Cap. 11 – Najla

A ninfa indicou a Harry uma cadeira e trancou a porta magicamente. Ele espantou-se por vê-la usar uma varinha.

— Podemos começar nos apresentando. Eu me chamo Najla.

Harry quase respondeu "Eu sei", mas se refreou a tempo. Apenas assentiu indicando que estava ouvindo.

— Eu sei que nós deveríamos ter tido esta conversa há muito mais tempo. Aliás, o ideal seria que nós sequer tivéssemos essa conversa. Tudo deveria ser muito natural para você, sem a necessidade de qualquer explicação. Contudo, infelizmente, a vida geralmente não é como nós esperamos que ela seja.

"Do que é que ela está falando?", pensava Harry.

— Eu soube que há algum tempo você conheceu o seu padrinho. Deve sentir-se muito feliz por isso. Eu imagino também o quanto ele deve estar feliz. — aqui ela fez uma pausa e ficou sorrindo, olhando para Harry — Harry, desde que conheceu o seu padrinho, você nunca se perguntou se por acaso não teria também uma madrinha?

Ele fez um esforço para não arregalar os olhos, mas foi inevitável. Ela estava realmente dizendo aquilo que ele achava que ela queria dizer?

— Você... isso quer dizer que... você é... — Harry não conseguiu completar a frase.

— Sua madrinha? Sou.

Harry não sabia que reação Najla esperava que ele tivesse, mas com certeza ela não imaginava que ele fosse ficar um tanto abobado, sem saber o que dizer. Porque foi assim que ele ficou, e ficou claro que não era isso que a ninfa esperava.

— O que foi, Harry? Não acredita? — perguntou ela, seu sorriso vacilando ligeiramente.

— Não, não é isso... Eu só... não entendo...

— Não entende... Não entende porque eu nunca dei sinal de vida, é isso? Porque ninguém nunca falou sobre mim para você?

— Éé. — Harry queria dizer alguma coisa, queria fazer perguntas, mas não conseguia. Havia alguma coisa na ninfa que o intimidava, alguma coisa que o fazia querer ficar quieto, só ouvindo e nada mais. Por fim, ele conseguiu perguntar, meio de supetão — Há alguma coisa entre você e o Sirius?

Najla riu com gosto, e Harry sentiu-se ridículo por ter feito essa pergunta.

— Não, Harry. A única ligação entre eu e o seu padrinho é o fato de termos apadrinhado o mesmo garoto. Nada mais. Nunca tivemos um relacionamento amoroso, se é isso o que você quer saber.

Harry mirou aqueles olhos azuis. Ela estava se divertindo com a situação, e ele não se sentia nada confortável. Então lhe ocorreu: ela não devia ter mais do que vinte e cinco anos; de maneira alguma tinha idade para ser madrinha dele.

— Você... não parece ter a mesma idade dos meus pais, ou do Sirius...

— De fato, Harry. Eu completei oitenta e nove anos em fevereiro.

Najla riu da expressão de Harry diante daquela afirmação; e parou de rir quando ele se recompôs, pensando "não seja idiota, afinal, ela é uma ninfa". Aos poucos, Harry foi se soltando mais, e logo sentiu-se à vontade para conversar. Tinha tão poucas oportunidades de falar com Sirius e, quando isso acontecia, raramente falavam sobre seus pais. Agora ele tinha sua madrinha diante dele; quem sabe ela não poderia lhe contar algumas coisas.

— Vocês eram muito amigos? — disse Harry, numa tentativa de fazer uma pergunta banal.

— Bom, na verdade... Eu não era tão amiga dos seus pais quanto Sirius ou Remo, por exemplo. Mas eles eram pessoas que eu admirava muito... Que admiro até hoje, a coragem com que eles enfrentaram tantas adversidades... E eu, bem... Apesar de não ser tão amiga, era alguém em quem Lílian e Tiago confiavam muito. Eu me orgulho disso, de ter sido escolhida por eles.

Certo, então ela não poderia lhe contar muita coisa sobre os seus pais. Mas poderia explicar outras.

— Mas, me diga, por que eu nunca soube que você existia?

— É como eu disse... A vida nunca é o que nós esperamos. Eu gostaria de ter estado com você, por perto, esses anos todos. Gostaria de ter visto você crescer. De ter visto você representando a escola no Torneio Tribuxo. De ter visto você ganhando a Taça de Quadribol. Eu gostaria de ter podido fazer tantas coisas, Harry. Eu gostaria de nunca ter ido embora. Agora é tarde demais. Não se pode mudar o que ficou para trás, o tempo perdido não se recupera.

— Por que é que você voltou, então? Foi só por causa do Pássaro de Ouro? Quando tudo estiver resolvido, você vai embora de novo?

— É engraçado isso... Como as pessoas sempre têm medo que eu vá embora... Isso costumar dificultar as coisas na minha vida.

— Se elas têm medo que você vá, é porque você deve fazer isso sempre. Abandonar as pessoas aqui e voltar para a terra das ninfas, o Parnaso.

Ela baixou os olhos e falou com a voz fraca:

— Minha mãe morreu, Harry.

— Ahn? — ele perguntou rápido, erguendo a cabeça e voltando-se para encará-la nos olhos.

— Minha mãe morreu — continuou Najla tristemente — pouco mais de um mês depois de tudo acontecer, dos seus pais morrerem. Foi no dia 25 de dezembro. O Natal mais negro da minha vida.

Ela parou de falar, e por um minuto tudo ficou em silêncio, com Najla perdida em suas lembranças.

— Ela queria que eu voltasse, que eu assumisse tudo. Ela era a rainha, e queria que eu o fosse. Então eu voltei, para reinar sobre meu povo. Pelo menos até encontrar alguém para me substituir — ela soltou um longo suspiro — Eu não contava que fosse ficar por quase quinze anos. Eu não pretendia.

"E quando o Pássaro de Ouro foi libertado, nós decidimos intervir. Foi quando eu decidi que era hora de voltar. Por ser meio bruxa, todas as ninfas concordaram que eu era a mais indicada para capturar o Pássaro, porque me sentiria mais livre para andar entre os bruxos.

"E foi o que eu fiz. Voltei. As ninfas esperam que, quando eu terminar, volte para o Parnaso. Mas eu não vou fazer isso. Eu não vou embora outra vez. Não há mais nada que me prenda lá, elas não precisam mais de mim. E aqui... há muitas coisas que me prendem a este mundo agora, e eu não vou mais abandoná-lo."

Por um instante, Harry pensou ter visto uma lágrima surgir nos olhos dela, mas quando ela abriu-os novamente, eles estavam surpreendentemente secos.

— Por onde você andou, Harry? Alicia e Angelina passaram aqui feito umas doidas, procurando por você. O que foi que aconteceu? — Rony foi logo perguntando assim que ele entrou pelo buraco do retrato.

— Eu não estou com cabeça para treinar quadribol.

— Você está doente? Desde quando você não tem disposição para jogar quadribol?

— Onde está Hermione?

— ...

— Eu preciso conversar com vocês dois. É importante.

— Ela deve estar estudando, ou dando comida para aquele besouro insuportável. É só o que ela faz.

Rony mal acabou de falar quando Mione apareceu na passagem da mulher gorda, ofegante, e logo anunciou animada:

— Harry, Rony, vocês não vão acreditar! Acabo de voltar das cozinhas e a Winky...

— Mais tarde, Hermione. Agora eu preciso falar com vocês.

Uma ruga de preocupação apareceu na testa dela, que abaixou a voz para perguntar:

— É confidencial? — Harry confirmou — Então vamos dar uma volta pelos jardins, esse salão está muito cheio.

Andando perto da orla da floresta proibida, Harry relatou aos amigos a conversa que tivera com Najla há pouco. Rony ficou absolutamente fascinado com a idéia de Harry ter uma ninfa como madrinha.

— Harry, você deve ser o cara que tem os padrinhos mais esquisitos desse mundo! Um foragido de Azkaban e uma meio ninfa. É... fantástico.

— O que é fantástico? — perguntou Jorge que acabara de chegar com Fred — Por acaso o Harry faltar ao treino de hoje é fantástico?

— O que é que você está pensando, Harry? — continuou Fred — Só falta nos matar quando nos atrasamos para os treinos, e, no entanto, quando não está com vontade, você simplesmente não vai.

Ele olhou para os próprios pés. O que diria aos gêmeos? Eles estavam certos, afinal. Não fora uma atitude correta da parte dele.

— Eu... realmente não estou... me sentindo bem hoje... acho que...

— Acho que você deveria ter um pouco mais de responsabilidade, Harry — afirmou Jorge convicto — Quando assumiu a liderança do time, você contraiu um compromisso. Faria bem melhor se o honrasse.

— Espero que essa sua atitude não se repita novamente, Harry — finalizou Fred, e os dois rumaram para o castelo. Quando já estavam longe, Harry pôde perceber que eles tremeram ligeiramente.

— Estão rindo — constatou Rony — Não ligue para eles. Adoram fazer a gente se sentir mal.

Durante o jantar daquela noite, Harry não parava de lançar olhares em direção a Najla. Era tudo muito estranho. Ele começara o dia apenas levemente curioso sobre o motivo que levaria uma ninfa a se abalar até Hogwarts; e terminava esse mesmo dia apreensivo com a possibilidade de Voldemort ter despertado uma fera milenar, que trouxera até Harry uma madrinha que ele nunca pensou que existisse.

Se isso não era estranho, ele não sabia o que mais poderia ser. E Rony tinha razão: não poderiam ter lhe arranjado uma madrinha mais esquisita. Linda, é verdade, com aqueles cachos azul-turquesa, e muito debochada.

Assim pensando, adormeceu, e sonhou um sonho recheado de pássaros dourados e ninfas de cabelos azuis.

Quando Hermione recebeu o Profeta Diário no café na manhã seguinte, soltou um gritinho de incredulidade ao ver a manchete da primeira página. Ainda balançando a cabeça em sinal de reprovação, chamou Harry e Rony para lerem com ela a reportagem.

— Olhem só para isso! "Ministro dá entrevista bombástica".

— Deixa eu ver! Deixa eu ver! — exclamou Rony.

O ministro da magia do Reino Unido, Cornélio Fudge, recebeu o repórter Péricles Fletcher em seu gabinete na tarde da última quarta-feira e concedeu uma entrevista exclusiva ao Profeta Diário, na qual ele trata de assuntos como a segurança nacional, cumprimento das leis da magia, rumores a respeito de uma ascensão do Partido das Trevas e supostas traições de antigos companheiros.

Profeta – Rumores de uma possível volta de Você-Sabe-Quem têm deixado grande parte da população mágica alvoroçada nos últimos cinco meses. Em comunicados oficiais, o ministério garante que tudo não passa de boatos infundados. O que o senhor tem a dizer sobre isso?

Fudge – É claro que são apenas boatos, começados por pessoas que querem desestabilizar o ministério e prejudicar o meu governo. Não vou citar nomes, mas devo dizer que estou muito decepcionado com velhos amigos que se voltaram contra mim e planejam me desmoralizar perante a população, para poderem me tomar o cargo.

Profeta – O senhor estaria se referindo ao diretor de Hogwarts, Alvo Dumbledore?

Fudge – Já disse que não vou citar nomes, mas o povo sabe quem são as pessoas que estão espalhando esses boatos.

Profeta – Sr. ministro, o senhor há de convir que tem havido uma intensificação nas atividades de bruxos eternamente suspeitos de manterem ligações com as artes das trevas. Não seria esse um indício de que o Partido das Trevas esteja reunindo forças novamente?

Fudge – Não há indício algum. Bruxos que praticam magia negra ilegalmente sempre existiram e sempre vão existir. Apesar de o ministério fazer um grande esforço, não é possível alcançar todos eles, a população bem sabe disso. Mas isso não significa que eles estejam organizados e planejando ataques, não, não é possível. Ações como as que vemos por aí não passam de casos isolados de bruxos malucos que querem aparecer.

Profeta – Não é o que diz a Ordem da Fênix. Eles recomendam à população cautela máxima e têm até um contato para quem queira denunciar bruxos e movimentações suspeitas.

Fudge – A Ordem da Fênix é uma grande bobagem. São bruxos que não têm coragem de me enfrentar cara a cara e ficam se escondendo atrás de codinomes, com medo de represálias. Não vão a lugar nenhum se continuarem seguindo por esse caminho, e a população mágica faria bem melhor se não desse ouvido às ordens desse tal de Mr. Buzz.

Profeta – O Profeta Diário realizou uma pesquisa de opinião, e os resultados são que a grande maioria da população se sente mais segura cumprindo as determinações sugeridas por Mr. Buzz. O sr. não acha que isso enfraquece o poder do ministério e sua influência até mesmo diante de outros países?

Fudge – De modo algum. É essa a intenção da Ordem da Fênix, mas o objetivo deles não foi alcançado. Eles têm esperança de enfraquecer meu poder como ministro, ditando regras e criando um poder paralelo. Mas isso já está sendo devidamente combatido, e classificado como crime de atentado à segurança nacional. Todos os membros ativos da Ordem da Fênix, assim que forem descobertos, serão julgados e trancafiados em Azkaban.

Profeta – Não seria uma medida muito severa, sr. ministro?

Fudge – Com os temores do povo não se brinca. A Ordem da Fênix está brincando com o medo do nosso povo, fazendo-os acreditar em mentiras absurdas e deixando-os apavorados. Isso é realmente muito sério, e deve ser devidamente punido.

Profeta – E quanto aos rumores de que o Pássaro de Ouro teria sido libertado? O que o senhor tem a dizer sobre isso?

Fudge – Outra mentira absurda! Todos sabemos que o Pássaro de Ouro está muito bem aprisionado há quatro séculos, não há meios de se libertá-lo. A volta dele não passa de uma invenção de grupos mal intencionados, que pretendem, com isso, instalar o pânico na população mágica.

Profeta – Para finalizar, o senhor gostaria de dizer algumas palavras aos nossos leitores?

Fudge – Eu gostaria de dizer a todos os bruxos deste país para não se preocuparem e não se deixarem levar por grupos levianos como a Ordem da Fênix, que têm como único intuito provocar o caos e a desordem no mundo mágico. E gostaria de acrescentar que o povo pode sempre contar comigo, e confiar em mim, o seu ministro.

— Tss, tss... O Fudge não toma jeito, francamente! Chamar a Ordem da Fênix de "grupo leviano"! Aposto que ele bem gostaria de ser chamado para participar. Mas é claro que nunca vão fazer isso, Mr. Buzz recruta gente com cérebro, e não bananas como o Fudge.

— O que me preocupa — começou Hermione — é se as pessoas levarem a sério o que o ministro falou no jornal. Se as coisas estão relativamente calmas até agora, é porque a Ordem tem conseguido mobilizar um grande número de bruxos, sempre dispostos a colaborar. Mas, se a colaboração cessa, acho que não há muita coisa que eles possam fazer sozinhos.

— Não acredito que há muita gente que vá engolir o que o Fudge disse — ponderou Harry — Eu e Rony vimos, lá na casa dele, quanta gente foi às reuniões do sr. Weasley. Pareciam dispostas a depor o ministro se fosse preciso, para frear Voldemort e seus Comensais.

Os dois tremeram ligeiramente à menção daquele nome, mas Harry sequer notou. Seus pensamentos estavam concentrados na Ordem da Fênix. Ele tinha quase certeza que Dumbledore liderava a Ordem. Era bem a cara dele. O velho diretor não entraria em uma guerra declarada contra o ministro, não tendo Voldemort para se preocupar. Criar um poder paralelo, que oferece proteção e age independente lutando contra o Partido das Trevas parecia muito mais eficaz. Harry fantasiou por um momento se ele não se sairia bem como um membro da Ordem, quem sabe Mr. Buzz, o contato.

Najla estava correndo, desabalada, pelos corredores. Quase tropeçou em dois alunos do primeiro ano, e por pouco não bateu de frente com a estátua de uma velha corcunda de um olho só. Quando chegou em frente à porta da sala dos professores, parou para recuperar o fôlego, se apoiando na parede. Deu três batidas na porta, e então entrou. O diretor e todos os professores estavam sentados em volta de uma grande mesa, no meio de uma reunião, à exceção da profª Trelawney que não se encontrava na sala.

— Desculpa interromper — falou, ligeiramente ofegante — mas é que aconteceu... finalmente aconteceu...

— Acalme-se e diga-nos o que aconteceu, senhora — pediu Snape, seu olhar frio mirando a ninfa com desprezo.

— Aqueles horrores... Se juntaram... Abandonaram Azkaban... Se uniram ao Lord das Trevas... Os dementadores... Abandonaram a fortaleza... Eles atenderam ao chamado... Vão se unir ao Lord...

(continua...)