Capítulo um
Novamente, uma força, que não conseguia controlar, que tomava conta do seu corpo e mente, havia lhe levado a um lugar desconhecido. Mas desta vez havia despertado antes, não como das outras vezes: que acordava em sua cama com a sensação de que havia saído dela. Desta vez tinha certeza de que estava mesmo fora: o local era escuro como o dormitório, mas o frio era insuportável.
Apoiou a mão no chão e se levantou, mesmo estando com medo, mesmo querendo não andar. Deu dois passos e com a pouca claridade do local, conseguiu distinguir as paredes e rodeou-as com os olhos. Voltou-se ao local onde estava deitada e viu que estivera aos pés de uma estátua. Ergueu os olhos lentamente, pegando cada detalhe macabro da pedra esculpida. Seu coração batia cada vez mais rápido à medida que se aproximava do rosto. Quando chegou a ele, não agüentou e soltou um grito de pavor. Cada contorno que dava forma ao semblante era assustador e incrivelmente real, apesar de ser feito, visivelmente, de uma pedra de aparência fria e coberta de musgo.
Sua boca ainda se mantinha aberta e seu corpo inteiro parecia estar amarrado a fios suspensos, como um fantoche. Uma voz fria e sem nenhuma entonação de sentimento chegou aos seus ouvidos, fazendo com que sua cabeça começasse a doer. Seu corpo queria tremer de medo, mas não o conseguia. Apenas respirar lhe parecia ser permitido. E isso já era um alívio.
- Acordou, menina Virgínia... Vejo que aprecia a estátua do poderoso Slytherin. Pelo que me contou, serei tão ou mais grande que ele futuramente, e isto é realmente espantoso até para meus mais ambiciosos objetivos!
- Tom? – ela perguntou, meio incerta. Já havia escutado aquela voz em seus sonhos, ou melhor, em seus pesadelos. Lembrava-se de um jovem de cabelos muito negros, olhos penetrantes e frios e voz suave como aquela, mas totalmente carregada de autoritarismo. Este jovem lhe sussurrava ordens, coisas que ela não sabia o que eram, mas que de uma forma ou de outra, sempre a levavam a fazer ligações com a cor vermelha. "Vermelho sangue..." ela pensou, e isso lhe dava medo; porque era exatamente a cor da pixação na parede, a cor dos galos mortos, a cor do seu pijama quando acordava assustada...
Não sabia como relacionara a voz sombria com o jovem que se chamava Tom no seu diário. Aquele Tom era simpático, amigo, ajudava-lhe a agüentar os pesadelos; não podia ser dono de uma voz tão horripilante... "Sua caligrafia era tão suave.. Suave como esta voz...." pensou. Mas aquilo não lhe convenceu. Sabia haver algo entre aquele atencioso jovem do diário e a voz maligna que dizia ser igual a Slytherin. E isso a fazia chorar.
- Tom? – ele repetiu – Nome trouxa inútil, vulgar... Tom Servoleo Riddle, sobrenome trouxa! Um descendente de Slytherin – um dos fundadores de Hogwarts – não pode ter um nome desses, não pode suportar mais essas raízes trouxas!
- O quê? – ela perguntou. Sentia-se tonta, fraca. Queria deitar-se no chão, descansar, mesmo que a pedra fosse fria e áspera contra sua camisola fina. Mas seus movimentos não lhe eram direitos, ela não conseguia sequer piscar os olhos... – Você é mesmo Tom? – sussurrou – O que há de mau em ser Tom? O que há de bom em ser Slytherin?
- Não, eu não sou mais Tom. Sou aquele que todos temerão, que conquistará poder e respeito entre os que souberem entender os mais fortes e desprezar os mais fracos! Tom S. Riddle aos poucos vai sumindo, assim como sua vida, menina. E novamente Lord Voldemort ressurge!
O tom alto, e espantosamente tenebroso de sua voz, fez os ouvidos de Gina fraquejarem com a pressão do som. O pavor que sentiu dentro de si ao ouvir o nome "Voldemort" foi tão grande que suas cordas vocais entoaram o grito mais alto e apavorado que já dera na vida. Com isso, as cordas que pareciam lhe sustentar, soltaram-se uma a uma, e logo após o grito, seu corpo estava caído no chão.
Agradeceu mentalmente por ter controle de seus braços novamente, e tampou os ouvidos para que não escutasse mais nenhuma palavra, nenhuma entonação daquela voz que lhe gelava o sangue. Pensou em cantar, como fazia quando era pequena e não queria ouvir Rony ou os gêmeos lhe provocando, mas não conseguia se lembrar de nenhuma música. A certeza de que nada disso adiantaria a fazia desistir da idéia: podia jurar que ele poderia entrar em sua mente e com isso, de nada adiantaria seus ouvidos estarem tampados.
- Não, não, não! – ela gritou – Tom é meu amigo! Você não é Tom! – sabia que não adiantaria gritar negações sem sentido, mas algo lhe dizia que se tivesse certeza de que aquele de voz macabra não era o jovem do diário, o Tom verdadeiro viria lhe salvar. Sempre lhe ajudara, não é?! Não poderia ser naquela hora que iria falhar...
- Eu sei... A dor da decepção é um punhal cravado no peito a furar qualquer sentimento de esperança. Já senti isso, já ousei ter fé nas pessoas... Mas elas sempre nos enganam, nos decepcionam e nos traem, sem nenhuma hesitação! Se você fosse viver, jovem Virgínia, dar-lhe-ia um conselho mais que precioso: feche-se aos sentimentos fracos: amor, esperança, amizade, compaixão... Basta almejar, ter ganância... Com estes, você não precisa de outrem, você não sofre. Mas sinta-se privilegiada: você não irá sofrer mais desilusões... Irá morrer...
Gina começou a chorar. Sabia que parte do que ele dizia estava certo: se ela não tivesse esperanças de uma salvação, não ressentiria tanto se não conseguisse se salvar. Apenas aceitaria morrer. Mas seu coração acelerado e suas lágrimas quentes caindo insistentemente lhe mostravam que aquelas palavras não surtiam efeito e que dentro de si ainda tinha esperança de sair viva dali, mesmo que não parecesse existir alternativas...
Seus soluços ecoavam pelas paredes, soando de volta em seus ouvidos. Aquilo fazia com que a dor em sua cabeça aumentasse e aumentasse. Queria parar de chorar, levantar-se e encarar aquele que a havia enganado. Desejava ter forças suficientes para lhe dizer que uma pessoa sem perspectivas não podia viver; pois sem esperanças, sem sonhos, não haveria uma batalha, não haveria uma razão para enfrentar as dificuldades, não haveria motivos para buscar a felicidade.
Mas suas pernas tremiam e suas lágrimas aumentavam com os soluços e não conseguia tirar forças de nenhum lugar para lutar contra as palavras pessimistas. Sentia que a cada segundo perdia sua energia, sua vida; mas desejava falar, dizer que não desistiria.
- Por que, Tom? – ela disse – Por que se tornar um ser temido, um tirano sangüinário? Vale a pena dar as pessoas o sofrimento que você teve? Terá algum proveito passando as pessoas experiências que não são boas? - sua voz saia abafada e chorosa, como uma súplica.
- Mais cedo ou mais tarde, elas descobriram esse lado obscuro e doloroso de se viver. Apenas dou a chance para que eles vejam isso e aceitem que não há um modo de amar sem odiar. Os que conseguem enxergar isso facilmente, tornar-se-ão meus seguidores, como você já disse que há, neste presente, muitos deles.
- Eu não disse que eles serão seus seguidores! – ela sussurrou – Disse que serão seguidores de... Você-sabe-quem...
A voz medonha saiu numa gargalhada irônica, que denotava orgulho.
- Vocês irão temer apenas me nomear! Tolos e fracos...
Gina apertou mais as mãos contra os ouvidos. Queria diminuir a dor que latejava dentro da cabeça a cada palavra que ouvia de Tom. Mas ao mesmo tempo queria provar que não era o que ele determinava. Poderia lutar.
- Eu... eu não sou fraca. – sua voz não transmitia nenhuma certeza de força dentro de si. Mesmo querendo provar que esse julgamento estava errado, ainda soava como um apelo de uma garotinha chorona, irmã mais nova de seis garotos, apaixonada pelo herói do colégio.
- Até quando você acha que poderá não ser fraca? Acredita que agüentaria a tudo, que não fraquejaria nos momentos mais dolorosos e sem escapatórias?
- Não, não acredito que não possa fraquejar. Mas eu sei que continuarei lutando, mesmo que perca; continuarei persistindo para manter minha vida. Conscientemente ou não.
Desta vez a firmeza da voz de Gina pôde passar alguma credibilidade e Tom percebeu que ela não desistiria facilmente. Sabia, pelo que a garota compartilhara ao longo do ano, que certamente seria contra ele, mas estava em dúvida se realmente poderia chamar de fraca uma pessoa persistente. "São tolos em suas escolhas, são fracos em seu poder. Mas são fortes em sua determinação, e este é o problema..." pensou, lembrando-se que, em seu futuro, fora derrotado pela determinação (e amor) de uma mãe em salvar o filho.
- Posso crer em sua perseverança, minha cara, mas desta vez não. Sua vida depende da minha vida, e eu não irei perder esta luta de nenhuma maneira.
Gina permaneceu em silêncio. Sabia que Tom estava certo. Sentia a cada segundo como se uma fagulha de sua vida fosse fugindo de seu corpo, e sentia cada vez menos suas forças vitais. Iria morrer, se dependesse realmente dela lutar contra Tom Riddle, iria morrer. Acabara de dizer que não abandonaria nenhuma chance de sobrevivência, que não deixaria de buscar a salvação; mas não existiam caminhos alternativos... Porém, sabia que se lhe aparecesse apenas uma chance de vitória, agarrá-la-ia com toda sua determinação. Bastava esperar, esperar uma chance...
Então Tom se aproximou devagar, vendo os cabelos ruivos balançarem decompostos a cada soluço solto. Levantou sua mão, erguendo a manga da sua veste, e levemente, quase que com doçura, tocou o ombro esquerdo da jovem.
Gina sentiu um ar gelado envolver-se ao seu redor e antes que pudesse supor a origem da baixa temperatura, sentiu-a concentrar-se em seu ombro, com um leve toque. Era com se finíssimas agulhas, de pontas afiadas, penetrassem sobre o tecido fino de sua camisola e a furassem como brasões quentes, derretendo sua pele. Sentia suas veias serem rompidas e seu sangue se espalhar numa pequena hemorragia. Estranhamente, o sangue vazando era frio como neve, mas lhe queimava como a chama de um dragão.
Queria gritar ou até se mexer para que a dor parasse, ou ao menos se extinguisse. Mas novamente seus movimentos pareciam estar paralisados: seus músculos não se contraíam, suas cordas vocais não soavam nenhum som e acreditava que nem mesmo seu coração estivesse bombeando sangue. Era como se por alguns segundos estivesse morta, sem nenhum sinal vital... Apenas parecia que o sangue continuava a sair pelos furos diminutos em suas veias e que a sensação de tê-lo espalhado em locais impróprios, como se queimasse por dentro, era indescritivelmente insuportável.
Ouviu, a suas costas, a voz desprovida de sentimentos de Tom, pronunciando palavras que não faziam sentido a ela. Mas afinal, o que fazia sentido naquele momento?
Uma lágrima solitária escorreu por seu rosto, e ela percebeu que sua sensibilidade ainda funcionava, transmitindo dor tanto quanto suas glândulas lacrimogêneas funcionavam. E no instante seguinte, uma forte pressão em seu peito a fez perceber sua falta de ar e ela se sentiu sufocar-se, ao mesmo tempo em que sentia cada órgão voltando a exercer suas ações normais. Novamente a sensação de que tinha morrido e em seguida retornado a vida.
A pequena hemorragia que começava a se formar em seu ombro pareceu nunca ter existido e toda dor e agonia que ela lhe causara, aos poucos iam sumindo, numa sensação de alívio para Gina; porém, deixando a região dormente por algum tempo. Antes que a dor se extingue por completo, sentiu algo sendo traçado em sua pele, como uma pena desenhando algo que ela não conseguia distinguir, mesmo acompanhando os traçados; estava distraída demais para isso.
- Esta é uma pequena lembrança minha, frágil menina. Um primeiro teste de um feitiço que venho treinando há algum tempo e que usarei em muitos, aliás, que meu eu futuro já usou em muitos... Sempre que sentir dor, decepções ou medos, lembrará de mim. Pena que isso não irá acontecer nas próximas horas, pois mais tardar, não restará nenhum sentimento para se sentir, nenhuma lembrança para se recordar, nenhum vislumbre de vida para ser aproveitado... Você estará entre os que já não sofrem, e irá me agradecer por isso, pois daqui em diante, os anos ficarão cada vez mais negros...
A consciência sádica de Tom deixava Gina enojada. Como poderia ser grata a alguém que lhe fez cometer coisas cruéis e depois lhe mataria? Apenas uma mente desumana - que agora, ela compreendia ser o caso dele - poderia esperar algum tipo de gratidão por assassinato.
Mas uma coisa a fez esquecer das divagações pós-morte: seus movimentos locomotores tinham voltado. Resolveu, antes que ficasse paralisada novamente, fazer o que estava desejando desde que ouvia a voz lhe tirando a vida: olhar para trás, encarar Tom. Ver se aquele que aparecia em seus sonhos era Tom Riddle mesmo.
Os cabelos negros e muito brilhantes – mesmo que a sua imagem ainda fosse fosca – estavam caprichosamente penteados para o lado, mostrando um lado detalhista do jovem. Os olhos continham um brilho imenso, mas as intenções por detrás do também negros não eram legíveis e por isso, tão belos, tão puros. E apesar de parecer um borrão, eram visíveis os contornos suaves do rosto jovem e muito belo. Este era Tom S. Riddle aos olhos de Gina, tanto naquele momento na câmara, como em seus pesadelos.
Mas sentia uma total incredulidade. Aquele rosto perfeito e determinado, com olhos brilhantes e encantadores, que formavam um conjunto que se podia dizer angelical, não poderia ser dotado de uma voz maligna e controladora, não podia pertencer ao homem que futuramente traria muitas trevas para o mundo mágico.
Já havia visto como era bela a face de Tom em seus sonhos; mas não houvera chance de notar a tamanha pureza que ela passava, numa irônica controvérsia com seu caráter: seu rosto doce e belo mostrava o oposto de sua alma fria e calculista.
Então ele deu um sorriso a meio fio, assim que a viu o encarando, surpresa. Não era uma expressão que denotava alegria, mas sim, satisfação, arrogância. Ela tinha certeza de que ele sabia exatamente o que Gina achara de seu rosto, e acreditava que muitas coisas foram conquistadas por não transparecer nenhuma de suas intenções reais naquela face, em seus olhos.
- Futuramente, sua pele não será tão alva e saudável, seus olhos não serão mais redondos e brilhantes e seus contornos faciais não terão mais uma forma tão humana... – Gina murmurou – Rony me contou o que Harry viu quando o encontrou ano passado. Esta sua imagem é a versão distorcida de sua personalidade... Quando seu futuro perdera parte de sua humanidade, trouxe à tona o espelho de seu ser, e sua alma foi refletida em seu rosto, Tom: somente seus sentimentos impuros e sem altruísmo, todos usando o ódio de base.
- A aparência não revela nada de um ser, jovem. Não se engane com as belezas e feiúras ao seu redor, apenas observe suas atitudes e elas lhe dirão o que realmente está dentro de um ser. Aparências não são importantes. Até mesmo podemos nos enganar com algumas atitudes falsas, de certas pessoas...
Tom movimentou-se para se aproximar de Gina, mas ela se afastou rapidamente, com a ajuda de seus braços, até tocar suas costas na estátua do imponente Slytherin. Estava com medo de estar perto daquela estátua, mas era preferível estar ao lado dela do que ser tocada novamente por Tom. A dor já não existia mais, mas a lembrança do sangue lhe queimando o ombro, mesmo frio como neve, não lhe era agradável.
- Eu posso estar morta, mas sei que sendo jovem ou velho, Tom ou... – ela respirou fundo, tomando fôlego – Vold... Voldem... ou sendo seu eu futuro, – disse rápido, não conseguindo repetir o nome adotado – sempre haverá alguém determinado a terminar com suas trevas. Isso são minhas esperanças e eu tenho fé nelas, sofra ou não. – falou, as lágrimas escorrendo rápidas e espessas pelo rosto, enquanto o observava se aproximar.
- Agüentei-a falar por um ano inteiro, agora é hora de se calar... – ele disse, tocando-a nos lábios – fechar os olhos e... – disse, tocando seus olhos – dormir eternamente. – terminou, enquanto via o corpo da jovem cair para o lado, num sono profundo, que ele desejava que fosse eterno...
=*=
Ele dissera a verdade. Sempre lembraria de Tom quando estivesse em momentos ruins, por isso se lembrava dele naquele momento: estava absorta em dor.
Lembrou-se de como fora parar ali, do desespero ao ser separada dos amigos, de ser arrastada pelos corredores, arranhando suas pernas nas pedras pouco polidas do chão. Mas o que mais lhe machucara realmente, o que lhe trouxera a necessidade de exprimir sua tristeza em lágrimas, foi a visão de Draco ao lado do pai.
Havia chegado em uma sala pouco iluminada, com vários Comensais observando cada um que entrava, mantendo os semblantes de vitória. Viu que conhecia alguns dos rostos, pois havia alunos de Hogwarts; mas não esperava de nenhuma maneira encontrar Draco entre eles.
Deveria fazer mais de um ano que mantinha um relacionamento forte, porém restrito, com o louro, mesmo depois que ele havia terminado os estudos na escola. Sempre o ouvia dizer que não compartilhava dos mesmos interesses do pai, que não se interessava em seguir um bruxo inescrupuloso… E agora, via-o ali, junto dos outros servos de Voldemort, atacando a escola.
Sabia que estava sendo levada para servir de comoção. Tinha certeza de que seu pai e irmão deveriam estar em outra sala, sofrendo torturas para revelarem o paradeiro de Harry Potter.
Estava com medo.
Foi jogada em um canto, ainda incrédula por ver o namorado ali. Não desgrudava os olhos dele, mas não recebia nenhuma atenção de volta. Parecia o antigo Malfoy, que lhe tratava como um inseto, desprezando-a pela descendência, e não o Draco que se dizia capaz de fugir para conseguirem uma chance de um relacionamento menos turbulento.
Ela começou a chorar, sentindo cada partezinha de seu lado sentimental desmoronar com a frieza do jovem Comensal, mais do que com o medo que tinha do que lhe poderia acontecer. Sempre dera credibilidade total ao que ele dizia e vê-lo ali era uma traição que nunca tinha esperado acontecer, por mais que soubesse que estava se envolvendo com um Malfoy. Deixara sua confiança nas pessoas predominar e novamente ficara decepcionada… Tom e Draco a estavam fazendo sofrer mais do que ao receber um ferimento profundo…
Encolheu-se, desistindo de tentar achar alguma resposta na imensidão de águas geladas que era os olhos de Draco. Só lhe restava chorar e chorar… Não havia nenhuma chance em derrotar uma dúzia de Comensais e fugir. Não importava se eles confirmassem suas suspeitas de que ela era uma garota chorona, que não agüentaria nem mais alguns minutos para começar a implorar por sua vida. Só queria ficar ali, quieta, soltando suas frustrações e esperando algo que pudesse lhe ajudar… ou não.
Quando já estava com os olhos vermelhos e inchados, sentiu seu braço ser rodeado bruscamente e puxado para cima, sendo obrigada a se levantar. Olhou ao redor da sala e teve calafrios ao ver seu pai amarrado por cordas apertadas e brilhantes, mantendo uma aparência acabada e deprimente.
Quis gritar, apelar pelo pai, mas lhe pareceu que se fizesse isso, prejudicaria a si mesma e a ele, então se calou, mas sem impedir suas lágrimas de rolarem soltas e espessas pelo rosto.
A cabeça pouco cabeluda do Sr. Weasley pendia para baixo e Gina jurava que se aquelas cordas brilhantes não estivessem prendendo tão firmemente o corpo na cadeira, ele despencaria para o chão, sem forças. Ela se perguntava se ele estaria consciente ou não, ou se já estaria insano de tanto receber maldições... E isso lhe doía no peito, quase tão profundamente como quando sentiu a decepção por Draco.
Estava tão desesperada vendo o pai naquele estado que mal sentiu o impacto do feitiço, vindo logo depois a sentir uma dor insuportável da maldição Cruciatus invadindo todo seu corpo e tirando-lhe a capacidade de distinguir qualquer coisa ao seu redor. Só sentia dor, agonia e mais dor...
Até que ouviu a voz do Sr. Weasley num grito estridente de clemência, que a fez recuperar um pouco da sua consciência. O seu corpo de repente foi aliviado da maldição e aos poucos ela pôde voltar a ter todos os seus sentidos totalmente normais. Mas a dor fora tão forte, que não conseguia se mexer sem sentir seu corpo latejando. Estava deitada no chão, querendo que seu coração parasse de bater, pois isto lhe causava dores insuportáveis.
Olhou para seu pai, que desta vez mantinha a cabeça erguida num olhar de afeto e preocupação. Ela via que ele estava mais apreensivo com sua vida do que com a dele próprio e isso fazia seu amor aumentar mais, assim como sua agonia ao vê-lo daquele modo.
Ouviu alguns comensais dirigindo-lhe palavras bruscas que ela não compreendia, por ainda estar atordoada e confusa, mas pela luzes dos feitiços, pôde perceber que as respostas de seu pai eram negativas. Quis levantar e tentar intervir, nem que fosse usando seu corpo com escudo, mas logo que mexeu uma perna, novamente uma maldição tomou conta do seu corpo.
A sensação terrível de minutos antes lhe invadiu todo o corpo, fazendo-a gritar e soltar mais lágrimas. Em alguns poucos segundos que tinha lucidez, perguntava-se se Draco estaria ali, vendo-a sofrer e se estaria satisfeito com aquilo tudo, ou se estaria sofrendo tanto quanto seu pai, ao vê-la em agonia... Talvez ela sofresse mais por essa dúvida do que pela impressão de seu corpo rasgando e seu sangue a queimando por dentro...
Até que, inesperadamente, tudo parou e Gina sentiu que se formava um tumulto ao redor. Abriu seus olhos e viu que seu pai estava sozinho, os olhos seguindo diretamente para uma movimentação ao seu lado. Continuou a olhá-lo, esperando que ele a visse também e dissesse o que fazer; mas como não conseguia sua atenção, desviou os olhos para o lado e espantou-se com o que viu, fazendo com que por um segundo esquecesse a dor em seu corpo.
Viu Draco, a varinha em punho, lançando vários feitiços contra a maioria dos Comensais presentes na sala. Viu também Lúcio Malfoy em um canto, indeciso entre ajudar o filho ou ser um Comensal e atacá-lo como um traidor. Então, antes que recebesse um feitiço que a derrubasse, ouviu a voz desesperada, dizendo:
-CORRA, Gina! Fuja daqui, AGORA!
O pequeno momento em que viu o desespero nos olhos tão cinzas de Draco, fez Gina se arrepender dolorosamente de ter desconfiado do amor dele... Sentiu lágrimas quentes rolarem fáceis por seu rosto, enquanto mordia fortemente o lábio inferior e tentava se levantar. Apenas não sabia para que estava se levantando: se para fugir pela porta, libertar seu pai ou ir em socorro a Draco, mesmo sabendo que as duas últimas opções provavelmente não adiantariam nada.
Deu uma última olhada e viu Draco cair pesadamente, sendo em seguida bombardeado com mais maldições. As lágrimas lhe cegavam e o desespero a fazia não conseguir tomar nenhuma decisão. Porém, o aperto em seu peito era tão grande ao vê-lo ali, sendo torturado, que acabou fazendo o mesmo que ele: indo tentar protegê-lo.
Correu o mais rápido que suas pernas permitiram - esquecendo qualquer dor - e se jogou no chão, tentando bloquear os ataques recebidos. Assim que Draco teve consciência da presença de Gina, ela sentiu que ele a envolvia com os braços, apertando-a forte contra si. Sentiu-se tão bem e reconfortada ao tê-lo consigo, que por um segundo não sentiu nenhuma dor ou desespero. Só por um segundo.
No momento seguinte, a mira foi voltada para Gina também e ela passou a receber ataques, apesar de Draco virar o corpo e mantê-la embaixo de si.
Sua garganta estava tão seca e sua respiração tão fraca, que não tinha forças para soltar em um grito toda angústia e medo que sentia, não contando as terríveis sensações que lhe penetravam no corpo a cada feitiço lançado em seu corpo. Suas costelas pareciam prestes a se quebrar, tamanha a força que Draco lhe apertava; porém, ela preferia ter as costelas quebradas do que a perda daquele abraço.
Frozen inside without your touch, without your love, darling
Congelada por dentro, sem o seu toque, sem o seu amor, querido
Only you are the life among the dead
Só você é a vida entre a morte
Gina ouviu Draco lhe murmurar algo rapidamente, mas não pôde entender nada além do "... até você...", devido aos constantes gritos dos Comensais. Quis dizer que a presença dele fazia muita diferença naquele momento, que ela, se sobrevivesse, morreria de tristeza se ele fosse mesmo um falso, que não lhe amava. Mas ele estava ali, provando que ela era importante e Gina não sabia se depois desta prova queria morrer ou viver...
Antes que pudesse abrir a boca para expressar o que sentia, um feitiço lhe atingiu a cabeça, parte que Draco não conseguira cobrir e aos poucos foi perdendo os sentidos, até que tudo não passasse de escuridão...
=*=
Without a soul my spirit's sleeping somewhere cold
Sem uma alma, meu espírito dorme em algum lugar frio
Until you find it there and lead it back home
Até que você o encontre e leve-o de volta para casa
(Wake up) Wake me up inside
(Acorde-me) Acorde-me por dentro
(I can't wake up) Wake me up inside
(Eu não consigo acordar) Acorde-me por dentro
(Save me) Call my name and save me from the dark
(Salve-me) Chame por meu nome e salve-me das trevas
(Wake me up) Bid my blood to run
(Acorde-me) Faça meu sangue correr
(I can't wake up) Before I come undone
(Eu não consigo acordar) Antes que me desfaça
(Save me) Save me from the nothing I've become
(Salve-me) Salve-me do vazio que me tornei...
O vento gelado batendo suavemente em sua nuca, fê-lo despertar. Não se lembrava de ter visto nenhuma janela aberta naquela sala, mas havia movimentação do ar e ele teria que estar entrando de algum lugar. "Talvez da porta", pensou.
Sentia o corpo latejar de dor, mas conseguiu se virar para o lado e sentir as pedras geladas do chão contra suas costas. Estava consciente da presença de Gina ao seu lado, mas sentia medo. Do mesmo modo que sentiu medo de que ela morresse na hora que estava sendo atacada, tinha medo que a descobrisse sem vida naquele momento. A pressão desse sentimento em seu peito era tão grande que se lembrou do medo que sentia - apesar de não demonstrar - de seu pai quando este o ameaçava de o entregar a Voldemort.
Mas ele sabia que a dor da perda de Gina era muito maior, pois os poucos momentos alegres que teve naqueles dois últimos anos devia a ela, e ele não queria perder isto. Seria o mesmo que a morte.
Abriu os olhos e deparou-se com uma sala deserta. Tentou respirar fundo, mas a dor em seu peito era forte demais para isso, então não passou de um suspiro silencioso. Até que a viu.
Os muitos cabelos vermelhos estava jogados para trás de seus ombros, como se quisessem que Draco visse perfeitamente o rosto de Gina sem nenhum obstáculo. A claridade era mínima, mas ele pôde ver os delicados traços do rosto com sardas. Uma onda de tristeza lhe invadiu quente, fazendo suas esperanças evaporarem ao ver as sempre rosadas bochechas de Gina, pálidas. Mas de imediato, antes que essa onda subisse aos seus olhos, seu coração disparou rápido e doloroso em seu peito.
Viu os olhos de Gina comprimidos, como se estivesse forçando-os a não abri-los. Além de um constante fluxo de lágrimas descendo lentamente, juntando na bochecha com um filete de sangue que escorria de um corte acima de sua testa. "Lágrimas, sangue... Ela está viva!" pensou, abandonando a sensação de tristeza interior.
Levantou o braço e levou a mão até o rosto da ruiva, cobrindo a bochecha ensangüentada. Quando viu que Gina iria começar a gritar, movimentou-se rápido, colocando-se em cima dela e unindo seus lábios aos também comprimidos de Gina.
Sem que precisasse murmurar qualquer palavra, Draco sabia que Gina o havia reconhecido, e os dois começaram um beijo longo e carinhoso, que há tempos era desejado.
Gina abriu os olhos, ainda um pouco insegura. Draco encarou os olhos castanhos, que estavam - apesar de revê-lo - cheios de tristeza.
Ficaram apenas se encarando, esquecendo-se de qualquer dor ou medo. Até que ela soltou um pequeno sorriso fraco e ele colocou o braço por debaixo de seu pescoço e a puxou para junto de si, beijando-a de novo. Lágrimas quentes escorriam dos olhos de Gina, contrastando com seus lábios frios, além do gosto adocicado que Draco sentia do sangue de Gina. Mas não se importava. Poderia estar em brasas, mas não a largaria por nenhum instante!
Ah, konomama dakishimete
Ah, abrace-me
Nuretamamano kokorowo
Abrace meu coração triste
Kawaritsukuzu kono tokini
Se existe amor imutável
Kawaranai aiga arunara
Que se transforma sem parar
Will you hold my heart?
Você aceitará meu amor?
Namida uketomete
Segure as lágrimas do meu coração
Mou kowaresouna
Prestes a despedaçar
Apertou-a contra si e Gina encostou a cabeça em seu ombro, chorando pesadamente. Tremia o corpo todo a cada soluço e ele agradecia por tê-la viva em seus braços, agradecia por não tê-la perdido.
- Me... Meu pai... - ela disse.
- Eu não sei o que aconteceu, desmaiei... Parece tudo tão deserto, silencioso...
Ela continuou a chorar, ainda agarrada a ele. Passaram algum tempo assim, deitados no chão, abraçados. Até que ela murmurou:
- Eu... eu estava com medo de abrir os olhos, medo até de mexer meus braços para ver se líquido que escorria por meu rosto eram lágrimas ou sangue... Agora sei que eram lágrimas, eu só sei chorar...
Draco olhou o rosto dela e viu que já não havia mais sangue escorrendo. Mas se lembrou que no primeiro momento que a vira, havia.
- Não eram só lágrimas, eram lágrimas e sangue... Lágrimas de sangue... - ele murmurou.
- Lágrimas de sangue... - ela repetiu - Acho que já sequei a fonte... Podemos ir ver o que aconteceu?
- Vamos - disse, levantando-se.
O gosto adocicado do sangue de Gina permanecia em sua boca, e Draco pensava o quanto irônico era, um momento de dor e sofrimento, produzir resultados adocicados...
=*=
Something has been taken
Algo foi retirado
From deep inside of me
Das profundezas de dentro de mim
A secret I've kept locked away
Um segredo que eu tinha guardado bem trancado
No one can ever see
Ninguém poderia vê-lo
Wounds so deep they never show
Feridas tão profundas que nunca pareceram
They never go away
Elas nunca sumirão
Like moving pictures in my head
Como imagens movendo-se em minha cabeça
For years and years they've played
Por anos e anos elas têm passado
Assim que a jovem Virgínia caiu novamente aos pés da estátua, o que era a lembrança de Tom levou as mãos à cabeça, num gesto de sufoco.
Nunca fora difícil mentir, dissimular. Sempre conseguira enganar a qualquer um facilmente, nem mesmo Prof. Dumbledore, com aqueles olhos azuis tão indiscretos, havia descoberto sua façanha na câmara… E agora, ele tinha dificuldade de enganar uma garotinha. Sabia que faltara pouco para que não tivesse dito que não desejava mais lhe causar mal, que estava enfeitiçado pelo modo doce da garota ser.
Mas fora forte e cumprira suas determinações até o fim. Porém, agora se torturava, sentia-se mal em deixar a garota ali, em lhe tirar a vida.
Agachou-se ao lado da estátua, observando a jovem adormecida. Desejava lhe tocar os cabelos, mas não era possível se não fizesse algum feitiço, e não queria isto, pois já tentara uma vez e falhara.
Seu objetivo ao tocá-la, anteriormente, era lhe deixar uma marca maligna, testar na garota um feitiço que vinha aperfeiçoando para usar futuramente com seus seguidores, uma marca negra. Queria provar para si mesmo que fazendo isto não estaria submetido à garota, como pensava.
Porém, assim que seus dedos tocaram o ombro descoberto, uma onda de calor – que era praticamente impossível de ser sentida devido ao seu estado não humano – assolou seu corpo inteiro, passando para sua mão e indo como a cor vermelha para pele de Gina, fazendo um desenho que estava borrado, apesar de ser identificável um leão e uma cobra, mas que logo sumiu.
Ele finalizou o feitiço e tirou sua mão, assustado. Não era aquela imagem que deveria se formar. Nunca que Tom Riddle, futuro Voldemort, deixaria um leão como sua marca, nem mesmo se ele viesse acompanhado de uma cobra…
Mas já estava feito. Destruiu a tudo que poderia lhe trazer alguma fraqueza, pois não seria agora que deixaria uma garotinha desviar o rumo de seus planos. Voltaria a vida, destruindo Harry Potter. Desta vez conseguiria dominar o mundo mágico. Nada o atrapalharia, nem mesmo a preocupação que sentia por ter deixado aquela estranha marca em Gina; afinal, ela morreria mesmo!…
"N/A: Primeiro capítulo terminado e vocês devem ter notado como os fatos e os pensamentos não estão seguindo uma cronologia exata, como eu disse inicialmente. Espero que isso não tenha comprometido a compreensão da fic. Nha, obrigada pelas reviews, Lisa e Aline! Espero que gostem deste".
"N/A 2: Como minha beta parece ter sumido, a fic está sem betagem. Peço desculpas por isso, mas é necessário deixar a fic publicada antes deu ir viajar, porque ela já está mofando aqui no meu PC há semanas...rs!".
