CAPÍTULO 08 - Vítimas e Desculpas
Já estavam na metade da semana, eram mais de nove horas agora e Draco sozinho, se dirigia à sala do espelho. Fazia alguns dias que estava tendo aulas particulares sobre comportamento com Harry, todas as noites sem exceções. Ele e Harry sempre estavam atentos para as aparições repentinas de Filch, mentalmente abalados desde o trágico ocorrido com sua gata. Draco vestia uma enorme capa negra que cobria todo seu corpo deixando apenas a cabeça à amostra, sem contar o capuz caído para trás. Seu passo era um tanto apressado, quase corria pelos corredores vazios, havia se atrasado no banho, e agora tinha que correr.
Um pouco afobado entrou no local.
- Chegou, heim? Aleluia! – Zombou Harry se dirigindo até ele.
- Infelizmente eu me atrasei no banho, Harry! Desculpa! – Explicou-se dando um leve selinho no namorado – Vamos as nossas... hnn... Aulas!
- Claro! – Animou-se Harry indo até o fundo da sala, trazendo consigo na volta uma sacola de papel.
- O que é isso? – Indagou curioso tentando olhar dentro do pacote – Fala logo!
- Calma, me deixe explicar! – Riu empurrando Draco pelo ombro até a parede, fazendo-o sentar – Eu trouxe hoje seu sapato, olha só! – Disse ele tirando um para fora – Você tem de se acostumar a andar de salto alto.
- Olha só este salto! – Balbuciou incrédulo, puxando o exemplar da mão de Harry – Agulha para ajudar, vou acabar me arrebentando no chão se usar isto!
- Deixa de ser bocó! – Exclamou recuperando o objeto – é por isso que estamos aqui! Vamos, vai? Tire logo essa capa e o sapato, e experiente este aqui.
Draco meio incerto obedeceu às ordens, retirando primeiramente a capa pesada, e logo depois seus sapatos lustrosos e com dificuldade calçou os de salto. Por um momento olhou boquiaberto para os próprios pés, totalmente descrente que conseguiria se levantar. Parecendo ler seus pensamentos, Harry estendeu a mão.
- Venha, eu te ajudo!
Draco hesitou um pouco antes de aceitar a ajuda alheia. Quando se convenceu que conseguiria segurou, não a mão, mas sim o braço inteiro de Harry com força. No primeiro instante suas pernas tremeram com a falta de apoio suficiente, deixando-o com um terrível gelo na espinha. Sem aviso, agarrou Harry por de baixo dos braços na altura do peito, tentando ter um pouco mais de apoio e também segurança. Seu pé teimava em virar a cada passo que dava.
- Ouch! – Chiou quando quase caiu, quase levando Harry junto, que apenas se manteve em pé por sorte – Isso é complicado!
- Deu para perceber! – Mofou Harry ajudando-o a se manter em pé segurando-lhe pelos ombros. Eles andando torto pelo aposento escuro, igual a bêbados. – Ai! Cuidado comigo!
- Perdão! – Desculpou-se Draco retirando constrangido o salto agulha do meio do pé do menino – Hunf... Queria ver você manter o controle de seus próprios pés com isto!
- Não, obrigado.
As horas se passaram rapidamente, Draco pegava com certa dificuldade os macetes do andar gingado e delicado das meninas, agora já conseguia se manter em pé por si mesmo e caminhar tranqüilamente. Devagar ia aprendendo a pisar com suavidade e delicadeza, o oposto do seu andar normal. Seus pés estavam doloridos e apertados na ponta fina do sapato, e isso estava lhe rendendo um martírio a mais de duas horas. Sem aviso algum caiu sentado no chão.
- Vamos para por hoje, vai? – Implorou retirando um dos calçados, aproveitando para massagear pé inchado e extremamente dolorido, tendo os dedos dormentes – Daqui a pouco eu não ando mais se continuar assim!
- Para de reclamar, Draco! Você sabe que temos apenas mais três dias para treinarmos, acha que já aprendeu tudo é?
- Mas dói muito... – Choramingou tentando se explicar em vão – Ok... Ok... – Exclamou irritado, calçando mais uma vez o tormento, se levantando logo em seguida, sentindo o pé moldar-se a forma fina – Hug... Tudo isso por causa da sua idéia maluca, nunca mais te dou ouvidos!
- Ah, não diga isso! – Cantarolou Harry abraçando-o, conseguindo prender os braços de Draco entre os dois corpos, deixando-o sem ação – Fiz isso só para ficar mais tempo perto de você!
- Sabia que você não sabe mentir? – Caçoou se livrando meio sem jeito dos braços fortes, saindo por debaixo deles – Mas eu sempre caio direitinho! Incrível!
- É, eu sei...
O relógio anunciou duas da manhã, quando Draco finalmente pode usufruir o seu descanso tanto desejado há tempos, estava quase dormindo apoiado na parede, enquanto assistia Harry tentando também andar com os calçados. Um desafio bem planejado de sua parte lhe garantiu alguns momentos de descontração.
- Como é, Potter? Não consegue andar? Que coisa mais feia...
- Nhé, nhé, nhé... Credo isso é difícil mesmo! Uooh... – Gritou sentindo o chão faltar aos seus pés.
Harry simplesmente não sabia o que realmente havia acontecido, apenas sentira as forças de suas pernas serem tragadas e então seus ossos cederem sobre o peso de seu corpo, lançando-o para frente, de cara no chão. Demorou algum tempo para seu cérebro voltar a funcionar do devido jeito, permitindo que ele ouvisse a gargalhada desenfreada de Draco. No primeiro instante ficou bravo pelo garoto tirar uma com sua cara e não ajudar, mas quando se deu conta de sua posição, entendeu o por que: Ele estava estirado de bruços no chão, com as pernas caídas abertas em ângulos completamente estranhos.
- Você é uma comédia, Potter! – Balbuciou ajudando-o a se levantar – Acho que por hoje já chega, né?
- Ai! Acho melhor que sim! – Massageava o queixo ferido – Vamos então? – Perguntou olhando para o lado onde Draco estava, deparando-se com o vazio.
- Já fui! – Draco respondeu da porta – Beijos!
- Hei... Espera um pouco seu mal agradecido! – Gritou tentando correr para alcançá-lo, mas assim que deu o primeiro passo seus pés viraram, suas pernas dobraram, seu corpo inclinou-se para frente, os braços se precipitaram na frente do corpo para protegê-lo, e novamente se encontrou dolorosamente com o chão.
- O que aconteceu? – Perguntou Draco aparecendo na porta, preocupado com o barulho – Se machucou?
- Mais do que na última vez! Torci o braço... – Murmurou entre os dentes. Seus olhos lacrimejavam por causa da dor excessiva que percorria todo o seu braço – Saco, viu? Vou ter que ir à enfermaria!
- Há essa hora? Tá doido? Ela vai te encher de perguntas...
- Prefiro um interrogatório em plena madrugada, ao invés de ficar sofrendo a noite inteira!
Draco reconsiderou rapidamente. No escuro, seguiam sorrateiramente, a pouco tinham certeza de ter ouvido Filch brigando com as armaduras enferrujadas que ficavam rangendo, o que os deixou ainda mais alarmados. Draco deixou Harry na frente da enfermaria, relembrando-o da história a ser contada.
- Calma! Deixa ver se eu entendi: Eu acordei com um barulho no salão principal, e quando eu estava descendo as escadas, o causador do barulho: Bichento, passou por mim me derrubando! É isso né?
- Exatamente, mas fique atento com o que ela fala... Ela é mestra em fazer perguntas sem nexo, quando entrar lá continue a formular a história. Caso de a louca nela você vai estar preparado...
- Pode deixar! – Confirmou enérgico dando um beijo rápido em Draco antes de entrar.
A sala estava normalmente vazia, com certeza Pomfrey devia estar dormindo a esse horário. Enquanto se dirigia ao quarto de Pomfrey ia pensando em quantas vezes já estivera lá desde o primeiro ano, sozinho ou acompanhado, todo ano se encontrava naquele mesmo lugar. Rindo internamente bateu de leve na porta onde deveria ser o quarto da enfermeira. Não ouve resposta. Não satisfeito bateu mais uma vez, agora mais forte. Para sua surpresa a porta se abriu lentamente com a força aplicada, rangendo bem baixinho.
- Licença... Madame Pomfrey? A senhora está aqui? – Perguntou olhando ao redor, constatando que ali não tinha nada nem ninguém, apenas a cama desarrumada de alguém que não tivera tempo de arrumar – Que estranho... – Murmurou se retirando do aposento lentamente, quando bateu no tórax de alguém bem mais alto do que ele. Meio atordoado olhou para cima – Snape!?
Essa foi a única palavra que soou por seus lábios incrédulos, seus olhos se arregalaram ao ver a presença encorpada do professor. Recuo-o aturdido alguns passos, mas o homem o puxou de volta rapidamente, apanhando- o com força pela roupa.
- Venha comigo, Sr. Potter! – Disse suavemente, sem modificar a expressão tranqüila em seu rosto – Preciso conversar com o senhor...
- O-onde está a Papoula? – Perguntou amedrontado, enquanto era arrastado a força para fora do aposento.
- Teve um probleminha com sua irmã... Teve que sair às presas, por isso me deixou tomando conta da enfermaria... Que coincidência, não?
O sorriso que se formou no rosto de Snape, apavorou Harry ainda mais, foi quando bateu o braço em uma estatueta soltando um lamento.
- Professor... Meu braço está doendo! – Começou ele, sabendo que não estava sendo ouvido, ainda assim insistindo – Eu caí da escada, torci ele...
- E o que eu tenho a ver com isto, rapaz? – Perguntou impaciente.
- Como assim? O senhor é um professor, é responsável pela minha saúde... Apesar de não se importar!
- Não fui eu que o mandei sair às essas horas do dormitório, certo Potter? E isso vai ser apenas mais uma dor!
- O que!? Ai! Me larga! Está me machucando! – Chiou quando Severo tocou o seu braço, agarrando-o pelo braço ferido, puxando sem piedade – Aonde esta me levando?
- Verá quando chegar lá...
Harry protestava com todas as suas forças, não queria ir sabe-se lá para onde com o homem mais odioso de todos, só que ele era muito fraco, não conseguia se livrar das mãos suadas de Snape que, sem esforço aparente, não estava tendo dificuldades em seu transporte.
Snape o empurrou com violência para dentro de um quarto no final de pequeno corredor, seu odor lembrava muito o da floresta proibida, o cheiro de mato, umidade, neblina e madeira. O local era um cubículo apertado e estreito, havia grandes archotes pendurados pelas paredes brancas manchadas por gotas de água viscosa que escorriam do teto, manchando de preto acinzentado. Não se via janela alguma ou então alguma brecha de iluminação alheia àquela proporcionada, tinha uns dois colchões rasgados e maltratados enrolados no canto esquerdo, e uma cadeira prata à direita, forrada de panos das mesmas tonalidades. Quando entrou foi de cara com o chão, sentindo o gosto da poeira que entrou em sua boca, as farpas da madeira podre entrando em seus dedos, foi levantado violentamente pela gola da camisa por trás, quase sendo enforcado. Snape o arremessou contra a parede a sua frente, fazendo Harry bater os ombros, o rosto e os joelhos. Antes que escorregasse para o chão, o homem pressionou seu corpo contra o do menino, enchendo sua mão com os cabelos rebeldes forçando a cabeça de Harry para trás.
- Seu pentelho impertinente! – Bramiu agressivo, colocando sua perna entre as de Harry, prendendo o menino ainda mais – O que anda tramando com o Malfoy?
- O que está dizendo? – Perguntou com dificuldade, o ar custava passar pelo pulmão prensado – Não estou tramando nada...
- Jura? Então por que estão se encontrando todas as noites... Estão deliciando-se todo dia é? Duvido... – Ele ajoelhou Harry com violência nas costas.
- Huf... Eu juro que não é nada! – Insistia a ganas de chorar. Seu corpo doía pedindo um pouco de piedade – Pare com isso, por favor!
Sua resposta foi uma gargalhada fria e cortante, junto com mais um apertão sufocante contra a parede. A única coisa que sentiu antes da perda de consciência foi os dois choques contínuos de sua cabeça contra a parede. As cores se misturaram, os sons sumiram, tudo ficou preto, a dor lacerante cessou, o mundo desabou na sua frente.
Quando acordou, se viu submerso em breu. Que horas deviam ser? Sua cabeça latejava, seu braço ferido estava dormente, tirando o ardor que sentia por outras partes do corpo. Tentou se levantar, mas as amarras que envolviam e apertavam suas mãos e pés o impediram, tinha uma mordaça contra sua boca, amarrada de tal jeito que parecia que ia rasgar os cantos dela. Engasgou um grito de pavor. Ele estava deitado de barriga para baixo em um daqueles colchões velhos, que de tão usados já se dava para sentir o chão por baixo, mas o fato que mais o assustou foi de estar completamente nu, quando virou o rosto raspando no pano putrefato, o sentiu arder ferozmente, devia estar seriamente ferido naquela área. Com grande esforço conseguiu se erguer apoiando-se na parede a suas costas, sentindo a dificuldade de se movimentar com os músculos dormentes. Já sentado passou os braços feridos e doloridos por de baixo das pernas com certo esforço, conseguindo assim retirar a mordaça de suas boca, engolindo um grande gole de ar, suspirando um pouco mais aliviado. Com os dentes ia mordiscando as cordas grossas, puxando e desfiando-as, esse foi o passo mais difícil para Harry, os dentes e a gengiva doíam com a força exagerada para arrancar algo tão duro, mas foi ganhando a luta até as cordas esfiapadas escorregaram pelos seus pulsos em encontro ao chão. Desamarrou as pernas com pressa, queria sair de lá o quanto antes.
Cegamente, foi apalpando o chão em busca das suas vestes, ele não deveria ter muita dificuldade em fazer isso, já que o lugar era tão pequenino. E realmente aconteceu o que ele previa, pouco tempo depois encontrou num canto distante alguns panos, que concluiu serem suas roupas, mas para garantir os revirou de todas as formas possíveis a procura de sua varinha, como suspeitava, ela caiu entre suas coxas.
- Lumos... – Murmurou rouco, e o aposento se iluminou por inteiro, continuava o mesmo de antes, a única diferença era a parede manchada com o seu sangue, isso o fez sentir um calafrio. Então olhou para si mesmo. Hematomas se evidenciavam em sua pele branca, roxos esparramados em diversas partes, cortes nas pernas e braços, arranhões vermelhos e sangue seco, um arrepio lhe percorreu a espinha ao pensar o que podia ter acontecido com ele em seus momentos de inconsciência.
Tentando deixar para lado esses pensamentos, se vestiu apressado não ligando para a dor que percorria todo seu corpo, carregou a gravata dentro do bolso do casaco, e os sapatos nas mãos esfoladas. Abriu a porta com a ajuda de sua varinha, espiando para fora. Ainda devia ser madrugada julgando pela iluminação fraca do local. Mancando com desespero, chegou rapidamente na torre da Grifinória, acabando por assustar o quadro que dormia a sono alto.
- Meu Deus, menino! O que foi que te aconteceu?
- Se tem piedade de mim senhora, abra essa passagem – Implorou desejando loucamente um bom banho e cama – Minotauro!
- Como quiser! – Concordou ainda confusa, achando melhor não discutir agora. Sem nem mais uma palavra rodou para o alado, liberando a passagem.
Cambaleante subiu lentamente as escadarias da Grifinória, não pensou nos amigos que ali estavam, nas roupas ou nas horas, apenas queria se livrar daquela sensação desagradável. Ligou o chuveiro ao máximo, deixando a água bem fria, entrou com as vestes e os óculos embaixo dela. Despiu-se lá dentro, lavando com cuidado os ferimentos sujos, não havia milímetro algum de seu corpo que não doesse, mas afinal de contas, o que tinha acontecido? Não lembrava de nada, tinha até medo de pensar nisto, as imagens que afloravam em sua mente não eram agradáveis, nem aconchegantes.
Secou-se com a toalha mais próxima, a enrolando na cintura, um pouco relutante se dirigiu à frente do espelho manchado pelos vapores. A cena não o agradou: seu rosto estava inchado e vermelho, um dos olhos estava roxo na parte de baixo, na boca se encontrava diversos cortes, tinha um rasgo transversal na sobrancelha e seu nariz insistia em doer. Virou o rosto bruscamente, revoltado com tal imagem, vestindo-se com inquietação. Por mais que não tentasse não pensar em nada, seu cérebro insistia a continuar funcionando a mil por hora, a primeira coisa que passou por sua cabeça foi que não tinha condições de ir para aula no dia seguinte. Como iria explicar aquela aparência assustadora aos professores, amigos e Draco? Outro problema o pegou desprevenido, como ia contar ao garoto? Não queria preocupação da parte dele, se sentia encurralado.
Deitou-se na cama com um rangido fraco do estrado, enrolou-se por inteiro nos edredons vermelhos deixando apenas as pontas dos cabelos para fora, ia pensar isso na manhã seguinte, não tinha condições de fazer isso no momento.
* * *
A aula última aula do dia, transfiguração, acabara de começar, todos estavam empolgados com as novas artes aprendidas, eram mais inteligentes e úteis. Rony e Hermione estavam sentados nas primeiras carteiras, quase de frente para a professora, e igual ao resto da classe, conversavam entusiasmados antes da professora chegar.
- Pois é Hermione... Ele nem me deixou ver o rosto dele – Cochichava Rony bem próximo à menina – Eu realmente não estou entendendo mais nada, ele disse que não vai aparecer hoje!
- Então somos dois desentendidos, Harry nunca foi de fazer estas coisas, por que não quer vir à aula? Você insistiu em vê-lo?
- Um pouco, queria saber o que acontecia, mas ele tava todo enrolado, não tive nem chance. Quando me aproximei, ele me afastou rapidamente de perto da cama com os pés...
- Estranho, estranho e estranho! – Balbuciou ela se endireitando na carteira cruzando o braço irritada – Sei que tem coisa ai! Pode ser que tenha algo em comum com aquele caso do Severo.
- Duvido – Replicou – Ele nos contaria... Bem, acho que contaria né? – A dúvida o pegou.
- Não sei Ron... Simplesmente não sei... E o pior que todos os professores já perguntaram sobre ele, sabe o que é ter que mentir para todos eles? Saco!
- Relaxa Hermione, a professora acabou de chegar... Depois vemos isso!
* * *
Encoberto pela capa da invisibilidade, Harry se dirigia rapidamente para enfermaria, havia ouvido alguns garotos corvinais comentarem sobre o assunto.
~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~ [Meninos no corredor]
- E a Pomfrey? – Perguntou o primeiro menino escrevendo algo na mão.
- Não sei... Pelo jeito teve que sair às pressas ontem à noite... Algo com a irmã dela eu acho... Pelo menos foi isso que eu ouvi!
- Sabe se tem alguém no lugar dela? – Perguntou um terceiro.
- Sim, ela assumiu o cargo hoje depois do almoço, é uma moça bem boazinha... Bem, pelo menos ela parece ser, eu acho! Mas é melhor do que nada!
- Hum... Espero que a Papoula volte logo – Disse um outro – Gosto mais dela.
- Eu também! – Respondeu o primeiro.
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Retirou a capa apenas depois que viu a tal pessoa que o grupinho falava. Era uma mulher de meia idade, alta, com os cabelos curtos repicados para cima, loiros. Usava um vestido trouxa branco e por cima as vestes pretas de Hogwarts abertas, olhos eram azuis claros, quase cristalinos. Tirou a capa e timidamente chegou perto dela.
- Com licença!
- Pois não – Virou o rosto quadrado para ele, espantando-se logo em seguida – Meu Deus, garoto! O que foi que aconteceu?
Harry mal teve tempo de abrir a boca para responder algo, logo a mulher o estava empurrando para cima de uma cama.
- Sente-se aqui... Brigou com alguém?
- N-não... Caí da escada.
- Jura? – Ironizou com um meio sorriso – Sendo sincera com você, isso não parece ser verdade! Alguns degraus podem quebrar ossos e deixar roxos mais claros do que estes... E se as escadas das casas não mudaram desde que eu me formei... Tenho certeza que elas não causam isso, centenas de cortes e arranhões... Conte-me a verdade, sim!
- Não posso... – Balbuciou constrangido – Perdão, mas não posso dizer.
- Não vou te obrigar, mas vê se toma mais cuidado a partir de agora, certo?
- Claro! Obrigado.
- Não precisa agradecer – Disse ela enquanto cicatrizava os cortes em seus lábios com uma pasta que cheirava fortemente a gasolina – Esse é o meu trabalho, não é?
Ele riria se pudesse, mas seus lábios se encontravam dormentes agora, e pouco a pouco a dor ia cessando, e as marcas sumindo.
- Nossa! Esse braço está destruído! – Exclamou assustada levando a mão a boca – Além dos danos superficiais, ainda se pode encontrar grande desgaste nos ossos, não sei o que ou quem fez isso com você... Mas é um monstro!
Harry sorriu em pensamentos, concordava com tudo o que ela dizia e mais um pouco.
* * *
Já era hora do jantar, e Draco estava sentado entre os dois gorilas, que por sinal não se falavam há vários dias, pensando em Harry "Ai que saco, cadê ele? Não o vi o dia inteiro... Sumiu! Na enfermaria não pode estar, já que a enfermeira não está lá. Não o vi com os amigos, nem na biblioteca, muito menos nos jardins... Será que... Não, isso não... Pensamento absurdo" Balançou a cabeça negativamente quando sua atenção foi chamada de volta à realidade.
- Hã, Draco... Posso falar com você? – Era Pansy – Tem um minutinho?
- Depende, Pansy... Pra que?
- Er... Eu queria te pedir desculpas por aquele incidente...
- Que incidente? Do que está falando, Pansy? – Perguntava impaciente, não tinha paciência para ela.
- Oras Draco, você sabe muito bem do que eu estou falando... Aquele dia no almoço, lembra? Não me diga que esqueceu tamanho barraco...
- Sei, sei, o que é que tem? – Estava irritado.
- Então? Me perdoa? – Insistia perseverante no seu desejo, para Draco a única coisa que faltava era ela cair de joelhos lhe implorando clemência – Heim?
- Por favor, me deixa em paz Parkinson, eu não quero nada de você, nem sua amizade, seu amor... Nada! – Dizia calmamente com uma nota grave em sua voz, encarando a garota com severidade.
- Pelo amor de Deus, Draco! Não faz isso comigo... O que fiz para merecer tal humilhação? – Os olhos pequeninos se enchiam de lágrimas.
- Foi por tua culpa que eu cai nas garras daquele monstro...– Grunhiu Draco, seu olhar mostrando toda a cólera desenfreada que se apoderava dele – Sua culpa, Pansy!
- Dá um tempo aí Draco... Do que você esta falando? Sinto muito, mas não estou ciente de ter feito nada contra a tua pessoa, e que monstro é este? – Agora as lágrimas perdiam seu lugar para a desconfiança e autodefesa – É uma injustiça lançar este peso contra mim, que sempre te quis bem!
- Consciente ou não, foi essa sua insistência ridícula que causou tudo! – Eles ainda não estavam gritando, mas já chamavam a atenção dos colegas sonserinos que paravam de comer para prestar melhor atenção. Draco percebeu isso.
- Tudo o que? Fale claramente, sim...
- Vem comigo, Pansy! – Ordenou ele puxando-a para fora da mesa.
- Ei, aonde pensa que esta indo? Me larga! – Dizia ela, mas apenas da boca para fora, pois não fazia nada para se livrar dele – Draco, você está me assustando... Todo mundo está olhando, até aquela ignorante da Granger! – Guinchava afobada.
- Calma...
Draco a levou para fora do castelo, em direção ao jardim, mas não parou por ai, continuou avançando até a margem do lago onde a soltou finalmente. Ela se esquivou de seu alcance assim que se sentiu livre.
- Agora fala! – Determinou agressiva – Eu juro que não sei nada sobre o que você sta falando, Draco! Qual foi o meu pecado?
- Ser idiota o suficiente para não ver quando não é querida – Disse ele cruelmente – Sempre se fez de cega Pansy, sabe que nunca te dei bola, mas em vez de desistir, ficou me azucrinando e acabou mesmo que sem querer, me jogando para cima daquele ser agourento.
- OK. Já sei essa parte, estou acostumada com suas ofensas sem base, sei que insisti demais por algo talvez impossível, garanto que não sou burra – Ela sabia muito bem o que fazia – Mas quem é este tal monstro que te causa tanto pavor?
- Isso não te interessa Pansy...
- Já que não tenho o direito de saber o porque de tal rude acusação, poderia ao menos me perdoar? – Encerrou a discussão.
Estava atormentado, se não a perdoasse com certeza ela ficaria lhe enchendo a paciência por um bom tempo. Então vencendo seu próprio orgulho, que era muito grande, aceitou.
- Tá bom, pronto! Desculpada... E satisfeita também? – Ironizou nervoso.
- Muito! Mas você ainda vai me contar o seu segredo, ah, se vai!– Disse ela decisiva, indo embora para o castelo, não mostrando sua felicidade.
Draco revirou os olhos, voltando sua atenção para a água.
* * *
Harry havia perdido praticamente sua noite inteira, tendo que explicar o seu sumiço aos dois amigos exasperados. Pensou em contar uma mentira, mas resolveu contar uma verdade modificada, parecida com a real, o que era bem mais fácil. Hermione ficou incrédula, enquanto Rony arregalava os olhos, abismado.
- Meu Deus, como ele pode fazer isso? – Gritou Hermione batendo na mesa com os punhos fechados – Ele devia estar bêbado, se tivesse em condições normais, nunca faria isso... Ainda, mas dentro do colégio com o risco de ser pego por qualquer um!
- Mas ele fez... E muito sóbrio! – Afirmou Harry acariciando o braço enfaixado – Não entendi bem o porque... Acho que ele desconfia de algo.
- Isso quer dizer que ele pode vir atrás de mim e da Hermione?
- Sim e não Rony.
- Não estou entendendo! Como sim e não? Um ou outro, por favor!
Harry suspirou fundo se jogando para trás de encontro ao encosto, fechando os olhos.
- Não tenho certeza, mas ele acha que eu estou planejando tudo sozinho! – Esfregou os olhos com as pontas dos dedos.
- Sozinho!? – Ecoou Hermione quase rindo – Realmente ele é doido! Não que você não fosse capaz Harry, nada disso! – Adicionou ao ver a expressão irritada do menino.
- Eu concordo com a Hermione, afinal de contas nós sempre planejamos tudo juntos... Não seria estranho demais você querer resolver tudo sozinho, assim de repente? – Interveio Rony.
- Eu sei, eu sei disso! Só não sei como funciona a cabeça dele! Você sabe? E você? – Olhou primeiro para Rony, depois para Hermione – Quero uma resposta... – Cantarolou.
- Ok! Está certo, uma mente daquela é incompreensível! – Concordou Rony revirando os olhos.
- De todo modo, até o dia do baile temos que ficar alertas! Ele desconfiado ou não da nossa participação nisso, continua perigoso! – Resmungou Hermione mau-humorada – Saco, este maldito baile que não chega... Não me sinto mais à vontade, nem na minha própria escola!
- Mais dois dias e tudo acaba... Ai, ai – Suspirou - Isso parece uma eternidade, sabia?
- E como Rony! E como!
Continua...
Já estavam na metade da semana, eram mais de nove horas agora e Draco sozinho, se dirigia à sala do espelho. Fazia alguns dias que estava tendo aulas particulares sobre comportamento com Harry, todas as noites sem exceções. Ele e Harry sempre estavam atentos para as aparições repentinas de Filch, mentalmente abalados desde o trágico ocorrido com sua gata. Draco vestia uma enorme capa negra que cobria todo seu corpo deixando apenas a cabeça à amostra, sem contar o capuz caído para trás. Seu passo era um tanto apressado, quase corria pelos corredores vazios, havia se atrasado no banho, e agora tinha que correr.
Um pouco afobado entrou no local.
- Chegou, heim? Aleluia! – Zombou Harry se dirigindo até ele.
- Infelizmente eu me atrasei no banho, Harry! Desculpa! – Explicou-se dando um leve selinho no namorado – Vamos as nossas... hnn... Aulas!
- Claro! – Animou-se Harry indo até o fundo da sala, trazendo consigo na volta uma sacola de papel.
- O que é isso? – Indagou curioso tentando olhar dentro do pacote – Fala logo!
- Calma, me deixe explicar! – Riu empurrando Draco pelo ombro até a parede, fazendo-o sentar – Eu trouxe hoje seu sapato, olha só! – Disse ele tirando um para fora – Você tem de se acostumar a andar de salto alto.
- Olha só este salto! – Balbuciou incrédulo, puxando o exemplar da mão de Harry – Agulha para ajudar, vou acabar me arrebentando no chão se usar isto!
- Deixa de ser bocó! – Exclamou recuperando o objeto – é por isso que estamos aqui! Vamos, vai? Tire logo essa capa e o sapato, e experiente este aqui.
Draco meio incerto obedeceu às ordens, retirando primeiramente a capa pesada, e logo depois seus sapatos lustrosos e com dificuldade calçou os de salto. Por um momento olhou boquiaberto para os próprios pés, totalmente descrente que conseguiria se levantar. Parecendo ler seus pensamentos, Harry estendeu a mão.
- Venha, eu te ajudo!
Draco hesitou um pouco antes de aceitar a ajuda alheia. Quando se convenceu que conseguiria segurou, não a mão, mas sim o braço inteiro de Harry com força. No primeiro instante suas pernas tremeram com a falta de apoio suficiente, deixando-o com um terrível gelo na espinha. Sem aviso, agarrou Harry por de baixo dos braços na altura do peito, tentando ter um pouco mais de apoio e também segurança. Seu pé teimava em virar a cada passo que dava.
- Ouch! – Chiou quando quase caiu, quase levando Harry junto, que apenas se manteve em pé por sorte – Isso é complicado!
- Deu para perceber! – Mofou Harry ajudando-o a se manter em pé segurando-lhe pelos ombros. Eles andando torto pelo aposento escuro, igual a bêbados. – Ai! Cuidado comigo!
- Perdão! – Desculpou-se Draco retirando constrangido o salto agulha do meio do pé do menino – Hunf... Queria ver você manter o controle de seus próprios pés com isto!
- Não, obrigado.
As horas se passaram rapidamente, Draco pegava com certa dificuldade os macetes do andar gingado e delicado das meninas, agora já conseguia se manter em pé por si mesmo e caminhar tranqüilamente. Devagar ia aprendendo a pisar com suavidade e delicadeza, o oposto do seu andar normal. Seus pés estavam doloridos e apertados na ponta fina do sapato, e isso estava lhe rendendo um martírio a mais de duas horas. Sem aviso algum caiu sentado no chão.
- Vamos para por hoje, vai? – Implorou retirando um dos calçados, aproveitando para massagear pé inchado e extremamente dolorido, tendo os dedos dormentes – Daqui a pouco eu não ando mais se continuar assim!
- Para de reclamar, Draco! Você sabe que temos apenas mais três dias para treinarmos, acha que já aprendeu tudo é?
- Mas dói muito... – Choramingou tentando se explicar em vão – Ok... Ok... – Exclamou irritado, calçando mais uma vez o tormento, se levantando logo em seguida, sentindo o pé moldar-se a forma fina – Hug... Tudo isso por causa da sua idéia maluca, nunca mais te dou ouvidos!
- Ah, não diga isso! – Cantarolou Harry abraçando-o, conseguindo prender os braços de Draco entre os dois corpos, deixando-o sem ação – Fiz isso só para ficar mais tempo perto de você!
- Sabia que você não sabe mentir? – Caçoou se livrando meio sem jeito dos braços fortes, saindo por debaixo deles – Mas eu sempre caio direitinho! Incrível!
- É, eu sei...
O relógio anunciou duas da manhã, quando Draco finalmente pode usufruir o seu descanso tanto desejado há tempos, estava quase dormindo apoiado na parede, enquanto assistia Harry tentando também andar com os calçados. Um desafio bem planejado de sua parte lhe garantiu alguns momentos de descontração.
- Como é, Potter? Não consegue andar? Que coisa mais feia...
- Nhé, nhé, nhé... Credo isso é difícil mesmo! Uooh... – Gritou sentindo o chão faltar aos seus pés.
Harry simplesmente não sabia o que realmente havia acontecido, apenas sentira as forças de suas pernas serem tragadas e então seus ossos cederem sobre o peso de seu corpo, lançando-o para frente, de cara no chão. Demorou algum tempo para seu cérebro voltar a funcionar do devido jeito, permitindo que ele ouvisse a gargalhada desenfreada de Draco. No primeiro instante ficou bravo pelo garoto tirar uma com sua cara e não ajudar, mas quando se deu conta de sua posição, entendeu o por que: Ele estava estirado de bruços no chão, com as pernas caídas abertas em ângulos completamente estranhos.
- Você é uma comédia, Potter! – Balbuciou ajudando-o a se levantar – Acho que por hoje já chega, né?
- Ai! Acho melhor que sim! – Massageava o queixo ferido – Vamos então? – Perguntou olhando para o lado onde Draco estava, deparando-se com o vazio.
- Já fui! – Draco respondeu da porta – Beijos!
- Hei... Espera um pouco seu mal agradecido! – Gritou tentando correr para alcançá-lo, mas assim que deu o primeiro passo seus pés viraram, suas pernas dobraram, seu corpo inclinou-se para frente, os braços se precipitaram na frente do corpo para protegê-lo, e novamente se encontrou dolorosamente com o chão.
- O que aconteceu? – Perguntou Draco aparecendo na porta, preocupado com o barulho – Se machucou?
- Mais do que na última vez! Torci o braço... – Murmurou entre os dentes. Seus olhos lacrimejavam por causa da dor excessiva que percorria todo o seu braço – Saco, viu? Vou ter que ir à enfermaria!
- Há essa hora? Tá doido? Ela vai te encher de perguntas...
- Prefiro um interrogatório em plena madrugada, ao invés de ficar sofrendo a noite inteira!
Draco reconsiderou rapidamente. No escuro, seguiam sorrateiramente, a pouco tinham certeza de ter ouvido Filch brigando com as armaduras enferrujadas que ficavam rangendo, o que os deixou ainda mais alarmados. Draco deixou Harry na frente da enfermaria, relembrando-o da história a ser contada.
- Calma! Deixa ver se eu entendi: Eu acordei com um barulho no salão principal, e quando eu estava descendo as escadas, o causador do barulho: Bichento, passou por mim me derrubando! É isso né?
- Exatamente, mas fique atento com o que ela fala... Ela é mestra em fazer perguntas sem nexo, quando entrar lá continue a formular a história. Caso de a louca nela você vai estar preparado...
- Pode deixar! – Confirmou enérgico dando um beijo rápido em Draco antes de entrar.
A sala estava normalmente vazia, com certeza Pomfrey devia estar dormindo a esse horário. Enquanto se dirigia ao quarto de Pomfrey ia pensando em quantas vezes já estivera lá desde o primeiro ano, sozinho ou acompanhado, todo ano se encontrava naquele mesmo lugar. Rindo internamente bateu de leve na porta onde deveria ser o quarto da enfermeira. Não ouve resposta. Não satisfeito bateu mais uma vez, agora mais forte. Para sua surpresa a porta se abriu lentamente com a força aplicada, rangendo bem baixinho.
- Licença... Madame Pomfrey? A senhora está aqui? – Perguntou olhando ao redor, constatando que ali não tinha nada nem ninguém, apenas a cama desarrumada de alguém que não tivera tempo de arrumar – Que estranho... – Murmurou se retirando do aposento lentamente, quando bateu no tórax de alguém bem mais alto do que ele. Meio atordoado olhou para cima – Snape!?
Essa foi a única palavra que soou por seus lábios incrédulos, seus olhos se arregalaram ao ver a presença encorpada do professor. Recuo-o aturdido alguns passos, mas o homem o puxou de volta rapidamente, apanhando- o com força pela roupa.
- Venha comigo, Sr. Potter! – Disse suavemente, sem modificar a expressão tranqüila em seu rosto – Preciso conversar com o senhor...
- O-onde está a Papoula? – Perguntou amedrontado, enquanto era arrastado a força para fora do aposento.
- Teve um probleminha com sua irmã... Teve que sair às presas, por isso me deixou tomando conta da enfermaria... Que coincidência, não?
O sorriso que se formou no rosto de Snape, apavorou Harry ainda mais, foi quando bateu o braço em uma estatueta soltando um lamento.
- Professor... Meu braço está doendo! – Começou ele, sabendo que não estava sendo ouvido, ainda assim insistindo – Eu caí da escada, torci ele...
- E o que eu tenho a ver com isto, rapaz? – Perguntou impaciente.
- Como assim? O senhor é um professor, é responsável pela minha saúde... Apesar de não se importar!
- Não fui eu que o mandei sair às essas horas do dormitório, certo Potter? E isso vai ser apenas mais uma dor!
- O que!? Ai! Me larga! Está me machucando! – Chiou quando Severo tocou o seu braço, agarrando-o pelo braço ferido, puxando sem piedade – Aonde esta me levando?
- Verá quando chegar lá...
Harry protestava com todas as suas forças, não queria ir sabe-se lá para onde com o homem mais odioso de todos, só que ele era muito fraco, não conseguia se livrar das mãos suadas de Snape que, sem esforço aparente, não estava tendo dificuldades em seu transporte.
Snape o empurrou com violência para dentro de um quarto no final de pequeno corredor, seu odor lembrava muito o da floresta proibida, o cheiro de mato, umidade, neblina e madeira. O local era um cubículo apertado e estreito, havia grandes archotes pendurados pelas paredes brancas manchadas por gotas de água viscosa que escorriam do teto, manchando de preto acinzentado. Não se via janela alguma ou então alguma brecha de iluminação alheia àquela proporcionada, tinha uns dois colchões rasgados e maltratados enrolados no canto esquerdo, e uma cadeira prata à direita, forrada de panos das mesmas tonalidades. Quando entrou foi de cara com o chão, sentindo o gosto da poeira que entrou em sua boca, as farpas da madeira podre entrando em seus dedos, foi levantado violentamente pela gola da camisa por trás, quase sendo enforcado. Snape o arremessou contra a parede a sua frente, fazendo Harry bater os ombros, o rosto e os joelhos. Antes que escorregasse para o chão, o homem pressionou seu corpo contra o do menino, enchendo sua mão com os cabelos rebeldes forçando a cabeça de Harry para trás.
- Seu pentelho impertinente! – Bramiu agressivo, colocando sua perna entre as de Harry, prendendo o menino ainda mais – O que anda tramando com o Malfoy?
- O que está dizendo? – Perguntou com dificuldade, o ar custava passar pelo pulmão prensado – Não estou tramando nada...
- Jura? Então por que estão se encontrando todas as noites... Estão deliciando-se todo dia é? Duvido... – Ele ajoelhou Harry com violência nas costas.
- Huf... Eu juro que não é nada! – Insistia a ganas de chorar. Seu corpo doía pedindo um pouco de piedade – Pare com isso, por favor!
Sua resposta foi uma gargalhada fria e cortante, junto com mais um apertão sufocante contra a parede. A única coisa que sentiu antes da perda de consciência foi os dois choques contínuos de sua cabeça contra a parede. As cores se misturaram, os sons sumiram, tudo ficou preto, a dor lacerante cessou, o mundo desabou na sua frente.
Quando acordou, se viu submerso em breu. Que horas deviam ser? Sua cabeça latejava, seu braço ferido estava dormente, tirando o ardor que sentia por outras partes do corpo. Tentou se levantar, mas as amarras que envolviam e apertavam suas mãos e pés o impediram, tinha uma mordaça contra sua boca, amarrada de tal jeito que parecia que ia rasgar os cantos dela. Engasgou um grito de pavor. Ele estava deitado de barriga para baixo em um daqueles colchões velhos, que de tão usados já se dava para sentir o chão por baixo, mas o fato que mais o assustou foi de estar completamente nu, quando virou o rosto raspando no pano putrefato, o sentiu arder ferozmente, devia estar seriamente ferido naquela área. Com grande esforço conseguiu se erguer apoiando-se na parede a suas costas, sentindo a dificuldade de se movimentar com os músculos dormentes. Já sentado passou os braços feridos e doloridos por de baixo das pernas com certo esforço, conseguindo assim retirar a mordaça de suas boca, engolindo um grande gole de ar, suspirando um pouco mais aliviado. Com os dentes ia mordiscando as cordas grossas, puxando e desfiando-as, esse foi o passo mais difícil para Harry, os dentes e a gengiva doíam com a força exagerada para arrancar algo tão duro, mas foi ganhando a luta até as cordas esfiapadas escorregaram pelos seus pulsos em encontro ao chão. Desamarrou as pernas com pressa, queria sair de lá o quanto antes.
Cegamente, foi apalpando o chão em busca das suas vestes, ele não deveria ter muita dificuldade em fazer isso, já que o lugar era tão pequenino. E realmente aconteceu o que ele previa, pouco tempo depois encontrou num canto distante alguns panos, que concluiu serem suas roupas, mas para garantir os revirou de todas as formas possíveis a procura de sua varinha, como suspeitava, ela caiu entre suas coxas.
- Lumos... – Murmurou rouco, e o aposento se iluminou por inteiro, continuava o mesmo de antes, a única diferença era a parede manchada com o seu sangue, isso o fez sentir um calafrio. Então olhou para si mesmo. Hematomas se evidenciavam em sua pele branca, roxos esparramados em diversas partes, cortes nas pernas e braços, arranhões vermelhos e sangue seco, um arrepio lhe percorreu a espinha ao pensar o que podia ter acontecido com ele em seus momentos de inconsciência.
Tentando deixar para lado esses pensamentos, se vestiu apressado não ligando para a dor que percorria todo seu corpo, carregou a gravata dentro do bolso do casaco, e os sapatos nas mãos esfoladas. Abriu a porta com a ajuda de sua varinha, espiando para fora. Ainda devia ser madrugada julgando pela iluminação fraca do local. Mancando com desespero, chegou rapidamente na torre da Grifinória, acabando por assustar o quadro que dormia a sono alto.
- Meu Deus, menino! O que foi que te aconteceu?
- Se tem piedade de mim senhora, abra essa passagem – Implorou desejando loucamente um bom banho e cama – Minotauro!
- Como quiser! – Concordou ainda confusa, achando melhor não discutir agora. Sem nem mais uma palavra rodou para o alado, liberando a passagem.
Cambaleante subiu lentamente as escadarias da Grifinória, não pensou nos amigos que ali estavam, nas roupas ou nas horas, apenas queria se livrar daquela sensação desagradável. Ligou o chuveiro ao máximo, deixando a água bem fria, entrou com as vestes e os óculos embaixo dela. Despiu-se lá dentro, lavando com cuidado os ferimentos sujos, não havia milímetro algum de seu corpo que não doesse, mas afinal de contas, o que tinha acontecido? Não lembrava de nada, tinha até medo de pensar nisto, as imagens que afloravam em sua mente não eram agradáveis, nem aconchegantes.
Secou-se com a toalha mais próxima, a enrolando na cintura, um pouco relutante se dirigiu à frente do espelho manchado pelos vapores. A cena não o agradou: seu rosto estava inchado e vermelho, um dos olhos estava roxo na parte de baixo, na boca se encontrava diversos cortes, tinha um rasgo transversal na sobrancelha e seu nariz insistia em doer. Virou o rosto bruscamente, revoltado com tal imagem, vestindo-se com inquietação. Por mais que não tentasse não pensar em nada, seu cérebro insistia a continuar funcionando a mil por hora, a primeira coisa que passou por sua cabeça foi que não tinha condições de ir para aula no dia seguinte. Como iria explicar aquela aparência assustadora aos professores, amigos e Draco? Outro problema o pegou desprevenido, como ia contar ao garoto? Não queria preocupação da parte dele, se sentia encurralado.
Deitou-se na cama com um rangido fraco do estrado, enrolou-se por inteiro nos edredons vermelhos deixando apenas as pontas dos cabelos para fora, ia pensar isso na manhã seguinte, não tinha condições de fazer isso no momento.
* * *
A aula última aula do dia, transfiguração, acabara de começar, todos estavam empolgados com as novas artes aprendidas, eram mais inteligentes e úteis. Rony e Hermione estavam sentados nas primeiras carteiras, quase de frente para a professora, e igual ao resto da classe, conversavam entusiasmados antes da professora chegar.
- Pois é Hermione... Ele nem me deixou ver o rosto dele – Cochichava Rony bem próximo à menina – Eu realmente não estou entendendo mais nada, ele disse que não vai aparecer hoje!
- Então somos dois desentendidos, Harry nunca foi de fazer estas coisas, por que não quer vir à aula? Você insistiu em vê-lo?
- Um pouco, queria saber o que acontecia, mas ele tava todo enrolado, não tive nem chance. Quando me aproximei, ele me afastou rapidamente de perto da cama com os pés...
- Estranho, estranho e estranho! – Balbuciou ela se endireitando na carteira cruzando o braço irritada – Sei que tem coisa ai! Pode ser que tenha algo em comum com aquele caso do Severo.
- Duvido – Replicou – Ele nos contaria... Bem, acho que contaria né? – A dúvida o pegou.
- Não sei Ron... Simplesmente não sei... E o pior que todos os professores já perguntaram sobre ele, sabe o que é ter que mentir para todos eles? Saco!
- Relaxa Hermione, a professora acabou de chegar... Depois vemos isso!
* * *
Encoberto pela capa da invisibilidade, Harry se dirigia rapidamente para enfermaria, havia ouvido alguns garotos corvinais comentarem sobre o assunto.
~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~ [Meninos no corredor]
- E a Pomfrey? – Perguntou o primeiro menino escrevendo algo na mão.
- Não sei... Pelo jeito teve que sair às pressas ontem à noite... Algo com a irmã dela eu acho... Pelo menos foi isso que eu ouvi!
- Sabe se tem alguém no lugar dela? – Perguntou um terceiro.
- Sim, ela assumiu o cargo hoje depois do almoço, é uma moça bem boazinha... Bem, pelo menos ela parece ser, eu acho! Mas é melhor do que nada!
- Hum... Espero que a Papoula volte logo – Disse um outro – Gosto mais dela.
- Eu também! – Respondeu o primeiro.
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Retirou a capa apenas depois que viu a tal pessoa que o grupinho falava. Era uma mulher de meia idade, alta, com os cabelos curtos repicados para cima, loiros. Usava um vestido trouxa branco e por cima as vestes pretas de Hogwarts abertas, olhos eram azuis claros, quase cristalinos. Tirou a capa e timidamente chegou perto dela.
- Com licença!
- Pois não – Virou o rosto quadrado para ele, espantando-se logo em seguida – Meu Deus, garoto! O que foi que aconteceu?
Harry mal teve tempo de abrir a boca para responder algo, logo a mulher o estava empurrando para cima de uma cama.
- Sente-se aqui... Brigou com alguém?
- N-não... Caí da escada.
- Jura? – Ironizou com um meio sorriso – Sendo sincera com você, isso não parece ser verdade! Alguns degraus podem quebrar ossos e deixar roxos mais claros do que estes... E se as escadas das casas não mudaram desde que eu me formei... Tenho certeza que elas não causam isso, centenas de cortes e arranhões... Conte-me a verdade, sim!
- Não posso... – Balbuciou constrangido – Perdão, mas não posso dizer.
- Não vou te obrigar, mas vê se toma mais cuidado a partir de agora, certo?
- Claro! Obrigado.
- Não precisa agradecer – Disse ela enquanto cicatrizava os cortes em seus lábios com uma pasta que cheirava fortemente a gasolina – Esse é o meu trabalho, não é?
Ele riria se pudesse, mas seus lábios se encontravam dormentes agora, e pouco a pouco a dor ia cessando, e as marcas sumindo.
- Nossa! Esse braço está destruído! – Exclamou assustada levando a mão a boca – Além dos danos superficiais, ainda se pode encontrar grande desgaste nos ossos, não sei o que ou quem fez isso com você... Mas é um monstro!
Harry sorriu em pensamentos, concordava com tudo o que ela dizia e mais um pouco.
* * *
Já era hora do jantar, e Draco estava sentado entre os dois gorilas, que por sinal não se falavam há vários dias, pensando em Harry "Ai que saco, cadê ele? Não o vi o dia inteiro... Sumiu! Na enfermaria não pode estar, já que a enfermeira não está lá. Não o vi com os amigos, nem na biblioteca, muito menos nos jardins... Será que... Não, isso não... Pensamento absurdo" Balançou a cabeça negativamente quando sua atenção foi chamada de volta à realidade.
- Hã, Draco... Posso falar com você? – Era Pansy – Tem um minutinho?
- Depende, Pansy... Pra que?
- Er... Eu queria te pedir desculpas por aquele incidente...
- Que incidente? Do que está falando, Pansy? – Perguntava impaciente, não tinha paciência para ela.
- Oras Draco, você sabe muito bem do que eu estou falando... Aquele dia no almoço, lembra? Não me diga que esqueceu tamanho barraco...
- Sei, sei, o que é que tem? – Estava irritado.
- Então? Me perdoa? – Insistia perseverante no seu desejo, para Draco a única coisa que faltava era ela cair de joelhos lhe implorando clemência – Heim?
- Por favor, me deixa em paz Parkinson, eu não quero nada de você, nem sua amizade, seu amor... Nada! – Dizia calmamente com uma nota grave em sua voz, encarando a garota com severidade.
- Pelo amor de Deus, Draco! Não faz isso comigo... O que fiz para merecer tal humilhação? – Os olhos pequeninos se enchiam de lágrimas.
- Foi por tua culpa que eu cai nas garras daquele monstro...– Grunhiu Draco, seu olhar mostrando toda a cólera desenfreada que se apoderava dele – Sua culpa, Pansy!
- Dá um tempo aí Draco... Do que você esta falando? Sinto muito, mas não estou ciente de ter feito nada contra a tua pessoa, e que monstro é este? – Agora as lágrimas perdiam seu lugar para a desconfiança e autodefesa – É uma injustiça lançar este peso contra mim, que sempre te quis bem!
- Consciente ou não, foi essa sua insistência ridícula que causou tudo! – Eles ainda não estavam gritando, mas já chamavam a atenção dos colegas sonserinos que paravam de comer para prestar melhor atenção. Draco percebeu isso.
- Tudo o que? Fale claramente, sim...
- Vem comigo, Pansy! – Ordenou ele puxando-a para fora da mesa.
- Ei, aonde pensa que esta indo? Me larga! – Dizia ela, mas apenas da boca para fora, pois não fazia nada para se livrar dele – Draco, você está me assustando... Todo mundo está olhando, até aquela ignorante da Granger! – Guinchava afobada.
- Calma...
Draco a levou para fora do castelo, em direção ao jardim, mas não parou por ai, continuou avançando até a margem do lago onde a soltou finalmente. Ela se esquivou de seu alcance assim que se sentiu livre.
- Agora fala! – Determinou agressiva – Eu juro que não sei nada sobre o que você sta falando, Draco! Qual foi o meu pecado?
- Ser idiota o suficiente para não ver quando não é querida – Disse ele cruelmente – Sempre se fez de cega Pansy, sabe que nunca te dei bola, mas em vez de desistir, ficou me azucrinando e acabou mesmo que sem querer, me jogando para cima daquele ser agourento.
- OK. Já sei essa parte, estou acostumada com suas ofensas sem base, sei que insisti demais por algo talvez impossível, garanto que não sou burra – Ela sabia muito bem o que fazia – Mas quem é este tal monstro que te causa tanto pavor?
- Isso não te interessa Pansy...
- Já que não tenho o direito de saber o porque de tal rude acusação, poderia ao menos me perdoar? – Encerrou a discussão.
Estava atormentado, se não a perdoasse com certeza ela ficaria lhe enchendo a paciência por um bom tempo. Então vencendo seu próprio orgulho, que era muito grande, aceitou.
- Tá bom, pronto! Desculpada... E satisfeita também? – Ironizou nervoso.
- Muito! Mas você ainda vai me contar o seu segredo, ah, se vai!– Disse ela decisiva, indo embora para o castelo, não mostrando sua felicidade.
Draco revirou os olhos, voltando sua atenção para a água.
* * *
Harry havia perdido praticamente sua noite inteira, tendo que explicar o seu sumiço aos dois amigos exasperados. Pensou em contar uma mentira, mas resolveu contar uma verdade modificada, parecida com a real, o que era bem mais fácil. Hermione ficou incrédula, enquanto Rony arregalava os olhos, abismado.
- Meu Deus, como ele pode fazer isso? – Gritou Hermione batendo na mesa com os punhos fechados – Ele devia estar bêbado, se tivesse em condições normais, nunca faria isso... Ainda, mas dentro do colégio com o risco de ser pego por qualquer um!
- Mas ele fez... E muito sóbrio! – Afirmou Harry acariciando o braço enfaixado – Não entendi bem o porque... Acho que ele desconfia de algo.
- Isso quer dizer que ele pode vir atrás de mim e da Hermione?
- Sim e não Rony.
- Não estou entendendo! Como sim e não? Um ou outro, por favor!
Harry suspirou fundo se jogando para trás de encontro ao encosto, fechando os olhos.
- Não tenho certeza, mas ele acha que eu estou planejando tudo sozinho! – Esfregou os olhos com as pontas dos dedos.
- Sozinho!? – Ecoou Hermione quase rindo – Realmente ele é doido! Não que você não fosse capaz Harry, nada disso! – Adicionou ao ver a expressão irritada do menino.
- Eu concordo com a Hermione, afinal de contas nós sempre planejamos tudo juntos... Não seria estranho demais você querer resolver tudo sozinho, assim de repente? – Interveio Rony.
- Eu sei, eu sei disso! Só não sei como funciona a cabeça dele! Você sabe? E você? – Olhou primeiro para Rony, depois para Hermione – Quero uma resposta... – Cantarolou.
- Ok! Está certo, uma mente daquela é incompreensível! – Concordou Rony revirando os olhos.
- De todo modo, até o dia do baile temos que ficar alertas! Ele desconfiado ou não da nossa participação nisso, continua perigoso! – Resmungou Hermione mau-humorada – Saco, este maldito baile que não chega... Não me sinto mais à vontade, nem na minha própria escola!
- Mais dois dias e tudo acaba... Ai, ai – Suspirou - Isso parece uma eternidade, sabia?
- E como Rony! E como!
Continua...
