ANDRÔMEDA
"Você e Tonks são parentes?" – Harry perguntou, surpreso.
"Ah, sim, a mãe dela, Andrômeda era a minha prima favorita" – disse Sirius, examinando a tapeçaria atentemente – "Não, Andrômeda não está aqui, veja" (...)"As irmãs de Andrômeda continuam aqui porque fizeram bons, respeitáveis casamentos puro-sangue, mas Andrômeda casou-se com um bruxo nascido trouxa, Ted Tonks, então..."
***
Ainda era madrugada quando Andrômeda desceu silenciosamente as escadas, e entrou na grande sala de estar de Grimmald Place. Mesmo naquela hora, o calor do verão já era intenso. A garota aproximou-se da janela e abriu um fresta, para tomar um pouco de ar. Oculta atrás das cortinas, observou interessada a rua deserta. Perguntou-se se um trouxa que passasse por ali sequer desconfiaria que naquele local havia uma casa. "Uma casa não, A casa...a residência da Família Black" – ela podia imaginar a tia falando, como se essa pudesse, mesmo dormindo, ler os seus pensamentos. Talvez só faltasse isso mesmo para que ela tivesse total controle sobre os dois filhos e as três sobrinhas.
Andrômeda vivia naquela casa desde os nove anos, quando a mãe morrera, e o pai chegara à brilhante conclusão que uma mulher criaria melhor três meninas de dez, nove e oito anos. Assim, confiara a educação das filhas à cunhada, ardorosa defensora dos bons costumes da família. De vez em quando o pai as visitava, sempre levando belos presentes comprados nas diversas regiões que visitava. Mas quando as filhas entraram em Hogwarts, as visitas se restringiram às férias de Natal e verão. Com o tempo, Andrômeda percebeu que se afastava cada vez mais do pai, ao contrário das irmãs, Bellatrix e Narcissa. Conforme crescia, aumentava a desconfortável sensação de que estava na família errada.
Pegou um castiçal, e acendeu a vela. A luz inundou a sala, e a garota caminhou até a enorme tapeçaria que tinha ilustrada toda a árvore genealógica da família, desde a Idade Média. Aproximou as chamas, e agachou-se para ver os últimos nomes. Ela já nem sabia dizer quantas vezes lera todos os nomes ali expostos, quase setecentos anos de história, os bruxos e bruxas poderosos e influentes que a família produzira até ali. Em um ou outro ponto, haviam pequenos buracos, onde antes haviam nomes, representando todos aqueles que de alguma forma , haviam desonrado o nome da família. Agora, nas duas últimas gerações, dois nomes foram retirados, talvez um em conseqüência do outro...Sirius, o seu primo mais velho, que fugira de casa no ano anterior, após uma violenta briga com Bellatrix. E o tio Alphard, irmão mais velho do seu pai, que morrera poucos meses depois, mas tivera o cuidado de transferir sua pequena fortuna para o sobrinho. Aquilo deixara toda a família desconcertada, quando abriram o testamento do velho bruxo. Solteiro e sem filhos, já estava bem doente quando Sirius deixara a casa, e não era segredo que o rapaz era o sobrinho favorito do velho...Andrômeda ficara um tanto chateada...ela também queria ter recebido uma parte do ouro...
Então porque você não fugiu de casa também? – Regulus, o irmão mais novo de Sirius perguntara – quem sabe assim, você não ficaria com metade do ouro? Talvez isso compensasse ser deserdada pelo seu pai...depois vocês dois casariam, juntariam o dinheiro novamente, e ... Por que você não cala essa sua boca estúpida?!! – ela respondeu, fechando com força um livro que desistira de ler sobre a mesa – Você só diz asneiras... Mas tenho certeza de que se um dia Sirius reparasse que você é uma garota, e estalasse os dedos assim – e o garoto fez o gesto – você correria para os braços dele...se liga, Andrômeda...todo mundo já percebeu...Aquela discussão ocorrera ainda em Hogwarts. E ainda latejava nos ouvidos de Andrômeda. Por que no fundo, Regulus tinha um pouco de razão. Durante anos, ela fora a companheira de brincadeiras de Sirius, e ele a tratava como uma igual...alguém em quem ele confiava, mas que jamais despertaria qualquer outro sentimento senão o de amizade. E mesmo isso, ela sentia, um dia poderia acabar. Nos últimos tempos, em Hogwarts, ele passava a maior parte do tempo com os amigos. Tanto Narcissa, quanto Regulus, por influência de Bellatrix, evitavam contato com Sirius, como se este tivesse algum tipo de doença contagiosa. Andrômeda era a única que eventualmente contrariava a determinação da irmã, e conseguia, durante alguns bons momentos, conversar com o primo. Mas sempre tinha a sensação de que estava cometendo algum crime. E ainda havia a questão do ouro, que a fazia quase sentir raiva de Sirius, porque este parecia não ter percebido o quanto de ouro que tinha em mãos.
Já amanhecia quando ela voltou para o quarto. Na cama ao lado da sua, Narcissa dormia tranqüilamente, seus longos cabelos louros espalhados no travesseiro. Antes de se deitar, Andrômeda mirou-se no espelho: grandes olhos castanhos, o rosto magro e comprido, os cabelos escuros e volumosos como os do pai, a marca registrada dos Black. Mas ela, numa definição maldosa de Bellatrix, era o patinho feio da família. Jamais seria notada numa multidão.
***
Como acontecia todos os anos, o Expresso de Hogwarts estava lotado de alunos que se cumprimentavam nos corredores, colocando em dia as novidades das férias. E como ocorrera nos anos anteriores, Andrômeda atravessou mal-humorada os grupos barulhentos, procurando passar com a sua bagagem. Encontrou alguns colegas, trocaram algumas palavras e ela se afastou. Por fim, entrou no mesmo compartimento em que Narcissa e Regulus estavam, juntamente com mais alguns quintanistas da Sonserina.
Acho que os NOMs não devem ser tão terríveis assim...pelo menos, eu acho que não terei grandes problemas – Narcissa dizia, exibindo o distintivo de monitora – embora agora eu vá ter menos tempo para os deveres...não é mesmo, Andrômeda? Você foi bem no seus exames, não foi? Hum-hum – respondeu, concordando. Também, do jeito que você estuda – Regulus encarou a prima divertido – eu não me preocupei tanto assim com esses exames – sorriu displicentemente – afinal, nossa família sempre tem as portas abertas, em qualquer lugar não? E o que você vai fazer com o tempo que deveria estar estudando? – Andrômeda perguntou, enquanto vasculhava a bolsa – treinar mais quadribol? Lógico – ele respondeu, fingindo que segurava um bastão – esse ano eu decidi que vou achatar o nariz do Potter... Há, há, há...muito engraçado – a prima respondeu, ao mesmo tempo em que pegava um grande pacote de presente, e abria a porta do compartimento. Aonde você vai? – Narcissa perguntou, olhando com curiosidade o pacote – e para quem é este presente? Não é da sua conta... – Andrômeda respondeu ao sair, mas ainda teve tempo de ouvir Regulus murmurar – e precisa perguntar? É lógico que é para ele...dois meses longe e a tonta já está atrás dele...Andrômeda fizera de conta que não ouvira as palavras de Regulus. Durante as férias, decidira que a partir daquele ano letivo as coisas seriam um pouco diferentes. Dar menos confiança para as insinuações de Regulus e Narcissa, encontrar novas maneiras de se encontrar com Sirius e parecer uma garota legal. Seu único problema continuava a ser Bellatrix, e o medo que sentia do olhar feroz da irmã quando esta se irritava. Carregava nas mãos uma caixa de sapos de chocolate, que ela sabia ser um dos doces favoritos do primo. E começou a procurá-lo no trem, já que no momento do embarque não o avistara uma única vez. No entanto, parecia que ele havia se escondido, porque não o encontrava em parte alguma.
Por duas vezes, abriu compartimentos de supetão, por imaginar ter ouvido a risada cínica dele. Na terceira, para seu azar, encontrou Bellatrix com o namorado, Rudolphus. Sentindo o olhar fuzilante da irmã, fechou a porta com força, sentindo o sangue subir pelo rosto de pura raiva. Enquanto decidia o que fazer, andando a esmo pelo corredor, sentiu que esbarrava em alguém. Ou antes, alguém esbarrara nela, e Andrômeda deixou o pacote cair no chão.
Não olha por onde anda, idiota? – perguntou irritada para o rapaz grandalhão parado a sua frente, com uma expressão estúpida no rosto. Bom dia para você também, Black – ele respondeu, mal-humorado – esse pacote por acaso é seu? – o rapaz perguntou, pegando-o do chão curioso, tentando adivinhar o que tinha lá dentro. É! E seria bom você me devolver logo, tenho mais o que fazer do que perder tempo com você... Ah, sim...a senhorita é importante demais para perder tempo com...como é mesmo a expressão que vocês, sonserinos, costumam usar? Ralé? Não, melhor...sangue-ruim? – ele riu desdenhosamente – não é isso? Se você sabe a palavra tão bem, porque me perguntou? – ela respondeu, irritada – agora, me devolva o pacote, senão...Mas ela não chegou a completar a frase. De um dos últimos compartimentos do trem, surgiram duas garotas que cochichavam entre si, entre risos. Uma tinha os cabelos longos e ruivos, e os olhos verdes. A outra, cabelos castanhos, curtos e lisos, e os olhos da mesma cor. Andrômeda não sabia seus nomes, mas sabia que ambas pertenciam à Grifinória, estavam no último ano e não vinham de famílias bruxas. E era esta última informação que fazia a diferença para ela. As duas garotas pararam a conversa quando viram Andrômeda e o rapaz, que ainda segurava o presente de Sirius.
Ei, Ted...- a garota de cabelos curtos chamou-o – como foram as férias? Melhor impossível, Cathy – o rapaz devolveu o pacote para Andrômeda, como se aquela brincadeira tivesse perdido todo o interesse, e continuou a conversar com as duas garotas, ignorando-a completamente – eu tive idéias muito interessantes para o nosso clube de Herbologia, não vejo a hora de encontrar a Profa. Sprout...Andrômeda não se afastara completamente, quando ouviu a outra garota, a ruiva, chamar seu nome. Voltou lentamente, de má vontade.
Está procurando o Sirius? – ela perguntou, e antes que Andrômeda pudesse responder "não é da sua conta", a garota emendou – ele está naquele compartimento – e apontou o lugar de onde acabara de sair com a amiga.Olhou-a como se não tivesse entendido. Ou antes, como se fornecer uma informação tão simples para uma quase desconhecida fosse algo extremamente estranho e fora de comum. Não ocorreu a Andrômeda que a menina fora apenas gentil, e adivinhara sua intenção. Era apenas uma questão de sensibilidade, algo que ela ainda não aprendera. Ela murmurou um "obrigada" entre dentes, e seguiu para a porta que lhe fora indicada. Antes de entrar, no entanto ainda virou para trás, e viu que o rapaz continuava a conversar com as duas garotas.
***
O inverno chegou tão rápido que Andrômeda mal percebeu a passagem das estações. Estava, naqueles dias ocupada demais com seus estudos para se preocupar com qualquer outra coisa. E, além do mais, pensava desanimada, havia algo mais em Hogwarts com que gastar seu tempo, a não ser com livros? Não era monitora – o diretor de sua casa alegara que lhe faltava espírito de equipe, apesar das boas notas e bom comportamento. Por espírito de equipe, podia-se entender grupos de amigos, ser o mais popular possível dentro de sua casa. Pelo menos era assim que funcionava dentro da Sonserina. E apesar de considerar Lucila Malfoy sua melhor amiga, Andrômeda jamais era vista em companhia de outras pessoas, excetuando-se os primos e a irmã mais nova. Assim, foi sem emoção que assinou a lista dos alunos que partiriam para casa no Natal, embora tanto Narcissa, quanto Regulus e Bellatrix passariam as férias em Hogwarts, por causa do tradicional Baile de Inverno.
Faltando apenas uma semana para o baile e o início das férias, numa manhã de domingo particularmente fria, Andrômeda foi acordada por uma forte sacudida nos ombros, e uma voz ardida a chamou, primeiro calmamente – se isso era possível – e depois com mais vigor, até se tornar insuportável. A garota abriu os olhos e virou-se para o lado onde a chamavam. E viu os olhos negros de sua irmã mais velha sobre o seu rosto, sorrindo de satisfação enquanto agitava no ar um pedaço de pergaminho, provavelmente uma carta.
Bom dia!! – Bellatrix a cumprimentou com um ar tão satisfeito que Andrômeda não pôde deixar de se sentir curiosa pela presença de sua irmã no seu dormitório – sabe que horas são, preguiçosa? Quase onze...e você ainda deitada... Bella...hoje é domingo...me deixe dormir.... Bah! – a outra respondeu, não ligando a mínima para as queixas da irmã – você reclama demais, esse é o seu problema...esse seu humor chega a ser insuportável... Se foi para me recriminar, então vá embora, Bellatrix, por favor... Não...você não tem jeito mesmo...eu não ia perder meu tempo, deixar o meu namorado – e Bellatrix enfatizou a última palavra – lá fora treinando quadribol sozinho, se eu não tivesse algo importante para lhe dizer – agora ela já estava sentada sobre a cama, assim como Andrômeda – recebi uma carta do pai hoje no café – e entregou o pergaminho para a irmã – leia você mesma. Aqui diz que ele não chegará a Inglaterra a tempo para o Natal...e daí? E daí que a tia Úrsula resolveu, então visitar umas parentes em Nottinghan e nos desejou Feliz Natal! – a moça tirou outro pergaminho de dentro das vestes – aí está, ficaremos todos em Hogwarts este ano. E isso significa que você tem apenas essa semana para ser convidada para o baile...entendeu, Andrômeda? Seja boazinha, e consiga um bom par para o próximo sábado.E dizendo isso, Bellatrix saiu satisfeitíssima consigo mesma, enquanto Andrômeda ruminava as últimas informações. Era por isso, pensou, que a irmã estava tão contente...porque com certeza, ela, Andrômeda, jamais seria lembrada por algum rapaz relativamente decente dentro da Sonserina...e os outros, bem, estes estavam fora de cogitação.
Porém, na hora do almoço o seu humor melhorou bastante, e se animou com a empolgação de Lucila, que fora convidada para ser o par de Regulus. Passaram toda a refeição discutindo penteados, e a amiga lamentou os cabelos louros e extremamente lisos que possuía.
Se ainda tivessem algum volume como o seu, ou o da Narcissa – murmurou – mas não, tem que ser assim, parecendo fios de milho... Acho que há alguma poção que o deixe mais encorpado, Lucy – Andrômeda respondeu, mas então se lembrou de que não tinha um par...mas quando viu Sirius deixando a mesa da Grifinória em companhia do Potter, ela teve uma idéia. Acompanhou com o olhar os dois rapazes saírem do salão, e praticamente correrem para os jardins.Terminou de comer rapidamente e, murmurando uma desculpa, também saiu para os jardins. Não foi difícil encontrá-los. Estavam sentados próximos à margem do lago, sobre um banco de madeira, o lugar onde costumavam passar suas horas livres, quando não estavam aprontando dentro do castelo. Aproximou-se displicentemente, e sorriu com satisfação quando Sirius a chamou para perto.
Perdida por aqui? – ele perguntou, sorrindo de uma maneira que a desconcertava – ou só dando uma volta? Digamos que eu esteja a fim de respirar ar puro... Também... – Potter se meteu na conversa – de onde você vem, ar puro é algo raro não? Me diga uma coisa, Andrômeda...é verdade que a Sonserina fede? Potter, me faça apenas um favor...cale essa sua boca estúpida!! Shh, vocês querem parar? – Sirius interrompeu a discussão e mudou de assunto – eu vi que você mudou de idéia, e assinou a lista dos alunos que vão ficar em Hogwarts...Andrômeda sentiu-se aquecer por dentro. Ele estava encaminhando a conversa pelo caminho que ela queria.
Eu resolvi ficar para o baile... – ela mentiu. Você fez uma boa troca...garanto que alguém a convidou, não? – ele sorriu maliciosamente. Er...na verdade ainda não... Não sabia que você iria ficar...senão a teria convidado...seria legal ir com você, mesmo sendo minha prima..."Isso não me importa...Sirius, por favor...não me diga..." – pensou, enquanto o chão lentamente se abria sob os seus pés...
...mas agora eu convidei outra garota...e você sabe, eu não podia desperdiçar essa oportunidade..." Cale a boca!! Eu não quero ouvir..."
Você conhece Catherine Bishop? Quem? – ela perguntou com raiva. Eu a convidei para o baile...ela é realmente uma garota legal...Andrômeda não precisou de muito tempo para descobrir quem era Catherine. Enquanto conversavam sobre banalidades, as duas garotas que ela vira no trem no início do período se vinham em sua direção, trocando risinhos irritantes. E enquanto a ruiva aproximava-se de Tiago, segurando-lhe o rosto com as duas mãos, e beijando-o na boca, a outra, de cabelos castanhos permaneceu ao lado de Sirius e olhava curiosa para a prima deste.
Você não acha que está na hora de me apresentar sua prima oficialmente, Sirius?Ele sorriu, e pegou discretamente na mão da moça.
Andrômeda Black, minha prima...Catherine Bishop, minha namorada... Eu disse para você que ainda vou pensar... E eu te dei o dia do baile como prazo – e voltou-se para Andrômeda – é lógico que ela vai aceitar...e espero que vocês possam ser amigas também..." Isso está fora de cogitação, Sirius Black..." – pensou, amargurada.
Voltou para a Sonserina pior do que saíra naquela manhã. E se deu conta de que apenas em seus sonhos ele iria sentir por ela mais do que a afeição de primo. E isso foi o bastante para fazê-la chorar até a hora do jantar.
***
A sexta-feira chegara, e Andrômeda ainda não se refizera do desgosto com Sirius. Via-o de vez em quando no corredor, sempre tão derretido por aquela intrometida da Bishop...sentia vontade de desaparecer, humilhada. Refugiava-se o quanto podia na biblioteca, longe dos comentários a respeito do baile, da empolgação de Lucila e dos comentários mordazes de Bellatrix. E naquela tarde, enquanto procurava decorar uma lista de ingredientes para uma poção, viu que alguém se aproximava da sua mesa. Levantou os olhos dos livros, e viu parado, na sua frente, Rabastan Lestrange.
Olá – ele disse, um tanto sem-graça – posso me sentar?A garota fez um gesto que tanto podia ser sim , quanto não. O rapaz não hesitou. Sentou-se ao lado de Andrômeda. Esta interrompeu mais uma vez a leitura e o olhou exasperada. Apesar de estarem no mesmo ano, dele ser amigo de Regulus e irmão do namorado de Bellatrix, não havia a menor intimidade entre ambos, além do bom-dia e boa-noite habituais, mesmo depois de quase seis anos de convivência. Ele era quase bonito: tinha cabelos loiros, bem lisos que ele sempre jogava de lado, caindo-lhe sobre parte da testa. Seu rosto era magro, porém sempre corado, e o nariz proporcional ao restante do rosto. Mas eram os olhos, azuis e frios, que desarmonizavam o conjunto, e lhe davam a impressão de ser antipático.
Você vai ao baile? – ele perguntou de supetão – aliás, você já tem um par? Não sei ainda...- Andrômeda respondeu à primeira pergunta – porque? Pensei em convidá-la – Rabastan disse, e não parecia muito sincero – quer ir comigo?" Aí está o dedo de Bellatrix – a garota pensou, antes de dar uma resposta definitiva – ok, dessa vez ela venceu...mas que seja pela última vez..."
Será um prazer, Rabastan... – disse por fim, e quase se divertiu ao ver uma expressão de surpresa no rosto dele – " imaginava que eu recusaria o convite? " – pensou, mais uma vez.***
O dia de Natal amanheceu frio e nevava com mais intensidade lá fora. Após abrir os seus presentes, Andrômeda subiu para o café, sem mesmo esperar Lucila. Sentia-se meio idiota por ter aceitado tão facilmente o convite de Rabastan. Era óbvio que Bellatrix o persuadira a isso. E, pensando nisso, não notou que Sirius vinha em sua direção, e antes que ela pudesse se dar conta, ele já a estava beijando nas faces, desejando-lhe Feliz Natal.
Recebeu o meu presente? – ela perguntou, ruborizada. Claro. Gostei muito da capa, é bastante quente. E você? Recebeu o meu?Como resposta, a garota puxou para fora das vestes uma fina corrente de ouro, em cuja ponta brilhava uma estrela cravejada de brilhantes.
É linda...mas você não precisava ter gastado tanto num presente... Eu não me preocupei com o dinheiro...bem, você sabe – ele respondeu, melindrado. Não precisa me dizer sobre a herança mais uma vez... – ela disse sombriamente, e procurou desviar os seus pensamentos de que o seu presente fora comprado com o dinheiro que tio Alphard deixara para Sirius. O rapaz parecia ser da mesma opinião, porque rapidamente mudou de assunto. E com quem você vai ao baile hoje? Rabastan Lestrange – e ela o disse com tanta naturalidade que se surpreendeu. Quem?!! Rabastan Lestrange – repetiu Andrômeda, levemente irritada – qual o problema? Ele é um problema...você vai descer ao nível da Bellatrix agora? Pelo menos ele não é um sangue-ruim como a sua amiga Catherine – a garota respondeu friamente, e encarou os olhos cheios de fúria do primo – o que foi? Eu disse alguma mentira? Hogwarts inteira sabe que a sua namoradinha não tem um pingo de sangue bruxo nas veias, nem ela, nem a amiga irritante dela, e ... Cala a boca!! Cala-a-boca, Andrômeda!!! – ele gritou, chamando a atenção dos outros alunos. E o que você vai fazer para me calar? – agora ela também gritava – vai me ameaçar, como fez com a Bellatrix, antes de ir embora? Quando você quer, consegue ser tão desprezível quanto a sua irmã – ele respondeu, magoado – acho melhor tomar o meu café, antes que eu estrague o resto da minha manhã.Afastaram-se, e durante toda a refeição procuraram ficar de costas um para o outro. Logo, Lucila e Regulus apareceram no salão, e se juntaram à Andrômeda. Pela primeira vez na vida, ela conseguia sentir raiva de Sirius, e pela primeira vez não se rebaixara diante dele, parecendo ser uma boa menina.
A noite chegou depressa, e, pontualmente às oito horas Andrômeda estava impecavelmente vestida e penteada para o baile, de braços dados com Rabastan aguardando o Salão se abrir. Ignorou solenemente Sirius e Catherine, fingia um grande interesse pela conversa enfadonha de Rabastan a respeito de quadribol. Sentaram-se a mesma mesa que Regulus e Lucila, e teve um início de noite quase agradável. Quando a música começou a tocar, Rabastan a tirou para dançar, e ela não hesitou em acompanhá-lo.
Enquanto dançavam, ele procurava apertá-la ao encontro do seu corpo, mas Andrômeda o afastou discretamente.
Algo errado? Hum...estou com sede...você não quer buscar rum de groselha para mim? Você não prefere algo mais fraco? Cerveja amanteigada? Não – ela respondeu prontamente – você traz para mim? Vou Ter que pedir ao meu irmão...eles não servem menores.Pouco depois, Rabastan trazia dois copos, e ambos beberam em silêncio. Regulus dançava com Lucila, Narcissa, com Hareton Avery...e Andrômeda não pode deixar de notar, o quão apaixonado Sirius parecia, agarrado com Catherine, quase beijando-a . Sorveu o restante da bebida, e pediu outro copo. Rabastan relutou, mas acabou voltando com mais dois copos.
Venha, Rabastan, vamos dançar mais um pouco.Dessa vez, o rapaz manteve distância. Durante duas músicas, ou mais, ambos ficaram em silêncio, até que Andrômeda fez a perguntava que a deixara curiosa desde a véspera.
Quanto Bellatrix lhe ofereceu para vir ao baile comigo? O que?!! Você não me convidaria a toa... Ela não me ofereceu nada...eu também estava sem companhia, e... ...e então eu podia servir? Não...quer dizer, eu não sabia que você estava sem par...e, bem...realmente sua irmã falou que eu poderia lhe chamar, que você também não tinha sido convidada – ele a encarou – se você não quisesse ter vindo comigo, poderia ter recusado o meu convite...não precisava armar toda essa cena... Eu quis vir com você... – ela mentiu – é lógico que eu teria recusado se não estivesse a fim. Será? - Ele desafiou. Sim. Da mesma forma que eu enjoei de dançar com você – respondeu Andrômeda.A garota o largou sozinho no meio da pista, deixando-o com cara de bobo. Caminhou lentamente até a mesa onde estavam sendo servidas as bebidas. Próximo dali, Bellatrix conversava com o namorado e alguns amigos, e Andrômeda percebeu que a irmã não lhe tirava os olhos. Ignorando-a, a garota aproximou-se da mesa, apanhou uma garrafa de cerveja amanteigada e ficou bebericando, pensando seriamente em voltar para o dormitório, quando viu Sirius muito junto de Catherine. Ele cochichava no ouvido da moça e ela ria. Em seguida, ambos saíram do salão. Aquilo, ao invés de entristecê-la, deixou-a com mais raiva do primo. E decidiu continuar no baile.
Você não acha que já bebeu o bastante? – Bellatrix agora estava ao seu lado, fiscalizando-a. Não tanto quanto você... Mas eu estou acostumada – a irmã sorriu maldosamente – preste atenção, Andrômeda, não vá me fazer passar vergonha...eu vi você andando, você está completamente bêbada. O problema é meu, se eu resolvi beber esta noite. E porque você não está com Rabastan? E porque você não está cuidando da sua vida, Bellatrix? – Andrômeda gritou, o que despertou risinhos a sua volta. Você está dando um show ridículo...e está me matando de vergonha....chega de beber!! – exclamou, ao ver que Andrômeda pegava outra garrafa – eu estou lhe avisando, nosso pai e a tia Ursula vão ficar sabendo disso...me de-vol-va essa garrafa!! – Bellatrix puxou o recipiente da mão da irmã para si, mas com a força que utilizou, a garrafa entornou, derramando o conteúdo sobre o seu vestido – olha o que você fez, sua estúpida!!- ela gritou de raiva – você vai me pagar caro...Rudolphus, me ajude...olhe o que ela fez...Depois daquilo, o mais sensato era sumir das vistas de Bellatrix. Porque quando ela ficava desapontada, furiosa ou as duas coisas juntas ( o que era o mais comum ) o mundo parecia desabar. E ela sempre acabava descontando em quem estivesse por perto. Agora, sua visão estava totalmente embaçada, e teve plena certeza de que estava embriagada. Os fatos daquela noite se misturaram depois em sua mente, e mesmo sóbria, mesmo passando anos ela tentou entender por completo o que se passara desde o momento em que largara Bellatrix reclamando a sujeira no vestido. Mas uma coisa era certa: fora ali que as coisas começaram a mudar em sua vida...
Estava sozinha no meio do salão. Todos os seus conhecidos estavam dançando ou no jardim. Sentiu-se em pânico, mas estava determinada a não desistir. Deveria ficar ali até o fim.
Então ele se aproximou. De onde mesmo ela o conhecia? Ah, sim...de vez em quando o via nos corredores. E ele esbarrara nela no trem...
Vai ficar parada aí a noite toda?Ela o olhou melhor. Era um rapaz alto e magro, cabelos e olhos castanhos, um rosto sem nenhum atrativo. Não tinha a beleza, os traços fortes de Sirius. Nem o seu olhar penetrante. E viera de uma família trouxa. Extremamente trouxa, como diziam seus colegas de casa... um dos passatempos na Sonserina era apontar dentro de Hogwarts todos aqueles que não tinham sangue puro. E aquele rapaz, quase esquisito, era um deles. Não ousou responder à pergunta. Mesmo fora de si, embriagada, ela sabia que não devia lhe dar atenção. Agir como aprendera desde sempre...como Narcissa e Bellatrix...
"Mas o que ele fez contra mim para que eu finja que ele não existe?" pensou.
Eu não sei... – respondeu vagamente. Hum...seria um desperdício...ficar parada num baile...preferível estar na cama... Talvez... Você só sabe dizer isso? – ele zombou – não sei...talvez... ou, - e ele assumiu um ar mais sério – talvez você não queira falar comigo... Pode ser... ...porque talvez você seja mais uma esnobe sangue-puro?Andrômeda o encarou surpresa. Não esperava tanta sinceridade, ou, como ela interpretara naquela noite, um verdadeiro tapa em seu rosto. Algo para fazê-la acordar. Afora o esbarrão no trem, ela jamais tivera qualquer outro contato com ele. E naquele dia, ele dissera palavras parecidas.
Afinal, porque você me provoca assim? Eu nem sei seu nome, nós não nos conhecemos...- as palavras saíam automaticamente da sua boca. Ela não conseguia se controlar. Não sei porque faço isso...quer mesmo saber o meu nome? Sou Theodore Tonks, mas os meus amigos – e ele deu muita ênfase às ultimas palavras – costumam me chamar de Ted... E eu sou Andrômeda Black...- ela murmurou – da Casa dos Black...o primeiro registro da nossa família data aproximadamente sete séculos... meu tataravô foi diretor de Hogwarts, sabia? E o meu pai torra a nossa fortuna em viagens exóticas ao redor do mundo...O rapaz ouvia com curiosidade. Seria muito cruel da sua parte continuar com aquela provocação gratuita. Ele também bebera naquela noite, mas conseguia controlar a língua, ao contrário de Andrômeda. Uma música trouxa começou a ser tocada. Ele conhecia a melodia. Alguns alunos vaiaram, liderados pela turma de Bellatrix. Outros pararam de dançar. Mas eram apenas uma minoria naquele salão. Pelo menos ali, naquele dia de festa, os preconceitos deveriam ser deixados de lado.
Vem cá – Ted puxou Andrômeda pela mão, enlaçou-lhe a cintura e a puxou para o meio do salão. No início ela protestou, mas achou aquela situação tão absurdamente divertida, que não teve como recusar sem ser grosseira.Dançaram apenas uma música. Por cima do ombro do rapaz, Andrômeda encontrou os olhos de Bellatrix observando-a, numa censura muda. A garota não sabia quanto tempo bastaria para que a irmã atravessasse o salão e a impedisse de continuar a dançar com Ted Tonks.
Eu não estou passando bem – ela sussurrou, e era verdade. Começava a se enjoar – preciso de ar fresco.Saíram do salão. Alguns olhares curiosos os acompanharam, e Andrômeda teve a impressão que lançavam azarações às suas costas. Estava ao mesmo tempo constrangida e excitada, e sentiu-se novamente como uma criminosa. Como se estivesse fazendo algo errado. Ficaram um bom tempo em silêncio, e ela começou a se perguntar porque ele estava ali ainda, ao seu lado. Eram completos estranhos um para o outro, não tinham nada em comum. E no entanto, estavam juntos, sentados nos degraus da escada da entrada do castelo.
Está uma noite bastante bonita... – ele disse, mais para quebrar o silêncio incômodo – me lembra as noites na fazenda... Você vive numa fazenda? – ela murmurou, e encolheu-se com frio, a cabeça sobre os joelhos – isso é muito engraçado... Engraçado? O que? A fazenda? Não...nós dois aqui fora...eu quase bêbada e você falando da noite...- ela riu baixinho – isso não faz sentido. É...é mesmo engraçado...e sabe do que mais? Eu também bebi além da conta...senão não iria me arriscar, lhe chamando para dançar...e amanhã, quando a nossa ressaca passar, vamos perceber que essa noite foi uma espécie de...de sonho, entende? Porque nós dois somos muito, muito diferentes... Muito diferentes...- ela repetiu. ...porque você é influente. As pessoas sabem o seu nome, conhecem a sua família... Os outros me conhecem apenas porque sou uma Black...é essa a diferença entre eu, e minhas irmãs e meus primos...nunca fiz nada que merecesse alguma atenção especial...eu sou apenas a irmã de Bellatrix e Narcissa, entende? É assim que sou conhecida... Então eu prefiro ser como eu sou...é muito mais simples ser Ted Tonks, aluno do sétimo ano de Hogwarts, cujos pais são trouxas, criadores de carneiro...Andrômeda riu novamente, e para seu alívio o rapaz não se zangara.
Criadores de carneiro? Produzimos lã da melhor espécie – ele respondeu, fingindo seriedade – qualquer dia lhe mostrarei umas fotografias de lá... Você não acabou de dizer que amanhã seremos como dois desconhecidos? – ela perguntou, maliciosa – então não faz sentido você querer me mostrar fotografias da sua fazenda... É... – ele disse, encarando-a – você tem razão. Foi apenas um modo de falar.Começara a nevar, e Andrômeda estremeceu. Aproximou-se instintivamente de Tonks, procurando se aquecer. Ele fingiu não notar, mas discretamente tocou as mãos da moça e percebeu que estavam geladas. Tomou-as entre as suas, esfregando-as.
Você devia ter trazido luvas... As que eu tenho não combinam com o meu vestido... Boa resposta! – o rapaz sorriu, irônico – a elegância sempre em primeiro lugar...mulheres!!Ela sorriu, e pela primeira vez na noite sentiu-se realmente bem. A cabeça parara de girar, o mundo lhe parecia mais nítido. E entre tudo, era o rosto do rapaz que entrava em foco, e ele a olhava com interesse...de um modo que Sirius jamais a enxergaria um dia...como uma garota atraente.
E, por falar no primo, ele se aproximava do castelo com a namorada. Sim, não havia dúvidas, pensou Andrômeda, quando o viu abraçado com a moça – Catherine, esse era o nome – e uma sensação incômoda tomou conta de si. Continuavam brigados, ele passaria reto por ela...talvez nem voltassem mais a se falar...Sirius subia as escadas devagar, conversava ao pé do ouvido com a moça...o casal se aproximava...ainda estava de mãos dadas com Ted...então, encarou fixamente o rapaz, e depois olhou para a sua boca...não era assim nos romances? Ele pareceu captar a mensagem...e quando Sirius passou pelo casal, e olhou com certa curiosidade para os dois, Andrômeda fechou os olhos e encostou os seus lábios nos de Ted...um beijo morno...entreabriu os olhos e viu que Sirius continuava o seu caminho...mas isso não impediu que ele lançasse um olhar irônico na direção da prima.
Naquela noite Andrômeda não dormiu direito. Lucila e suas outras colegas de quarto a olharam com curiosidade, mas ela não disse uma única palavra. Puxou as cortinas em torno da sua cama, refugiou-se entre as cobertas. E no escuro, ela confundia os olhos de Sirius com os de Ted.
***
Os dias que se seguiram foram, para Andrômeda, um misto de aborrecimentos e surpresas. Primeiro, na manhã seguinte ao baile, fora obrigada a enfrentar a fúria de Bellatrix, o vestido inutilizado, "e pode ter certeza que vou exigir que você me pague o prejuízo", e o fato de ter sumido do baile em companhia de Ted Tonks "um trouxa que brinca de ser bruxo, Andrômeda...como você pôde?" – a irmã exclamava pelos quatro cantos da sala comunal, os outros alunos observando a cena como se esta fosse uma comédia. Andrômeda ouvia calada. Não encontrava argumentos – nem força – para contradizer a irmã. No seu íntimo, achara Ted uma pessoa interessante. E agora se perguntava, onde estava a diferença entre ambos? Ele era tão apto em magia quanto ela, até mais, se considerassem que ele estava prestes a se formar. Então, de onde vinha tanta discriminação? À noite, antes de dormir, relacionou todos as famílias puro-sangue que conseguia se lembrar. Não conseguiu colocar no pergaminho mais que uma dúzia de nomes. Se a pureza do sangue dependesse apenas deles, num futuro não muito distante, irmãos seriam obrigados a se casar com suas irmãs...
" E primos com primas..."- pensou. Mas ela já riscara essa possibilidade da sua vida. Sirius a odiava agora, não? E no fim, ele era quase seu irmão...naqueles dias subsequentes ao baile, a sua paixão pelo primo aos poucos desvanecia. Se encontravam nos corredores, ele a cumprimentava com frieza, ela não o procurara para fazer as pazes. As aulas, os deveres tomavam praticamente conta de todo o seu tempo.
Em compensação, surpreendeu-se ao se pegar pensando em Ted com certa ternura. Encontrava-o quase todos os dias na biblioteca, nos corredores, nos jardins, e se perguntava como jamais percebera a presença daquele rapaz grande e desengonçado. Na primeira vez que se encontraram após o baile, ambos constrangeram-se, e não trocaram uma palavra sequer. Mas ela se acostumara todos os dias, antes do jantar, a estudar na biblioteca. E para sua surpresa – e porque não confessar? – prazer, ele também aparecia por lá. Nas primeiras vezes, acompanhado de um ou outro amigo, ficavam num canto discutindo sobre as matérias que cairiam nos N.I.E.M.S e vez ou outra, ela percebia um olhar mais longo em sua direção.
Mas então, uma noite, logo após o jantar, Ted chegou sozinho à biblioteca. Andrômeda trabalhava concentrada em seus deveres, e só percebeu a chegada do rapaz quando ele se sentou à sua frente.
Alguém vai se sentar aqui? – ele perguntou. Não...- foi a resposta seca dela. Então você não se importa se eu ficar aqui? Não... Realmente, Black...você é a pessoa mais comunicativa que eu conheço... E você o mais chato...não vê que estou tentando estudar?Ele lançou um olhar para o livro que ela lia.
Herbologia? É...uma pesquisa sobre alguns fungos que eu estou desenvolvendo... Se você precisar de ajuda... Ajuda? Isso aqui é bem complexo... Está me menosprezando? – ele riu, sarcástico – esqueceu que sou um ano mais velho que você? E que eu ajudei a fundar o Clube de Herbologia, com a aprovação da Profª Sprout?Andrômeda o encarou. Sempre havia alguma coisa naquele garoto estranho que a surpreendia. Era como se a cada palavra, ele a desafiasse para um duelo.
Bem, eu não conhecia tão a fundo o seu histórico escolar, Tonks... Você não admite quando perde a razão, né? Isso prova o quanto você é mimada. Eu não dei liberdade para você me tratar assim... Oh...me desculpe, Miss Perfeição...prometo que não dirigirei mais a palavra à sua ilustre pessoa...Permaneceram em silêncio durante vários minutos, nos quais Andrômeda fingia que lia o seu livro, e Ted, por sua vez, simulava alguns cálculos de Aritmancia. Depois do que pareceu uma eternidade, ele fechou o livro, e recolheu o pergaminho. Deixou do lado de fora da mochila um livro em brochura. Andrômeda lançou um olhar para o volume, e estranhou o material de que era feito, assim como o título e o autor.
Isso é romance? – ela perguntou, de supetão. É...o mais famoso de todos os tempos – ele respondeu, irônico – ou você não conhece a história de Romeu e Julieta?Diante da expressão da moça, ele percebeu que ela não fazia a menor idéia da história. Suspirou, resignado.
É uma peça de teatro...escrita pelo dramaturgo mais famoso da Inglaterra, Andrômeda. Trouxa, naturalmente...você nunca ouviu falar de Willian Shakespeare, certo? – diante do olhar interrogativo dela, ele se animou a continuar – essa história é sobre um romance proibido entre dois jovens, cujas famílias são inimigas mortais. É muito bonita e triste também... Parece interessante...- ela respondeu, folheando o volume – nunca li nenhum livro trouxa...- ela murmurou. Pode ler esse, se quiser...eu lhe empresto, é só tomar cuidado, porque pertence a minha mãe...ela tem uma coleção completa... Você não parece ser o tipo da pessoa que gosta de literatura – ela observou, examinando as mãos calejadas do rapaz, as unhas sujas de terra, as vestes surradas. Eu gosto de ler, mas tenho pouco tempo livre...estou envolvido em muitas atividades aqui no castelo, principalmente no que se refere às plantas...- ele olhou para as próprias mãos – eu nasci no campo, e é para lá que eu vou voltar, quando me formar...meu pai acha que vou me dedicar à nossa criação, e esquecer essas "coisas estranhas de bruxos e magia..." – ele riu – acho que estou cansado demais, pra ficar falando dessas coisas com você... Eu não me importo – ela respondeu com simplicidade – eu não conheço absolutamente nada do mundo trouxa...isso não faz parte da minha realidade, então... Se você não conhece, não devia fazer coro com os seus amigos, e nos chamar de sangue-ruins – ele disse, sério – porque os trouxas também têm muito a contribuir para o mundo. Eu só faço o que esperam de mim. Se você acredita na superioridade do seu sangue puro, e me provar porque vocês são superiores, eu nunca mais toco nesse assunto...mas algo me diz que muitas vezes você apenas repete o que aprendeu durante a sua vida...Ela olhou envergonhada para o livro em suas mãos. Um quase desconhecido conseguira adivinhar muitas das coisas que ela não dizia para ninguém, que ficavam guardadas, escondidas em sua alma. Nem mesmo Sirius um dia chegara a lhe dizer todas aquelas palavras.
Leve o livro com você – ele insistiu – e depois poderemos discutir a história... Eu vou levar...- ela guardou o livro junto com o material escolar, e se preparou para sair da biblioteca – obrigada. – agradeceu, por fim e sorriu.E ainda sorria, quando chegou a Sonserina, e seu humor não se alterou nem mesmo com a presença de Bellatrix, que parecia querer irritá-la de qualquer modo, ainda reclamando sobre o vestido manchado. Naquela noite, Andrômeda sonhou com o campo, e um rapaz a pegava pela mão...não conseguia ver seu rosto, mas ela tinha plena certeza que não era Sirius.
***
Se antes os encontros entre Ted e Andrômeda eram apenas coincidências, agora já não se podia dizer o mesmo. Tinham um horário fixo na biblioteca, e todas as noites se viam entre os livros e os deveres. Conversavam sobre vários assuntos, e ela se espantava por conseguir dizer coisas que guardava apenas para si. Ele falava sobre a fazenda, os pais, a irmã mais nova, e a sua antiga vida de trouxa.
Às vésperas do Dia dos Namorados, os dois encontraram-se mais uma vez. Naqueles últimos dias, Andrômeda vinha se preocupando cada vez mais com sua aparência. Levava mais tempo para arrumar os cabelos, passava perfume e coloria levemente os lábios. As pessoas a sua volta, principalmente Lucila e Narcissa apoiavam a sua "transformação", e apostavam que ela estava interessada em algum rapaz. Mas o que elas diriam se soubessem que a pessoa em quem Andrômeda mais pensava nos últimas dias era um sangue-ruim?
Terminei de ler o livro – ela disse, sem rodeios, quando se sentou ao lado dele – e achei muito triste. É a história de amor mais famosa de todos os tempos – ele respondeu, sorrindo – exatamente porque eles não ficam juntos... Mas não é justo, certo? Quero dizer...- ela mordeu os lábios, sem-graça – se duas pessoas se gostam, têm que ficar juntas... É isso o que você pensa? Mesmo que as pessoas não entendessem a sua escolha? Acho...que sim...Ted puxou a mão de Andrômeda para si, e a acariciou delicadamente.
E se eu dissesse que estou me apaixonando por você, qual seria sua reação? Se fosse há algumas semanas eu diria que você é louco...mas agora...- ela hesitou – eu não sei o que dizer... Vamos fazer o seguinte...- ele apertou com mais força a mão dela – vou dar um tempo para você...até a próxima visita a Hogsmeade, no Dia dos Namorados...aí nós poderemos ir juntos ao vilarejo, e conversamos com mais calma...Ela o olhou demoradamente, como se avaliasse a situação. Em sua mente apareciam as imagens de suas irmãs, sua tia, a família inteira...diriam não àquele namoro, com certeza...Bellatrix a importunaria o tanto quanto conseguisse...mas ela , Andrômeda, estava gostando de Ted Tonks...aquilo era um fato. E ela simplesmente cansara de fingir.
- Eu gosto de você também...- ela respondeu, sorrindo.
Ted enlaçou-a com o braço, e a trouxe para junto de si. Por um instante, Andrômeda pensou em desistir de tudo, voltar a ser como era antes...sua vida era tão tranqüila...mas a sua hesitação desvaneceu quando sentiu novamente os lábios do rapaz nos seus.
***
Apesar do frio intenso, na tarde seguinte Andrômeda deixou o conforto da sala comunal, e seguiu para o campo de quadribol. Ainda estava confusa sobre o que acontecera na noite anterior – na verdade nem dormira – e agora, mais do que nunca, precisava falar com a única pessoa que a entenderia em Hogwarts, mas para isso teria que passar por cima do próprio orgulho, o que não era nem um pouco fácil...
Ela sabia que era hábito de Sirius acompanhar o treino do time de quadribol da Grifinória, embora ele não fosse um dos jogadores, e no fim apostar corridas de vassoura com Potter. Naquela tarde não fora diferente, e ela viu dois pontos sobre o campo, se exibindo sobre suas vassouras. Andrômeda subiu a arquibancada, mas então percebeu que duas garotas acompanhavam o vôo dos rapazes: suas respectivas namoradas.
Andrômeda aproximou-se devagar. Não gostava delas, e sabia que a recíproca era verdadeira. Mesmo assim, não hesitou em sentar-se ao lado das garotas e cumprimentá-las. Por alguns instantes, as duas a olharam chocadas. Mas foi a ruivinha – a namora de Potter – que quebrou o gelo.
Er...olá, Black... – disse a garota, também sem-graça – e então? Eu preciso falar com o Sirius – Andrômeda respondeu, apontando para o céu – por isso vim aqui... E o que lhe faz pensar que ele vai querer falar com você? – Catherine falou – eu sei que vocês brigaram, e qual foi o motivo...e o mais engraçado disso tudo foi ver você aos beijos com o Ted...será que ele sabe o tipo de pessoa que você é? Ele sabe muito bem quem eu sou...melhor que você... – a prima de Sirius estava se irritando, e sabia que seria questão de tempo para soltar os tipos de ofensas que ela estava acostumada a dizer. Mas isso a faria perder moral em relação à Ted, e essa era a última coisa que ela queria naquele momento.Sirius e Potter aterrissaram no campo, e subiram a arquibancada sorridentes, comentando sobre a próxima partida da Grifinória contra a Corvinal. Andrômeda manteve-se um pouco afastada enquanto o primo conversava com a namorada, mas não demorou nada para que ele a notasse ali também. E foi com uma expressão de poucos amigos que ele a encarou, e ela percebeu que ele ainda estava magoado.
Eu preciso conversar com você...mas não aqui... Você é engraçada...diz barbaridades para mim, depois chega como se nada tivesse acontecido, e ainda impõe exigências para conversar comigo. O que há de tão importante para me dizer, que nem meus amigos, nem a minha namorada possam saber? Será que vou ter que expor a minha vida à estranhos? Eu vim aqui para te pedir desculpas, seu grosso...- ela levantou-se, irritada – mas agora estou vendo que é impossível...Por um instante, Andrômeda teve a impressão que sua cena – sim, a reação do primo era mais que esperada, e ela se preparara bem para aquele momento – não surtira nenhum efeito. Mas ele respirou fundo, e concordou em conversarem num lugar mais tranqüilo. E para a satisfação de Andrômeda, Catherine não gostara nem um pouco daquela súbita mudança de atitude do namorado, e negou-se a beijá-lo quando Sirius se despediu.
Sentaram-se no banco próximo ao lago, onde Sirius era constantemente visto em companhia dos seus amigos. Durante algum tempo, ficaram em silêncio. Então, Andrômeda percebeu que ela teria que iniciar o assunto.
Eu realmente queria pedir desculpas por tudo o que eu disse...eu não devia ter ofendido você daquela maneira...mas é o modo que eu aprendi a me defender...e estou procurando corrigir... Sei... – ele murmurou, mal-humorado, cutucando a grama com um graveto – mas há certas coisas, certos traços que nós nunca vamos perder, Andrômeda. E eu duvido que você nunca mais vá chamar alguém de sangue-ruim...isso está tão enraizado em você, que às vezes eu sinto...sei lá, medo... – ele olhou para a prima – às vezes você se parece demais com a Bellatrix....Andrômeda riu.
E você tem medo da minha irmã? Por quê? Porque ela consegue odiar com muita facilidade – ele estalou os dedos – assim...rápido. Pelo menos eu não consigo entender o que se passa na mente dela... Mas vocês costumavam se dar bem...quer dizer, bem até onde isso é possível quando se trata dela... – a garota murmurou, como se lembranças tivessem vindo à sua memória – pelo menos não havia tantas brigas antigamente... É...- Sirius murmurou, ruborizado – nós costumávamos nos dar bem...- ele repetiu, como se isso houvesse acontecido em outros tempos, numa outra vida – mas não foi para falar de mim, nem da Bellatrix que você me chamou aqui...Andrômeda o encarou. Havia ensaiado como dizer a Sirius que fora pedida em namoro por Ted Tonks, mas agora as palavras fugiam da sua boca. Não se sentia confiante o suficiente, mas o primo parecia adivinhar os seus pensamentos...e além de tudo, ele vira o primeiro beijo, no dia do baile.
É algo relacionado com o baile...com o Tonks? É...quero dizer...bem, eu não sei como explicar...Sirius, eu não sei o que fazer – ela respondeu, quase desesperada – eu acho que estou gostando do Ted.Ele riu.
E só agora você percebeu, Andrômeda? Muita gente já percebeu o quanto vocês andam juntos...não me admira nada que esses comentários já não tenham chegado à Sonserina... Ele quer namorar comigo! E qual o problema? – ele perguntou, já prevendo a resposta - ah, sim...tão óbvio... Não tenho nada contra ele ser sangue....quero dizer, ser nascido trouxa – ela corrigiu – mas eu não vou conseguir esconder... Concluindo: você quer namorar com o Tonks, mas tem medo do que suas irmãs, o seu pai, a família inteira vai dizer? – ele perguntou, irritado – sinto muito, Andrômeda...se é isso o que está mais te preocupando, então eu lhe digo: esqueça o Tonks. Porque se você ficar com ele, você estará arrumando problemas com todo mundo... O que você faria no meu lugar? – Andrômeda o encarou, percebendo o quão fora estúpida a sua pergunta – será que não existe uma maneira de conciliar tudo? Você sabe que não...porque você acha que eu saí de casa? Por causa dessa obsessão pelo sangue-puro...você acha que o Tonks é pior que eu ou o Regulus? A Cathy não é tão bruxa quanto você? Só posso lhe dizer uma coisa, Andrômeda: eu apóio você no que for preciso para a sua felicidade. Se daqui algum tempo você me disser – Ah, eu não vou mais namorar com o Ted porque descobri que não gosto mais dele., não vou fazer nenhuma observação, porque a vida é sua...mas se você não agüentar a pressão, e desistir dele, então só posso lamentar por você...porque aí você vai provar que é tão superficial quanto o resto da família...Permaneceram em silêncio novamente, e Andrômeda refletia sobre as palavras de Sirius. Ainda não sabia se valeria a pena arriscar tudo por Ted, mas ela tomou o discurso do primo como um desafio. Levantou-se e o encarou, meio séria, meio rindo.
Eu não vou decepcionar você, Sirius Black!!***
Hogsmeade nunca parecera tão bela para Andrômeda quanto naquela tarde, quando ela pisou naquelas ruas, já velhas conhecidas suas ao lado de Ted Tonks. Caminhavam lado a lado, quase em silêncio. Evitaram o "Três Vassouras", àquela hora lotado de estudantes ávidos por cerveja amanteigada, ou qualquer outro local em que fossem vistos ou apontados por alunos da Sonserina – mais especificamente, Bellatrix, Narcissa e Regulus. Pelo menos daquela vez, Andrômeda desejava um pouco de sossego para poder conversar a vontade com o rapaz.
Subiram uma das colinas que cercavam Hogsmeade, e sentaram-se sobre a grama para apreciar a vista que tinham, dali, de todo o vilarejo e mais ao longe, de Hogwarts. Ali, o mundo parecia ter parado. Era como se todos os problemas houvessem se extinguido de uma só vez. Os dois jovens esqueceram-se por alguns momentos que em breve seriam alvo da maledicência e do preconceito...ignoraram que teriam que resistir às pressões da família Black, se quisessem continuar juntos...ali se sentiam em paz. Não era preciso temer nada.
***
Andrômeda,
Percebi pela sua última carta que o seu verão tem sido extremamente enfadonho. Bem, não posso dizer que o meu esteja sendo melhor, já que não estamos juntos. Tenho pensado em você, e no quanto seria bom tê-la ao meu lado. Não me acostumei ainda a Londres, mas em breve comprarei aquelas terras que lhe falei, para que eu possa começar a formar a minha fazenda de ervas mágicas. Enquanto isso não acontece, ficarei nessa cidade de loucos, trabalhando como pesquisador júnior no St. Mungos. A equipe na qual trabalho está empenhada em descobrir os usos de diversas plantas e fungos no combate aos efeitos da Maldição Cruciatus. É um trabalho interessante, mas não é exatamente isso o que quero fazer da minha vida. Você sabe o quanto eu gosto de lidar com a terra e acompanhar o crescimento das plantas.
De vez em quando encontro o seu primo, Sirius. Ele tem me passado informações sobre o que está acontecendo pelo país, e na Europa em geral, e só agora percebo o quanto estávamos desinformados em Hogwarts. Uma guerra, Andrômeda! Baseada na intolerância, na idéia da supremacia de uma raça. Eu cresci ouvindo meu pai contando sobre a Segunda Guerra Mundial, sobre Hitler e o Nazismo. E agora, eu vejo que um dia contarei aos nossos filhos sobre esse bruxo que todos evitam dizer o nome, que em nome de uma raça pura de bruxos, tem matado e torturado.
Mas não é sobre essa maldita guerra que eu quero falar. É sobre nós dois. Penso em você, dia após dia, e não consigo imaginar o meu futuro sem a sua companhia. Estamos juntos há tão pouco tempo, e eu já sinto que você é parte de mim. Superar esses dias, semanas e talvez meses longe da sua presença será um grande desafio. Mas se resistirmos e formos fortes, e não deixarmos que a intolerância da sua família nos afaste, então seremos as pessoas mais felizes do mundo. E poderemos ser egoístas o suficiente para esquecermos essa guerra e vivermos a nossa vida.
Aguardo ansioso sua próxima carta.
Com amor,
Ted.
***
Ted,
Eu realmente estou entediada nesse fim de mundo chamado Salisbury. Quando eu era criança, aguardava ansiosamente o verão, para vir para o campo e passar dois meses aqui. Mas isso foi em outra época. Agora, meu pai finalmente lembrou-se que tem três filhas, e insistiu em nos trazer para a casa de campo da família, para que possamos passar dias agradáveis juntos. Só que ele se esquece que agora nós somos quase como estranhas para ele. Estamos só nós quatro nessa casa enorme. O lugar é bonito e agradável, e sempre chove no final da tarde. Eu queria que você estivesse aqui comigo, agora. Tenho me sentido muito solitária e isolada aqui.
Eu não sou a única que não está satisfeita aqui. Bellatrix tem resmungado pela casa nos últimos dias, murmurando coisas sem nexo. Há algo nessa casa que a incomoda, isso eu já percebi. Principalmente nas tardes de chuva, ela fica mais melancólica, debruçada na varanda, olhando para os campos. Falta de notícias do noivo não podem ser – ela recebe cartas quase diárias, e ás vezes as lê em voz alta para o meu pai. Há muito sobre a minha irmã que provavelmente eu não saiba – e também não me preocupo em saber.
Narcissa tem passado praticamente todas as tardes na casa de campo dos Malfoy – eles têm uma propriedade muito próxima daqui – e tenta me convencer a acompanhá-la. Apesar de ser amiga de Lucila, eu não gosto da família como um todo. São todos uns esnobes, na minha opinião ( eu sei que vindo de mim isso soa engraçado, mas eles conseguem ser piores que eu ou a minha família no quesito "nós somos os melhores ).
Obviamente as suas cartas também não passaram despercebidas. Até então, minhas irmãs achavam que o nosso namoro era apenas mais um caso passageiro, como outros tantos ocorrem em Hogwarts. Mas agora, Bellatrix tem me feito ameaças veladas. Ela diz que qualquer hora vai descobrir onde escondo a minha correspondência e vai entregá-las não ao nosso pai – como ela diz, um pobre desligado da vida prática – e sim a tia Úrsula, a única pessoa que tem conseguido manter a unidade da nossa família. Por isso, acho melhor não tratarmos de assuntos confidenciais por cartas, não enquanto eu estiver nesse exílio. Quando voltar à Hogwarts, talvez teremos mais liberdade em nossa correspondência.
Sirius tem me escrito também. Ele pretende se alistar para lutar na Guerra. Eu temo por ele, mas sei que ele é bem capaz disso. Faz parte da natureza dele desafiar o perigo. Por mim, a única coisa que interessa é estar ao seu lado, Ted. Conto os dias para ir embora, voltar para Hogwarts e aguardar os dias de visita a Hogsmeade, quando finalmente poderemos nos encontrar novamente.
Sempre sua,
Andrômeda
***
Um sangue-ruim, tia. Um estúpido mestiço, é esse o namorado secreto de Andrômeda!! – a voz de Bellatrix soava vitoriosa, enquanto pelo quarto da irmã, estavam espalhados diversos envelopes e cartas dobradas.A tensão na família chegara ao extremo nas férias de Natal. Andrômeda, Narcissa e Regulus não receberam permissão para permanecer em Hogwarts, em função do casamento de Bellatrix, que aconteceria nos últimos dias de dezembro. Todos os planos de Andrômeda, de tentar se encontrar com Ted em Hogsmeade no dia de Natal foram por água abaixo. Em Grimmald Place, era obrigada a se preocupar com a segurança de sua correspondência. E fora tola o suficiente para trazer consigo as últimas cartas do namorado, e escondê-las no fundo da sua mala.
Se no início suas irmãs acreditavam que o namoro de Andrômeda era apenas fachada, ou ainda, uma espécie de capricho, com o tempo perceberam que era sério. E enquanto Narcissa tentava convencê-la dos riscos que corria se insistisse naquele "romance tolo e desigual", Bellatrix ia mais longe, e parecia vigiar cada passo da irmã. Sempre ameaçando-a . Assim fora nos últimos meses de aula em Hogwarts, e durante todo o verão. Depois, quando as aulas recomeçaram, Andrômeda sentiu-se um pouco mais aliviada. Narcissa simplesmente limitou-se a afastar-se da irmã, gesto que fora imitado pela maioria dos alunos da Sonserina.
O inferno recomeçara no momento em que Andrômeda pisara em casa novamente. Bellatrix parecia ter mudado nos meses em que ficaram afastadas. Havia em seus olhos um brilho maldoso, quase fanático. E pela primeira vez, Andrômeda realmente sentiu medo.
Agora, sua intimidade fora vasculhada e escancarada para a apreciação da sua tia. A velha ameaça de Bellatrix fora cumprida.
Você está proibida de voltar a encontrar esse rapaz, Andrômeda, ou de manter qualquer tipo de contato com ele, entendeu? Se eu souber que minhas ordens foram desobedecidas, você pagará caro – a voz de Úrsula Black soou como uma punhalada em seus ouvidos – Bella, junte todo esse lixo e queime-o . E faça com que a sua irmã cumpra as minhas regras – a tia voltou-se para Andrômeda – nossa família tem setecentos anos de tradição puro-sangue...não pense que você irá quebrá-la. – disse isso, e deixou as duas sobrinhas.Bellatrix encarava a irmã com um brilho de triunfo no olhar.
Por que você fez isso? – Andrômeda perguntou, ríspida, enquanto via as cartas de Ted serem incendiadas, uma a uma – Hein? Vamos, diga!! – gritou furiosa, e agarrou os braços da irmã com força – Por que?!! O que a tia Úrsula lhe disse não é suficiente? Agora me largue!! – antes que Bellatrix se soltasse, Andrômeda a empurrou contra a parede – aprendeu a ser corajosa? Eu nunca fui covarde como você...nem invejosa... Inveja? – Bellatrix riu – minha querida, eu jamais vou sentir inveja de você...olhe-se no espelho, Andrômeda. Você não despertaria inveja nem mesmo numa minhoca. No fundo, eu entendo porque você escolheu um sangue-ruim...qual outro homem sentiria orgulho de ser seu namorado?? Cale a boca!! Cale a boca, sua estúpida. Ou você acha que eu teria coragem de ficar com um tipo asqueroso como o SEU namorado? Um idiota, que só falta lamber o chão que você pisa... Ele é um idiota que me dará um nome decente, querida. E isso conta muito hoje em dia, e será ainda mais importante no futuro... Eu não ligo para isso... Pois eu se fosse você me preocuparia mais com isso – a voz de Bellatrix tornou-se ameaçadora – os tempos estão mudando, irmãzinha...logo pessoas como o seu namoradinho não terão a menor chance...vocês está tendo a oportunidade de se livrar de um grande problema...preste atenção no que eu estou dizendo e, no futuro, não diga que eu não avisei. Eu não preciso dos seus conselhos...eu não preciso de nada disso – apontou para o quarto como um todo – para viver a minha vida.Andrômeda pegou um casaco que estava jogado sobre a cama e vestiu-o enquanto saía do quarto. Bellatrix veio logo atrás.
Aonde você pensa que vai? – gritou do alto da escada, chamando a atenção do resto da casa. Eu vou cuidar da minha vida – disse, em resposta.Desceu as escadas apressadamente, e quando se preparava para abrir a porta da rua, ouviu a voz da tia logo atrás de si.
Se você sair por esta porta não precisa mais voltar, Andrômeda. Por acaso eu sou algum tipo de prisioneira dessa casa? Você ouviu o que eu disse... Então eu sinto muito, titia – Andrômeda virou-se para encarar a tia – eu preciso de liberdade para fazer o que eu bem entender...Abriu a porta, saiu a fechou com um estrondo atrás de si. Na rua nevava intensamente.
Sentou-se na calçada, e refletiu sobre a sua situação. Além da varinha e de alguns nuques, que trazia no bolso, não levava mais nada dos seus pertences. Tinha o suficiente para pagar o Noitibus até o apartamento que Ted alugara no centro de Londres. Mas o medo e a vergonha pareciam impedi-la de agir. Somente quando o frio tornou-se insuportável, ela resolveu estender a varinha. Num estalo, um grande ônibus roxo surgiu na rua. Olhou mais uma vez a casa, que agora parecia desaparecer...
" E amanhã, meu nome não estará mais na tapeçaria" – pensou, amargurada.
***
Sirius,
Relutei muito nos últimos meses em lhe escrever, mas como você foi a primeira pessoa ( e talvez a única ) a incentivar o meu namoro com Ted, acredito que seria muita falta de consideração da minha parte não lhe deixar a parte de tudo o que aconteceu desde que eu deixei Grimmald Place.
A situação tornou-se insuportável. Eu tive que escolher entre continuar a minha vida confortável com a nossa família, ou viver a minha felicidade ao lado do meu namorado. Agora eu vejo o quão injusto essas convenções são. Eu imaginava que um dia poderia ter as duas coisas, mas isso é impossível.
Depois que saí de casa, procurei o Ted. No início ele me pareceu assustado, como se estivesse se sentindo culpado pela minha situação. Tentei acalmá-lo da melhor forma possível, embora eu ainda não saiba o que fazer da minha vida daqui para a frente. Eu não tenho dinheiro, não tenho amigos...nem com você mesmo eu posso contar, devido às circunstâncias dessa guerra. Estou com medo. Não me lembro de ter me sentido assim antes. No momento estou em Hogwarts, terminando os meus estudos...e depois? O Ted tem me falado constantemente em casamento. E embora eu ache essa atitude precoce, sei que é o mais sensato a se fazer. No momento, ele está procurando terras para comprar, e realizar o sonho de formar uma fazenda para cultivar ervas mágicas. Ao mesmo tempo, ele tem trabalhado duro no St. Mungus. Eu me alegro com essas notícias, e elas me deixam um pouco mais tranqüila.
Não tenho mais notícias de casa. Narcissa se recusa a falar comigo, e fez com que todas as minhas supostas amigas se afastassem de mim também. Com Regulus, no entanto, ainda consigo manter uma relação cordial, mas nós não tocamos no assunto da minha fuga, ou de qualquer outra coisa que nos faça entrar em conflito. Nossa relação é, basicamente a de dois colegas de turma.
Em breve lhe escreverei novamente, contando as minhas novidades. Espero que na próxima carta, eu tenha coisas mais alegres para lhe dizer. E antes que eu me esqueça, descobri que os trouxas podem ser pessoas muito divertidas. Eu conheci a família do Ted durante o Natal, e entendi que eles também têm muito a nos ensinar.
Com carinho, sua prima
Andrômeda
