Capítulo 5: Pondo Tudo Em Pratos Limpos

           O dia passou normalmente, o duelo foi rapidamente esquecido ao se constatar que não haveria continuação.Mas rei morto rei posto, logo uma nova fofoca escolar tomou conta do colégio.Tudo por causa do incidente na aula de Poções.

         O trabalho encorajador e animado da aula envolvia o preparo da poção para mudar a voz.E os ingredientes não podiam ser melhores: toletes dissecados,  erva-daninha-da-Patagônia, leite azedo de bezerro apaixonado e outras coisas assim agradáveis.Snape parecia realmente aborrecido, comentava-se que Moody mais uma vez o provocara.E quando isso acontecia...

         - Lembrem-se de que se exagerarem no leite azedo a voz irá ficar fina demais, E CORRE O RISCO DE IR FICANDO CADA VEZ MAIS FINA ATÉ DESAPARECER! E se passarem da conta na erva daninha irá ficar grossa demais, E PODERÃO ACABAR TENDO QUE FICAR CALADOS O RESTO DA VIDA PARA NÃO QUEBRAR COPOS POR AÍ! – o interessante é que as partes mais enfatizantes eram disparadas no ouvido de Neville, deixando os grifinórios furiosos e os sonserinos de ótimo humor.Até aí normal, o pior veio na hora de testar a coisa.

         - Longbottom, traga seu sapo. – mandou Snape como se estivesse pedindo um copo d'água.

         -Me-meu sa-sapo, professor? – repetiu um assustado Neville.

         - É, seu sapo, agora ficou surdo também?Vamos, agora! – Snape pareceu crescer uns dois metros – Temos que testar sua poção!

         Os alunos ficaram espantados com a maldade gratuita do professor, afinal todo mundo sabe que sapo não pode falar, certo?Mas quando Neville pegou Trevo e ia entrega-lo, tremendo, ao professor, uma voz surpreendentemente desafiadora ecoou do fundo da sala.

         - Longbottom, você é um bolha mesmo!Como pode deixar que façam isso com você, ainda mais esse trasgo cabeludo! – os olhares e ouvidos se voltaram para ninguém menos que Mary, de pé, isso mesmo, de pé na cadeira com os braços cruzados e uma expressão zangada passeando de Neville a Snape.Parecia esperando uma resposta, que veio depressa.

         - SRTA. SIENFIELD, O QUE PENSA QUE ESTÁ FAZENDO? – chamar Snape de trasgo cabeludo não é bom para a saúde, mesmo sendo da casa dele!Era a primeira vez que ele aparentava ter vasos sanguíneos no rosto, e cresceu uns quatro metros dessa vez.Mas Mary não parecia nem um pouco intimidada.

         - O senhor é muito mau, sabia?Não devia fazer essas coisas com os alunos, está incentivando o sadismo, sabia?Sempre persegue o Longbottom, no começo era divertido mas agora é cruel, sabia? – ela falava e apontava o dedo na direção do professor, que ficara estarrecido com a situação, aparentemente.Aparentemente, porque, quando Mary acabou de falar, ele deu um sorriso enigmático e olhou fixamente para ela, que arregalou os olhos o máximo que podia, mas tentando não demonstrar medo.

         - Então parece bem interessada no sr. Longbottom, srta. Sienfield. – disse ele, calmo como Dumbledore.Foi o bastante para deixa-la rubra, inteira e involuntariamente.A sala toda começou a fazer comentários obscenos, mas, sem saber, Snape aguçou Mary da pior forma possível.

         - Você...é...O MENOS INDICADO PARA FAZER ACUSAÇÕES DESSE TIPO! – num segundo, ela se colocou cara a cara com o professor, pulando sobre a carteira de John Rover e espalhando sangue de tolete pela cara dele toda.

         - Que quer dizer, senhorita?! – de alguma forma, Snape parecia afetado.Mary sorriu maldosamente.

         - O que sabe sobre assuntos do coração?Eu imagino o sucesso que faz com as mulheres, o garanhão de Hogwarts!Concorrente de Flitwick em matéria de porte!

         A sala explodiu em risos, de ambas as partes(era impossível segurar), mas Mary não queria parar.

         - Sabe do que mais?ACHO QUE SE O SENHOR FALHOU COM A PROFESSORA MINERVA ONTEM À NOITE, A CULPA NÃO É DO SAPO DO LONGBOTTOM!EXISTEM POÇÕES PRA RESOLVER ESSAS COISAS, IMAGINO!OU O SENHOR NÃO SABE?

         No fundo da sala, Noriçá tapou o rosto com as mãos para não ver o corpo da amiga estendido no chão.Harry e Mione se perguntavam quem era aquela menina e Rony lamentava não ter uma câmera.Os outros alunos se calaram diante da cara de "contagem regressiva para explosão" de Snape.Algo como "me ferrei legal" passou pela mente de Mary.

         - Srta. Sienfield...50 pontos a menos para a Sonserina(o mundo vai acabar) e a senhorita vai ficar encarregada de limpar os caldeirões da sala o resto do mês.E vá se sentar.

         O sentimento de alívio estava quase penetrando em Mary, mas, quando ela estava voltando ao seu lugar...

         - Inventar histórias sobre os outros deve estar no sangue... – ninguém entendeu o comentário, mas ao ouvir, Mary saiu correndo da sala(estaria chorando?)

         Ninguém saberia que Neville, pela primeira vez, sentiu vontade de responder a Severo Snape.

         - Eu nunca vi algo assim. – comentava Mione ao sentar numa poltrona do Salão Comunal da Grifinória, lembrando do que acontecera na aula de Poções.

         - Foi espetacular... – Rony se jogou na cadeira com os braços estendidos – Peitar o Snape desse jeito!E foi a primeira vez que ele descontou tanto da Sonserina.Deve ter algum fundo de verdade no que ela disse...

         - Que nojento, Rony! – Bichento pulou no colo da dona, miando em sinal de aprovação.

         - Eu só não entendi porque o que Snape disse deixou ela daquele jeito. Noriçá disse que encontrou ela chorando no banheiro, mas parecia ser de raiva, não de tristeza. – comentou Harry, encostado numa parede.

         - Não faço idéia e não é da nossa conta.O que importa é que Trevo foi salvo, certo?Aliás, porque é que Snape ia querer testar num sapo uma poção para mudar a voz?

         Bichento sibilou baixinho para Rony, e saiu do recinto.Por pouco, Rony não respondeu da mesma forma.Mione repentinamente lembrou-se de algo, mas não quis comentar nada na presença dos garotos.

Enquanto os bons alunos descansavam tranqüilamente em suas casas, do lado de fora seria uma longa e cansativa noite.Filch conduzia Noriçá e Draco pelos corredores até a sala de quadribol.Enquanto ele tagarelava sobre as saudosas correntes e masmorras, atrás dele não se ouvia ruído.Ou nenhum dos dois queria começar uma briga ou imaginavam as coisas mais terríveis a serem postas em prática quando estivessem sozinhos.Agiam como se o outro não estivesse ali.Ao chegarem, encontraram a profa. Minerva na porta, que olhou pra eles meio temerosa, mas abriu a sala sem dizer nada, apenas recomendando a Filch que ficasse de olho aberto, e saiu para o castelo. 

- Podem entrar e começar o serviço, pestinhas.Quero ver todas essas peças brilhando ao final do turno, hein!Estou de olho em vocês!

Madame Nor-r-r-a concordou com um miado rouco e a porta se fechou estrondosamente.Noriçá deu uma olhada geral pela sala antes de largar os materiais de limpeza no chão.

- Vocês gostam bastante de quadribol mesmo... – ela começou a colocar as luvas – Isso vai levar um boooom tempo.

- Como pode dizer isso com essa calma?

- Pra começo de conversa, a gente mereceu.Depois, aprendi a não me irritar por qualquer coisa.Não vale a pena...

- Ela ficou muito magoada com o que eu disse.Na verdade, como sempre a culpa foi toda minha.Eu devia estar satisfeito com isso, mas na verdade estou meio incomodado...

- Eu não vou fazer tudo sozinha, sr. Folgado-mor! – ela apontou para o material de limpeza de Draco, intocado.Pra sua surpresa, ele pegou a esponja e sabão e começou a limpar uma goles sem reclamar.Ela sentiu vontade de sorrir ao olhar pra ele.Por isso, parou de olhar e voltou aos acessórios de árbitro.

Eles ficaram em silêncio por um bom tempo, os dois querendo começar uma conversa mas sem dar o braço a torcer.Depois de toda aquela guerra entre eles, pensava Noriçá, no mínimo ele desdenharia dela a noite toda com comentários do tipo "você não disse que eu era infantil?Se quer conversar comigo então é tão infantil quanto" e tudo o que ela não queria era se aborrecer.Por outro lado, Draco pensava que se tentasse dizer alguma coisa ela responderia com os olhos frios "que não adianta tentar ser gentil com a sangue-ruim de terceiro mundo que ela não vai perdoá-lo" e tinha medo de se sentir mal com isso.Por isso não diziam nada e evitavam se olhar nos olhos.Mas...

- Só faltam os balaços agora. – suspirou Noriçá, guardando a última vassoura.

- Como vamos limpar essas coisas? – Draco olhou desconfiado para a caixa de balaços aberta, as bolinhas negras se agitando nas correntes.Noriçá se mostrou um tanto inconformada.

- Droga, que espécie de demente inventou essas coisas?

- Do jeito que fala, parece que você nunca jogou quadribol...

- Jogar jogado não.Só vi.A gente jogava Trancabola no Brasil, sabe o que é?

- Acho que vi alguma coisa naquele livro do Whisp...

Começaram a discutir uma forma de limpar os balaços sem correr perigo de vida, e logo já estavam conversando sobre outras coisas em que eram parecidos, como por exemplo, a família de Noriçá também tinha origem francesa, e descobriram que ambos gostavam muito das lendas e histórias bruxas do período dos samurais.

- Os meus favoritos são os ninjas animagos, principalmente aquele Mondo Matsuyama. – disse Noriçá – Ele era incrível!

- Também são os meus preferidos!Engraçado...eles eram considerados artistas marciais das trevas, nunca conheci ninguém que gostasse deles como eu.

- Mas na verdade eles tinham um grande código de honra, e eram leais ao mestre mesmo que precisassem fazer coisas erradas.Lutavam por aquilo que acreditavam, por isso eu os admiro!

- Nunca tinha pensado dessa forma.Será que minha família é leal ao Lord das Trevas por ideal?

- A coisa mais admirável é alguém que luta pelo que acredita.Acho que hoje em dia isso falta um pouco.

- Como assim? – Draco estava começando a achar que além de bonita, Noriçá era realmente madura.Era a primeira vez que conversava assim com alguém.

- Ideais, Draco.Sonhos, objetivos na vida...tem gente que acha que ter poder e ser temido é o máximo que a vida pode dar.Mas isso não é verdade...tudo isso é muito, mas não preenche aqui dentro. – e apertou com ligeira força o próprio peito. Sentiu que batia depressa, tanto pelo desabafo quanto pela presença de Draco.Só agora estava entendendo.O que sentia era aquilo que chamam de amor, podia ser estranho, inimaginável, mas era.Talvez tivesse começado no trem, no salão comunal, ali naquele instante, mas o que importava?Estava ali dentro dela, e ela sabia disso. Mas...não iria ser levada pela emoção, não diria nada de que pudesse se arrepender depois, quando tivesse pensado melhor.

 - Preencher...aí dentro?Acho que...entendo... – e como não entender, depois de ter sentido na pele?Sim, sempre quando algo não dava certo ele esfregava na cara de quem estivesse na frente sua posição social, a impressão de que era melhor que os outros, para ver se sentia melhor, e fez fama.Mas sempre faltava preencher alguma coisa, agora ele percebia claramente.Sim, era temido por ser um Malfoy, mas o temor traz um ódio avassalador consigo...

- Você... por acaso...tem...medo...de mim? – pareceria idiota, mas ele tinha que saber se ela o odiava.Não teve coragem de olhar nos olhos dela e não viu que eles o fitavam com surpresa.Talvez por isso passaram-se alguns momentos de silêncio antes que ela respondesse.

- Não.

A voz dela era doce e suave, quase imperceptível, e Draco sentiu-se seguro de levantar o rosto.

- Eu não tenho medo de você.Nem um pouco.

Ela sorria, e ele entendeu que ela "lera nas entrelinhas" o sentido da pergunta.Mas faltava uma coisa.

- Desculpa.

- Quê?

- Desculpa por te xingar aquela noite.Eu tenho que pedir desculpas, né?

-...é, acho que sim.Tudo bem, aceito suas desculpas se você não fizer de novo.

- Pra levar outra prensa daquela logo de manhã?Nem ferrando!

Noriçá riu um pouco, e Draco notou de novo com o riso dela era divertido e diferente.

- É, foi uma boa diversão para o segundo dia de aula!

- Você já se divertiu na primeira aula do ano, ao mostrar sua habilidade especial.Ahn?Normalmente eu chamaria de anomalia bizarra!

- Não se esqueça do stress com a Chapada Trelawney!

- Aquele foi demais.Nem a Granger jogou tanta coisa na cara dela quando saiu da aula.Ela te assustou, né?

- Digamos que...um pouco...Draco!

- Fala.

- Vai me considerar sua inimiga porque eu sou amiga dos grifinórios?

- Vai torcer por eles no quadribol?

- Eu nunca torci pra quadribol!

- Bem, então acho que posso relevar...

- Também vou relevar os dois trasgos que te acompanham...

- Ei!Crable e Goyle são daquele jeito mas são legais!Vai ver quando eu te apresentar a eles.

- Vai me apresentar a eles?Como?

- Bem... – bem vermelho, isso sim – se você quiser, claro...

- Tá me convidando pra ser sua amiga? – vermelha também.

- Acho...que é isso, sim.Eu nunca convidei ninguém pra ser meu amigo antes..

- Hum;sempre tem uma primeira vez pra tudo.E...eu ia te convidar, mesmo!

- Sério?Também nunca me convidaram pra ser amigo de alguém antes...

- Não tem segredo!Agora é oficial?

- Certo! – ele se levantou e subiu na caixa fechada dos balaços – Aham! Declaro que a amizade está agora oficializada entre nós!

- Há!Vida longa à nova era!

- De onde tirou isso?

- Acho que é básico de filme épico trouxa.

A porta escancarou-se e a figura de Filch acabou com o clima leve da sala. Noriçá deu um toque para Draco descer da caixa rapidinho.

- Hum!Estão felizes porque terminaram o serviço, espero... – e olhou fixo para a caixa de balaços.

- Tudo pronto, sr. Filch! – os dois falaram ao mesmo tempo com a melhor cara de santo que sabiam fazer.Filch fungou, aborrecido, e fez sinal para saírem da sala.Os dois foram saindo abafando risadinhas.

- Esses adolescentes não controlam os hormônios...

Se houvesse lua, daria pra ver o resultado do comentário de Filch no rosto rubro da duplinha...mas apenas o miado sarcástico de Madame Nor-r-r-a não poderia comprovar nada.

Enquanto isso, na Torre da Grifinória...

- Não vou ouvir mais nada, Rony! – Harry enfiou a cabeça debaixo do travesseiro, aborrecido.Àquela hora da noite não era um momento apropriado para uma discussão, mas nenhum dos dois parecia estar se importando com isso.

- Olha Harry, eu vi!Faz um bom tempo que estou vendo!Você anda olhando a Gina diferente ultimamente!!!!

- Está dando uma de irmão babaca ciumento de novo, Rony...

- Babaca aqui é você!Eu não me importaria, afinal é meu melhor amigo, mas essa enrolação imbecil me deixa louco!

- Eu, enrolado?

- É!Se antes a Gi não conseguia falar na sua presença, agora é você que fica sonso perto dela!Até o Neville já percebeu que você tá gostando dela!

- Eu não tenho certeza disso...eu nunca gostei de alguém antes!

- E a Cho Chang?

- Bem, depois que ela me deu aquele fora eu fiquei zangado mas depois passou.Então eu percebi que não gostava mesmo dela.E se agora for a mesma coisa?Só vou fazer a Gina sofrer!

- É isso?Pelo menos a Cho você teve peito pra convidar pro baile!

- Coisa que você não tem pra se entender com a Hermione!

- Isso...é diferente!

- Não fique vermelho, vai dar na vista...

- Se eu sou enrolado você também é!!!!!! – os dois falaram ao mesmo tempo. Olharam um para a cara do outro e sentiram uma imensa vontade de rir, ao chegarem à mesma conclusão:eram dois enrolados, sim, e só o que lhes restava era agir em conjunto para mudar isso.Com certeza os próximos dias iam ser cheios de acontecimentos.

E muito mais do que eles imaginavam...

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