Capítulo 1

- Convite inesperado -

Era mais um dia quente na rua dos Alfeneiros, enquanto Harry passava as férias de verão na casa de seus tios. Ao contrário dos anos anteriores, o clima estava um tanto quanto insuportável e não havia razão lógica para isso. Talvez o motivo estivesse de alguma forma relacionado a ele estar crescendo e ficando mais velho, Harry agora tinha 16 anos, ou apenas porque a cada ano ele estava ficando mais acostumado com o clima agradável de Hogwarts. Independente de qual seja o motivo, Harry evitava passar o dia dentro da casa de seu tio Válter. É verdade que essa férias tem sido uma das melhores, pois antes as ameaças de Moody e os outros membros da ordem da Fênix deixaram o tio Válter mais apreenssivo. Não que ele tivesse deixado de tratar Harry como um estranho indesejável que dormisse sob o mesmo teto, mas que ele evita manter contato com o sobrinho o máximo que podia. Ambos só se encontravam durante o café da manhã, o qual Harry fazia questão de acordar mais tarde para diminuir ao máximo o encontro, e à noite, quando Duda voltava da rua após causar baderna com sua gangue. Era sempre nessa hora que Harry voltava, pois se voltasse um minuto mais tarde, seria repreendido e teria que ouvir os mesmos insultos de sempre. Tia Petúnia continua a mesma carrancuda de sempre, talvez até mais. Sempre dando razão ao seu filho e o marido, nunca fazia nada para tornar o verão de Harry menos desagradável, mas dessa vez ela imitava as atitudes do marido ao evitar manter contato com Harry. Duda também tomou a mesma atitude dos pais, com muito mais motivos que eles pois ele não queria passar por momentos tão difíceis como os que já passou anteriormente. Eventualmente tinha pesadelos onde ele acordava em sua sala, com um rabão de porco saltando para fora de sua calça e uma língua monstruosa caindo sobre o chão, enquanto todos os seus colegas de turma riam dele. Não fosse pela coruja Edwiges que trazia as cartas de seus amigos e fazia companhia a ele todas as noites, esse teria sido o verão mais solitário da vida de Harry.

Lupin também escrevia contando como iam as coisas em Grimmauld Place e as novidades sobre Lord Voldemort. Após a morte de Sirius, o elfo doméstico não tinha mais que obedecer a ninguém naquela casa e eles tentaram encontrar uma solução para o futuro dele, mas foi desnecessário. O próprio elfo foi encontrado morto na manhã seguinte, com um bilhete pedindo para que sua cabeça fosse colocada ao lado da de seus parentes. Ter que servir a esses "traidores, imundos, desgraçados" como diziam ele e a mãe de Black, era a última coisa que faria e por isso preferiu ter o mesmo fim que os seus parentes. Harry tentou imaginar a reação de Hermione ao saber disso, mas ele mesmo se sentiu um pouco aliviado pois o elfo era uma ameaça à ordem por saber de tanta coisa que nem mesmo Harry sabia. Todos os outros continuavam atentos a qualquer sinal de Lord Voldemort, que foi visto ou teve-se notícias apenas no ataque ao ministério da magia. Desde então, foi procurado incessantemente por aurores, mas sem resultados. Ninguém sabe o que ele está planejando agora, apenas que muito provavelmente ele está tentando libertar os comensais da morte presos em Azkabam.

Nas cartas de Rony, ele dizia como suas férias estavam sendo maravilhosas apesar dos acontecimentos. Fred e Jorge estavam indo muito bem com sua loja de logros e brincadeiras. O ritmo de produção aumentou bastante o que a princípio deveria ser uma razão para preocupação a Rony, mas agora eles tinham muito pouco tempo para ficar em casa e preferiam testar isso no que eles chamam de "Redoma dos horrores". Um local muito mais apropriado para isso. Dizem até que encontraram alguém para ser a cobaia de suas invenções, apenas para se ter idéia de quão bem estão indo. Passando pouco tempo do dia em casa, os irmãos não causam mais tantos problemas quanto antes. Até a Sra. Weasley diz que foi bom eles terem conseguido se dar bem em algo que gostavam, mas é óbvio (ao menos para Rony) que apesar do que ela diz, ela ainda tem esperanças de que algum dia os irmãos queiram terminar os estudos e arrumarem um emprego mais convencional. Percy mandou uma carta formal pedindo suas sinceras desculpas a todos da família e comentando que sentia muito por não ter dado ouvidos ao que seu pai dizia, mas mesmo assim explicou que diante das circunstâncias ele acreditava que o Sr. Fudge tinha toda razão em desconfiar de Dumbledore e que não se arrepende de ter ficado ao seu lado, pois tudo isso fez parte de uma série de eventos que culminaram na revelação de Voldemort ao resto do mundo. Percy era orgulhoso demais para admitir estar mais errado do que admitiu, mas essa carta já foi o suficiente para deixar seus pais de melhor humor. "Percy vêm nos visitar nos fins de semana, não quis voltar a morar com a gente!" dizia Rony na carta, que obviamente não estava nem um pouco incomodado com isso. Gina está crescendo e mudando bruscamente, tanto seu físico quanto seu psicológico. "Não entendo! Achei que mamãe fosse contra poções ou qualquer outro artefato que altere a constituição física!" dizia Rony, escrevendo a respeito de sua irmã. Ele não entrou em detalhes, mas Harry não deixou de achar graça ao imaginar um ciumento Rony repreendendo sua pequena irmã Gina por vestir saias tão curtas, na altura dos joelhos... A Sra. Weasley, na falta de seus outros filhos, têm mais tempo para se dedicar a Rony e Gina. "imagino que ele tenha ganho alguns quilinhos" pensava Harry enquanto comia um pedaço de bolo de sonho, feito pela Sra. Weasley e que veio junto com a carta. O Sr. Weasley tem trabalhado muito, agora que a situação no ministério foi amenizada e Fudge estava em trégua com Dumbledore. Todos os esforços agora estavam sendo concentrados na captura de Você-sabe-quem, escrevia Rony.

Nas cartas de Hermione, ela não dizia muita coisa. Apenas que suas férias estavam muito bem e que esperava que as de Harry também. Com certeza essa férias estavam longe de serem boas, mas até agora foram as melhores que ele já passou na casa do seu tio Válter. Ela contou que viajou até países de clima tropical, visitou exuberantes praias e desfrutou de magníficas paisagens que nunca imaginou poder existir fora de Hogwarts. Também contou que conheceu um jovem trouxa, nativo do país em que visitou. Seu nome era Hugo Beltazar, morava atualmente na Itália, mas estava visitando parentes. Ele estava cursando o último ano na sua escola e iria prestar vestibular para odontologia. Caiu nas graças de seus pais no mesmo instante que contou isso, e se tornou quase como o anfitrião da família nessa viagem passando grande parte do tempo mostrando diversos lugares. Ele já havia viajado para lá outras vezes e conhecia bem o lugar. Essa, entre tantas outras coisas a respeito de Hugo, Hermione contava na carta e fez Harry pensar pela primeira vez que em todas suas cartas, ela não falava muito de sua família. Era sempre "estamos bem" ou "as férias têm sido ótimas, espero que as suas também" mas nunca entrava em mais detalhes como fazia Rony. Agora, Harry também estava curioso para saber como eram os pais de Hermione. Só tinha visto eles algumas vezes e nessas vezes pareceram pessoas bastante simpáticas e normais. "isso explica por que ela é tão inteligente..." pensava Harry, imaginando seus tios e suas notas em Adivinhação. Com certeza os pais de Rony eram simpáticos, mas longe de serem normais para o padrão dos trouxas. Harry também notou que metade da carta era falando a respeito desse Hugo que ela conheceu recentemente. "será que ela parou de se corresponder com Krum?" pensou Harry, mas isso ele não iria perguntar se Hermione não quisesse contar.

Era tarde da noite e Harry estava deitado no gramado em frente à casa, olhando para o céu limpo e estrelado. Sua cicatriz latejava todos os dias, mas com menos intensidade como se Lord Voldemort não quisesse demonstrar algum sinal de sua existência. A lua crescente estava bem no alto e ela o fazia se lembrar de Lupin. Pensando em suas aulas para se defender dos dementadores, Harry mal pôde notar como estava ficando tarde e Duda havia passado muito da hora habitual de chegar em casa.

"provavelmente escondido nas árvores, esperando o melhor momento pra destruir os brinquedos do parque" pensava Harry, enquanto contava as estrelas. Um grito de dentro da casa, que mais parecia com um mugido de boi pouco antes do abate, o fez voltar à realidade.

"HARRY POTTER! VÁ PARA O SEU QUARTO DORMIR! NÃO É HORA DE FICAR NA RUA!" mugia o seu tio Válter.

Cansado demais para responder ou até mesmo se irritar, Harry se levantou e obedeceu à risca a ordem de seu tio. Também já estava com as costas doendo devido ao chão duro. Entrou na casa e quando estava subindo o primeiro degrau, Harry viu sua tia Petúnia limpando o ombro do casaco de seu marido, enquanto ele pegava as chaves do carro. Ele conseguia distinguir uma leve expressão de preocupação na cara de cavalo de sua tia, em meio a tanta carrancudice. Seus lábios estavam formando uma linha, enquanto o sangue parecia lhe faltar na cabeça. As sobrancelhas do seu tio estavam juntas e várias rugas na testa impediam as gotas de suor de cair sobre seus olhos. O bigode seguia movimentando conforme o ar impulsionado de suas narinas o empurrava.

"eu volto logo! Feche as janelas e desligue as luzes!" - dizia Válter - "E você, o que está fazendo aí? Suba!"

Harry se viu parado no degrau, olhando aquela estranha cena. Será que seu primo havia ficado preso entre duas grades de algum muro, tentando ultrapassá-lo? Não era muito difícil de acontecer, mas mesmo assim Harry não teria tanta sorte. "Creio que nem sua cabeça conseguiria passar pelas grades" pensava Harry, enquanto terminava de subir as escadas.

Chegando em seu quarto, trancou a porta e jogou-se na cama. Deu para ouvir o barulho do carro saindo da garagem rapidamente e dobrando a rua numa velocidade que seu tio só alcança quando está atrasado para o trabalho. Em seguida, sua tia fecha a porta e ele a escuta fechando as janelas.

Harry tentava entender o que tudo aquilo significava, quando um pio estridente o tirava mais uma vez de seus pensamentos. Edwiges havia acordado com o barulho do carro e olhava para Harry com seus grandes olhos negros.

"tudo bem. É só Duda causando problemas" disse Harry, reconfortando sua coruja.

Ela abre suas largas asas e alcança vôo, passando direto pela janela. Tinha saído mais uma vez para caçar ratos na vizinhança. Harry tinha suas suspeitas de que até mesmo os ratos daquele lugar pudessem fazer mal à sua coruja, mas se até hoje ela está bem...

Minutos mais tarde, Harry estava quase caindo no sono, quando um bater de asas entra pela janela e pousa bem em cima de sua barriga. Depois do repentino susto, ele se senta, obrigando a coruja a pousar em outro lugar próximo, e pega seus óculos. Não era Edwiges quem estava ali, mas uma coruja parda de porte médio e uma curiosa linha amarela vertical que ia dos olhos até a parte de trás de sua cabeça. Essa coruja lhe parecia familiar, mas ele não se lembrava de onde. Um pequeno pergaminho vinha em sua pata. Harry tira o pergaminho e o desenrola.

"mas quem é que mandaria a essa hora? Será que é alguma coisa sobre lord voldemort??" pensava Harry, enquanto coçava o olho para ler a carta.

"querido Harry,

Como estão as coisas por aí? Espero que estejam bem! Sei que não estão como você queria, mas com certeza estão melhores. Aqui também está tudo indo ótimo! Você nem faz idéia de quanta coisa interessante eu li nesses últimos dias..."

"Hermione..." pensou Harry, antes de ler o resto da carta. A bonita e organizada letra também o ajudou a deduzir isso.

"bem, sei que não tenho muita coisa para lhe contar, mas resolvi mandar essa carta pois tive uma idéia fantástica. Ontem à tarde eu me dei conta de que não nos conhecemos direito. Quero dizer, eu nunca fui onde você mora (provavelmente seus tios não perimitiriam) nem você nunca veio aqui. Todo ano você passa o fim das férias na casa de Rony ou com a família dele (ultimamente, eu também), mas agora que nada de anormal aconteceu, gostaria muito que viesse passar uns dias aqui em casa. Meus pais querem te conhecer. Você sabe que eles são trouxas e não conhecem a sua fama, mas mesmo assim...

Enfim, acho que seria legal. Temos um quarto vago aqui em casa. Não é como a casa dos Weasley, mas também é confortável e agradável. Talvez seja até parecida com a casa de seus tios! Eu já falei com meus pais e eles disseram que ficariam felizes em ter você aqui. Bem, o convite está feito e se seus tios permitirem estarei lhe buscando domingo, às 2 da tarde. (não temos um carro voador, apenas um normal) Por favor, responda a carta o mais rápido que puder.

Carinhosamente

Hermione

PS: já mandei uma coruja para Dumbledore e ele me disse que não haveria problema algum. Essa, por sinal, é uma das corujas do colégio que ele teve a gentileza de emprestar."

Uma profunda alegria preencheu Harry, que se imaginou saindo daquele lugar entediante e indo passar o resto das férias com Hermione e sua família.

"Tomara que lá não seja igual a aqui! não mesmo!" dizia Harry, pensando em como iria pedir aos seus tios para que o deixassem sair. Talvez agora fosse mais fácil, pois Válter se lembrava muito bem dos tipos estranhos que eles encontraram na estação de trem e nunca mais desejava topar com um deles, algum dia.

Nesse instante, o barulho do carro do tio Válter entrando na garagem, chamou a atenção de Harry até a janela. Ele se debruçou e viu que o tio voltava para casa com as luzes do carro desligadas. Rapidamente pôde notar uma forma oval imensa no banco da frente, que pertencia ao seu primo Duda. O regime forçado de tia Petúnia não funcionou muito bem, principalmente porque Duda era alimentado fora de casa pelos membros de sua gangue e todos aqueles que tinham medo dele, na turma. A cada dia que passava, Duda parecia muito mais gordo e redondo, como uma espécie anã e mal-humorada de Hagrid. O tio Válter também não ficou para trás, o que prova que ninguém na casa estava seguindo a dieta à risca. Talvez até mesmo tia Petúnia não seguia, mas isso não tem como saber pois alguma coisa a impedia de tomar formas menos ossudas. O tio válter fecha a porta da garagem e Harry sai da janela, com o rolo de pergaminho em suas mãos.

"eu já volto! Não saia daqui!" disse Harry, encarando a coruja parda que se dirigia para o travesseiro.

Harry abre a porta lentamente e se aproxima do topo da escada, ouvindo reclamações e sermões mal-humorados do seu tio. Ele tenta espiar sem ser notado, mas o máximo que consegue ver é seu primo sentado na cadeira com os braços cruzados, expressão bem fechada na cara e bochechas infladas como um sapo pronto para coachar. Ele encarava os pés de seu pai, que estava em pé na sua frente. A casa estava meio escura pois tia Petúnia deixou apenas a luz da cozinha ligada.

"Eu não sei mais o que faço com você!" dizia Válter. "Quantas vezes já lhe proibimos de ir lá? Quantas vezes já lhe dissemos para não andar mais com aqueles marginais? Você não vê que eles são uma má influência?"

Harry entendeu tudo. Já é a segunda vez que Duda é pego junto com sua gangue, tentando destruir as lápides do cemitério ou alguma estátua. Por mais que tio Válter não quisesse admitir, Harry sabia que a má influência era Duda.

"Válter, não fale assim com meu dudinha querido" dizia Petúnia, que para variar tentava amenizar a situação.

Em meio aos rugidos e grunhidos de seu pai, duda começava a choramingar.

"A culpa disso tudo é sua, Petúnia! Eu tentei pôr um fim nisso, mas você sempre diz para eu me acalmar e acaba assim! Já pensou se os vizinhos descobrem isso? Já pensou o que vão dizer de nós se souberem que tive que pagar multa pra trazer meu filho da delegacia?!?" gritava Válter, confiante na impermeabilidade de suas paredes.

"shhhhh! Fale baixo! Harry pode estar ouvindo!" disse Petúnia.

"Não me fale esse nome! Eu não entendo porque você insiste em mantê-lo aqui! Já estou farto dessa situação, Petúnia!" continuava gritando, Válter, fazendo sua papada balançar freneticamente.

"Agora é tudo culpa minha? É por minha causa que aquele moleque está aqui? É por minha causa que meu filho voltou da delegacia? Agora vai me dizer que é minha culpa você não conseguiu a promoção que queria e tem que continuar bajulando o seu chefe por mais um ano?!"

"CALE-SE! Dos meus negócios, cuido eu! E Duda não é apenas o seu filho, é meu também! Como eu deveria ter feito a muito tempo, vou tomar uma atitude! Agora ele vai aprender!" gritava Válter que aparentemente estava puxando o cinto de suas calças.

Agora Harry entendia que era ele quem mantinha aquela família unida. Enquanto eles estivessem concentrados em desmoralizá-lo, não havia tempo para brigarem entre si. Só que esse ano a história é um pouco diferente. Duda agarrou-se com força à saia da mãe, quase derrubando-a no sofá e Válter levantou seu cinto sobre sua cabeça. Nesse momento, a coruja parda passa como uma flecha sobre a cabeça de Harry, que tenta segurá-la mas apenas consegue derrubar o pergaminho nas escadas. Piando alto, a coruja prende suas garras na mão de Válter que segurava o cinto, fazendo com que todos ali na sala gritassem em pânico. Duda relembrou naquele segundo de todos os momentos estranhos pelos quais passou e se jogou com a cara no sofá. Petúnia continuava escorada no braço do sofá, gritando estridentemente enquanto Válter sacudia a mão até conseguir se desvencilhar da coruja. Ela voava em círculos sobre a cabeça de válter, piando alto. Harry tentou aproveitar aquele momento para tentar pegar o pergaminho no último degrau da escada, mas Válter o vê e pára de tentar perseguir a coruja.

"HARRY POTTER! PARE ONDE ESTÁ!" gritou Válter, ignorando a coruja completamente.

Harry pega o pergaminho e ergue a cabeça, parado. Ele sabia que não deveria dizer que escutou tudo aquilo, mas não sabia como explicar a coruja. Ao mesmo tempo, ele tentava encontrar um meio de pedir ao seu tio para que deixasse viajar no fim das férias, mas suas esperanças estavam todas jogadas fora. A coruja pára sobre o centro da sala, encarando Duda que levanta um olho sobre seus grossos dedos trêmulos, mas o abaixa na mesma hora escondendo sua cara feia de choro.

Tia Petúnia parou de gritar e agora estava imóvel, achando que se fizesse algum movimento seria atacada pela coruja.

"EU NÃO ADMITO ESSES ANIMAIS AQUI! JÁ BASTA A SUA CORUJA ENCARDIDA! NÃO ME IMPORTA QUANTOS AMIGOS ESTRANHOS VENHAM PARA CÁ, EU NÃO VOU MAIS PERMITIR ISSO!" gritava Válter, cujo rosto estava numa tonalidade avermelhada. Ele apertava o cinto com mais força que nunca, pois sua mão tremia bastante. Harry teria respondido pois sabia que seu tio temia mais que qualquer coisa os seus "amigos estranhos" mas ele não queria enterrar mais fundo suas esperanças de conseguir permissão para viajar.

"des.." dizia Harry, antes de seu tio interromper.

"CALE A BOCA! NÃO VENHA SE DESCULPAR AGORA! O QUE É ISSO QUE ESTÁ SEGURANDO?"

"uma.. uma carta"

"O QUE FAZIA FORA DO SEU QUARTO? VOCÊ PODE MUITO BEM LER AS SUAS NOTÍCIAS BIZARRAS LONGE DA SALA!"

"er... eu só queria pedir algo..." Harry sabia que aquela não era a melhor hora, mas depois de amanhã seria domingo e ele não teria muito mais tempo. Além do mais, não estava conseguindo arrumar uma desculpa melhor.

"SE É PARA ASSINAR ALGUMA PERMISSÃO, PODE ESQUECER DISSO! TENHO MUITO BEM O DIREITO DE LHE NEGAR!"

"não precisa assinar. É que uma amiga me chamou para passar o fim das férias com..."

"JÁ TEMOS PROBLEMAS DEMAIS AQUI E VOCÊ AINDA ACHA QUE PODE NOS PERTURBAR COM OS SEUS? VOLTE PARA O SEU QUARTO E NÃO SAIA DE LÁ ATÉ SEMANA QUE VEM! TEMOS MUITO O QUE RESOLVER AQUI E NÃO QUERO VOCÊ XERETANDO!" bufava Válter, ainda de cinto na mão. Uma veia em sua testa latejava, assemelhando-se à cicatriz de Harry.

"por favor! eu só quero permissão para passar o fim das férias com minha amiga!" insistia Harry, que não pensava em dar o braço a torcer se eles não concordassem.

"NÃO FALE DESSES SEUS AMIGOS ESTRANHOS AQUI EM CASA! JÁ BASTA PASSAR O ANO INTEIRO COM ELES, AINDA QUER MAIS? VOCÊ NÃO VAI E NINGUÉM VAI ME OBRIGAR A PERMITIR QUE VOCÊ VÁ! DIGA A AQUELE ESQUISITO QUE EU SOU SEU TIO E QUE ELE NÃO É NADA E NÃO TEM O MENOR DIREITO DE ME OBRIGAR A ALGO!" com certeza Válter não havia esquecido de Moody. Era sempre o primeiro "esquisito" de quem se lembrava, antes mesmo do pai de Rony.

"tudo bem... se você não quer me deixar ir, não posso fazer nada. Vou voltar pro meu quarto e responder para ela que não posso ir, pois vou ter que ficar aqui espalhando para os vizinhos que meu primo foi pego pela polícia." Dito isso, Harry deu as costas e subia as escadas, mas uma pesada e gorda mão o segurou no ombro. Ele se vira para encarar seu tio, que tinha uma expressão de susto e raiva incrustada na sua cara, que mais parecia com uma foca agonizando. O lábio superior estava tremendo tão rápido que fazia seu bigode parecer ainda maior e vivo.

"o que você disse?" perguntou Válter, cuja voz havia sido estrangulada pela própria garganta.

"isso mesmo que você ouviu! e se vocês tiverem um pouco de sorte, os vizinhos não vão estar olhando para cá enquanto Moody vier me buscar após eu mandar uma carta para ele contando como as coisas estão indo aqui! Já pensou? o filho de Válter, um marginal, e o sobrinho, uma bizarrice com amizades estranhas! sua vida estará acabada, Válter!" disse Harry, que nunca tinha encarado seu tio dessa forma. Sua cabeça doía, mas não era por causa da cicatriz. Uma vontade imensa de lançar uma praga em Válter surgiu na sua mente, mas ele não poderia fazer isso ou atrairia mais problemas para si. Seu tio também estava bastante surpreso e assustando, pensando na possibilidade daquilo que Harry disse, um dia chegar a acontecer.

"muito bem!" dizia Válter, largando o ombro de Harry e tentando manter a voz calma. "se é assim que você quer que seja, eu vou deixar que vá embora. Mas eu não me importo com o que lhe aconteça ou com o que sua tia diga. Não vou mais lhe buscar em lugar algum! Se ainda quiser voltar, venha sozinho e de um jeito normal. Se mais alguma coisa estranha acontecer por aqui, você pode se considerar expulso! Já estou cansado de tanta ingratidão!" seu olhar era vago e trêmulo. O sangue lhe sumiu da cabeça, dando a valter a aparência vaga de um boneco de neve derretido.

"hum... ótimo..." dizia Harry "eles vêm me buscar domingo, às duas horas. E eles vão vir de um jeito normal, não se preocupem."

"NÃO ME INTERESSA QUANDO ELES VÃO VIR! APENAS VÁ EMBORA! EU NÃO TENHO QUE RECEBER NINGUÉM." gritou Válter, enquanto ia em direção à cozinha para fazer um curativo na mão arranhada. Harry chama a coruja com as mãos e ela voa até seu ombro, liberando passagem para tia Petúnia que não foi capaz de dizer uma palavra após isso tudo. Harry sobe em seu quarto e tranca a porta, pensando em tudo o que acabou de acontecer. Será que ele havia tomado o controle da casa? Seu tio tinha tanto medo assim de que os vizinhos soubesse de tudo, a tal ponto que ele pudesse ceder aos pedidos de Harry sempre que necessário? Harry achava que poderia mandar em seu tio, mas ele também sabia que não poderia exagerar pois só haveria proteção de Voldemort enquanto morasse naquele teto. Se algum dia ele fosse expulso definitivamente, sua vida correria um grande risco.

"bem... pelo menos por enquanto, está tudo bem" pensava Harry, enquanto se deitava na cama e molhava a ponta da pena para escrever uma resposta à Hermione. Naquele momento, Edwiges entrava pela janela com uma ratazana no bico e olhou enciumada para a outra coruja, que retribuiu o olhar com a mesma intensidade.

Na carta, Harry respondia.

"Querida Hermione,

Por incrível que pareça, meu tio deixou que eu fosse passar o fim das férias com vocês. Fiquei muito contente que tenha me convidado e espero não causar muitos problemas. Você nem faz idéia do que precisei fazer para convencê-lo a me deixar ir, mas vou contar tudo quando estiver aí. A sua coruja também me ajudou bastante. Só em ver a cara de raiva do meu tio, enquanto ele pensa em me estrangular mas sabendo que se fizer isso coisas 10 vezes pior vão acontecer com ele, já fico bem mais animado. Já não aguento mais esse lugar e tenho certeza de que vai ser ótimo ficar com vocês esses dias. Mande um abraço para seus pais e diga a eles que às 2 em ponto estarei na porta de casa esperando.

Um beijo,

Harry"

Não estava muito longa, mas era o suficiente. Harry enrola o pergaminho e prende na pata da coruja, mandando-a seguir de volta ao endereço de Hermione. A coruja desaparece na escuridão da noite e Harry volta a se deitar, com os olhos pesados. Ele ainda podia ouvir os passos forçados dos seus tios no andar de baixo e podia ouvir o seu primo rindo de tudo no quarto ao lado, mas os sons se tornavam cada vez mais distantes, enquanto Harry caía no sono...

...

Era tarde da madrugada e todos os sons haviam cessado. Harry dormia tranquilamente e Edwiges mantinha seu bico aquecido embaixo da asa. Um vento frio balança a cortina e faz a coruja se arrepiar levemente, despertando-a de seu sono. Ela olha para a cortina balançando e então olha para Harry, mas vê que aparentemente estava tudo normal. De repente, um estranho feixe de luz emerge silenciosamente de baixo do travesseiro de Harry. Iluminando parte da escrivaninha e sem despertar Harry, um pedacinho do travesseiro começa a subir e a descer como se estivesse tentando se livrar de uma pesada cabeça. Edwiges empina a cabeça em prontidão, olhando atentamente à cena. Aos poucos a luz vai se tornando mais forte, como se sua fonte estivesse conseguindo sair de baixo do travesseiro. Então, uma pequena mão semi-transparente e azulada com 4 dedos sai do travesseiro, emanando uma luz muito mais forte. Edwiges comprime seus grandes olhos, mas permanece vendo a cena, sempre preparada para um rápido ataque. Uma segunda mão sai do travesseiro. Elas eram finas e aparentemente não tinham esqueleto, apenas uma fina cartilagem era visível através de sua pele. Todo o quarto toma um tom azulado quando a cabeça da criatura sai do travesseiro. Ela tinha uma elevação onde supostamente deveriam haver olhos, lembrando algo parecido com sobrancelhas. Também não havia pêlo em seu rosto, mas a forma de suas sobrancelhas e os lábios flexíveis apertados davam a entender que a criatura realizava um grande esforço. Ele não emitia som algum, apenas um leve tilintar saía de todos os lugares que a luz atingia. Seu nariz era liso e achatado, quase como se fossem duas fendas no rosto. Uma esfera brilhante era visível dentro de sua cabeça, como se fosse o seu cérebro. Em pouco tempo, a criatura que não devia medir mais de 20 centímetros, estava completamente fora do travesseiro e esfregava seus braços como se estivesse mais aliviada. Ela então se vira para Harry, vagarosamente e arqueia seus braços, recuando alguns passos. A coruja não poderia mais arriscar e abre suas grandes asas soltando um pio estrondoso, chamando a atenção da criatura. Esta, vira-se rapidamente e encara ferozmente com seus olhos inexistentes, a coruja. Edwiges não espera nem mais um segundo para avançar sobre a criatura, mas esta salta da cama e cai graciosamente no chão, ainda fazedo apenas um ruído de tilintar. O bico de Edwiges estava totalmente aberto, preparado para segurar a criatura com tanta força que ela só sairia de lá dividida ao meio, mas momentos antes de alcançar a criatura, esta mostra as palmas de sua mão para a coruja e um pequeno jato brilhante atinge os olhos de Edwiges. A coruja perde a consciencia e continua caindo na direção da criatura, mas ela rola de lado batendo a cabeça no pé da cama, pouco antes da coruja cair no chão e seguir arrastando até embaixo da cama, onde permaneceu imóvel. A criatura se levanta, sacode a cabeça e bate com uma das mãos em uma das pequenas orelhas arredondadas. Sacode mais uma vez e olha todo o quarto, examinando-o cuidadosamente. Em seguida ela encara o guarda roupa e corre rapidamente até se chocar contra a porta. Como se não tivesse sentido nada, ela abre a porta, salta sobre o baú que Harry guarda seu material da escola, vira-se de volta para a porta e a fecha com mais um erguer de mãos. Harry vira-se em sua cama e continua a dormir...