquilo. Não iria perder seu amante para ninguém, muito menos para Ken.

"Cansei de ficar vendo você maltratar Aya, ele não merece isso", respondeu Ken olhando desafiadoramente para o playboy que estava recostado no caixa.

"Você não sabe de nada, Kenken, então não se meta. Ele tem exatamente o que merece", retrucou Yohji amargou. "Vou sair para fumar".

Ken teve que se conter para não falar o que estava entalado em sua garganta, não podia dizer nada porque não sabia ainda o que havia acontecido naquela missão, mas com certeza logo descobriria. Voltou a fazer seu trabalho para se distrair antes que fizesse algo de que se arrependeria muito.

Aya passou o dia em seu quarto, não queria ver nenhum de seus colegas, odiava ver piedade nos olhos de Sena, Ken e Kyou e desprezo nos olhos de Omi, mas mesmo que quisesse sair não poderia porque seu koi havia trancado a porta.

Aguardava apreensivo Yohji, o playboy não deixaria seu atraso passar sem nenhuma punição. Sabia que não devia ter se distraído enquanto estava no hotel, seu amante agora iria infernizar sua vida e não o deixaria em paz até que contasse o que havia feito, mas não podia dizer nada e mesmo que dissesse ele não acreditaria.

As horas se passavam deixando-o nervoso, queria resolver logo aquela situação toda. Yohji com toda certeza estava em algum lugar bebendo antes de confrontá-lo, quando isto acontecia o loiro ficava incontrolável. Não agüentava mais ficar trancado no quarto sem ter o que fazer, precisava se distrair com alguma coisa ou seus pensamentos o enlouqueceriam.

Quando estava prestes a sair do quarto de qualquer maneira ouviu o carro de Yohji chegando. Em pouco tempo o playboy estava na porta do quarto, mas bêbado como estava demorou alguns minutos para conseguir abrir a porta. Entrou cambaleando no quarto e atirou-se na cama, Aya suspirou resignado vendo aquela cena deprimente. Era difícil acreditar que esse era o mesmo homem pelo qual havia se apaixonado.

Aproveitando que o playboy tinha desmaiado na cama, Aya foi treinar com sua katana, não queria pensar em nada no momento. Por algumas horas ficou absorvido com seu exercício, deixando de lado todas suas preocupações. Somente quando estava exausto demais para continuar é que resolveu parar, tomou uma ducha e voltou relutante para seu quarto, onde sua infeliz realidade o aguardava.

Mesmo cansado e com dores por todo o corpo devido ao esforço preferiu dormir na poltrona do que na cama com seu amante. Acomodou-se como podia na poltrona desconfortável e em poucos minutos estava dormindo.

Acordou assustado quando ouviu a porta do quarto batendo, ao olhar para a porta viu seu koi encostado nela. Lentamente Yohji cruzou o quarto e se aproximou do ruivo que aguardava temeroso o que aconteceria. Acho estranho o comportamento do playboy que aparentava calma, quando o normal dele era se descontrolar e atacá-lo.

"Estou esperando uma explicação, Aya", falou Yohji sentando-se na cama de frente para o ruivo.

"Eu já falei, Yohji, fui dar uma volta e perdi a noção do tempo", reafirmou Aya tentando parecer confiante.

"Tsc...tsc.... esperava que você me contasse a verdade desta vez", comentou Yohji acendendo um cigarro. "Você sempre foi um péssimo mentiroso, Aya."

"É verdade", insistiu Aya evitando olhar nos olhos do playboy.

"Com quem você estava?", perguntou Yohji sem rodeios, estava sendo difícil controlar sua raiva, mas estava conseguindo.

"Com ninguém, fui caminhar sozinho", afirmou Aya nervoso, seu koi não podia nem imaginar o que ele andava fazendo ou estaria morto.

"Maldição, Aya, não minta para mim!", gritou Yohji erguendo o espadachim pela gola da camiseta. "Você sabe que odeio quando você faz isso".

"Mas eu não estava com ninguém", murmurou Aya aturdido com a mudança súbita de comportamento de Yohji.

"Você acha que sou idiota, Aya? Você esta fazendo tudo outra vez", rosnou Yohji acertando um forte soco no rosto do ruivo que só não caiu porque ele estava segurando-o.

"Por favor, acredite em mim", disse Aya vacilando sabendo o que o esperava.

Irritado com a insistência do ruivo em não mudar a história, ele empurrou Aya com violência. Desequilibrado Aya caiu, o espadachim gemeu em dor quando sua cabeça entrou em contato com a perna da mesa. Ele começou a rastejar longe de Yohji.

"Não se mova", gritou Yohji, fazendo Aya congelar. As lágrimas de dor rolando por sua face pálida. Ele sabia o que iria acontecer, e não havia nada que pudesse fazer para parar, se tentasse só pioraria tudo.

Descontrolado Yohji ergueu o espadachim e o atirou de volta no sofá. Nem mesmo as lágrimas que caiam dos olhos ametista o comoviam, estava disposto a ensinar uma lição ao seu koi, uma lição da qual ele nunca esqueceria.

"Por favor, Yohji. Por favor, não faça. Nunca mais vou me atrasar", suplicou Aya. Ele odiava implorar, quase tanto quanto ele odiava a batida, mas a dor que a seguia era pior. Normalmente levaria uma semana para toda a dor finalmente deixar seu corpo. Gemeu quando Yohji acertou outro soco em seu rosto. Tentou se esquivar, mas como ainda estava tonto da pancada na cabeça caiu novamente.

Clamou em dor quando sentiu Yohji chutar seu lado. Ele enterrou seu rosto em seus braços para evitar que o loiro o acertasse no rosto. O playboy ficou mais furioso com a passividade do ruivo, Yohji o agarrou pelos cabelos e o ergueu do chão. Com força acertou um soco no estômago de Aya, fazendo-o perder o fôlego.

"A verdade, Aya, só quero saber a verdade!", gritou Yohji esmurrando Aya no rosto, enviando ele novamente ao chão.

Aya pensou por um minuto que ia desmaiar, porque tudo escureceu, mas infelizmente não iria escapar tão rápido daquela tortura. Não podia acreditar que Yohji estava batendo em seu rosto, ele raramente fazia aquilo. As contusões no corpo podiam ser escondidas debaixo de roupas, mas no rosto não. Sentiu o pontapé em suas costelas, gemeu quando a dor rasgou por seu lado. Não teve que lidar com a dor por muito tempo antes de desmaiar.

Yohji olhou para o rosto de seu amante e viu uma contusão se formando no olho dele. Agora teriam que inventar uma explicação para os cliente curiosos. Mas o ruivo só estava escalado para trabalhar dentro de dois dias, até lá a contusão teria melhorado. Ele saiu do quarto ignorando seu amante desmaiado no chão.

Algumas horas depois Aya acordou, ele olhou ao redor e viu que estava ainda no chão de seu quarto. Ele tentou não fazer barulho quando viu Yohji deitado na cama. Cuidadosamente ficou de joelhos, permaneceu naquela posição por alguns minutos até a onda de vertigem passar. Devagar se levantou e lentamente caminhou até a porta do quarto, a dor era muito grande, ele suspeitou que tinha um par de costelas quebradas. 'Não seria a primeira vez', pensou amargo saindo do quarto.

Suspirou aliviado quando conseguiu sair do quarto sem que Yohji acordasse. Seu corpo inteiro doía, lágrimas teimavam em rolar por seu rosto. Ficou surpreso ao perceber que ele estava bravo. Normalmente depois de uma surra ele se sentia assustado, humilhado, mas essa raiva era algo novo.

Deitou-se no sofá da sala aproveitando que aquela hora da madrugada ninguém apareceria e fechou os olhos. Sentia dor por todo seu corpo quando se movia. Puxou seus joelhos até seu queixo e abraçou ele mesmo. Exausto pela surra e pelo tormento emocional adormeceu.

Acordou após algumas horas com muita dor, arrastando-se foi para o banheiro procurar algum remédio para amenizar sua dor. Após tomar o que achou de mais forte parou na frente do espelho para avaliar os danos. Seu tórax estava coberto de hematomas, seu lado direito no entanto estava assustador, roxo e inchado. Seu rosto tinha duas contusões horríveis, uma em seu olho esquerdo e outra pouco abaixo da maçã do rosto esquerdo. Desanimado com sua aparência voltou para a sala, mas parou na metade do caminho quando viu Yohji de pé no meio da sala.

"O que você pretende? Fazer com que todos saibam o que acontece na nossa relação?", disse Yohji. Sua voz estava perigosamente tranqüila. Aya nunca havia estado com mais medo de Yohji do que estava agora. "Eu perguntei, o que você pretende?", desta vez sua voz estava mais exigente, a raiva tomando controle dele. Aya não conseguia responder, ele abriu sua boca, mas nenhum som saia. "Me responda!".

"Eu...eu...fui ao banheiro. Não pensei que você...", gaguejou Aya recuando.

"Esse é seu problema, você nunca pensa em mim", explodiu Yohji.

"Não, Yohji, não é isso. Eu só precisava de um pouco de ar. Sabia que ninguém estaria aqui, por isso saí", murmurou Aya.

"Você não me ama mais, é isso? Você nem mesmo procura disfarçar isso mais. Você faz o que bem entende, não se importa comigo", Yohji estava fora de si. O medo de perder seu amante não o deixava em paz, mas o que mais o perturbava era o fantasma de uma nova traição.

Aya nem teve tempo para se preparar para o soco que levou no rosto. Ele cambaleou para trás até que chocou-se com a parede, usando-a como apoio para não cair. Yohji se aproximou e acertou um soco no nariz de Aya, logo sangue começou a correr.

Ken que havia acordado com os gritos de Yohji na sala, foi ver o que estava acontecendo e ficou chocado quando viu o playboy batendo em Aya. Aquilo subiu a sua cabeça e resolveu interferir para ajudar o espadachim.

"O que você esta fazendo, Yohji?", perguntou Ken tentando se controlar para não bater no loiro.

"Resolveu ajudar seu amante?", retrucou Yohji debochado. Agora estava convicto de que Aya e Ken estavam tento um caso.

"Não seja idiota, Yohji! Aya não merece esse tipo de insinuação", disse Ken, defendendo a integridade do amigo.

"Não seja idiota você, Kenken. Já falei que Aya tem exatamente o que merece", rosnou Yohji irritado. "Você já viu ele reclamando de alguma coisa?".

Aquele comentário deixou Ken um pouco apreensivo, mas achou que eram apenas coisas da cabeça de Yohji que estava com ciúmes de Aya. Enquanto parou para pensar, Yohji avançou em direção a Aya prestes a machucá-lo. Ken não pensou duas vezes partiu para cima do playboy para defender o ruivo. Ele e Yohji rolaram pelo chão, mas dominado pelo ódio Yohji acertou um soco no rosto do jogador que recuou assustado com o comportamento do outro.

Aproveitando que Ken e Yohji brigavam Aya tentou fugir, mas quando estava quase chegando nas escadas Yohji agarrou seu pé, perdendo o equilíbrio Aya rolou escada abaixo. Quando chegou ao chão escutou o barulho ominoso de alguma coisa quebrando. A última coisa que ouviu antes de perder a consciência foi alguém gritando seu nome.

Ken desceu correndo as escadas enquanto Yohji permanecia estático no topo da escada olhando para o corpo imóvel de seu amante. Quando viu Aya cair Ken pensou no pior, mas ficou aliviado ao sentir a pulsação do ruivo. Após uma rápida avaliação percebeu que o espadachim tinha alguns ossos quebrados e que precisavam levá-lo para o hospital.

"Aya, o que aquele bastardo fez com você", murmurou Ken ajoelhado ao lado do amigo.

"O que esta acontecendo aqui?", perguntou Kyou saindo do seu quarto esfregando os olhos com sono.

"Kyou, me ajude aqui. Temos que levá-lo para o hospital", chamou Ken vendo que Yohji estava em estado de choque e seria de pouca ajuda no momento.

"O que aconteceu?", perguntou Kyou confuso.

"Depois eu explico tudo, mas primeiro temos que ir para o hospital", cortou Ken irritado. "Pegue as chaves do carro de Yohji".

Ken cuidadosamente ergueu Aya nos braços para levá-lo até a garagem. O movimento acordou Aya que gemeu em dor.

"Ken?", sussurrou Aya franzindo o cenho confuso.

"Sim, sou eu. Nós estamos indo para o hospital agora. Yohji não vai machucar você novamente", disse Ken tentando confortar o espadachim.

"Hospital? Não, nenhum hospital", murmurou Aya com dificuldade. Ele não queria ir para hospital nenhum, só queria deitar em sua cama e esperar a dor passar.

"Você precisa ir para o hospital, mas eu estarei com você, não se preocupe com nada", afirmou Ken ajeitando Aya no carro.

Ken sentou-se atrás com Aya em seu colo, tinha que tomar cuidado com os danos do espadachim ou poderia causar algum dano grave. Sentindo-se seguro Aya descansou sua cabeça no ombro de Ken e fechou os olhos. Ken o segurou com cuidado, afagando os cabelos sedosos e murmurando palavras confortantes para acalmar Aya que detestava hospitais.

Em poucos minutos chegaram no hospital, onde Aya foi atendido prontamente. Ken sabia que Aya não gostaria que mais ninguém soubesse o que havia acontecido, então mentiu que haviam se envolvido em uma briga na rua.

As radiografias confirmaram as suspeitas de Ken, Aya tinha torcido o tornozelo e fraturado um braço, além de um choque leve e várias contusões. Nada muito grave então o ruivo ficaria apenas algumas horas em observação antes de ser liberado.

De hora em hora alguma enfermeira ia até o quarto para acordar Aya, mas ele nunca ficava acordado mais que alguns minutos e freqüentemente o que ele falava durante esse tempo era um pouco confuso.

"Ken...", chamou Aya sonolento.

"O que foi? Esta sentindo dor? Se você estiver eu chamo a enfermeira....", perguntou Ken preocupado.

"Não é isso. Preciso que você faça um favor para mim", pediu Aya relutante, odiava depender das pessoas.

"O que você precisa?", perguntou Ken, sabia o quanto custava para o ruivo pedir alguma coisa.

"Eu ia...falar com Yohji no hotel hoje", respondeu Aya em voz baixa envergonhado. "Você poderia avisá-lo que não posso ir?"

"Sem dúvida, assim que Kyou voltar eu vou até lá", aceitou Ken prontamente, seria uma ótima oportunidade para rever Omi.

"Obrigado", sussurrou Aya antes de adormecer.

"Kyou você pode ficar com o Aya até eu voltar?", perguntou Ken quando o rapaz entrou no quarto trazendo algo para beberem. "Preciso fazer uma coisa, eu não demoro".

"Claro, sem problemas", respondeu Kyou, queria agradar Ken de qualquer maneira.

"Obrigado", agradeceu Ken saindo do quarto apressado.

Estava amanhecendo quando Ken chegou no hotel. Não havia pensado no que dizer ou fazer, estava preocupado que Yohji resolvesse ir atrás de Aya no hospital e Kyou não fizesse nada para impedi-lo. Tinha que dar o recado que o espadachim havia pedido e voltar para o hospital.

Omi abriu bem as janelas do quarto e deixou ar fresco do inicio da manhã entrar, não era uma manhã muito ensolarada, mas ainda assim lhe era agradável respirar aquele ar. Omi começava a sentir saudades de casa, queria ver novamente a mesma paisagem que podia observar da janela de seu quarto, mas isso agora parecia tão distante. Olhou para trás e viu Yohji terminando de colocar a mesa do café e foi sentar-se com ele em seguida.

"Sabe, eu não dormi muito bem essa noite", disse o loiro com ares de preocupação. "Estive pensando em tudo o que me contou ontem, sobre o seu encontro com Nagi, eu... estou cada vez mais confuso"

"Eu sei, Yohji-kun, mas não podemos nos desanimar. Temos que tentar de tudo, mesmo que isso aparente ser uma esperança mínima", Omi tentava animar o amigo, mas no fundo sentia-se tão perdido quanto ele.

"Vai procurar Nagi novamente hoje?", Yohji estava curioso sobre aquilo, não via a hora de acabar com o suplicio de todos.

"Não sei... primeiro preciso pensar em algo para dizer a ele. Não posso simplesmente chegar e esperar que ele me conte toda a verdade. Isso não funcionaria com Nagi.", como sempre Omi tentava agir racionalmente.

"Tem razão... mas tem outra coisa que me preocupa", concordou o playboy para só então revelar o verdadeiro motivo de sua preocupação. "Aya. Estou preocupado com ele"

"Não fique assim. Deve estar tudo bem com ele", sorriu o chibi tentando oferecer um pouco de conforto para o amigo, via-se claramente no rosto de Yohji que ele não estava bem.

"Não sei... estou me sentindo estranho... mas eu não acredito em pressentimento, isso é besteira!!"

"Aya virá hoje?", perguntou o menino, talvez isso fizesse o loiro perceber que não deveria se preocupar. Omi já sabia a resposta, Aya viria e ele teria que se ausentar novamente. Como na manhã anterior também não tinha nenhum lugar para ir e nesse instante desejou também poder estar com seu koi, mas não podia e nem devia. Ken não era mais seu amante naquele tempo, o jogador ainda devia trazer muita magoa consigo em relação a ele e talvez fosse melhor deixa-lo viver sua vida. Omi não se sentia no direito de interferir na vida de Ken novamente.

"Virá sim, será que você poderia..." continuou Yohji sem perceber a tristeza nos olhos do garoto. "Desculpe estar te pedindo isso, mas você sabe como Aya é"

"Tudo bem, não precisa se explicar. Eu arrumo alguma coisa pra fazer enquanto vocês... conversam", respondeu colocando um pouco mais de café em sua xícara.

Neste instante a campainha tocou, Omi percebeu Yohji se exaltar em expectativa. Devia ser Aya, mas ainda era muito cedo. O playboy levantou da mesa em um salto e se dirigiu até a porta com a empolgação de uma criança. Omi também se levantou bebendo todo o café que restava em sua xícara.

"Só terminar aqui e já saio, Yohji-kun", Disse o menino bem depressa. Mas Omi não escutou nada de Yohji desde que a porta se abriu

"Ken?", pronunciou o loiro surpreso.

Omi quase engasgou-se com o café ao ouvir o nome de seu ex-amante, sentiu um tremor percorrer seu corpo. O que Ken estaria fazendo ali aquela hora? Virou-se para constatar o que realmente havia escutado.

"Ken, o que aconteceu? Onde está Aya?", perguntou Yohji desesperado pela resposta.

"Aya, não vai poder vir hoje", respondeu ele um tanto sério.

"Por que?? O que aconteceu?", Yohji queria respostas e Ken não estava ajudando muito.

O jogador ficou em silencio por alguns instantes, não sabia se deveria contar tudo o que havia acontecido, mas também não havia pensado em nenhuma desculpa. "É que Yohji ficou muito aborrecido com o atraso de Aya ontem, então Aya achou melhor não sair hoje para não complicar as coisas", titubeou uma meia verdade.

Yohji até teria acreditado naquilo se a marca do soco que o Yohji do futuro dera no rosto de Ken na noite anterior não estivesse tão visível. "Você não está dizendo a verdade! Quero saber o que aconteceu com Aya!!", reclamou já irritado.

"Não aconteceu nada, Yohji-kun".

"Então o que é isso roxo no seu rosto?", questionou Yohji exigindo uma explicação.

"Isso?", disse Ken levando a mão ao hematoma, havia se esquecido completamente dele. "Nada, foi só um acidente."

"Droga, Ken! Acha que sou tão idiota!", Yohji estava cada vez mais irritado.

Ken começou a achar que fora uma péssima idéia ter ido até lá, talvez deveria ter esperado um pouco mais, mas agora não tinha mais jeito. "Ok, isso foi um soco que Yohji me deu. Nós brigamos, foi isso"

"E por que? Ele bateu em Aya, não foi? Foi isso o que aconteceu, não é mesmo?", gritou o playboy já imaginando que Ken teria tentado defender Aya dos desmandos do seu eu psicótico.

"Sim, foi isso o que aconteceu", respondeu Ken virando o rosto ocultando assim todo o pesar que sentia.

"Então... o que ele fez com Aya para que ele não pudesse vir aqui hoje? Conte-me!", ordenou ele pegando Ken pela gola da camisa.

Foi então que Omi se aproximou dos dois tentando amenizar as coisas. "Calma, Yohji-kun. Não podemos nos descontrolar. "Conte a ele o que aconteceu, Ken, por favor".

Mediante ao apelo do menino Yohji largou Ken e aguardou pela resposta. Ken não sabia como contar aquilo para ele. Não podia simplesmente encara-lo e dizer com naturalidade o quão machucado Aya estava. Isso irritaria ainda mais o playboy. E evitando dar muitos detalhes e meio que hesitando disse "Aya, está no hospital em observação".

Os olhos de Yohji se incendiaram de raiva. Ken não podia estar falando sério, isso queria dizer que as coisas tinham ficado realmente feias para o lado de Aya.

"Como é que é? Aya deve estar muito machucado para ter que ir ao hospital! Diga-me, ele está muito machucado?", gritou ele furioso.

"Um pouco... ele... fraturou o braço", respondeu Ken, não achava ser uma boa hora para relatar a verdadeira condição física de Aya, Yohji já parecia irritado o suficiente.

"Como aquele desgraçado teve a coragem de fazer isso com ele? Como?", a fúria e a indignação foram tomando rapidamente o pensamento e as ações do loiro.

"Foi um acidente... Aya caiu da escada", o jogador começou a tentar amainar as coisas quando percebeu que se aquilo continuasse mais um pouco, as coisas sairiam do controle, ou melhor, Yohji sairia do controle.

"Não me interessa se foi um acidente! O que eu sei é que aquele canalha teve a ousadia de encostar a mão em Aya e eu não vou perdoa-lo por isso! Eu vou matar aquele desgraçado!", grunhiu indo em direção da porta, Yohji as vezes esquecia que estava falando dele mesmo.

Os olhos de Omi não podiam acreditar no que estavam presenciando, nunca havia visto Yohji tão descontrolado. O loiro estava mesmo disposto a sair daquele quarto e acabar definitivamente com a vida de seu eu do futuro. Ken pode observar os olhos do menino banhados em súplica, como se pedissem que de alguma forma tentassem impedir Yohji de fazer aquela loucura. Omi não queria nem se quer imaginar as conseqüências daquele encontro entre o loiro e seu eu, muito menos se Yohji realmente comprimisse o que blasfemava enquanto tentava sair do quarto.

"Você não vai a lugar algum, Yohji!", disse Ken enquanto tentava com todas as suas forças segurar o loiro.

"Largue-me, Ken. Eu já disse que vou acabar com a raça daquele desgraçado!".

"Não!", relutou o jogador segurando-o com mais força.

"Eu disse para me largar!", gritou Yohji arremessando Ken com toda a sua força para o outro lado do quarto. O jogador caiu no chão aturdido com aquilo tudo, Yohji parecia não ter noção de sua força, parecia estar completamente possuído pelo ódio.

Omi olhou assustado para aquilo tudo, Ken não havia conseguido segurar Yohji, mas o garoto não podia deixar que o playboy atravessasse aquela porta, no entanto o que ele poderia fazer? Não sabia, mas tinha que tentar de alguma maneira. Correu na direção da porta passando por Yohji e colocando-se de fronte a ele. Agarrou-se ao batente de madeira impedindo a passagem do homem mais velho como se isso fosse a coisa mais importante de sua vida.

"Saia da frente, Omi!", rosnou o loiro. Não queria perder mais nem um minuto ali.

"Não...", murmurou o garoto já com os olhos cheios de lagrimas.

"Que diabos!! Sai da minha frente!!", Yohji não conseguia enxergar mais nada, todo seu ser agora ardia por uma única vontade, a de dar o troco naquele que fizera seu koi sofrer.

"Não... não vou sair, não posso deixar você fazer isso", Omi que até agora não havia tido coragem de encarar o playboy ergueu os olhos lacrimejantes para encarar a expressão enfurecida do outro.

"Eu não vou mandar de novo, Omi! Saia!".

"Não!", gritou o chibi mais forte que o loiro. "Não percebe que está agindo feito o seu eu psicótico!? Pare com isso, Yohji".

Aquela atitude o irritara ainda mais, quem Omi pensava que era enfrentando-o daquele jeito? Já estava prestes a partir para cima do garoto e arranca-lo dali a força, mas Omi não parava de falar. "Saia!! Vamos!", repetia Yohji.

"Não, você já estragou tudo uma vez, Yohji. Não vou deixar você fazer isso novamente.", disse chorando. "Você já tirou minha felicidade um dia... não posso permitir que você faça isso de novo", só Omi sabia o quando lhe custava dizer todas aquelas duras palavras para Yohji, mas não dispunha de nenhuma outra alternativa no momento.

Aquilo feriu o loiro profundamente. Embora soubesse que tudo o que Omi dizia era verdade, ele não conseguia se controlar. "Saia daí. Estou perdendo minha paciência", rangeu entre dentes.

"Não!", insistiu o garoto virando o rosto e esperando o golpe que Yohji estava prestes a lhe dar. Mas nada aconteceu, nenhum golpe veio e nenhum som foi ouvido. Omi ainda receoso levantou o rosto e se deparou com o playboy na mesma posição que se encontrava há minutos atrás quando estava prestes a lhe golpear, mas a expressão em seu rosto mostrava claramente a angustia de Yohji pelo que não tivera coragem de fazer.

O loiro jamais conseguiria bater no garoto, muitos menos sabendo que Omi tinha toda a razão, tinha mesmo estragado tudo. E julgando aquelas palavras do menino sentiu que não podia continuar com aquilo, mesmo que à vontade de sair dali e acabar com tudo ainda percorresse vivamente por seu corpo.

"Desculpe, Yohji-kun. Eu jamais me perdoaria se acontecesse algo com você. Sei que não sou tão importante para você quanto Aya, mas... eu preciso que me ajude a concertar as coisas... não posso fazer isso sozinho. Preciso de você, Yohji-kun".

Yohji então sentiu-se completamente desarmado vendo aqueles olhos carregados de sentimentos, sentiu o efeito daquelas palavras que vinham juntamente com as lágrimas que rolavam do rosto do garoto. Aos poucos foi voltando a razão e percebeu a estupidez que por um triz não havia cometido, virou-se de costas e andou até o outro lado do quarto sentando numa cadeira perto da janela, acendeu um cigarro e permaneceu quieto.

Ao ver que finalmente o amigo se acalmara, o chibi sentiu suas pernas perderem as forças desabando de joelhos no chão caindo num choro convulso e sofrido.

Foi então que Ken se levantou ainda atordoado por aquela seqüência de fatos que acabara de vivenciar, chegou mais perto e ajoelhou-se junto a Omi, procurando confortar o loirinho com seu abraço. "Ei, fique calmo. Está tudo bem agora. Não precisa chorar."

"Eu sei... mas não consigo parar", respondeu entre seus soluços cansado pela guerra psicológica que havia acabado de enfrentar.

Ken continuou abraçado a Omi até perceber que aos poucos o garoto ia se acalmando e que o choro ficava mais distante, mas as palavras de Omi não saiam de suas cabeça. Aquelas acusações contra Yohji.... Sabia que não era o momento para pedir qualquer explicação sobre aquilo, mas tinha ficado intrigado demais para que deixasse passar em branco. "Omi, o que você quis dizer com Yohji ter tirado sua felicidade?", perguntou secando as ultimas lágrimas que restavam no rosto do garoto.

Omi gelou dos pés a cabeça, só agora havia se dado conta de que o jogador havia escutado tudo o que dissera e provavelmente agora lhe cobraria explicações para o que não havia entendido.

"Eu disse isso?", balbuciou ele tentando desconversar.

"Disse sim! Disse que Yohji havia estragado tudo... do que você estava falando?".

"Bem, eu... não sei... no calor da discussão nem percebi o que estava dizendo. Não é nada de verdade", respondeu o chibi levantando-se. "Ken, acho melhor você voltar para o hospital. Aya pode estar precisando de você. Obrigado por vir nos avisar".

Ken não havia engolido aquilo, Omi era um péssimo mentiroso e podia perceber-se claramente que ele tentava mudar de assunto, mas por outro lado se lembrou que realmente precisava voltar para o hospital, no momento Aya precisava de cuidados, depois pensaria no que fazer para resolver aquela questão. Olhou para o canto da janela e viu que Yohji ainda estava sentado do mesmo jeito, provavelmente absorto em seus pensamentos e preocupações com a saúde de Aya, "Certo, vou mesmo voltar para o hospital. Kyou está com Aya, mas quero estar por perto e me certificar que Yohji não vai se aproximar dele".

Embora Omi soubesse que não devia, não conseguia deixar de sentir-se incomodado toda vez que escutava o nome de Kyou, nunca iria esquecer a cena que presenciara quando estavam enfrente ao Koneko e muito menos aquele forçoso beijo que Kyou havia dado contra a vontade do jogador. Ficava assim toda vez que pensava em quanto tempo Ken resistiria ao assédio de Kyou, mas não diria nada, não era direito seu fazer isso, pois mesmo ele já tinha outro amante.

"Vou trazer noticias assim que possível", disse o jogador tomando o rosto do menino entre as mão e depositando um leve e rápido beijo em seus lábios.

Omi observou Ken sair pela porta, iria tentar agora fazer alguma coisa por Yohji, era lamentável ver seu amigo em tão péssimas condições.

Continua...

Por Suryia Tsukiyono e Bad Kitty / Outubro de 2002

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