Capítulo 4 – A Noite Dos Acontecimentos Insólitos

Draco havia acabado de acordar quando sua coruja pousou no peitoril da janela do quarto. Trazia um exemplar do Profeta Diário e uma carta. Ignorou o jornal, jogando-o em cima da cama, e abriu a carta. Era de Nicolle. Achava engraçado que ela estivesse tentando se adaptar ao correio coruja. Agora mandava sempre Boss, sua enorme e mal humorada coruja castanha, na casa da namorada para levar e trazer recados.

"Draco,

eu ainda não acredito que esse bicho vai entregar a carta direitinho nas suas mãos. Sempre acho que ela vai me bicar." Draco riu. "Em todo caso, espero você mais tarde. Pensei em passarmos o dia juntos. Estou com saudades de acordar ao seu lado. Espero que venha para passar a noite.

Sua Nikki."

Draco se jogou satisfeito nos travesseiros. A vida estava sendo muito boa para ele. Pensara que não se livraria mais das lembranças de Gina mas já fazia dois meses que sequer pensava na ex-mulher. Ainda feliz, abriu o exemplar do jornal mas o que viu o fez se irritar e atirá-lo longe, passando perto de Boss, que esvoaçou em protesto.

Ele leu de novo a manchete, tinha foto:

"Este sábado será realizado o casamento de Harry Potter e Virgínia Weasley, o feliz casal espera mais de mil convidados."

Olhou nauseado pra foto, Gina se pendurava entusiasmada no pescoço de um Harry sorridente.

- Bando de idiotas... - perdeu todo o seu bom humor.

Entrou no banho e deixou que a água fria escorresse por seu corpo durante um bom tempo.

- Como é que podem anunciar essa palhaçada no jornal? Eu vou cancelar a minha assinatura dessa porcaria. Nunca vi, um jornal que anuncia só inutilidades... - falava sozinho enquanto se secava.

Depois de se vestir pegou a carta de Nicolle e releu. Novamente sentiu o corpo se encher de alegria. Sentou na sua escrivaninha e começou a responder a carta.

"Nikki,

também estou com saudades de você. Depois que te conheci tenho me esquecido de todos os meus problemas. E de certa forma você pode se considerar tão mágica quanto eu (talvez mais...). Estou indo pra sua casa hoje à noite. Espero não voltar mais para a minha (estou brincando mas vontade não falta).

D.M."

Terminou assinando a carta com seu próprio brasão. Teve uma certa dificuldade em prender a carta nas patas de Boss, que estava com um certo receio depois de ter quase apanhado com o jornal que ele jogou longe.

Nicolle recebeu a coruja castanha de volta com um pires de água e biscoitos, algo que Draco não precisou ensinar já que adorava animais. Boss, a partir de então, começou a ser muito mais simpático com a namorada de seu dono.

Ela ficou feliz ao ler a carta dele e imediatamente deu folga aos empregados. Paolo não pareceu nada satisfeito.

- Desde que madame arrumou o novo namorado temos mais folga do que trabalho... - as duas empregadas olharam pra ele, abismadas.

- Paolo, você quer dizer que prefere trabalhar a que tirar folga? - as duas disseram juntas e ele pareceu desconcertado.

- É por que eu venho da Itália e minha família toda está lá e... - Marie, a mais falante das duas, cortou-o.

- Você veio da Itália com dois anos. A única família que tem lá é uma tia-avó surda e cega que vive num asilo. Você tem certeza que passaria suas folgas com ela? - ele abaixou a cabeça e se retirou, deixando as duas rindo às suas custas.

Nicolle se arrumou e foi para o salão de beleza. Queria estar linda para quando Draco chegasse. Ele chegou de noite e ela tinha preparado novamente o jantar na varanda mas como começou a chover os dois tiveram que entrar correndo. Riram enquanto se secavam no banheiro. A música que ela havia colocado no som tocava alto, preenchendo o apartamento de alegria. Ela dançava enquanto secava os cabelos e cantarolava também. Ele assistia divertido à cena.

- Você está feliz, não é? - ele perguntou.

- Estou sim. Como nunca estive... - ele ficou em silêncio por alguns instantes, curtindo a satisfação de ser o responsável por toda a felicidade dela.

- Eu amo você - pensou alto. Quando terminou de dizer estava tão assustado quanto ela.

Nicolle deixou a toalha cair. Ele olhou para o chão molhado do banheiro e tentou disfarçar.

- Nós molhamos tudo aqui, não é mesmo? Amanhã aquele seu mordominho vai dar um ataque e... - ela andou até ele e ergueu seu queixo com as mãos.

- Se você vai se arrepender de dizer teria sido melhor que não tivesse dito... - ele engoliu em seco; ela foi tão contundente quanto uma facada.

Draco a segurou pela cintura com firmeza e olhou dentro de seus olhos.

- Eu não sou homem de meias palavras, Nicolle Marah. Eu disse que amo você. E amo. Só que eu não sei se você está preparada para ser amada por mim. Eu passei por uma situação constrangedora por causa de um amor não correspondido - Nicolle riu.

- Ora, Draco. Quem não passou? - disse, ficando sem graça.

Ele percebeu que ela estava escorregando por entre seus braços. Tentou abraçá-la mas ela não correspondeu. Estranhou.

- O que está havendo, Nikki?

- Nada. Estamos molhados, é só - ela disfarçou.

- Isso não era problema ainda agora - disse com categoria. - Pelo jeito você não segue as próprias recomendações. Não está conseguindo assumir o que sente - ela abaixou a cabeça. - Eu compreendo que você não retribua o sentimento mas está te incomodando tanto assim o fato de eu senti-lo? - ela sacudiu a cabeça, ainda baixa. - Me diga o que é então, Nikki... - ela respirou fundo e ergueu os olhos marejados.

- Eu... Eu... Não posso, Draco. Não consigo... - ele tentou consolá-la mas Nicolle se afastou. - Eu acho melhor você ir embora... – disse, a voz trêmula e fanhosa; ele se sentiu impotente diante da situação.

Draco ainda tentou se aproximar mas ela estava irredutível.

- Nikki... Nicolle....

- Só vá, Draco. Vá... - ele suspirou.

- Eu vou mas eu volto. E quando eu voltar você vai ter que me dar uma boa explicação - ela agora chorava baixinho e se esquivou do beijo que ele tentou lhe dar.

Nicolle ouviu Draco bater a porta com violência, tinha descontado toda sua raiva e frustração. Ela abaixou no chão do banheiro e chorou, soluçando como uma menininha. Depois de algum tempo o telefone tocou. Ela não quis atender mas ouviu o recado na secretária eletrônica: "Nikkita, mamãe vai aí amanhã. Seu pai vai fazer uns exames e você pode me contar as novidades."

"Ótimo!", pensou, "Agora mamãe já sabe que eu estou namorando alguém".

Draco saiu do apartamento de Nicolle todo molhado. Nem se deu ao trabalho de vestir a camisa. Causou estranhamento na vizinha da namorada quando entrou no elevador.

- Que chuva! - disse cinicamente para a velhinha. - Ainda bem que está calor - deu um sorriso que assustou ainda mais a senhora.

Quando chegou na rua virou imediatamente e entrou no beco. Pensou em aparatar para casa mas estava muito irritado para isso. Decidiu ir então para o Três Vassouras.

Assim que entrou causou estranhamento geral. O bar estava decorado com bolas coloridas e as mesas estavam todas agrupadas no centro.

- Mas que diabo será isso e... - Madame Rosmerta olhou surpresa para ele.

- Sr. Malfoy? O senhor por aqui? - ele franziu a testa.

- O Três Vassouras não é um bar público? - a mulher sacudiu a cabeça.

- É sim, senhor, mas é que hoje ele está fechado para uma festa - ela travou.

Draco olhou para a parede na qual uma faixa flutuava com os dizeres "Parabéns aos noivos" mudando de cor. Esfregou os olhos. Parecia estar entrando em um pesadelo. Primeiro leu a notícia desagradável no jornal, depois Nicolle agiu estranhamente e o expulsou, agora estava na despedida de solteiros de Harry e Gina.

Quando o absurdo é muito grande as reações ficam retardadas, então ele não conseguiu desaparatar imediatamente, tal era o seu estado de choque. Também não conseguiu passar incógnito. Estava completamente encharcado, sem camisa e sua expressão não era nenhum pouco comum. Imediatamente foi notado por Hermione, que estava com a barriga de uma gravidez de quatro meses bastante evidente. Ela esfregou os olhos; não conseguia acreditar que Draco estava ali. Tratou de se posicionar de forma que tapasse a visão de Rony, Harry e Gina. Tinha certeza de que não daria certo se eles se encontrassem. Ela, então, discretamente sinalizou para Carlinhos, indicando que fosse até o fundo do bar. Ele não tinha compreendido mas obedeceu. Sabia que a cunhada devia ter um bom motivo.

Carlinhos viu Draco sentado no fundo do bar e foi até lá. Gina acompanhou o irmão se levantar mas Hermione chamou a atenção da amiga.

- Gina, você e Harry querem ser os padrinhos do bebê? - disse de modo ríspido.

O casal não entendeu nada. Muito menos Rony.

- Nossa, Mione. Queremos sim. Não é, meu amor? – Gina respondeu.

Harry sorriu apenas. Estava com sono. Tinha tido um dia estafante e estava ansioso para ficar a sós com a noiva e dar seu presente de casamento para ela. Draco observou um dos Weasley caminhar até ele.

- Boa noite Malfoy - Carlinhos foi educado; Draco o olhou com desdém.

- Nossa, como esse bar anda mal freqüentado, Rosmerta - ele não dirigiu a palavra ao irmão de Gina e a dona do bar não fez nenhum comentário.

- Qual é, Malfoy? Você não precisava estar aqui. Poupe-se disso, homem - Draco deu uma gargalhada e dessa vez foi ouvido por todos.

- Poupar-me disso? - agora estava com uma garrafa de uísque na mão. - Eu deveria ter recebido este aviso há muito tempo. Mas vocês, Weasley, estavam preocupados com a irmãzinha de vocês - Gina olhou de Harry para Draco e abaixou a cabeça; Mione suspirou fundo.

- Cale a boca, Malfoy! - Rony disse, levantando da mesa.

Agora a música e a alegria das conversas tinha cessado e todos estava atentos àquilo.

- Nossa, Weasley! Os anos passam e você não melhora em nada a sua criatividade. Fico abismado que tenha conseguido fazer um filho na sua esposinha sangue-ruim.

Rony levantou da mesa de um salto mas Carlinhos o segurou pelas vestes. Draco, porém, não estava intimidado pelo fato de ser o único ali contra mais de vinte bruxos adultos que o odiavam. Ele parecia estar querendo descontar a raiva.

- Aliás, eu não entendo o propósito de vocês, Weasley, se reproduzirem. Já tem muitos de vocês no mundo...

Abaixou a cabeça e viu em cima de uma mesa um álbum de retratos para bebês com os nomes de Gina e Harry. Não foi difícil deduzir.

- Minha nossa! Então nós vamos ter um bastardo nascendo aqui? - disse, segurando o álbum.

Harry não agüentou e se levantou. Gina ainda tentou segurá-lo mas Draco estava provocando. Estava com sede de sangue.

- Isso Potter. Levante mesmo. Do jeito que a sua noivinha é talvez o filho não seja seu, já pensou? - Draco deu um grande gole de uísque.

Harry pulou por cima da mesa e o segurou pelo pescoço, colando-o na parede. Gina e Hermione gritavam para ele parar. Draco ria, vendo que ele não conseguia apertar seu pescoço.

- E então? Não é homem o suficiente para isso? - ele olhou com ódio para Draco e depois para Gina e Hermione, nervosas; Rony ainda se debatia, seguro por Carlinhos.

- Você não vale à pena. Não vale à pena sujar as mãos com você. Você está bêbado. Vá para casa, Malfoy. Vá e amargue a solidão... - virou-se de costas e afastou Gina e Mione dali.

Rony estava vermelho como um tomate maduro e suava em bicas. Carlinhos deu duas sacudidas nele e o colocou em seu lugar, sentado ao lado de Hermione.

Draco estava ansioso para uma briga mas as palavras de Harry eram verdade. E foi o que o fez perceber que, na verdade, ele não se importava mais se Potter ia ou não se casar com a caçula dos Weasley. Nem se teriam filhos ou se mudariam para o Japão. O que estava fazendo com que ele quisesse entrar em uma luta desigual era o desespero que sentia. E percebeu claramente o motivo. Sairia no tapa com Potter e os seis Weasley e não se sentiria melhor. Porque o verdadeiro motivo de seu desespero estava sentada no chão do banheiro, tendo a pior crise de choro de sua vida.