CAPÍTULO 2: O BEIJO E A DEUSA

Quando Shun despertou, se deu conta de que se encontrava deitado em uma cama. Seus braços haviam sido colocados para cima e se sentia incomodado. Tratou de movê-los, mas não conseguiu. Sentiu uma resistência ao redor dos seus pulsos. Seus pés tampouco podiam se mover. Era como se uma corrente invisível o estivesse prendendo pelos tornozelos. Seu tronco e a sua cabeça se moviam com facilidade. Estava claro: Havia sido amarrado com algum laço invisível.

Shun voltou a tentar livrar os seus braços, em vão.

- Bem... Vejo que já despertou – disse uma voz. Shun se voltou para ver quem falava. Era o jovem moreno que acompanhou Ana na noite anterior – Me chamo Nick. Sou o cavaleiro de Teseu. Sei que não entende porque te trazemos até aqui, mas logo descobrirá. Não é nossa intenção causar algum dano em Athena... Fazemos isso pelo seu bem – Shun o encarou. Claro, tudo era para o seu bem... Que tonto acreditaria naquilo?

- Deixe-me. Quero lhe advertir que não terei compaixão... – Shun começou, mas Nick o interrompeu:

- E não poderá. Não pode acender teu cosmos e nem nem usar a sua força: Tudo está guardado – sacou um frasco verde – aqui por ordem de Radamanthys.

- O que disse? – disse Shun, encolerizado.

- Que não pode utilizar seu cosmos, porque eu o aprisionei nesta garrafa, por ordem de Radamanthys.

Por ordem de quem? E onde estava Ana? Shun não acreditaria em nada até que ela lhe explicasse porque queria ver Saori e porque o seqüestrou e lhe roubou seu cosmo.

- Ela virá em um momento – continuou o jovem, como que adivinhando os pensamentos de Shun – Há coisas que deve entender...

Ele foi interrompido, porque a porta se abriu. Por ela entrou Ana, seguida de seu outro acompanhante (o que se parecia com ela) e de outro homem. O jovem moreno empalideceu. Ana entrou com os olhos voltados para o chão. O homem parecia furioso.

- Eu disse que não trouxessem reféns!!! Eu disse que matassem a todos e que me trouxessem Saori Kido!!! – gritava enfurecido, sem deixar de insultar e maldizer a todos. Quando se acalmou um pouco, Ana começou a falar:

- Chegamos a atacar a mansão, como você nos ordenou. A revistamos por completo e descobrimos que Saori não estava lá. Como seus cavaleiros se negavam a dizer onde ela estava, tomamos este – disse apontando em direção a Shun – já que ele é mais pequeno que o seu irmão e este com certeza pressionará a todos para que digam onde Saori está.

Shun se sentia furioso e confundido ao mesmo tempo. A jovem estava mentindo... Eles não revistaram a mansão e sabiam muito bem que Saori estava lá. O homem todavia, pareceu satisfeito com a explicação de Ana.

– Bem, porém espero que a idéia funcione, senão, haverá conseqüências para os três... – saiu batendo com força a porta, mas com um ligeiro sorriso no rosto.

– Idiota... – Nick murmurou entre os dentes

– O que estão planejando? – Shun perguntou de repente. Ana o olhou.

- Vejo que já despertou – disse ela sorrindo – são muitas coisas que explicar, mas agora não...

– Quê? Por que não? – disse Shun.

– Porque temos pressa. Nick, David – disse aos seus companheiros – preparem tudo. Vamos ao Coliseu. – olhou seu relógio – São quatro da tarde. Sairemos em duas horas... – os dois jovens se inclinaram e saíram em silêncio.

– Te direi o que faremos – disse Ana dirigindo-se novamente a Shun – Te levaremos ao Coliseu e te entregaremos a eles em troca de que me deixem falar com Saori.

– É mentira. É uma armadilha. Estão me usando como isca para uma armadilha. – disse Shun.

- O que é mentira é o que eu disse ao homem que esteve aqui agorinha... – disse ela, como se estivesse reprimindo um calafrio – Quero falar com Saori. Tenho que dizer a ela algo importante...

– O que quer falar com ela de tão importante? Por que não me diz e me deixa em liberdade? Assim irei com ela e eu direi... – disse Shun. A menina sorriu.

– Eu sinto, mas não é tão fácil assim – disse, sentando na cama junto a Shun. O jovem cavaleiro pode ver mais de perto a profundidade de seus olhos, que parecia envolve-lo... E logo o despertou.

– Não te entendo... – disse Shun tristemente. Ela o olhou.

- Confia em mim.

- Como?

Ana não respondeu. Ao menos com palavras. Os dois se olharam nos olhos. Ele continuava atado nos pulsos e nos tornozelos com o laço invisível, mas agora conseguira mover seus braços um pouco. Ela se aproximou. Lentamente, as mãos de Ana tocaram o rosto de Shun e seus lábios tocaram os dele. Por sua parte, Shun passou seus dedos entre os cabelos dela. Aquele beijo durou muito tempo. Lágrimas surgiam dos olhos de Ana e caíam sobre o rosto de Shun. Ao mesmo tempo, a mente de Shun se converteu em um turbilhão de idéias. "O que está acontecendo?", "Por que me beija?", "Me ama?", "Se me ama, porque me prendeu assim?", "Por que chora?", "O que está acontecendo comigo?", "Por que eu tenho a sensação de que a conheço e de que eu a amei sempre? ". A jovem separou seus lábios dos dele e limpou as suas lágrimas. Shun notou que estava livre dos elos invisíveis, mas não quis se levantar. A olhou nos olhos que estavam mais belos por conta das lágrimas. Shun tomou o rosto dela com a mão direita e aproximou seu rosto do dela. Ele a beijou desta vez. De novo, outro turbilhão de pensamentos e vozes apareceu na mente de Shun. De repente, o turbilhão desapareceu e Shun voltou a dormir. Ana depositou outro pequeno beijo em seus lábios.

– Doces sonhos, cavaleiro – sussurrou – logo você entenderá... – e deixou o quarto.

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– Como está se sentindo? – Shun, de 10 anos, estava só no quarto dos meninos que viviam na Fundação. Não, não estava só. Havia um menino, Eric, sentado em uma cama, com a sua perna esquerda engessada.

- Bem, obrigado. É só uma pequena torção, nada grave – disse Eric, sorrindo para o seu amigo – Não sei o que teria acontecido se Ikki e os outros não tivessem chegado a tempo... – Shun baixou a vista e Eric se interrompeu – O que foi?

- Tudo foi minha culpa – disse Shun – Não teriam te machucado se eu fosse mais forte.

– Oh, vamos, não é para tanto... – interrompeu Eric – Não te preocupe. Verá que num dia destes, eles se arrependerão... E talvez será você que dará uma lição neles.

Shun pode ver que Eric tinha dificuldade para respirar e que fazia gestos de dor, ainda que não gemesse. Ele oprimia o flanco com força.

– Espere – disse Shun – acho que quebraram uma costela sua – e falando isto, passou sua mão pelo peito do amigo e seu tato detectou algo... Que definitivamente não era uma costela quebrada. Eric empurrou a mão de Shun.

– Não se atreva a me tocar! – disse muito irado, mas já era tarde demais. Shun tinha compreendido: Eric na verdade era uma menina.

– Quê...?! – Shun começou a perguntar, mas a menina começou a chorar.

– Eu te suplico, Shun, te suplico! Não diga nada. – disse entre soluços. Shun a abraçou. Era a primeira vez que tinha que consolar alguém.

– Não chore... Eu prometo que não direi nada... – disse.

– Te... Te agradeço... – disse ela – Me chamo Érika. Ninguém sabe que... Sou mulher, até agora. Já estou... Crescendo e logo não poderei ocultar... Mais.

- E por que quer se tornar um cavaleiro?

– Não quero ser um cavaleiro. Quando me mandarem para o local definitivo de treinamento eu fugirei no caminho. É a única escapatória que tenho. Se me levam ao orfanato com as outras meninas, nunca mais poderei escapar... Quero voltar a ver o meu irmão – disse, limpando as suas lágrimas com a manga da camisa. Shun beijou sua bochecha e a abraçou outra vez.

– Érika – disse Shun com muita seriedade – eu juro que guardarei teu segredo ainda que isso me custe a vida.

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O pôr-do-sol se aproximava. Os cavaleiros de bronze se dirigiam ao Coliseu, seguidos por Saori e os dois cavaleiros dourados: Mú e Miro.

O coração de Seiya batia com força. Não sabia o que iria acontecer. Hyoga rogava mentalmente aos deuses que seu amigo estivesse bem. A mente de Shiryu estava em branco. Ikki pensava que se tivessem feito algo contra o seu irmão, o mais puro de todos os cavaleiros, ele o vingaria rápida e terrivelmente.

Já no Coliseu, todos rodeavam Saori. Logo apareceu uma nuvem branca diante deles. Quando a nuvem se dispersou, apareceu Ana. Saori e Mú fizeram uma exclamação de assombro.

– Saori – disse Ana – necessito falar à você algo muito importante.

– Primeiro cumpra a sua promessa! – gritou Ikki. Ana sorriu.

- Teu irmão está aqui. – disse, mostrando a mão fechada – Antes minha morte que deixar que algo de mal lhe acontecesse. Deixe-me falar. Tenho pouco tempo e os inimigos já estão suspeitando.

– Fala então. – disse Saori, aproximando-se dela.

– Mas Saori... – disse Seiya, porém Mú o interrompeu.

- Não, deixe-a...

– Saori, tenho que lhe advertir... Um novo inimigo se aproxima... E é mais poderoso que os antecessores. Ele está reunindo vários deuses e cavaleiros para te atacar... – fez uma pausa e continuou – Deve se refugiar novamente e logo, no Santuário grego, tendo a proteção dos cavaleiros dourados – olhou para Miro e Mú.

– E quem é esse inimigo? – perguntou Saori.

– Não posso dizer o seu nome – disse tristemente – mas te direi isto: Estou destinada a me unir a ele... – disse baixando os olhos – Refugia-te no Santuário, para que esteja a salvo dele.

Saori o olhou, mas deu um sorriso e falou:

– Assim será feito.

– Uma deusa quer te ajudar, mas não tem cavaleiros – disse Ana – sem dúvida, ela chegará em seu auxílio quando for necessário. Tenha muito cuidado, Athena.

– Obrigada. – respondeu Saori – Agora, devolva meu cavaleiro.

Ana abriu sua mão direita. Um turbilhão saiu de sua mão e ao desaparecer, um jovem de cabelos verdes apareceu, inconsciente, apoiado em David e Nick, ambos vestindo armaduras. Ana beijou sua testa e lhe disse:

– Desperta, cavaleiro. – e os olhos de Shun se abriram.

Shun sorriu ao ver de novo seu irmão e seus amigos e se recebeu um abraço de Seiya, Shiryu e Hyoga... Ikki suspirou aliviado.

– Isto é seu – disse Nick, entregando a garrafa verde – pode abrir.

Assim fez Shun. Sentiu uma brisa fresca no rosto e viu a constelação de Andrômeda brilhando de novo no céu da noite.

– Obrigado – disse Shun. A armadura de Andrômeda chegou até ele e cobriu o corpo do seu cavaleiro que sorriu.

– Que comovente... – disse uma voz detrás de Ana, fazendo com que ela empalidecesse. Um cavaleiro com uma armadura negra chegou.

– Quem é esse homem? – perguntou Seiya.

- É Gaspar de Minotauro – disse Ana – foi enviado por...

Não terminou a frase, pois foi interrompida pelos ataques dos cavaleiros de bronze. Porém nem os meteoros de Seiya, nem o pó de diamantes de Hyoga, a fúria do dragão de Shiryu, as correntes de Andrômeda de Shun ou a ilusão fantasma de Ikki o feriu.

Gaspar de Minotauro contra atacou com seu "fio de Ariadne", que se enroscou ao redor dos pescoços dos cavaleiros de bronze, asfixiando-os. Mú havia criado uma barreira para proteger Saori, o contemplava horrorizada.

– Deixe-os! – gritou Saori – Leve-me se é isso... – mas Ana a interrompeu.

– Nem pensar – disse e com o dedo indicador cortou os fios.

– Não é tão leal como o Amo acreditou, menina – disse o cavaleiro dirigindo- se até Ana – agora duvido que sejas digna dele. Você o traiu e deve morrer. Logo seguirá Saori e seus cavaleiros.

– Primeiro terá que passar pelo meu cadáver antes de toca-la – disse David, interpondo-se entre ele e Ana.

– Tua irmã não necessita da sua proteção – disse despeitadamente – assim que sair daqui – o golpeou, fazendo com que ele caísse aos pés de Miro.

– Nick – disse Ana – una-se a eles. Usarei meu poder para ajuda-los.

– Mas... – disse Nick, porém Ana insistiu.

– Veja. Não temos tempo a perder. Eu prometi à minha irmã Athena que a protegeria – disse, começando a acender seu cosmo.

– Quê? – Shun escutara o que Ana tinha dito – Você é a...?

– Pode começar a se despedir deste mundo, deusa! – gritou Gaspar, enquanto elevava o seu cosmo.

– Deusa? – Shun perguntou a si mesmo.

– Em teus sonhos – disse ela, enquanto Nick, David e os cavaleiros de bronze se protegiam atrás do muro feito por Mú.

Os dois cosmos se chocaram, provocando uma grande explosão.

– Nãooo, irmã!!!! – gritou David.

Entre os escombros e os restos da explosão, Ana não escutava a mais nada. Estava de frente ao seu oponente que caiu ao chão.

– Te arrependerá – disse Gaspar, ferido de morte, agonizando – o Senhor das trevas te encontrará. E te destruirá!!! – e caiu morto.

Ana o olhou orgulhosamente, mas suspirou e caiu ao solo também.

– Irmã!!! – gritou David. Shiryu tomou o pulso da garota.

– Muito rápido. E demasiadamente débil – disse.

Mú a tomou nos braços e a levou.

- Eu cuidarei dela – disse a Saori – como antes...

– Como antes? O que quer dizer? – perguntou Seiya, mas Mú não lhe respondeu. Simplesmente se afastou e desapareceu.

– Não morra, deusa... – sussurrou Shun e uma lágrima escorreu pelo seu rosto.

CONTINUARÁ...