Capítulo Vinte e Um – Nervos à flor da pele
Harry demorou alguns instantes para absorver a mensagem. Murta o olhava decidida e, pelo menos no momento, não parecia estar se preocupando em observar um Harry recém saído do banho.
- Você tá querendo dizer que...
- A Profª. Stevens está indo conversar com o Prof. Snape. – Murta falou. – Eu estive observando-a, e um fantasma amigo meu que mora nas masmorras disse que ela estava indo pra lá.
- Você tem certeza?
- Absoluta.
Harry pensou por alguns instantes. Valeria a pena sair nesse momento e se arriscar? O comportamento suspeito de Samantha lhe deu certeza que sim. Ele precisava saber o que ele tinha a ver com ela, o que ela poderia querer com ele. E talvez ouvir essa conversa ajudasse.
- Ok, Murta. Nós vamos, só vou trocar de roupa.
A fantasma observou Harry de cima a baixo com um sorriso, como se o tivesse notado agora.
- É verdade. – ela deu sua risadinha característica. – Não pode ir desse jeito...
Harry a olhou com reprovação e se desviou dela para sair do banheiro. Murta o seguiu e o observou enquanto ele tirava do malão a primeira calça e camiseta que achava. Quando Harry colocou a mão sobre o nó na toalha, ele olhou para Murta e falou:
- Vira de costas e não olha!
Ela fez um bico.
- Pensei que não fosse lembrar... – Harry ergueu as sobrancelhas. Ela se virou e tapou os olhos.
O rapaz rapidamente colocou a roupa e se sentou na cama para colocar os tênis. Depois que terminou, lembrou de pegar a Capa de Invisibilidade e o Mapa do Maroto no malão.
- Você já terminou? – Murta perguntou, ainda de olhos tapados.
- Já. – ele disse, enquanto fazia o mapa de Hogwarts aparecer no pergaminho e confirmava o que Murta havia dito; o pontinho "Samantha Stevens" estava mesmo se movendo nas masmorras. – Ninguém te viu enquanto vinha pra cá, não é?
- Não se preocupe. – ela respondeu com um sorriso. – Eu tenho meus truques para ficar bem escondida.
No mesmo instante, eles ouviram vozes vindas do corredor. Harry as reconheceu no mesmo instante; eram seus colegas de quarto.
- Então pode começar seus truques agora mesmo! – ele falou alarmado para a fantasma.
Murta sorriu e rapidamente ficou invisível. Harry não teve muito tempo para admirar a habilidade dela; em pouco tempo, ele fechou por fora a cortina do dossel da sua cama e, com uma margem de mínimos segundos antes que a porta abrisse, ele vestia sua capa e ficou invisível.
Rony, Neville, Dino e Simas entraram dois segundos depois. Eles ainda comentavam sobre a aula de Defesa Contra as Artes das Trevas. Neville parecia com tanto sono, que logo se jogou na sua cama de roupa e tudo. Dino sentou na beirada de sua cama, enquanto Simas foi para o banheiro, e Rony se aproximava da cama de Harry, que rezou para que o amigo não abrisse as cortinas. Para seu alivio, Rony apenas sentou na sua própria cama, comentando:
- Parece que o Harry já dormiu mesmo.
- Ele tava com uma cara péssima. – Dino comentou. – Sério, ele precisa descansar. Anda muito estressado! Só falta puxar a gente pelas orelhas nos treinos.
- Ele é um mandão demais quando o assunto é quadribol, não é? – Rony perguntou rindo.
- Totalmente. – Dino respondeu. – Ele se empolga.
"Ótimo, então é isso que vocês pensam de mim, não é, seus sacanas?", Harry pensou com raiva. "Vão se ver comigo no próximo treino, vão desejar nunca mais entrarem num campo de quadribol!"
Harry foi forçado a esperar até que eles se deitassem para poder sair. Enquanto eles ainda se aprontavam, ele olhava desesperado para o Mapa do Maroto por baixo da capa; Samantha já estava entrando na masmorra de Snape. Estava perdendo tempo.
Por sorte, os garotos não demoraram muito a deitar. Neville dormiu assim que caiu na cama, Simas tomou um banho rápido antes de ir para a cama, e Rony e Dino só conversaram por mais alguns minutos antes de irem dormir também. Murta se fez visível assim que percebeu que era seguro. Ela fez gestos para o nada, já que não podia ver Harry por trás da capa, indicando que deveriam sair. Harry tirou apenas o capuz e acenou para ela assentindo.
Os dois saíram sorrateiramente do quarto, e desceram para o salão comunal. Murta estava visível atrás de Harry, e ele estava apenas com a cabeça descoberta. Para a sua sorte, não havia mais ninguém no salão comunal. Quando Harry abriu a passagem da Mulher Gorda, já coberto inteiramente pela capa, ela exclamou:
- O que você está fazendo aqui, menina?
Harry se virou assustado, mas logo percebeu que não era com ele que ela falava; era com Murta, que tinha se esquecido de ficar invisível. A fantasma olhou abobada para o quadro, e gaguejou:
- Eu... bem... eu... eu estava dando uma volta.
Não havia desculpa pior, Harry tinha certeza.
- Sei. – a Mulher Gorda disse desconfiada. – Não deveria ficar passando pelas paredes para entrar nas Casas! Eu deveria contar para o diretor!
- Não, por favor! – Murta pediu juntando as mãos. – Não farei mais!
- Dessa vez deixarei passar. Mas que não se repita!
- Sim, não se preocupe! – Murta disse urgente, flutuando no sentido oposto. Harry teve que correr na ponta dos pés para alcançá-la, mas ainda ouviu a Mulher Gorda dizer às suas costas:
- Mas por que ela abriu a passagem se poderia só passar pela parede?
Harry se apressou em sair logo dali, seguindo Murta. Os corredores estavam bem escuros por onde eles passavam. Harry de vez em quando olhava por baixo da capa o seu mapa, verificando se Filch ou Madame Nor-r-ra não estavam pelo caminho, mas Murta parecia saber os locais certos por onde seguir. O problema era que, por vezes, ela esquecia que Harry não podia passar paredes e o deixava sozinho. Ele tinha que esperar até que ela se tocasse e voltasse, o que não demorava muito. Logo, eles já estavam descendo para as masmorras geladas, e Harry viu no seu mapa que os pontinhos "Samantha Stevens" e "Severo Snape" estavam juntos na masmorra do professor.
- Você ainda tá aí, não é, Harry? – Murta perguntou num sussurro.
- Estou, mas é melhor a gente não falar muito agora. Estamos perto da sala dele, não é? – ele murmurou.
- Sim. Só mais um pouco.
Um minuto depois, eles estavam em frente à horrível masmorra onde Harry tinha aula de Poções. Vozes abafadas vinham de lá de dentro, e ele se perguntou como conseguiria entender o que diziam. Como se interpretasse seus pensamentos, Murta falou num tom de voz tão baixo que Harry teve que se esforçar para poder ouvir:
- Nós vamos entrar.
- Você tá maluca?
- Quando eu abrir a porta... – ela instruiu, ignorando o comentário dele. - ...você entra antes que eles a fechem.
- Mas, Murta...
Ela rapidamente ficou invisível de novo e abriu a porta tão rápido que Harry se assustou. Ele se recompôs o mais rápido que pôde, se esgueirando depois pela porta, na ponta dos pés, para entrar na masmorra, tendo certeza de que estava cometendo uma loucura. Estava invisível, mas não imaterial. Se Snape o achasse, ele usaria o que sabia sobre a Poção Polissuco para puni-lo de maneira exemplar.
Assim que entrou, Harry viu que Snape estava sentado atrás de sua mesa, encostado na cadeira, e Samantha estava de pé, com as mãos apoiadas sobre a mesa. Harry se escondeu entre algumas carteiras, tomando o máximo de cuidado para não bater em nada. Não tinha a mínima idéia de onde Murta estava, mas sabia que ela deveria estar ali. A porta que ela tinha acabado de abrir rangia, e Samantha e Snape a olhavam intrigados.
- O que foi isso? – o mestre de Poções perguntou desconfiado, levantando-se e se aproximando da porta.
- Deve ter sido o vento. – Samantha sugeriu, parecendo um pouco impaciente. – Você vai parar de enrolar e falar comigo.
Snape a ignorou. Ele colocou a cabeça na abertura da porta e olhou por alguns instantes para o corredor. Quando voltou, parecia mais desconfiado do que nunca.
- Estranho. – ele disse, encostando a porta atrás de si. – Não está ventando. E eu tenho certeza de que encostei essa porta, e ela não abre tão facilmente, mesmo estando destrancada...
- Nós vamos ficar discutindo sobre a porta? – Samantha perguntou irritada. – Severo, eu não vim aqui para falar sobre essa idiotice com você!
- Eu realmente ainda não entendi por que você veio aqui, Stevens. Não temos nada para conversar.
- Ah, não? E que tal sobre a ameaça que você me fez outro dia?
- Ameaça? Ah, sim, agora me lembro... – ele deu alguns passos pela sala, apreciando o momento. Parecia estar se divertindo. – Está com medo de mim, Stevens? Você sempre foi tão... destemida... mesmo sendo uma sonserina...
- Sonserinos podem ser tão corajosos quanto grifinórios quando o assunto é "salvar nossa própria pele". Você sabe disso melhor do que ninguém, Severo...
Os olhos de Snape escureceram um pouco mais. Harry quase não respirava.
- Você está com medo que eu conte o que você é para Dumbledore?
- Estou sendo precavida. E você sabe muito bem que eu conheço vários segredos seus, Severo. – ele não disse nada. Ela prosseguiu. – Eu posso contar para o Harry que você era apaixonado pela mãe dele.
Harry quase engasgou, mas se controlou antes que seu pé batesse perigosamente no pé da carteira. Snape e sua mãe? Aquilo era inconcebível!
- Isso é passado. – Snape disse tenebrosamente. – O meu amor foi enterrado junto com Lílian.
Samantha riu.
- Que tocante! Severo Snape relembrando o passado...
- Eu realmente não estou acreditando que você veio na minha sala para ficar dizendo essas besteiras! – Snape disse perigosamente irritado. – Se você disser ao menos uma palavra sobre isso para o Potter, eu...
- Então estamos combinados, Severo! – ela disse alegre. – Eu não digo nada, e você também não!
Snape suspirou e a observou por alguns segundos.
- É muito perigoso o que você está fazendo, Stevens. É perigoso jogar nos dois times.
- É, mas eu sou muito mais cuidadosa que você, Severo. Nunca deixarei que me apanhem...
- Você é escorregadia como uma cobra...
- É uma habilidade minha.
- O que você vai fazer? – Snape perguntou, lançando-lhe um olhar inquisidor. Harry apurou os ouvidos. – Você tem um plano, não é? O Lord das Trevas certamente mandou...
- O Lord não manda em mim.
Foi a vez de Snape rir.
- Ah, claro... Você deve ter muitos privilégios... É você aquela serva secreta do Lord, não é? A especial...
- E se for? – ela sorriu. Harry deixou o queixo cair; ela estava praticamente confirmando que era uma Comensal da Morte?
Num segundo, Snape se adiantou até ela e segurou com força seu braço esquerdo. Ela se assustou no início, mas depois apenas ficou olhando-o em silêncio. Ainda tentou se soltar, mas era inútil; ele era muito mais forte que ela.
- O que você vai fazer?
- Apenas verificar uma coisa. – ele puxou a varinha e apontou para a altura do antebraço esquerdo dela, murmurando um feitiço. Ela respirou fundo quando o jato de luz preta a atingiu e quase gritou:
- Isso dói, seu filho da mãe!
Ele não respondeu. Ficou observando a luz no braço dela clarear, mas quando isso aconteceu, não havia nada mudado; apenas a pele dela estava avermelhada e machucada no lugar onde o feitiço a havia atingido. Snape parecia surpreso quando a soltou e se afastou.
- Isso é impossível! – ele exclamou indignado. – Você não tem a marca!
- É claro que eu não tenho a marca, seu estúpido! – ela gritou, segurando o antebraço esquerdo não escondendo uma careta de dor. – Eu não sou uma Comensal da Morte!
- Como não? Eu tinha certeza que...
É porque você é um idiota que só está querendo bancar o esperto! – ela respondeu com raiva. – Como você acha que Dumbledore me aceitaria aqui se eu fosse fiel a Voldemort?
O queixo de Snape estava no chão. O de Harry também.
- Você está blefando!
- Ache o que quiser! Dane-se o que você pensa! – ela ainda segurava o braço, parecia realmente doer.
- Mas então... – Snape parecia realmente aturdido. Harry não se lembrava de tê-lo visto dessa maneira alguma vez na vida. – Por que você está com medo que eu conte algo que você não é?
Ela gargalhou, um pouco descrente, mas parecendo ligeiramente aliviada.
- Quer dizer que era disso que você estava falando todo o tempo? Eu não acredito... Então você não sabe... Por Merlin, você nem desconfia de que...
- O quê? – ele perguntou irritado.
- Todas aquelas vezes que você espionava... eu pensei que tivesse descoberto, mas... não. Você não sabe de nada...
- Ora, sua... – ele disse entredentes, adiantando-se novamente para segurá-la pelos braços. Os seus rostos agora estavam muito próximos. – O que você está insinuando?
- Nada que você precise saber...
- VOCÊ VAI FALAR AGORA! – ele gritou, mas ela estreitou os olhos, e ele, inesperadamente, caiu para trás.
- Você não está em condições de exigir nada, Severo. – ela falou, olhando-o de cima e apontando sua varinha para ele, sentado no chão. – Eu venci.
- Eu ainda não acredito em você. – ele falou venenosamente. – Está mentindo. Sempre foi habilidosa com a mentira. Essa é apenas mais uma delas.
- Acredite no que quiser, eu não preciso mais me preocupar com você. – ela guardou a varinha. – Você saberá a verdade de qualquer maneira. Na hora certa.
Ela deu uma risadinha e foi na direção da porta, abrindo-a e saindo; o barulho dos seus saltos cessando aos poucos enquanto ela se afastava. Por alguns instantes, Harry permaneceu observando Snape, no chão, tendo uma expressão de profundo ódio no rosto. Harry imaginava como ele estaria se sentindo: humilhado. O rapaz só se deu conta de que precisava sair quando sentiu um vento gelado passar por ele. Era Murta.
Mesmo invisível Harry pôde perceber quando ela passou flutuando pela porta aberta. Harry, na ponta dos pés, a seguiu. Não desejava permanecer sozinho numa sala com um Snape soltando fogo pelas ventas. Harry saiu da sala e, enquanto andava silenciosamente pelo corredor, ele ouviu a porta bater estrondosamente apenas alguns minutos após ele ter saído da sala. Não gostava nem de imaginar o que Snape não teria feito se o descobrisse.
Harry olhou seu mapa por baixo da capa. Snape estava na masmorra, andando de um lado para outro. Samantha já estava no segundo andar, bem longe dele. Murta estava bem à sua frente, invisível.
Por muito tempo, Harry seguiu Murta pelo castelo, apenas cuidando para não perdê-la de vista, observando-a no mapa. Ele seguia pensando no que tinha descoberto. Primeiro, Snape era apaixonado por sua mãe... Ainda não acreditava nisso. Snape, que ele tanto odiava, que seu pai odiava, que Sirius odiava... era apaixonado por Lílian Potter. Era inacreditável.
Segundo: Samantha. Harry estava muito confuso a respeito dela. Ela era ou não uma Comensal da Morte? Snape também pensava como ele, e parecia tão surpreso quando viu que ela não tinha a Marca Negra... Seria possível um Comensal não possuir a marca? Ela não possuía... e disse que não era uma Comensal... Mas ela sabia mentir, e muito bem. Mas o que ela falara fazia sentido. Como Dumbledore a aceitaria em Hogwarts se soubesse que ela era uma Comensal? Mas ele poderia não saber também. Dumbledore era muito sábio, mas era humano também. Poderia errar...
Harry só percebeu que Murta o estava levando ao banheiro das garotas no primeiro andar quando se viu bem em frente a ele. O rapaz pensou por alguns instantes se deveria ou não entrar. Resolveu-se pela primeira opção. Murta o tinha ajudado, e ele precisava agradecê-la. Além disso, não haveria perigo nenhum em entrar. Estava tão tarde que Harry tinha certeza que nenhuma garota viria a esse banheiro nessa hora.
Quando ele entrou, Murta já estava visível. Ela tinha uma expressão vaga no rosto, parecendo estar procurando por Harry.
- Você ainda tá aí, Harry?
Ele tirou a capa, ficando visível. Ela o olhou aliviada, mas parecia assustada também.
- Bem... – ela parecia sem jeito. – Serviu para alguma coisa ter ido lá?
- Ainda não sei. – ele disse com sinceridade, aproximando-se do espelho. Era possível ver o reflexo de Murta o observando por ele. – Descobri muita coisa, mas... tudo isso me deixou muito confuso...
- Eu não entendi nada. – Murta suspirou. – Mas não é possível que não tenha feito nenhum sentido para você...
- Fazer, fez, mas... ah, estou muito atordoado para tentar entender...
Ele fechou os olhos, mas nenhuma idéia vinha à sua cabeça. Não conseguia saber se Samantha era ou não inocente. Ela parecia estar sendo verdadeira, mas... ela sabia mentir muito bem. Alguns diziam para não confiar nela, outros para confiar... Era demais para sua cabeça.
- De qualquer modo, Murta, obrigado. – ele falou, sem abrir os olhos. – Você me ajudou muito hoje.
Ela não respondeu. Harry abriu os olhos e arregalou-os de susto. Murta estava de costas para ele, encarando uma pessoa. Eles não estavam sozinhos.
- O que você está fazendo aqui? – uma voz feminina perguntou.
Harry se virou para encarar Katherine Willians.
Ela estava encostada na parede, os cabelos mais desajeitados do que nunca. Harry notou que, estranhamente, ela estava sem suas luvas; estas estavam seguras na sua mão esquerda. Como ela estava de braços cruzados, ele não pôde ver o que de tão misterioso haveria nas suas mãos que sempre viviam cobertas, mas ele reparou que a mão direita dela estava bastante vermelha.
- Eu é que pergunto! – Murta falou numa voz aguda. Harry teve a ligeira impressão de que a presença de Willians a incomodava. – O que você está fazendo aqui?
- Vim usar o banheiro, não posso?
- Poderia usar o do seu dormitório. – Murta disse. – Está muito tarde para um aluno estar andando pelo castelo.
No mesmo momento em que ela disse isso, Harry percebeu que ela não deveria ter falado. Willians riu.
- É tarde pra mim, mas não para o seu amiguinho, né? – ela indicou Harry com a cabeça. – E ele ainda tem mais um agravante: além de estar fora da cama a uma hora dessas, está num banheiro de garotas!
- Eu quero que você saia agora do meu banheiro! – Murta gritou com a voz tremida.
Esse banheiro não é seu! – Willians retrucou. – Você é que deveria sair! Onde já se viu uma fantasma assombrando um banheiro!
- E qual é o problema? – Harry se intrometeu. – Se o diretor não se importa, ela pode muito bem ficar!
Willians o olhou com uma expressão divertida.
- Defendendo-a, Potter? Por quê? Ela é sua nova namoradinha? – ela zombou.
No mesmo instante, Murta abriu o berreiro e começou a chorar. Ela esvoaçou pelo banheiro, indo parar direto num dos boxes, e eles ouviram um som aquoso. Harry teve certeza de que ela tinha entrado no encanamento pela privada. Ele olhou bravo para Willians.
- Eca, ela é nojenta.
- Você é idiota ou o quê, garota?
- Vai dizer que não achou isso nojento? – ela fez uma careta. Harry bufou. – Mas isso não importa. O que eu estou curiosa para saber é por que você está aqui!
- Não interessa. – Harry disse rude. – E você? O que faz aqui?
- Também não interessa. – ela disse no mesmo tom.
- Então estamos quites.
- Estamos nada! – ela sorriu maliciosamente. – Você sabe que eu posso contar a um professor que te vi num banheiro de garotas, não é?
- Você não faria isso.
- Por que não?
- Porque isso te comprometeria também. – ele disse com convicção. – Você teria que contar que estava fora da sua Casa a essa hora...
- Mas eu poderia contar ao Prof. Snape, por exemplo. – ela sorriu vitoriosa. – Ele não pediria muitas explicações.
- Você não vai fazer isso.
- Me dê um motivo.
Ele se aproximou dela e, rapidamente, segurou suas mãos com força, encostando-a na parede. As luvas negras que ela segurava caíram no chão. Ela foi pega tão de surpresa, que não teve como reagir.
- Eu não vou permitir.
Ela respirava muito rápido. Com satisfação, Harry viu que havia medo nos olhos dela. Ela olhou rapidamente para a mão direita, e Harry acompanhou seu olhar; ele não pôde ver o que havia de tão especial ali, mas notou que a mão dela estava muito vermelha, e que havia pequenos cortes e arranhões nela. Harry sentiu a mão da garota ligeiramente úmida e áspera, e um cheiro de sabonete exalava dela, como se tivessem acabado de ser lavadas.
- Me solta. – ela falou assustada. Harry sorriu.
- Me dê um motivo. – ele provocou.
- Eu vou gritar se você não me soltar. – ela se debateu, mas ele era mais forte.
- Ninguém vai te ouvir.
- Como você pode ter tanta certeza?
- Eu tenho meus métodos. – ele blefou. – Eu sei que ninguém vai te ouvir.
Ela o olhou com raiva, seus olhos faiscando. Seus lábios tremiam freneticamente. Ela respirou fundo e cuspiu no rosto dele. Harry fechou os olhos lentamente, e depois os reabriu. Se ela não fosse uma garota, ele jurava que lhe daria o que merecia. Mas ele seria superior. Harry cuspiu de volta no rosto dela.
- Se você quer jogar comigo... – ele disse. - ...vai ter que seguir as minhas regras...
Ela não disse nada e apenas o olhou com fúria. Harry tinha conseguido reverter o jogo; agora era ela que estava nas mãos dele. Literalmente.
- Vamos fazer um trato. – ele sugeriu. – Você fica quieta e eu também. Ninguém precisa saber que estivemos aqui.
- E o que você vai fazer se eu não concordar?
Harry correu rapidamente os olhos para a mão dela.
- Eu vou ver o que tem de tão especial nessa sua mão e contar pra todo mundo.
- Eu concordo. – ela disse rapidamente. Harry percebeu que aquele era o ponto fraco dela. – Agora me solta.
Ele deu uma risadinha baixa e a soltou, dando alguns passos para trás. Ela o olhou furiosa, se abaixou para recolher as luvas e rapidamente as colocou nas mãos, de um jeito que Harry não pudesse enxergar o que ela escondia.
- Você ainda vai se ver comigo, Potter. – ela ameaçou.
- Ou então você, não é? – ele provocou, rindo.
Ela lhe deu as costas e saiu batendo os pés, furiosa. Harry a acompanhou com o olhar, rindo. Depois de um tempo, vestiu novamente a Capa de Invisibilidade e tomou o caminho da torre da Grifinória. Mas não conseguiu tirar da cabeça que aquela garota o lembrava alguém...
- E aí vem o time da Grifinória! – Ernie Macmillan irradiou. – Weasley, Spencer, Cavendish, Thomas e os Creeveys, liderados pelo apanhador Potter!
Harry respirou fundo enquanto caminhava conduzindo o time. Era uma manhã ensolarada de primavera. O sol batia no seu rosto, e ele ouvia a respiração ansiosa dos seus colegas de time atrás de si.
As arquibancadas estavam lotadas. Todos os professores estavam presentes, desde o miúdo Prof. Flitwick, muito animado vestindo uma capa azul sob a qual ele quase não aparecia, até mesmo Dumbledore, que não trajava a cor de nenhum dos dois times, usando uma "discreta" veste púrpura. Porém, Harry sabia que o diretor tinha preferência pela Grifinória, já que era sua Casa de origem.
Já a Profª. McGonagall sustentava sua postura rígida por detrás de uma capa com pequenos detalhes em vermelho e dourado, o que não significava que ela fosse menos fanática por quadribol. Para o desespero de Harry, a professora fez questão de desejá-lo boa sorte antes da partida e lembrá-lo de que a taça estava com a Grifinória desde o terceiro ano de Harry, e ela realmente não gostaria de tirá-la da sua sala.
Praticamente toda a escola estava contra a Grifinória na torcida; a Corvinal, obviamente, por ser a adversária; a Lufa-lufa, que torcia contra a Casa dos leões porque esta a derrotou na última partida, e a Sonserina por motivos óbvios. Restava apenas os grifinórios torcendo pela Casa, o que era uma margem bem reduzida da população de Hogwarts.
Isso não queria dizer que eles não se esforçaram; havia diversas faixas de incentivo aos jogadores, e todos eles usavam um broche com um leão que rugia de verdade (um pequeno feiticinho feito por Hermione). Porém, nem isso parecia animar os jogadores, que estavam terrivelmente nervosos.
Harry bem que tentou deixá-los mais à vontade antes da partida, mas era bem difícil quando ele mesmo estava nervoso. Não era a primeira final de Harry, como era para os outros, mas era a primeira em que ele estava comandando o time. No ano anterior, o campeonato não chegou a terminar, e Harry não teve oportunidade de comandar a Grifinória em uma final.
O nervosismo era tanto que, excepcionalmente, Jonnathan Cavendish não provocou nem implicou com ninguém, Dênis Creevey não chegou atrasado, e Dino não deu em cima de nenhuma garota pelo caminho. Todos estavam muito nervosos, primeiro por ser uma final, e segundo por ser contra a Corvinal. Como Harry cansou de prevê-los nos treinos, eles estavam com um time realmente forte, e seria uma partida difícil.
- Capitães, apertem as mãos! – Madame Hooch ordenou.
Harry e o capitão da Corvinal, Flávio Montgomery, apertaram-se as mãos. Havia um brilho feroz no olhar do setimanista da Corvinal; Harry já tinha jogado com ele uma vez e sabia o quanto ele era fanático por quadribol. Atrás dele, Harry viu a apanhadora da Corvinal, Cho Chang. Ela sorriu para Harry, e ele retribuiu com um meio sorriso; seus maxilares estavam um tanto duros demais para que ele sorrisse direito.
Madame Hooch abriu a caixa de bolas, e os balaços saíram em disparada para o céu azul. O pomo de ouro voou logo após, esvoaçando por entre as cabeças dos jogadores. A professora de vôo apitou, e todos deram impulso nas suas vassouras, colocando-se em posição.
- E a partida começa! – Ernie irradiou, no mesmo momento em que Madame Hooch lançou a goles, e Peta e a artilheira da Corvinal se esbarraram para segurarem-na. – Spencer passa para Cavendish, que desvia brilhantemente de um balaço e dois artilheiros; ele devolve para Spencer, que passa novamente para Thomas, que está de cara com o gol. Ele lança e... erra!
A torcida da Grifinória urrou de desânimo, ao mesmo tempo em que a Sonserina, a Corvinal e a Lufa-lufa davam vivas. A cara da Profª. McGonagall era tão feia, que Harry preferiu não olhar mais naquela direção e se concentrar em procurar o pomo.
Ele viu Cho próxima às balizas de Rony, que se preparava para defender o lançamento do ataque corvinal. Cho deu uma guinada na sua vassoura, e Harry por um instante pensou que ela pudesse ter visto o pomo; ele se aproximou rapidamente, mas quando estava a alguns metros da garota, percebeu que era alarme falso. Ela percebeu que ele estava ali e sorriu.
- Já queria aproveitar a oportunidade, não é? – a chinesa perguntou.
- Uma pena que não era o pomo de verdade... – Harry lamentou. – Assim eu poderia pegá-lo pra você. – ele piscou.
- Oh, que gentileza... – ela brincou sarcástica. – Pode deixar que eu pego sozinha mesmo.
- Ah, que pena.
- Esse jogo eu não perco.
- Está tão obstinada assim? – Harry perguntou, enquanto observava pelo canto do olho, com desgosto, Rony tomando um gol.
Cho também notou o mesmo que Harry e sorriu.
- É meu último ano aqui, tem que ser fechado com chave de ouro! – ela falou, enquanto começava a voar no sentido oposto.
- Ouro é dourado! – Harry gritou, mas não tinha certeza se a garota tinha ouvido. – E dourado é uma das cores da Grifinória... – ele murmurou para si mesmo, dando um impulso na Firebolt.
Como geralmente acontecia, seu nervosismo tinha evaporado assim que Harry sentiu o vento no rosto e a maravilhosa sensação de voar. Porém, o que ele queria naquele momento era ganhar.
O placar estava em trinta a trinta; por mais que Rony estivesse se esforçando bastante, os artilheiros corvinais eram muito bons. Os da Grifinória não ficavam pra trás, e também faziam ótimos lances, fazendo com que a partida ficasse equilibrada. Harry percebeu que a maioria dos seus jogadores já estavam um pouco menos nervosos, mas alguns ainda permaneciam quase desesperados. Dino tinha errado algumas bolas a mais do que o normal, e parecia um pouco desanimado, o que preocupou Harry de certa maneira. Dino era um bom jogador, mas tinha um terrível defeito: se animava demais com os acertos, na mesma medida que se desconcentrava com os erros. Harry lhe deu algumas instruções aos gritos quando passou perto dele.
Por sua vez, o pomo parecia estar escondido em algum lugar de onde não queria sair de maneira alguma. Harry estava tendo grandes dificuldades em encontrá-lo e não era o único; Cho também o procurava sem sucesso. O placar estava em oitenta a setenta para a Grifinória quando Harry viu um brilho dourado próximo à arquibancada dos professores. Cho não tinha visto, pois estava do outro lado do campo no momento. Ele voou rapidamente até o lugar, e viu a bolinha esvoaçar próxima à cabeça da Profª. Stevens, que estava sentada ao lado de Dumbledore.
Samantha observou o pomo distanciando-se da sua cabeça e depois encarou Harry bem fundo nos olhos. Por um instante, Harry viu um brilho vermelho nos olhos azuis dela e se assustou; sua cicatriz deu uma leve e quase imperceptível ardida, e Samantha desviou os olhos do rapaz para ouvir algo que Dumbledore lhe sussurrou ao ouvido. Harry desviou a Firebolt e tentou achar o pomo novamente, mas ele já tinha sumido.
- Gol da Corvinal! – Ernie irradiou. – Weasley bem que tentou alcançar a goles, mas não havia defesa para esse lance perfeito! Oitenta a oitenta, parece que o placar está empatado novamente!
O grito de Ernie acordou Harry de seus pensamentos, e ele guiou a vassoura para o outro extremo do campo. Sentiu quando Cho começou a segui-lo de perto, mais uma vez usando sua estratégia de seguir Harry, já que sua vassoura não era páreo para a dele. Harry deu uma guinada brusca na Firebolt, e Cho seguiu para o lado contrário. Ele não gostava de ser seguido.
Passaram-se quarenta minutos de jogo, e nada do pomo aparecer. Harry estava ficando irritado; além de estar muito aborrecido consigo mesmo por não conseguir encontrar a bolinha, o placar estava muito apertado: 130 para a Grifinória contra 120 da Corvinal. Harry sabia que a diferença poderia ser maior se Dino não estivesse tão desconcentrado com seus erros, e Jonnathan parasse de ser tão fominha. Diversas vezes, Harry passou perto deles e gritou instruções, mas algumas não eram escutadas por causa da balbúrdia no estádio, e outras não eram mesmo obedecidas (isso no caso de Jonnathan).
Foi quando o placar estava empatado em 160 a 160, que Harry viu um brilho dourado um pouco acima das balizas corvinais. Sem pensar duas vezes, o rapaz deu um impulso na Firebolt, voando a toda velocidade, sem ao menos ver por onde ia; vagamente, ele percebeu que Cho o seguia alguns metros atrás. Harry se virou para vê-la, e percebeu que ela só conseguiria chegar no pomo antes dele se acontecesse um milagre. Ele se concentrou novamente no pomo e, quando estava bem próximo dele, a bolinha se desviou e tomou bruscamente o rumo do chão.
Harry xingou alto e virou a Firebolt o mais rápido que pôde, mas acabou perdendo tempo com o movimento, e Cho, que estava vindo em linha reta, conseguiu diminuir em muito sua vantagem. O rapaz impulsionou novamente a vassoura, seguindo o pomo alguns metros atrás, dando voltas e rodopios para acompanhar a bolinha, ao mesmo tempo em que sentia o vento forte no rosto balançando seus cabelos.
- Os apanhadores estão bem atrás do pomo! – Ernie gritou, no mesmo momento em que Harry e Cho passavam como foguetes próximos dele. – Chang vem bem atrás de Potter; se ele bobear, será ela que assumirá a dianteira!
Harry apertou os olhos para ver melhor a bolinha, que continuava a rodopiar sem parar à sua frente de uma maneira que deixaria qualquer um no mínimo enjoado. De tão concentrado que estava, ele não notou que um balaço se aproximava até que Dênis gritou:
- Harry, do seu lado esquerdo!
No momento em que ouviu o grito, Harry virou o rosto para o lado indicado e viu a bola negra vindo na sua direção. O batedor da Corvinal tinha acabado de rebatê-la, e nem Colin nem Dênis estavam em posição de rebatê-la novamente. Harry deitou na vassoura, fechando os olhos um segundo antes de ouvir o zunido do balaço nos seus ouvidos e sentir os seus pêlos da nuca se arrepiando.
Assim que abriu os olhos, viu e sentiu ao mesmo tempo Cho passando por ele em disparada atrás do pomo. Aproveitando que estava deitado na vassoura, ele a impulsionou até que conseguisse alcançar a garota. Assim que Harry emparelhou com Cho, ela deixou escapar:
Ah, não, você não!
- Não vai se livrar de mim apenas com um balaço! – ele respondeu ofegante. O pomo deu uma volta em torno da baliza de Rony, e Harry e Cho a contornaram.
- Não vai me vencer mais uma vez, Harry! – ela gritou com a voz aguda.
Cho deu uma fechada com sua vassoura nele, mas Harry foi mais rápido e a impediu colocando o braço à frente; os dois se encostaram, e ele sentiu o perfume adocicado dela misturado ao cheiro de suor, ao mesmo tempo em que os cabelos lisos da garota batiam no seu rosto. Incrível como alguns anos atrás ele ficaria totalmente abobado com esse simples acontecimento, mas isso não ocorria no momento; tudo o que Harry queria no momento era ganhar, e somente isso.
O pomo se inclinou um pouco na direção do chão, e os dois apanhadores o acompanharam, ainda se esbarrando. Harry ouviu um zunido, e Cho gritou assim que percebeu do quê se tratava o ruído:
- É um balaço!
Ele vinha bem na direção dos dois, e quando estava a apenas alguns poucos metros deles, Harry e Cho se desviaram, cada um para um lado, e o balaço passou direto pelo local onde os dois estavam, indo bater direto na arquibancada mais próxima, a da Sonserina.
O pomo, que estava na mesma direção do balaço, como se percebesse o perigo iminente, mudou de direção também, e Harry percebeu com desgosto que ele foi exatamente para o seu lado contrário, onde Cho estava, o que deu uma imensa vantagem à garota. Harry deu uma virada brusca na vassoura e praticamente deitou nela para fazê-la voar mais rápido. Cho estava muito mais próxima do pomo do que ele.
- Anda, anda! – Harry pediu desesperadamente à Firebolt, mesmo sabendo que era idiotice.
Faltavam poucos metros para que o pomo, e conseqüentemente Cho, batessem na parede da arquibancada. Harry não se importaria se isso acontecesse com ele também, contanto que apanhasse a bolinha. Ele finalmente estava se aproximando, quando Cho deu uma cambalhota, e impediu sua colisão com a arquibancada. Harry freou antes que batesse também e percebeu, com desespero, que o pomo não estava em lugar algum.
Com o coração batendo muito depressa, Harry se virou e viu Cho se recuperando da manobra que acabara de fazer. Milhares de pensamentos passaram pela cabeça do rapaz, enquanto ele observava a apanhadora, ao mesmo tempo em que olhava para os lados tentando ver algum sinal do pomo.
Houve um silêncio ensurdecedor no estádio, e Harry pensou que seu coração tivesse parado por um instante. Cho sorriu vitoriosa, olhando diretamente para Harry, ao mesmo tempo em que levantava o braço, mostrando uma bolinha dourada que batia as asas inutilmente entre seus dedos. Ela tinha pego o pomo.
- Cho Chang apanhou o pomo de ouro! – Ernie narrou em meio aos gritos da torcida. – A Corvinal ganha o jogo por 310 a 160, e dessa vez são as águias que levam a taça de quadribol!
Harry estava paralisado. O vento ainda acariciava seus cabelos levemente, mas ele não o sentia. Os gritos se sobrepunham uns aos outros, mas era como se ele tivesse ficado surdo naquele momento. A torcida da Grifinória era a única silenciosa no meio de toda aquela bagunça, mas ele não estava prestando atenção a isso.
Ele tinha perdido. Tinha perdido a partida e o campeonato, tinha fracassado numa das coisas com as quais mais se importava na vida, o quadribol. Não era a primeira vez que perdia uma partida, mas era a primeira vez que perdia a taça. Tinha deixado-a escapar dos seus dedos assim como fez com o pomo de ouro. Treinara tanto esse time, com tanto empenho, para perder no último instante... Ele só precisava ter apanhado aquela bolinha, como já tinha feito tantas vezes, mas não conseguira... deixara-a escapar...
Sua estupefação era tamanha, que demorou algum tempo até que desse conta de que estava fazendo papel de idiota parado no ar, flutuando. Embicou a vassoura para o chão, até pousar suavemente sobre a grama, ainda um pouco sem ação. Olhou para os jogadores da Corvinal, que comemoravam felizes, levantando o capitão, Flávio Montgomery, no ar. Ele estaria nesse mesmo lugar se não tivesse fracassado...
- Harry... – alguém chamou, e o rapaz sentiu uma mão no seu ombro. Quando levantou os olhos, viu Rony, pingando de suor como ele mesmo também estava, com uma expressão desanimada no rosto.
- Nós perdemos... – Harry murmurou. – Eu perdi. Não consegui apanhar o pomo... não sei por quê... Eu sinto muito, Rony...
- Que isso, cara... – o amigo disse lentamente. – Eu também deixei muitas bolas passarem... Você não tem que ficar se culpando... – Rony respirou fundo, parecia tão chateado quanto Harry. – Acontece...
- Mas não podia ter acontecido! – Harry disse desesperado. – Eu não podia ter deixado que acontecesse! Com que cara eu vou encarar todo mundo? A Profª. McGonagall, o pessoal da Grifinória... o time!
- Com a mesma cara de sempre! – Rony falou. – Olha, nós podemos errar às vezes, não é? Você também pode errar, Harry!
O rapaz virou o rosto, e seu olhar correu até a arquibancada mais alta, onde estavam reunidos o time da Corvinal, o Prof. Flitwick, com um sorriso imenso, a Profª. McGonagall, com uma cara muito feia, e Dumbledore, que... passava a taça para as mãos do capitão da Corvinal. Quando ele ia levantá-la, Rony deu um empurrão em Harry.
- Vamos, cara, não é legal ver isso.
- Mas...
- Vamos entrar, o time todo já tá no vestiário! – Rony falou, enquanto empurrava o amigo para longe dali.
Harry desistiu de resistir, e acabou deixando-se levar pelo amigo, tentando não prestar atenção às palavras de Dumbledore saudando a Corvinal pela vitória, nem aos gritos entusiasmados dos alunos. Vagamente percebeu que tinha entrado no vestiário, e que Rony tinha encostado a porta, abafando o som que vinha do campo. Porém, ainda havia barulho: gritos enchiam o vestiário e, ao levantar os olhos, Harry percebeu de quem eram.
- Ah, não... – suspirou Rony, tendo a mesma visão que Harry.
Os jogadores estavam espalhados pelo vestiário, cada um de um jeito diferente, mas todos expressando a decepção da derrota. Dênis estava encolhido num canto distante, encostado na parede, mirando o chão enquanto fazia desenhos imaginários com o dedo indicador no piso; Dino tinha sentado no alto de um armário, e encarava a parede oposta como se não a visse; Colin estava sentado próximo à Peta, que estava de pé, muito vermelha, discutindo com ninguém menos que Jonnathan, que andava de um lado para outro.
Eu não acredito que perdemos um jogo fácil como esse! – Jonnathan gritava exaltado; seu rosto estava vermelho, de exaustão ou de raiva, era difícil precisar. – Nós estávamos com o jogo na mão!
- Na mão uma vírgula! – Peta exclamou. O cabelo dela estava totalmente grudado no rosto avermelhado. – O jogo estava empatado, qualquer um poderia vencer naquele momento!
- Claro, também ele não acertava uma goles no gol! – ele acusou, apontando Dino, que olhou desanimado para Jonnathan, mas não respondeu.
- Ele acertou sim que eu vi. – Colin se intrometeu.
- Ah, então é por isso que tinha tanto balaço me atrapalhando! – Jonnathan exclamou. – Você tava assistindo ao jogo ao invés de prestar atenção aos balaços!
- Calma aê, Jonh, eu posso não ser o melhor rebatedor de Hogwarts, mas faço bem o meu trabalho! – Colin falou ligeiramente exaltado, enquanto se levantava.
- Ah, essa é boa! – o artilheiro disse com um riso sarcástico. Harry fechou os punhos sem notar; aquele garoto estava passando dos limites. – Ninguém fez nada direito nesse time! Weasley deixou passar todas as...
- WEASLEY O QUÊ? – Rony avançou dois passos e gritou, suas orelhas perigosamente vermelhas. – Repita o que disse se for homem!
Jonnathan olhou com desprezo para Rony, e observou mais atrás que Harry também estava presente. Colin e Peta se surpreenderam ao ver que os dois já tinham chegado, enquanto Dênis parecia nem estar notando o que estava acontecendo, e Dino reparado bem vagamente.
- Eu repito sim! – Jonnathan falou em desafio. – Você deixou um monte de bolas entrarem, como fez no jogo passado também!
Rony tinha aberto a boca para retrucar, quando uma voz forçosamente controlada se sobrepôs à dele:
- Quem é você para dizer quem acertou e quem errou nesse jogo, Cavendish?
Todos olharam para Harry quando ele disse essa frase, até mesmo Dênis, que estava absorto no canto oposto do vestiário. Dino se ajeitou sobre o armário, e começou a realmente prestar atenção.
- Eu sou o único que enxerga os defeitos desse time. – Jonnathan respondeu no mesmo tom de Harry, desafiando-o.
- Ah, é mesmo? – Harry falou, enquanto caminhava lentamente até ficar a poucos metros do artilheiro. – Só que isso não te dá o direito de ficar apontando o dedo para os outros acusando seus erros! Se alguém poderia indicar o que deve ou não ser mudado, esse alguém seria o capitão, coisa que você não é!
Jonnathan riu.
- E você se acha um ótimo capitão, não é, Potter? Pois o único lugar aonde conseguiu nos levar foi ao segundo, à derrota! Pra começar, quem foi o maior culpado aqui foi você, que perdeu o pomo de ouro bem no meio suas fuças!
Harry não disse nada por alguns instantes. Fechou os olhos lentamente, e respirou fundo. Ele estava certo, afinal. Tinha errado, tinha perdido... fracassado... mas ao mesmo tempo não deixaria aquele moleque arrogante dizer o que ele tinha ou não que fazer. Abriu os olhos, e encarou firmemente Jonnathan:
- Eu errei sim. – era muito difícil dizer isso, mas Harry permaneceu firme. – Eu não consegui pegar o pomo, mas eu não perdi sozinho. Todos nós perdemos, juntos, como teríamos ganho juntos também. Somos um time, e ninguém ganha ou perde sozinho aqui. Tudo o que fazemos aqui é em equipe; um depende do outro. Eu posso ser o capitão, posso ser o apanhador e ter a responsabilidade de terminar o jogo, mas não jogo sozinho. Todos nós jogamos juntos, ganhamos juntos e perdemos juntos. Se você não entender isso, não pode mais continuar jogando.
O silêncio se sobrepôs às palavras de Harry, interrompido somente por um curto acesso de tosse por parte de Dênis. Jonnathan abriu e fechou a boca várias vezes, antes de decidir o que dizer.
- Você está me expulsando do time? – ele perguntou lentamente.
- De maneira alguma. – Harry disse calmamente. – Apesar de você ser chato, metido, arrogante e implicante, ainda assim é um bom jogador, e eu não quero que você saia do time. Só estou tentando lhe explicar o que aconteceu hoje, porque parece que você não tem maturidade suficiente para entender. Nós perdemos e teremos que aceitar isso. Não vou dizer que não será difícil. Será tão difícil para qualquer um de vocês quanto será para mim, mas teremos que aceitar... – Harry respirou fundo. – Eu perdi o pomo e peço desculpas a todos vocês pelo meu erro.
- Você não tem que pedir desculpas. – Rony falou. – Você pode errar tanto quanto qualquer um aqui!
- Mas eu quero pedir desculpas! Eu devo isso a vocês.
- Se for assim, todos nós devemos também. – Peta interveio. – Não teve nenhuma pessoa aqui que não tenha errado! – ela olhou diretamente para Jonnathan, que, incrivelmente, parecia envergonhado. – Nenhuma!
- Eu realmente gostaria de ter ganho esse jogo, mas... temos que admitir que a Corvinal jogou muito bem mesmo. – Colin falou.
- Nós também jogamos bem. – Harry disse, um pouco mais aliviado por eles finalmente estarem entendendo. Ainda estava bastante desanimado, e era difícil admitir essas coisas, mas ele estava tentando. – Não cedemos facilmente, nós lutamos como grifinórios, e era isso que eu esperava de vocês. Só estamos reunidos há um ano, e já fizemos bastante! É claro que eu queria muito vencer também...
- Mas algum lado tinha que perder, no final das contas... – Rony suspirou, enquanto se sentava num dos bancos.
- E ainda temos o ano que vem, não é? – Dênis disse corajosamente, levantando e tentando não se intimidar por estar no meio de todos aqueles outros jogadores mais velhos que ele. – Quer dizer, temos mais um ano juntos para tentarmos ser campeões!
- Eu concordo! – Peta piscou para o menino, que sorriu encabulado. Colin sorriu ao ver isso e lançou um olhar carinhoso à Peta.
Eles ouviram um grande estrondo. Jonnathan tinha acabado de se sentar barulhentamente no banco, cruzando os braços, emburrado. Harry estreitou os olhos na direção do garoto, e finalmente entendeu qual era o problema dele.
Você nunca vai chegar a capitão se continuar com essa atitude, Cavendish.
Jonnathan olhou para Harry assustado, enquanto os outros lhe lançavam olhares de curiosidade.
- Como?
- Não adianta fingir. – Harry falou. – Eu sei muito bem que o que você quer é tomar o meu lugar, mas nunca vai conseguir agindo assim. Você não tem a mínima maturidade para comandar um time.
- Quem disse que é isso mesmo que eu quero? – ele perguntou aborrecido.
- Eu estou dizendo. Dá para notar. Mas, ao mesmo tempo, sinto lhe informar que eu não vou permitir que você tome o meu lugar. Eu me esforcei muito para estar onde estou, e realmente vou me esforçar mais para não perder isso. Eu quero sair de Hogwarts como capitão do time de quadribol. Mas se você ainda quiser ser capitão depois que eu sair, vai ter que mudar muito. Precisará se esforçar sempre mais, e crescer mais um pouco. Se isso não acontecer, você sempre será só esse moleque emburrado.
- Quem você pensa que é para me dizer essas coisas? – Jonnathan perguntou ofendido, levantando-se.
Harry deu de ombros.
- Só estou tentando fazer um favor a mim mesmo. Vai ser complicado agüentar mais um desses seus ataques histéricos. – Peta abafou uma risadinha.
- E vai ser complicado agüentar mais uma dessas suas lições de moral... – Jonnathan respondeu com sarcasmo.
- Se não estiver contente, pode ir embora.
- Está me expulsando novamente?
- Não quero que ninguém permaneça aqui contra sua vontade, só isso. – Harry respondeu tranqüilamente. Dino o olhou de um jeito esquisito. – Eu o escolhi para ser artilheiro porque achei que era bom para a posição, mesmo que desde o início eu não tenha ido com a sua cara. Estou disposto a suportá-lo, se você continuar jogando bem e, é claro, parar de ser tão fominha.
Jonnathan estava boquiaberto.
- Eu... eu vou ficar, mas só porque eu gosto de jogar. E saiba, Potter, que também não fui com a sua cara desde o início...
- Como se conseguisse ir com a cara de alguém... – Rony comentou com sarcasmo. Jonnathan cerrou os dentes, mas não respondeu, e continuou a se dirigir a Harry:
- E saiba que você também é tão chato, metido, arrogante e implicante quanto eu. Não vou ser bonzinho com você.
Harry deu de ombros. Jonnathan bufou e começou a se encaminhar para a saída, batendo os pés. Ele abriu a porta e saiu, mas não antes de lançar um olhar mortal para Harry, que não se importou.
Passaram-se alguns minutos um pouco constrangedores em que ninguém disse nada, até que Peta exclamou do nada:
- Preciso de um banho! Urgentemente! Até mais!
E ela saiu apressada do vestiário. Colin fez menção de segui-la, mas desistiu. Dênis se aproximou do irmão, rindo da cara abobada dele, e o arrastou para fora, deixando Harry, Rony e Dino sozinhos. Harry suspirou longamente, e caminhou até Rony, sentando-se ao seu lado. Os dois olharam Dino, que não tinha dito nada desde o começo, e os encarava pensativo.
- Ficou mudo, é? – Rony brincou.
Dino fez um gesto negativo com a cabeça, e perguntou:
- Eu posso te pedir uma coisa, Harry?
- Claro. – o rapaz respondeu um pouco confuso.
Dino desceu do armário com estrondo, para depois se sentar no banco de frente a Harry e Rony. Ele olhou sério para Harry antes de dizer:
- Eu quero sair do time.
- O quê?
- Você não tá falando sério. – Rony falou.
- É muito sério. – Dino retrucou, suspirando. – Eu não sirvo para isso. Tô saltando fora.
- Mas por quê? – Harry perguntou. – Foi por causa da... derrota de hoje?
- Não, claro que não! Mas é só que... bem, é muita responsabilidade pra mim. Eu posso jogar mais ou menos, mas...
- Você joga legal. – Rony incentivou.
- Valeu. – Dino disse sem jeito. – Mas eu não tenho tanto talento assim para ficar no time. Vocês foram muito legais comigo, você principalmente, Harry, que me deu essa chance. Foi legal, mas pra mim não dá mais. É muito difícil.
Harry e Rony se entreolharam.
- Se você quer mesmo assim... – Harry falou. – Você que sabe.
- Além disso... – Dino se levantou. – Eu só tô substituindo a Gina mesmo... E ela vai voltar, não ?
Imediatamente, o clima ficou pesado. Rony abaixou os olhos, e Harry ficou sem saber o que dizer. Dino estava claramente arrependido de ter dito o que dissera.
- É... o que todos nós queremos. – Harry balbuciou.
- Vai acontecer. – Dino gaguejou. – Eu vou indo, então. Até.
E ele saiu pela mesma porta que os outros saíram. Harry suspirou desanimado e esperou alguns minutos até dizer algo novamente.
- Mas que dia... o que mais falta acontecer?
Rony o olhou de esguelha, e depois abaixou os olhos para o chão, voltando a olhar para o amigo em seguida.
- Harry, posso te pedir uma coisa?
- Contanto que não seja pra sair do time também...
- Não, é só que... – Rony apontou algo no chão. – Você tá pisando na minha vassoura. As cerdas vão ficar todas amassadas.
Harry olhou para o chão e viu que seu pé estava posicionado estrategicamente sobre as cerdas da vassoura de Rony, que estava no chão.
- Opa, foi mal. – ele disse rapidamente, levantando e sentando no banco da frente, onde seus pés ficassem bem longe da vassoura do amigo.
Rony suspirou.
- Tudo bem... – ele se espalhou no banco. – Eu queria ter uma cerveja amanteigada agora.
- Pra quê?
- Pra me embebedar.
- Cerveja amanteigada não embebeda ninguém, Rony. Tirando elfos domésticos.
- Assim você parece a Mione, sabia?
- Alguém mencionou o meu nome? – uma voz feminina perguntou.
Harry e Rony direcionaram suas cabeças até o lugar de onde vinha a voz, e viram Hermione encostada no batente da porta. Ainda havia um broche preso na blusa dela, e o leão rugia fracamente.
- O que você tá fazendo aqui? – Rony perguntou.
- Estava procurando vocês dois. – ela respondeu, desencostando da porta e caminhando até se sentar ao lado de Rony. Hermione chegou próxima ao namorado para beijá-lo, fez uma careta, desistiu e se afastou.
- Por que não? – ele perguntou decepcionado.
- Você tá fedendo a suor. – ela disse, enquanto abanava o ar próximo ao nariz. Harry riu suavemente.
- E então? Como estão as coisas lá fora?
- Tá perguntando sobre a festa ou sobre o velório, Harry?
- Os dois.
- Os corvinais não cabem em si de felicidade. – Hermione disse, contando nos dedos. – Os lufa-lufas já foram para a sua Casa, não têm o que comemorar, já que ficaram em último. Nem preciso dizer o quanto os sonserinos estão felizes, portanto, preparem-se. E os grifinórios... bem, estão todos muito chateados, mas não se preocupem, pois nenhum jogador vai ser linchado só porque o time perdeu. Vocês jogaram bem.
- O boletim de notícias "Hermione Granger" informa. – Rony completou em tom de brincadeira. – Assim você parece a Peta, Mione.
- Nem pensar, eu não sou fofoqueira!
- Eu tô brincando... – Rony sorriu, enquanto tentava beijar a garota, que se afastou, enojada.
- Só depois de um bom banho, Sr. Weasley!
- Saco! – ele cruzou os braços.
- Então... – Hermione juntou as mãos, levantando. – Por que vocês dois não me fazem o favor de irem mesmo tomar um banho? O cheirinho tá piorando cada vez mais!
- Tomar banho, tomar banho... Puxa, Mione, isso já é uma obsessão! – Rony falou.
- Só estou tentando ajudar vocês! Não sei como agüentam ficar assim, eca!
- Ah, tá bom, você ganhou... – Rony se levantou. – Vamos, Harry, ninguém vai ver se você for tomar banho no banheiro dos monitores também! Lá é ótimo!
- Eu sei que é. – Harry respondeu. – Tomei banho lá antes mesmo de vocês dois se tornarem monitores!
- Mas quebrou as regras! – Hermione repreendeu. Rony a olhou como se ela tivesse três cabeças.
- Mas eu não vou não. – Harry falou. – Vou ficar mais um pouco aqui.
- Ah, sem essa, Harry, vai ficar curtindo uma fossa aqui, é?
- Rony!
- Tudo bem... – Harry riu. – Eu vou ficar.
Hermione e Rony se entreolharam.
- Ok, faça bom proveito da sua fossa! – Rony deu de ombros. – Eu vou tomar meu banho, e se você quiser me acompanhar, Mione...
Dava para fritar um ovo no rosto de Hermione de tão vermelho que ele ficou.
- Seu idiota! – ela gritou, empurrando o namorado, e os dois saíram se batendo do vestiário, deixando Harry completamente sozinho.
O silêncio reinava no lugar. Parecia que até lá fora, no campo, não havia mais barulho. Harry tirou suas luvas e as botas, e saiu do vestiário até entrar no campo, que no momento, estava completamente vazio. Seus pés tocaram a grama fria, e ele caminhou até o centro do campo, onde se sentou. Já era quase noite.
Harry se deitou na grama, sob as estrelas que começavam a aparecer no céu, tentando limpar sua mente, deixando para se preocupar com coisas como quadribol, exames, Gina, Samantha Stevens e Voldemort mais tarde. Ele fechou os olhos e cochilou, sem saber que, em uma arquibancada muito distante, uma mulher o observava, dividida entre seu dever e seu coração.
