Capítulo 3
Adaptação mútua
Não foi antes do jantar que Rony e Hermione voltaram a falar com Harry. Mas os dois pareciam temerosos em se aproximar do amigo.
- Oi - disse Hermione. - Tudo bem, Harry?
- Acho que sim - foi o que ele conseguiu responder. - Desculpem. Eu estou meio... nervoso. É que aconteceu uma coisa... estranha. - Ele olhou para Severo, que estava atrás dele.
Rony perguntou:
- Você foi ver Dumbledore? O que ele disse?
- Que eu tenho que enfrentar os meus medos.
- Harry, está tudo bem? - quis saber Hermione - O que podemos fazer para ajudar?
Com cuidado, Harry respondeu:
- Não perguntar se está tudo bem de cinco em cinco minutos já iria ajudar.
- Desculpe - disse Hermione - Eu só queria ajudar.
- Eu sei. Mas eu tenho... muitas coisas para pensar. E o dever de... Poções.
Os três baixaram a cabeça. A morte de Snape ainda era meio tabu, e toda vez que eles falavam sobre a aula de Poções, as memórias horríveis daquela tarde na Travessa do Tranco voltavam para os três. Havia um silêncio constrangedor na mesa grifinória.
Severo disse:
- Harry, Alvo tem razão. Não é sua culpa eu ter morrido.
Instintivamente, ele tocou a mão no ombro do rapaz. Harry sentiu um toque quente e confortador. Ao invés de relaxar, porém, ele ficou ainda mais tenso e sentiu as lágrimas enchendo-lhes os olhos.
Hermione disse:
- A gente ajuda você a fazer o dever, Harry. Eu ajudo.
Ele limpou as lágrimas com as mãos e assentiu:
- Tá bom.
- Eu também posso ajudar, Harry - disse Rony. - Aliás, tem mais dever de Feitiços, que você perdeu.
Harry sorriu para seus amigos. Ele sabia que podia confiar em Ron e Hermione para dar à sua vida a volta de uma aparência normal.
Contudo, assim que ele olhou para Severo, sentiu que sua vida jamais seria normal de novo.
***
Harry logo começou a se irritar com o fato de ter uma pessoa atrás dele o tempo todo. Ainda mais sendo Snape. Asas ou não, anjo ou não, era enervante ter o ex-mestre de Poções atrás de si o tempo todo.
- Harry, a escada vai se mexer. Se quiser chegar à torre Grifinória, tome a outra.
Com Ron e Hermione o tempo todo com ele, Harry não podia responder a Snape. E aquilo estava dando nos nervos.
Mais tarde, os roncos suaves de Neville e Ron enchiam o quarto de dormir de Harry, que ainda pensava em sua situação. Snape tinha se fechado em copas, mal abrindo a boca para falar com ele. Mas parece que ele resolvera fazer uma exceção durante a noite.
- Sei que está acordado. Gostaria de conversar?
- Ah, agora você quer conversar?
- Eu estava lhe dando um pouco de privacidade, Potter. - A voz de Severo era áspera. - Sei que a situação é desconfortável para nós dois, mas...
Com cuidado para não acordar os outros, Harry rosnou: - Desconfortável é pouco! Sabe o que é ter você feito um urubu, sempre pousado no meu ombro?! Você tinha que continuar com sua roupa preta? Não podia ter trocado por um desses camisolões de um anjo de verdade?
- Se você prefere discutir meus trajes, podemos fazer isso. Mas você não acha que seria mais produtivo aproveitar minha disponibilidade para tratar de coisas mais profundas? Você é um adolescente; portanto, um inseguro e perdido. Eu posso ajudar nisso.
Harry mal se conteve:
- Inseguro e perdido, é? Quem é você para achar que eu sou inseguro e perdido?
Severo sequer se abalou:
- Sou seu guia e protetor.
- Que ótimo. Um urubu que se acha um grilo falante!
Severo franziu o cenho. Jamais tinha ouvido falar de semelhante ortóptero da subordem Grylloidea capaz de articular palavras. Talvez Potter soubesse mais de Magizoologia do que ele pudesse imaginar...
- Escute. Gosto disso tanto quanto você, mas o fato é que a situação existe e devemos fazer o melhor dela. Não vou negar que estou ainda me adaptando à minha nova... condição. Mas ainda assim, estou fazendo tudo para que isso seja o mais indolor possível tanto para mim quanto para você.
- Ah, é? E o que está fazendo?
- Em primeiro lugar, observando para saber como as coisas funcionam para mim e para você. Em segundo lugar, tentando evitar que você se meta em encrencas. Na realidade, eu estou tento um pouco de dificuldade para entender essa sua resistência. Muitas pessoas gostariam de saber que há alguém encarregado de zelar por elas. Sei que você não gosta de mim, mas podia pelo menos se mostrar um tanto... grato.
Harry olhou para Snape. Era o mesmo professor ensebado de sempre, talvez um pouco menos... corpóreo, por assim dizer. E os trajes que tanto esvoaçavam continuavam fazendo o mesmo, escondendo o volume das grandes asas.
- É que... Essa história toda da sua morte... Eu ainda não absorvi direito. Por que você salvou minha vida, pra começo de conversa? Você nem gosta de mim.
Snape suspirou:
- Não sei se você vai entender o que vou lhe dizer, Harry. Há coisas pelas quais vale a pena morrer. Se Voldemort capturasse você, o resultado seria desastroso, não somente para o lado de Dumbledore, mas para todo o mundo mágico.
- E você não podia simplesmente ter sabotado o plano dele?
- Eu já fiz isso muitas vezes, Harry, mais do que seria o normal. Voldemort já estava desconfiado de mim, e na verdade era apenas questão de tempo até ele me descobrir. Eu esperava poder ganhar mais tempo.
- Mas sua posição de espião era importante! Como pôde fazer isso com Dumbledore?
- Muito mais importante do que minha posição era evitar que Voldemort capturasse você e deixar você e seus amigos a salvo. - Severo deu de ombros, com um sorriso amargo. - Venho salvando você há tanto tempo, Harry, que esse trabalho deveria ser bem mais familiar para mim.
Harry sentiu uma dor lhe atravessando o coração. - Mas eu... sempre pensei.... - As lágrimas finalmente começaram a cair.
- Harry, o que foi?
- Eu sempre pensei... - Ele chorava ainda mais. - Pensei que... quem me protegia... eram meus pais...
Aquilo cortou o coração de Severo e ele se sentou na cama de Harry, dizendo:
- Mas é claro que eles o protegem, Harry. Só que de um jeito diferente. Eu nem sei se não foram eles que me mandaram proteger você.
Harry encarou os olhos pretos, procurando sinceridade neles:
- Você acha?
- Bom, é só uma suposição. De qualquer forma, eu tenho certeza de que eles estão olhando por você, sim. Sempre estiveram.
- Como você pode ter tanta certeza?
- Harry, o amor dos pais por um filho não some só por causa de uma coisinha menor como a morte. - Severo sentiu um impulso irresistível de chegar perto de Harry. - Você jamais esteve sozinho, Harry. - E tocou o ombro do menino de novo.
Dessa vez, Severo sentiu o alívio tomando conta do rapaz, que deu um sorriso triste. Harry suspirou:
- Tá bom.
- Agora vá dormir - disse Severo - Amanhã você tem aula cedo.
Na verdade, as aulas mais interessantes vieram mais tarde, no dia seguinte: duplo período de Poções. O Prof. Dumbledore esperou até que todos se sentassem e disse:
- Agora, se vocês estão todos ajeitados, podemos começar. Só que hoje eu não serei seu professor substituto. Eu tenho prazer de apresentar vocês ao seu novo professor, Robert Lambert. Ele vem de uma tradicional família bruxa americana. Tivemos muita sorte por encontrá-lo numa das mais conceituadas escolas de bruxaria dos Estados Unidos, em Salem.
Houve burburinho geral. Mas para Harry, um grito o fez encolher-se:
- Um ianque na minha sala?! - Snape andava de um lado para o outro, abanando os braços, as asas e capaz esvoaçando - Absurdo! Despropositado! Aposto como a família dele não tem sequer 300 anos!
Ron cochichou para Harry, rindo:
- Um americano, é? Snape deve estar se revirando na cova!
- Eu acho que você tem razão, Ron. - disse Harry, baixinho.
- Um insulto! - vociferava Snape - Como Alvo concordou com tamanha insanidade?! Americanos são grosseiros, exagerados, insensíveis e decididamente trogloditas!
- Por favor - pediu Dumbledore - Dêem as boas vindas ao Prof. Robert Lambert.
Todos começaram a bater palmas para o jovem que não parecia ter mais de 25 anos, cabelos castanhos levemente encaracolados, vestes verdes e pele muito pálida que contrastava com os olhos acinzentados. Ele entrou nas masmorras e fez uma reverência, antes de dizer:
- Obrigado a todos e obrigado, Prof. Dumbledore. É um privilégio estar em Hogwarts, ainda mais num assunto que sempre achei muito legal: Poções.
- Legal?! - imitou Severo, jocosamente. - Por Merlim!
- É claro que eu lamento as circunstâncias da minha vinda a Hogwarts. Por outro lado, talvez juntos possamos fazer do ensino de Poções uma atividade mais prazerosa - Ele olhou em volta com um olhar desaprovador - e mais cheia de vida. Alguém poderia abrir a janela, deixar um arzinho entrar, quem sabe um pouco de luz?
- LUZ?!?! - Harry deu um pulo tamanho o rugido de Snape. - Luz nos meus espécimes?! Os olhos de salamandra vão amarelar! E o resto de meus estoques?! Minhas ervas de fino trato! Minhas tripas de abissinato! O pó delicado de fígado de dragão pode pegar umidade de fora!
O novo professor continuava a fazer sua apresentação, com uma janela aberta. Dumbledore aproveitou a deixa para sair e Snape não parava de resmungar. Irritado, Harry tentou cochichar:
- Quer parar com isso?!
Hermione ficou intrigada:
- Parar com o quê?
Harry quis responder à amiga, mas Severo estava com a voz ainda mais ensurdecedora:
- Parar?! E deixar esse néscio inepto arruinar o trabalho de toda a minha vida?!
Harry estava trincando os dentes:
- Você - já - morreu!
- Só porque eu morri não quer dizer que eu tenha que aplaudir esse sicofanta sibarita enquanto ele destrói todo o meu patrimônio!!
- Harry, você está bem, amigo? - O rosto preocupado de Ron fez Harry se dar conta de que a classe toda estava olhando para ele, assim como os dois professores.
- Desculpe.
O Prof. Lambert chegou até perto dele e disse:
- Ah. Sr. Potter. Nossa celebridade.
- Ei! - protestou Severo. - Essa frase é minha!
Harry olhou para o teto para não explodir. Ele estava tão irritado que sua cicatriz começava a doer, e Severo continuava soltando fogo pelas ventas. Mas pelo menos ele tinha se calado.
O novo professor estava bem perto de Harry, encarando-o com um interesse quase palpável, os olhos acinzentados brilhando furiosamente. Harry se controlou, concentrando-se no problema à frente: Lambert.
- O senhor parece inquieto, Sr. Potter. Algum problema?
- Não, senhor. - Ele olhou disfarçadamente para Severo, que cruzou os braços e empinou o volumoso nariz.
- Muito bem, então. - Lambert encarou Harry intensamente, deu um meio sorriso e girou nos calcanhares. - Sendo assim, senhoras e senhores, vamos começar a trabalhar. Temos uma poção extremamente delicada que começaremos a fazer hoje: Poção Polissuco!
Hermione, Rony e Harry se entreolharam, divertindo-se, enquanto os demais alunos pegavam suas penas e pergaminhos. Afinal, os três tinham feito essa poção no segundo ano, tentando descobrir quem era o herdeiro de Sonserina que tinha aberto a Câmara Secreta. Harry passou o resto da aula tentando ignorar Snape, que o corrigia a cada cinco segundos, para a poção sair certa.
Snape estava incomodado o suficiente para espinafrar Harry, embora sua raiva, claro, não fosse com o menino. Lambert parecia um incompetente ainda maior do que quando tentou ser mestre de poções. Era verdade, Severo já conhecia Robert Lambert, ainda que superficialmente. Como autoridade no assunto, Snape tinha sido um dos professores chamados a avaliar o potencial do americano em ostentar o título de mestre. Desnecessário dizer que seus requisitos e atributos sequer chegaram perto de satisfazer o exigente mestre de Poções.
Na verdade, o que mais o incomodava era o fato de que o mundo continuava a girar e a vida continuava depois que ele tivesse morrido. Era um tanto estranho que ele, como sonserino, não tivesse visto a mudança da situação e aceitado. Contudo, aceitar intelectualmente era uma coisa. Ver a realidade nua e crua diante de si era outra coisa.
Tão absorto estava em sua nova situação que Severo quase deixou passar.
- Harry, cuidado! Neville!
Harry se virou, mas não a tempo.
Num impulso, Snape conseguiu fazer com que o desastrado Neville Longbottom derrubasse o ingrediente que manipulava fora do caldeirão. Se tivesse caído dentro do caldeirão borbulhante, eles estariam diante de mais uma explosão cortesia de Neville Longbottom.
- Ops - fez Neville, sem entender como tinha conseguido derramar os figos cortados.
Lambert se virou:
- O que aconteceu?
- Eu... eu... - Neville até gaguejou um pouco. - Eu derramei os figos da Abissínia, senhor.
Lambert caminhou até a mesa de Neville, observou a situação e disse:
- Ainda bem, senhor Longbottom. Teria sido um desastre se o senhor tivesse adicionado os figos nesta altura do cozimento. Precisa esperar até que a poção tenha se tornado totalmente transparente e o fogo esteja no volume mínimo. Por favor, procure seguir as instruções com mais cuidado.
Harry olhou para Snape, que ergueu uma sobrancelha. Ele parecia ter feito sua primeira incursão na corporalidade.
- Agora é que eu quero ver você trabalhar.
- Ah, então quer dizer que o grande Harry Potter não sabe nem treinar quadribol sem um protetor para mantê-lo na vassoura?
- Não é isso! É que estou louco para ver essas suas asas em ação!
- Rezando, Potter? - A voz era de Draco Malfoy, que estava deixando o campo de quadribol junto com o resto do time de Sonserina. - É bom mesmo.
- Você é quem devia estar rezando, Malfoy. - respondeu Harry, azedo - Agora desinfeta.
- Espero você no campo, Potter - Draco cuspiu, saindo com seus dois comparsas.
Severo comentou:
- Esse menino não tem o mínimo talento. Lúcio deve estar totalmente desapontado com ele.
Harry ficou surpreso:
- Pensei que ele fosse seu aluno favorito!
Severo deu um riso malévolo:
- Favorito? Esse pestinha Malfoy? Nem que o próprio Salazar me pedisse. Não, tudo é uma questão de política sonserina, Potter. Como um perfeito grifinório, eu não espero que você entenda.
Angelina Johnson tocou o apito e convocou:
- Muito bem, time, agora todos prestem atenção! Vamos treinar defesa. Quero técnicas de vôo defensivo e ação enérgica contra o time adversário. Vocês precisam impedir o goles de chegar perto dos aros. Eu quero todos nisso! Vamos lá!
O treino começou sem qualquer incidente. E isso foi realmente uma bênção, porque Harry estava tendo uma imensa dificuldade de se concentrar no vôo defensivo, de tanto que ria das tentativas de vôo de Severo com seu recém-adquirido par de asas.
Com seus mantos negros muito mais esvoaçantes pelo ar, Severo parecia um urubu em vôo acrobático, a toda hora gritando, reclamando e esperneando. Mais de uma vez Harry viu seu ex-professor de poções e anjo extraordinário agarrado a um dos aros, tentando se manter no ar. O Apanhador de Grifinória tinha dificuldade de ficar na vassoura, de tanto que ria, o que levava Severo a ir para seu lado (pensando que ele iria cair) e provocando espanto nos seus companheiros de quadribol, que não entendiam o motivo de tanta graça.
Na segunda parte do treino, aparentemente Severo tinha feito as pazes com suas asas e se dedicava a seguir Harry como um urubu realmente persistente. E foi aí que aconteceu.
Severo voava atrás de Harry, concentrado no menino, praguejando por que ele não podia ir mais devagar quando de repente, tudo pareceu ficar congelado no ar. Na verdade, não estava exatamente congelado, mas se movia a uma velocidade tão baixa que parecia estar parado. Severo olhou em volta, tentando se assenhorear da situação. Foi quando viu, atrás de si, um balaço que vinha direto para Harry - que obviamente não vira a ameaça.
Mais uma vez tomado por aquele estranho impulso, Severo deslizou no céu e virou a vassoura de Harry. No exato momento que fez isso, a ação voltou à velocidade normal, e o balaço investiu contra o Apanhador de Grifinória - errando por alguns centímetros. Harry se surpreendeu com o deslocamento de vento e agarrou-se à sua Firebolt.
- Harry - gritou Angelina - Tudo bem?
Harry olhou para Snape e respondeu:
- Tudo! Foi por pouco! - Baixinho, só para Snape, ele disse: - Obrigado.
Severo assentiu e pensou que aquele era um desenvolvimento interessante. Ele teria que observar mais para saber como provocar aquele efeito de congelamento. Se ele pudesse controlar aquilo, seria fundamental para sua missão.
- Queria saber como você fez aquilo. - disse Harry, disfarçadamente. - Eu não vi você.
- Segredos do ofício, Harry. Agora preste atenção no seu trabalho e deixe-me prestar atenção no meu.
Mas internamente Severo estava se dando conta de que cometera um erro crucial até aquela altura. Ele tinha pouco conhecimento sobre seu novo "trabalho". E ele teria que remediar isso o quanto antes.
Harry entendia o motivo, mas preferia que seus amigos não estivessem por perto. Contudo, Rony e Hermione estavam achando Harry cada vez mais esquisito desde aquele dia terrível na Travessa do Tranco.
Hermione adorara a idéia de Harry mergulhar num outro projeto extra-classes que não quadribol.
- Que ótimo você querer fazer uma pesquisa, Harry! Deixa que eu te ajudo. O que você quer saber?
Harry ficou vermelho:
- Er... anjos.
Ron ficou intrigado:
- Anjos? Por que anjos? Todo mundo sabe que anjos não existem.
- Como você sabe que isso é verdade? - disse Harry, na defensiva. - Para trouxas, bruxas não existem. Nem duendes, nem dragões, nem gigantes, muito menos o Bicho-Papão!
Hermione quis saber:
- Você acha que viu um anjo, Harry?
Harry olhou para Severo e respondeu:
- Acho que sim. Eu queria saber mais sobre eles.
- Vamos, então - disse ela - Eu sei exatamente o que você procura.
Mal chegaram à biblioteca, ela procurou numa estante e voltou com um imenso volume, que jogou na mesa:
- Aqui! "Pergunte ao seu Anjo e Obtenha a Resposta".
Ron fez cara de nojo:
- Odeio livro de auto-ajuda.
Harry folheou o enorme tomo e observou:
- Vejamos: anjos, arcanjos, príncipes, grupos, querubins, serafins... Mas... Todos eles têm nomes! Como eu vou saber qual é o que eu quero?
- O anjo que você quer tem nome?
- Er... Tem.
- Então procure o nome dele aqui.
- Ele não está aí.
- Como não? Se ele é anjo, está aqui.
- É que ele... é um anjo diferente. Acho que está em treinamento.
- Ah. Ainda não ganhou asas, então?
- Não, ele já tem asas.
- Puxa, eu queria ver isso - disse Ron. - Deve ser legal.
Severo estava ficando irritado:
- Que mania de todo mundo querer ver minhas asas! Agora ache alguma coisa de útil, Potter.
Hermione foi a salvação:
- Aqui diz que quando sinos tocam, um anjo ganhou as asas. Ouçam isso: "Anjos habitam um mundo à parte e sutil. A existência desses seres remonta à Cabala, tratado místico e filosófico que desvenda os mistérios da criação do mundo e das forças que regem o universo. As origens da Cabala se perdem no tempo. Sabe-se apenas que seus ensinamentos vêm sendo transmitidos oralmente, de geração a geração, pelos hebreus, e que ainda hoje há pesquisadores que se dedicam integralmente à análise de seus códigos e símbolos."
- Garota esperta - disse Severo - Mas gostaria que ela me ajudasse!
Hermione continuou a ler:
- "Os anjos podem manifestar-se nos homens através de pensamentos e idéias, já que são seres inteligentes. Eles nos auxiliam pela inteligência, boa vontade e na escolha certa das várias opções. A inteligência sempre leva à verdade e a verdade sempre ao bem. Os homens erram, porque seus conhecimentos vêm por etapas. Os anjos nunca nos abandonam, não têm a necessidade de se refazer através do sono e não sofrem os efeitos do tempo. Eles conhecem as modificações do sistema nervoso humano pela mudança da cor da nossa aura. Mas nem por isso eles ficam o tempo todo a nossa proteção, pois assim não haveria perdas e dores. Os anjos tem um horário certo de atuar sobre cada pessoa."
Harry disse:
- Então tem alguma coisa errada. Ele não larga do meu pé.
Hermione continuou lendo, desta vez para si mesma, e Ron comentou:
- Puxa, então não deve ser tão legal assim.
Harry disse:
- Pode apostar.
A garota se virou, decidida:
- Harry, alguma coisa não está certa. Aqui diz que não se pode ver anjos, mas que eles podem se mostrar para seus protegidos. Só para eles.
- Então esse anjo que o Harry anda vendo está protegendo ele? Harry, você tem proteção extra! Que ótimo! Depois do que aconteceu com Você-Sabe-Quem, até que isso não é ruim!
Harry olhou para Snape:
- Acho que sim. Mas eu gostaria que ele fizesse só o que ele deveria fazer, sabe? Só essa coisa de inspiração nos pensamentos e idéias que você falou. Não ficar no meu pé o tempo todo.
Severo não conseguiu deixar de dizer:
- Desculpe, Harry. Estou trabalhando nisso, e eu esperava que essa ida à biblioteca me ajudasse.
Hermione estava lendo um trecho adiante:
- Mas talvez isso ajude a entender, Harry. Aqui diz que anjos podem se deixar ver por seus protegidos no caso de perigo iminente. Mas que geralmente depois eles apagam essa memória do protegido.
Ron disse:
- Faz sentido. Se eu soubesse que alguém está me protegendo, eu provavelmente teria menos cuidado. Sabe, confiaria mais no anjo do que em mim.
- Por isso ninguém sabe se eles existem de verdade ou se são só um folclore para crianças - completou Hermione. - Isso não daria às pessoas iniciativa para crescer.
Harry estava surpreso:
- Então isso quer dizer que eu estou em perigo iminente? Mas perigo de quê?
- De acordo com esse livro - disse Hermione sombria -, eles só aparecem em perigo real de você perder a vida... ou a alma.
Ron abriu a boca, assustado, e Harry arregalou os olhos. Snape ergueu uma sobrancelha e disse:
- Tenha calma, Harry. Eu estou aqui para proteger você.
