Capítulo Três – Outro Tipo de Mágica

Assim que Draco e Nicolle chegaram ao hospital pediram informações. Uma das atendentes explicou onde ficava a Unidade Coronariana e os dois se encaminharam para lá.

- Mamãe... - Nicolle abraçou a mãe e chorou. Esta estava calmíssima. - Como ele está?

- O idiota do seu pai? Ah! Está ótimo. Eu digo para ele: "querido, não coma bacon, não faça isso com as suas veias..." mas ele escuta? Não. O palerma não escuta. E agora está lá, sendo espetado e cavucado... - Draco fez uma expressão de dor solidária.

- Mas ele está mal, mamãe?

- Ele? Mal? Nicolle, alguma vez você já viu o seu pai cortar as unhas? - Nicolle franziu a testa.

- Não...

- Ele sente dor até para isso. Então creio que ele esteja ótimo. Acho mais fácil que ele esteja é com uma baita indigestão. Ele se excedeu na ceia hoje. Comeu até carne de porco... Eu disse: "meu bem, do jeito que você come é uma ofensa aos porcos. É canibalismo isso" - Draco segurou uma risada. - Pode rir, meu filho. É engraçado mesmo... - Alícia cutucou o genro. - Como estão aquelas gracinhas? Eu mal posso esperar para estragá-los com mimos - emendou, apertando Draco em um dos seus famosos abraços sufocantes.

O médico abriu a porta da Unidade Coronariana e deu um sorriso amarelo para os três.

- Ele não teve um enfarte. Está com gazes. Comeu muito perto da hora de dormir. Mas é recomendável que faça exercícios, dieta... Nós vamos aproveitar a internação para fazer um check up completo...

Alícia sorriu. Nicolle suspirou aliviada, segurando forte a mão de Draco.

- Bem, já que estamos aqui, podemos ir até a lanchonete, não é mesmo? Enquanto viram seu pai do avesso lá dentro... - o médico sorriu mas indicou que Alícia estava sendo esperada pelo marido.

Nicolle acenou para a mãe e o médico avisou que só poderia entrar um de cada vez. Draco abriu a boca mas Nicolle respondeu antes que ele dissesse qualquer coisa.

- É o jeito dela ficar nervosa. Aposto qualquer coisa com você que ela vai voltar com os olhos vermelhos e inchados de lá de dentro... - Draco sorriu.

- Hum... Qualquer coisa mesmo?

- Draco, você é triste. Um caso totalmente perdido...

- E você simplesmente adora isso... - segurou a mão da esposa e a puxou para perto de si, enquanto esperavam o elevador chegar. - Nós vamos descer sem a sua mãe? - perguntou quando a porta se abriu.

- Eu acho que sim... - ela perdeu a fala ao ver que o elevador não estava vazio. - Eu já desço, Draco... Vo-vou chamar a minha mãe... - a voz saiu trêmula e ele estranhou quando ela soltou sua mão e permitiu que a porta do elevador se fechasse.

Draco trocou um olhar com o homem ao seu lado. A expressão deste era parecida com a de quem vê um fantasma. O homem trocou alguns olhares com Draco, olhando-o de cima a baixo algumas vezes, até que este se irritou.

- O que foi? Está querendo comprar alguma roupa para mim? - o homem ficou lívido.

- Não é isso...

- Então por que está me medindo com os olhos? É alfaiate ou costureiro por acaso? Perdeu alguma coisa aqui? Tenho algo nos dentes? - bombardeou o homem com todos os desaforos que podia. Estava sendo divertido descontar a raiva que tinha sentido de Paolo naquele trouxa estranho.

O homem tremeu mas olhou fixamente para Draco.

- Meu senhor, é que... - a luz do elevador deu duas piscadas estranhas e depois de alguns minutos em que pareceu que o artefato trouxa estava se decidindo se despencava ou parava, este acabou tomando a segunda opção.

- Agora mais essa... Trancado aqui com um panaca... - Draco bufou.

- Hey... - o homem pareceu se irritar com o comentário.

Draco o ignorou solenemente. Tentou olhar no painel se havia algo que pudesse ajudá-los a sair.

- Quem é o panaca agora? - perguntou para Draco, que bufou.

- Escute aqui, amigo, eu realmente não estou em um bom dia. Então faça um favor ao seu nariz e não me irrite mais, okay? Já me basta os seus olhares "nada estranhos" - debochou; o homem apertou os olhos.

- Você conhece aquela mulher ruiva?

Draco perdeu todo o interesse que tinha o painel no momento em que o homem mencionou Nicolle. Agora o homem tinha entrado em território REALMENTE perigoso.

- Se eu conheço a MINHA mulher? Sim, eu conheço... - respondeu em tom debochado.

- Então deve saber que ela é estéril - o homem disse em um tom vitorioso. Tinha a vaga idéia de que quando mencionasse aquilo estaria triunfando sobre Draco.

Ledo engano, Draco apenas abriu um sorriso.

- Richard. Eu realmente queria conhecer você...

O homem só teve tempo de piscar. No segundo seguinte estava colado contra a parede do elevador, suspenso um palmo do chão.

- Veja só que sorte a minha. Estou conhecendo você em um dia e circunstâncias muito especiais. Estou particularmente mais irritado do que já sou e em parte a culpa e sua - o homem grunhiu qualquer coisa, tentando livrar-se. - Silêncio, eu estou desabafando aqui, percebeu? - Draco deu dois cascudos na cabeça do outro. - Bem, meu sogro parece estar sendo virado do avesso nesse momento a mãe dos meus filhos, que por sinal estão sendo cuidados por um arremedo de ser humano, está lá em cima apavorada por ter visto a sua cara feia... Tsc, tsc, tsc... - sacudiu cabeça negativamente. - Você não sabe como a sua falta de desenvoltura me aborrece - o homem não conseguia emitir qualquer som, estava quase roxo. - Não que eu possa reclamar. Veja bem. Eu realmente queria conhecer você. O idiota mais patético - "e aqui você ganha até do Potter, acredite", acrescentou mentalmente - que já pus os olhos em cima. E olha que eu convivi sete anos com lufa-lufas e grifinórios... Até me casei com uma... - mantinha o homem seguro ainda. - Mas você é o maior monte de excremento que já vi... Estou impressionado... É sério. Poderiam moer você e adubar todo o deserto do Saara. Seria uma grande idéia... - ele liberou o homem, que caiu no chão, arfando.

- Filhos? - o homem perguntou com dificuldade, esfregando o pescoço.

- É, filhos. A sua ex não é estéril, seu idiota. Você é que não teve capacidade de engravidá-la - mentiu propositadamente.

- Impossível. Eu tenho outros filhos do meu segundo casamento - Draco riu.

- Já lhe ocorreu que eles não sejam seus? Duas palavras para você: adultério acontece. Ah! Mas você sabe bem disso... Mas chega de falar de você. Já o conheço o suficiente. Vamos aproveitar o tempo aqui... - Richard tomou fôlego e avançou com vontade para Draco, que se esquivou agilmente e deixou que o outro desse de cara na parede oposta. - O que é isso? - ele riu. - É só? - perguntou vendo o outro limpar o sangue dos supercílios. - Bem, valentão. Minha vez... - arregaçou a manga cuidadosamente e deu um soco certeiro no queixo de Richard. - Sua vez... - debochou.

Nicolle, que ainda estava esperando a mãe, ficou apavorada quando viu o elevador parar entre o sétimo e oitavo andar. Imaginou que a identidade do homem já não fosse um mistério para Draco e lembrou o que ele tinha dito sobre quando encontrasse Richard pela frente: "Se eu encontrar um dia com esse imbecil terei prazer em lhe lançar uma Maldição Imperdoável...". Suspirou nervosa. A mãe vinha saindo da UTI, os olhos marejados, exatamente como Nicolle havia previsto.

- Mãe! - Nicolle a segurou pela mão. - Vem comigo...

- O que foi, Nikkita? - fungou enquanto a filha a rebocava escada abaixo. - Seu pai quer vê-la. Acredita que ele me pediu chocolate? - disse enquanto desciam os degraus do vigésimo andar.

- Mãe, lembra quando a senhora me disse que eu devia partilhar meus segredos com Draco? - ela ofegava enquanto falava, Alícia tinha a mão no peito.

- Sim, sim. Lembro. Não corra tanto. Eu também comi carne de porco. Não quero dar o gostinho de ocupar o leito ao lado do seu pai...

Nicolle ignorou o comentário. Estavam no décimo oitavo andar.

- Draco também tem os seus segredos, mamãe... Ele não é um homem comum... - Alícia empacou no meio da escada, detendo a filha.

- Tudo bem, se você vai me dizer que ele é um mafioso ou coisa assim eu não quero nem saber. Eu vi nos filmes o que essa gente faz com as sogras... - Nicolle olhou aborrecida para a mãe.

- É claro que ele não é nada disso... - puxou a mãe até o décimo sétimo andar.

- Ele não é gay ou hermafrodita... Meu Deus, vocês tem um casamento aberto? - Nicolle bufou.

- É claro que não, mamãe... - ela encostou a mãe na parede entre o décimo sexto andar e o décimo quinto, olhou em volta e cochichou em seu ouvido. - Draco é um bruxo - Alícia riu.

- Como David Copperfield ou o Mister M? - Nicolle bateu na própria testa.

- Mamãe, esses dois são mágicos, ilusionistas... É um outro tipo de mágica... Da onde a senhora tirou isso?

- Bem, mágicos, bruxos, palhaços... Tudo isso tem no circo, não é mesmo? Eu não estou muito interada desses assuntos. Você sabe, detesto internet... A questão é: seu marido é uma aberração. Tudo bem, eu posso aceitar isso...

- Não, mãe. Draco não é uma aberração... Ou é, sei lá. Nunca parei para pensar no que isso o transforma...

- O que é então, Nikkita?

- O fato é que nesse exato momento ele está absolutamente furioso. E preso num elevador... - a mãe a interrompeu.

- É claustrofóbico ele? Porque a sua tia Elza é e você sabe como ela fica quando...

- Com o Richard - Nikki emendou e Alícia arregalou os olhos.

- Tudo bem. Depois eu tento entender por que você deixou o mais simples de entender pro final. Por enquanto corra...

As duas desembestaram escada abaixo.

- Ele é violento?

- Qual deles?

- Richard.

- Não. Acho que não - Alícia deu uma gargalhada.

- Deus tenha piedade de sua alma então...

- Mamãe!

As duas estavam chegando ao décimo andar e já podiam ouvir algumas batidas na parede do elevador.

- Eu tenho inveja do seu marido, filha - Alícia parou um pouco entre o décimo e nono andar, tomando fôlego.

- Por que ele é um bruxo? - sussurrou a última palavra.

- Não, Nikkita. Eu gostaria de alguns momentos a sós com o Richard dentro de um elevador. Isso me faria ter uma velhice bem mais feliz... - as duas prosseguiram.

Assim que chegaram no oitavo andar puderam ouvir claramente a voz de Draco.

- Sua vez...

Alícia fez uma expressão orgulhosa.

- Puxa, Nikkita. Que "gentleman". Até para brigar este é educado. Tá aí algo que não se vê todo dia... "Sua vez. Pode me socar..." - Nicolle ignorou o comentário ácido da mãe e se agachou na porta do elevador.

As duas ouviram um grito de dor e depois a risada debochada de Draco.

- Eu diria que o seu ex não aproveitou a chance, Nikkita... - Alícia riu.

- Cala a boca, mamãe. Já chega... Me ajude aqui. Aperte o botão que eu vou tentar abrir o elevador... Draco? - ela bateu algumas vezes na porta. - Você está bem, meu amor? - ele poderia ter uma crise de risos mas respondeu carinhosamente.

- Estou bem, querida. Eu e Richard estamos nos conhecendo, não é Richard? - o outro cambaleou um pouco e caiu sentado. - Ele não está em condições de responder, querida, mas manda um alô...

Nicolle puxou as duas bandas da porta enquanto a mãe mantinha o botão apertado. Afastou um pouco e pôde ver o rosto de Draco. Parecia extremamente calmo agora.

- Olá, meu bem... - disse sorridente, ela suspirou.

- Aperte a emergência. Para que o elevador não ande... - ele se dirigiu ao painel mas parou. Enfiou a mão no casaco mas ela o repreendeu. - Draco, não...

- Tem certeza? Eu poderia apenas...

- Não - ela foi contundente. Colocou o sapato calçando a porta e se esgueirou para dentro do elevador. - Pronto - apertou o botão e a porta se escancarou. - Agora é só sairmos daqui - disse desanimada - e esperarmos um processo por agressão. Pois Richard vai com certeza tentar colocá-lo na cadeia... - Draco analisou a situação.

- Vai nada... - apontou a varinha para o homem. - Obliviate! Você teve uma crise de pânico quando o elevador parou e se bateu nas paredes... - cochichou no ouvido do homem. - Pronto, Nikki. Tudo resolvido... - ele deu impulso e subiu no andar, puxando a esposa também.

- Draco, você apagou a memória dele?

- Não, Nikki. Ele vai se lembrar muito bem desse encontro. Apenas não vai saber a verdadeira origem das pancadas - riu. - E essa é a melhor parte... - entrelaçou a mão à da esposa enquanto se encaminhavam para a lanchonete.

- Hey! Talvez ele fique claustrofóbico - Alícia acrescentou e os três riram.